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Por que envelhecemos e o que estamos fazendo para frear esse processo?


- Atualizado no dia 31 de agosto de 2019 -

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        Um dos grandes anseios da humanidade, especialmente após a era industrial, é a busca por uma grande longevidade. A adoção de um estilo saudável de vida é o que hoje nós temos de principal aliado nessa luta por anos extras de vida, porém esse é um fator limitado, apesar de significativo. Nisso, entra os avanços cada vez maiores da medicina para complementar o estilo de vida saudável e é onde as pessoas depositam suas esperanças de que um dia será banal alcançar os 100 anos de idade em boa forma.

        Nesse sentido, pesquisadores da Univesidade de Northwestern (Northwestern Medicine) fizeram recentemente um notável achado. Em um grupo isolado de pessoas, os Amish Kindred de Berne, foi descoberto que eles viviam em média 10 anos mais do que outros Amish Kindred, e a mutação genética responsável por isso foi identificada, abrindo caminho para o desenvolvimento de medicamentos que aumentam substancialmente a longevidade, podem resolver o problema da calvície e até prevenir a diabetes!

ATENÇÃO: No início deste artigo, será feito uma pequena revisão sobre o entendimento da ciência sobre o processo de envelhecimento. Na segunda parte, será discutido o estudo.

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   ENVELHECER

          A observação de que a maioria dos animais vivendo no ambiente selvagem raramente se tornam 'idosos' - por morrerem antes devido à predação, doenças, fome ou secas - sugere que o envelhecimento para idades avançadas é um fenômeno único aos humanos, apesar de, virtualmente, todos os organismos vivos passarem por um gradual envelhecimento (!). Em outras palavras, os avanços no conhecimento sobre higiene e biomedicina - especialmente os antibióticos e as vacinas - nos levou a descobrir o processo o "universo" da terceira idade. Enquanto nossa longevidade máxima ainda permanece a mesma nos últimos 100 mil anos (~125 anos) nossa expectativa de vida aumentou significativamente, onde ganhamos uma média extra de ~27 anos no último século.

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(!Relevante:

- É alegado, de forma controversa, que o rato-toupeira-pelado (Heterocephalus glaber) não envelhece ou não envelhece de forma significativa. Entenda: Por que o Rato-Toupeira-Pelado é um mamífero tão único?

- Existe uma espécie de água-viva que desafia a noção de envelhecimento, passando por ciclos indefinidos de rejuvenescimento. Entenda: Esse animal é imortal, e os cientistas estão começando a desvendar seus segredos genéticos
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         O processo de envelhecimento nos seres vivos é extremamente complexo e multifatorial, não existindo hoje uma teoria que englobe satisfatoriamente toda a sua extensão. Fatores diversos que podem ser citados incluem os radicais livres, o encurtamento progressivo dos telômeros, inflamações, sistema imunológico, regulação genética e mitocôndrias, todos associados com inúmeras hipóteses e várias teorias que tentam explicar o envelhecimento, e as quais entram em duas categorias: envelhecimento programado (regulação genética) ou envelhecimento gerado por erros/danos (radicais livres, desgaste celular, acúmulo de mutações).

         De qualquer forma, nos humanos, o avanço de idade é o principal fator de risco para a maioria das doenças crônicas, incluindo diabetes tipo 2, síndrome metabólica, problemas cardiovasculares e problemas neurodegenerativos. E à medida que a população mundial tem sua parcela idosa cada vez crescente, essas doenças também crescem concomitantemente em número.

         E importante também lembrar, o envelhecimento não é uma doença e, sim, um processo natural. Mesmo se curássemos todas as doenças, principalmente cardíacas, que acompanham o envelhecimento, no máximo conseguiríamos algo em torno de 15 anos a mais de vida, ou seja, nessa hipotética situação não nos tornaríamos 'imortais', apenas experimentaríamos uma morte sem essas doenças associadas. Para aumentar a longevidade, precisamos encontrar os mecanismos biológicos diretamente responsáveis por ela e tentar detê-los.

        Por que nós envelhecemos? Quando nós começamos a envelhecer? Qual é o marcador mestre do envelhecimento? Existe um limite do quanto nós podemos avançar na idade? Essas perguntas perseguem a humanidade há um bom tempo, mas, apesar dos avanços na área da biologia e genética, os mistérios que controlam a longevidade humana e dos outros seres vivos ainda permanecem sem uma definitiva solução.

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   TEORIA EVOLUCIONÁRIA DO ENVELHECIMENTO

           O envelhecimento, do ponto de vista evolucionário, pode ser visto de duas formas: individual ou populacional.

         Do ponto de vista individual, o envelhecimento seria fruto de um declínio na força da seleção natural. Pacientes com a doença de Hintington, por exemplo, resultado de uma mutação dominante letal, deveriam ser eliminados durante a seleção natural, mas, pelo contrário, o gene mutante continuou sendo perpetuado dentro da população humana. Como a doença começa a se manifestar tipicamente a partir de idades entre 30 e 40 anos, esse espaço de tempo já permitiu que o indivíduo se reproduzisse antes de morrer.

         Nessa linha, a seleção natural atuaria até onde os indivíduos de uma espécie conseguem sobreviver. Ou seja, a predação e a falta de recursos de sustentação, por exemplo, limitariam a expectativa de vida das espécies, fazendo que fatores evolucionários benéficos atuem somente nessa faixa de tempo. Por isso, doenças diversas e danos que afetam o ser a partir de uma certa idade não mais passam a ser combatidas com eficiência por faltar ferramentas evolucionárias para tal. E, de fato, observações mostram que espécies relacionadas tendem a viver mais tempo quando estão em um ambiente mais seguro e livre de predadores.

         Já do ponto de vista populacional, podemos pensar que o limite de longevidade é algo programado (ou adaptativo), onde os humanos e a maioria dos outros organismos complexos possuiriam mecanismos biológicos que propositalmente limitariam suas longevidades porque isso cria uma vantagem evolucionária, de uma forma parecida com a menopausa (Por que a menopausa nos humanos é tão adiantada?). Nesse caso, o organismo estaria concedendo benefícios a nível populacional e não individual, ou seja, sacrifícios em prol do bem comum.

          Atualmente tende-se a aceitar um pouco mais a ideia de que a longevidade seria otimizada pela evolução a fim de garantir a melhor perpetuação possível da espécie em determinado ambiente, entrando em concordância com a Teoria da Regulação Genética. A maior ou menor longevidade seria um meio, não o objetivo.

         A seguir, algumas principais teorias e hipóteses suportando um ou outro cenário.


   TEORIA DOS RADICAIS LIVRES

          Durante os processos metabólicos do corpo, radicais livres (O que são os radicais livres?) acabam sendo gerados e vão se acumulando no corpo com o passar do tempo, levando a danos generalizados, desde o DNA até os tecidos. Isso levaria ao progressivo envelhecimento do corpo, através de mutações indesejáveis e inutilização de células.

         A respiração mitocondrial, a base de produção energética de todos os eucariontes, gera espécies oxigenadas reativas através do vazamento de intermediários da cadeia de transporte de elétrons.  Danos no DNA mitocondrial podem levar à mais falhas e vazamento de mais radicais livres. Danos no DNA nuclear levariam à mutações diversas que resultariam nas mudanças vistas durante o envelhecimento. E o DNA mitocondrial, apesar de conter apenas de 1 a 3% do material genético de um organismo eucariótico, é de extrema importância. Como não possui histonas de proteção como o DNA nuclear, acaba sendo várias vezes mais sensível aos danos radicalares.

           Além disso, o excesso de espécies reativas no corpo é uma dos principais fatores de causa para a inflamação nos tecidos, outro marcador de envelhecimento.

          Nesse sentido, podemos entender a vida como uma forma de metabolismo com efeitos colaterais potencialmente danosos, com estes se acumulando em nossos corpos ao longo dos anos e levando a diferentes mudanças. Muitas dessas mudanças se tornam patogênicas e, juntas, levam ao processo de envelhecimento que eventualmente nos mata.

         Para atenuar a ação dos radicais livres, existem os antioxidantes. Portanto, o balanço entre essas duas espécies resultaria em uma maior ou menor taxa de envelhecimento.

          Nesse sentido, um estudo publicado em 2018 no periódico FEBS Journal (Ref.17) mostrou que a enzima tioredoxina-1 (TRX-1) e seu antagonista parecem estar intimamente ligada com o processo de envelhecimento. As espécies reativas de oxigênio são em grande parte neutralizadas pela TRX-1 como um mecanismo de proteção do corpo. Enquanto isso, seu antagonista TXNIP bloqueia a ação dessa enzima, de forma a garantir uma população saudável de compostos oxidativos (1) - em específico a manutenção do equilíbrio redox intracelular. Como os genes que expressam O TRX-1 e o TXNIP são cruciais, eles acabaram sendo altamente conservados ao longo do percurso evolutivo dos animais, sendo encontrados de moscas até humanos. Os cientistas no novo estudo, analisando as células-T de um grupo de voluntários com idades acima de 20 anos, primeiro mostraram que indivíduo com mais de 55 anos de idade produzem significativamente mais TXNIP do que indivíduos entre 20 e 25 anos. Já na segunda parte do estudo, os pesquisadores encontraram que moscas-da-fruta - a espécie Drosophila melanogaster no caso - expressando mais TXNIP viviam bem menos do que aquelas produzindo menos desse antagonista no corpo. Esses achados reforçam a teoria dos radicais livres.

         Apesar da maior ingestão de frutas, vitaminas - principalmente a C e a E - e outros antioxidantes já ter mostrado benefícios para o corpo, é inconclusivo se o processo de envelhecimento é significativamente freado com esse tipo de intervenção. Aliás, certas doses de antioxidante podem ser perigosas por causa do (1) Paradoxo dos Antioxidantes.
     

   TEORIA DA REGULAÇÃO GENÉTICA

          Aqui, o envelhecimento seria o resultado de mudanças ocorrendo na expressão de genes. Não apenas mudanças, as proteínas codificadas por genes específicos poderiam ter papel em regular a longevidade. Estudos anteriores já mostraram que certos produtos genéticos parecem influenciar no controle de longevidade de animais como vermes, moscas e ratos.


         Apesar de ser claro que muitos genes mostram mudanças na expressão com a idade, foi tópico de bastante debate se a seleção natural teria atuado em genes que promovem o envelhecimento de forma direta, o que tornou esse campo controverso até em torno do ano de 1950. Porém, ao longo das últimas décadas, os mecanismos evolucionários darwinianos sofreram significativas mudanças, devido aos avanços da genética e melhor entendimento da Evolução Biológica. Benefícios que geram efeitos positivos a nível populacional já foram mostrados terem influência no processo evolucionário. Processos neutros, como a deriva genética, também podem ter tido papel nesse "envelhecimento programado".

          Aliás, chega até a ser difícil conciliar mecanismos não programados (como danos gerados por radicais livres) com as gritantes diferenças de longevidade entre espécies que estão inseridas em um mesmo grupo e partilhando um perfil estrutural e bioquímico muito similar, como entre os mamíferos, onde certas baleias podem alcançar quase 200 anos mas muitos roedores não passam de 1 ano de idade (apesar de existir uma relação clara entre tamanho e longevidade, existem muitas exceções). Além disso, estudos recentes mostram que a acumulação de mutações no DNA somático em leveduras não possui um papel de causa no envelhecimento. E outras análises recentes de DNA entre espécies com drásticas diferenças de longevidade mostram uma maior expressão de reparadores de DNA naquelas com uma maior longevidade. Por que tais mecanismos de reparo não existem em espécies com baixa longevidade? Isso tudo indica que existe uma administração genômica superior, a qual pode incluir tanto genética quanto epigenética, controlando a longevidade.


          Em um envelhecimento programado, teríamos mecanismos atuando da mesma forma que aqueles que controlam os passos de crescente maturidade dos indivíduos, ou seja, uma orientação via relógio biológico. Isso abre as portas para intervenções artificiais que barrem esses mecanismos e prolonguem a longevidade humana.

          Artigo recomendado: Encontrado tubarão com 400 anos de idade!


   TEORIA DO TELÔMERO

         O telômero, basicamente, é a porção final de um cromossomo, sendo constituídos de repetitivas sequências de nucleotídeos no DNA não-codificadoras. O telômero possui a função principal de proteger o cromossomo de danos, mas cada vez que uma célula se divide, ele se torna mais curto. Eventualmente os telômeros se tornam tão curtos que a célula não mais pode se dividir.

          O telômero está presente em ambas as pontas finais dos cromossomos e protegem o o genoma da degradação nucleotídica, recombinações desnecessárias, reparo e fusão inter-cromossômica. A atividade Telomerase - a habilidade de estender os telômeros - está presente em germes diversos e certas células hematopoiéticas, mas baixa ou indetectável em células somáticas, levando a um progressivo encurtamento a cada replicação e eventual morte celular. Telomerases são reativadas na maior parte das células de cânceres e células imortalizadas (algumas também mantêm o telômero a partir de outros mecanismos, provavelmente envolvendo recombinação genética).

.          Estudos já mostraram que os telômeros, de fato, encurtam mais lentamente em animais selvagens que envelhecem mais devagar do que aqueles que envelhecem mais rápido. Além disso, o tamanho reduzido dos telômeros está associado com um maior risco de desenvolver certas doenças, como cânceres e problemas cardíacos. Algumas evidências até sugerem que o tamanho dos telômeros pode predizer a longevidade de um espécime.

         Certos fatores de estilo de vida, como o fumo, obesidade, sedentarismo e dieta não saudável como aumentar a taxa de encurtamento dos telômeros, podendo levar a uma morte prematura ou à doenças.

            Nesse sentido, encontrar meios de frear o encurtamento dos telômeros pode aumentar substancialmente a longevidade.


   HIPÓTESE DO SISTEMA IMUNOLÓGICO

           Aqui, o envelhecimento seria indiretamente controlado por uma rede de mecanismos de defesa celulares e moleculares. As principais partes dessa rede são constituídas por enzimas de reparo do DNA, ativação de poli (ADP-ribosil) polimerase, sistemas enzimáticos e não-enzimáticos de antioxidantes (dismutase superóxido, catalase, peroxidase glutationa, etc.), e produção de proteínas de choque térmico. Esses mecanismos funcionam para limitar os efeitos negativos de uma variedade de agentes estressantes físicos, químicos e biológicos. A eficiência dessa rede é geneticamente controlada e difere entre espécies e espécimes, o que explicaria dessa maneira as diferenças de longevidade observadas.

          O sistema imune representaria o mais poderoso mecanismo contra agentes de estresse, afetando o estado e ação de macrófagos e leucócitos, e reagindo aos radicais livres. Suportando essa hipótese e a importância do sistema imune em determinar o envelhecimento temos a evidência da alta incidência de tumores e maior suscetibilidade às infecções de patógenos mostradas pelas pessoas idosas.


   TEORIA NEUROENDÓCRINA

          Aqui, o envelhecimento seria devido à mudanças nas funções neurais e endócrinas que são cruciais para: coordenação e resposta de diferentes sistemas ao ambiente externo; programar respostas fisiológicas aos estímulos ambientais; e a manutenção de uma estado funcional otimizado para a reprodução e sobrevivência.

         Essas mudanças, não apenas seletivamente afetam a regulação de neurônios e hormônios de significância evolucionária (reprodução, crescimento e desenvolvimento), mas também influencia a regulação da sobrevivência através de adaptações ao estresse. Portanto, a longevidade, regulada por "relógios biológicos", passaria por uma contínua sequência de estágios orientados por sinalizações endócrinas e nervosas. O principal regulador, nesse caso, seria representado pelo eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA).

          De fato, a concentração de hormônios diversos (testosterona, estrógenos, GH, etc.) diminuem com o avanço da idade e terapias de reposição hormonal sempre foram um foco de pesquisas mirando intervenções 'anti-envelhecimento'.

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   INTERAÇÃO E INTEGRAÇÃO

          Entre as várias hipóteses e teorias que vêm para explicar o envelhecimento é mais do que provável que exista uma complexa interação entre esses mecanismos propostos. O encurtamento dos telômeros e o acúmulo de espécies oxigenadas reativas podem ser a base de outros mecanismos (imunológicos, endócrinos, nervosos, inflamatórios, genéticos) que, em conjunto, explicariam o porquê dos seres vivos envelhecerem. Em específico, um conjunto de fatores poderia servir para orientar o envelhecimento programado através da regulação genética.

          Assim como outras estruturas biológicas dentro das células, o epigenoma também sofre uma progressiva perda de configuração durante o envelhecimento, resultando em uma profunda mudança na arquitetura cromossômica, integridade genômica e padrões de expressão genética. E os fatores epigenéticos - os quais são caracterizados por serem genes posteriormente ativados no material genético a partir de agentes externos e internos - podem sofrer influência de mecanismos programados ou não programados. Seria a epigenética uma causa ou apenas consequência?

         Um bom exemplo para ilustrar essa intercomunicação de sistemas é mencionar que o protocolo de restrição calórica já mostrou em modelos animais ser bastante eficiente para aumentar a longevidade máxima de um espécime. Uma dieta mantendo todos os nutrientes essenciais mas reduzindo 40% do consumo calórico normal é capaz de aumentar de 30% a 40% a longevidade de mamíferos.

          A longevidade promovida pela restrição calórica seria mediada por uma reprogramação metabólica, a qual reduziria o metabolismo energético, e aumentaria a biossíntese e modificação de proteínas. Além disso, já foi demonstrado que a restrição metabólica influencia a expressão de fenótipos patológicos e fatores epigenéticos. No geral, inúmeras são as respostas celulares e sistêmicas no corpo ativadas pelo menor consumo de calorias, principalmente com as adaptações trazidas pelas mudanças no nível de insulina circulante. Estudos recentes também já mostraram que existe um aumento no número de radicais livres dentro das mitocôndrias, levando, como resposta, a um aumento na capacidade antioxidante de defesa do corpo como um todo.

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Atualizações:

- Um estudo publicado em 2018 na Proceedings of the National Academy of Sciences (Ref.15) mostrou que moscas-da-fruta (Drosophila) geneticamente modificadas para não produzirem a proteína Sirt4 - a qual também é encontrada nos seres humanos - vivem significativamente menos, enquanto os insetos modificados para uma maior produção dessa proteína viviam mais do que o normal. Além disso, os insetos com a falta da Sirt4 mostraram uma maior sensibilidade à fome, uma diminuição na fertilidade e nas atividades gerais, e uma inabilidade de usar energia armazenada em seus corpos. A Sirt4 - encontrada nas mitocôndrias - faz parte de uma classe de proteínas, chamada 'sirtuina', que são responsáveis por regular aspectos da longevidade, metabolismo, estabilidade genômica, diabetes e neurodegeneração. O achado do novo estudo sugere que uma maior longevidade e melhor saúde humana podem ser alcançados com o uso terapêutico dessa proteína ou terapias genéticas que tenham ela como alvo.

- Acesse: Cientistas criam um teste simples de urina que pode medir qual a sua real idade 

- Em um estudo publicado em 2018 na Science (Ref.16), pesquisadores mostraram que fatores externos são muito mais decisivos na longevidade de um indivíduo do que a genética. Construindo uma árvore genealógica ligando 13 milhões de pessoas - englobando uma média de 11 gerações - os pesquisadores compararam as datas de nascimento e de morte das pessoas, levando em consideração também o parentesco entre elas. A conclusão foi que a hereditariedade explica somente cerca de 16% da diferença entre as longevidades computadas para essas pessoas. A maioria das diferenças foram ligadas a outros fatores diversos, como onde e como esses indivíduos viviam. Isso sugere que os genes possuem menos relevância do que pensado para definir a longevidade das pessoas, reforçando as teorias de envelhecimento ligadas ao acúmulo de danos no corpo como fator principal.

- Um estudo publicado em 2018 no periódico Genetics (Ref.18), analisando 400 milhões de pessoas associadas com árvores genealógicas se estendendo desde o século XIX até o início do século XIX, reforçou que o fator genético possui apenas uma limitada influência na longevidade (<10%). Curiosamente, eles encontraram que pessoas em um relacionamento estável da mesma família mas sem parentesco genético (casais) possuíam longevidades mais parecidas entre si em comparação com o fator 'parentesco genético', talvez porque os indivíduos tendem a formar casais com estilos de vida mais similares, ou seja, fatores ambientais podem ser mais importantes.
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   GENE DA LONGEVIDADE

           Em um notável estudo publicado em 2017 na Science (Ref.1), pesquisadores conseguiram destrinchar um importante fator genético que parece estar diretamente associada com o envelhecimento. Entre os destaques do estudo, temos:

- A descoberta da primeira mutação genética que protege contra múltiplos aspectos do envelhecimento em humanos;

- Pessoas do grupo Amish que carregam essa mutação vivem >13% mais - alcançam cerca de 85 anos - em comparação com aqueles que não carregam a mutação (cerca de 75 anos), e possuem telômeros 10% mais longos;

- Um medicamento foi criado com base nessa pesquisa e está sendo testado em humanos;

- Medicamentos relacionados estão sendo produzidos como tratamento tópico para a calvície;


   GENE SERPINE1

          Células e tecidos envelhecidos exibem um distinto padrão de expressão proteica, incluindo o aumento do inibidor de plasminogênio ativador PAl-1. Encodado pelo gene SERPINE1, o PAl-1 é o principal inibidor de plasminogênios ativadores endógenos e é sintetizado no fígado e no tecido adiposo. Em adição ao seu papel em regular a fibrinólise, o PAl-1 também já mostrou contribuir diretamente para o envelhecimento celular in vitro. Evidências acumuladas nos últimos anos também mostram uma associação entre o PAl-1 e a resistência à insulina, problemas cardíacos e encurtamento de telômeros.

           Porém, o papel específico do PAl-1 na longevidade humana até o momento era incerto e apenas extrapolado de experimentos controlados em modelos animais e in vitro. Isso agora parece mudar com a análise genética de indivíduos da Antiga Ordem Amish.


   AMISH KINDRED

         O povo Amish Kindred, em Berne, Indiana, são geneticamente e culturalmente isolados. Os ancestrais dos Amish de Indiana emigraram de Berne, Suíça, em meados do século XIX. A cidade relembra a arquitetura da sua cidade suíça natal de mesmo nome.

        Uma mutação no gene SERPINE1 foi introduzida entre os Amish Kindred por camponeses da Suíça, os quais se moveram para a área. Dois dos seus descendentes, que carregavam a mutação, se casaram dentro da comunidade Amish. Nesse sentido, a comunidade Amish fora de Berne não carrega essa mutação.

         Indivíduos que carregam uma cópia mutante do gene possuem níveis de PAl-1 cerca de metade do nível de outros Kindred com duas cópias normais.


   BAIXA CONCENTRAÇÃO DE PAl-1 EM HUMANOS

         Analisando o caso 'Kindred', os pesquisadores mostraram que aqueles carregando a mutação tinham o comprimento dos telômeros em torno de 10% maiores, uma longevidade 13% maior e possuíam um perfil metabólico bem melhor, com quase 30% menos insulina circulando em estado de restrição calórica, estando completamente protegidos da diabetes!

         Além disso, os pesquisadores também notarem uma melhora nos parâmetros cardiovasculares, como pressão sanguínea e flexibilidade das artérias. Apesar de, nesse caso, a melhora não ter sido estatisticamente significante, o sistema cardiovascular dos indivíduos carregando a mutação parecia mais jovem, especialmente na 3° idade.

        Pela primeira vez, um marcador molecular de envelhecimento (tamanho dos telômeros), um marcador metabólico de envelhecimento (níveis de insulina sob jejum) e um marcador cardiovascular de envelhecimento (pressão sanguínea e rigidez de vasos sanguíneos) são todos unidos por um único parâmetro.

          Para obter esses resultados, 40 médicos de diversas áreas, enfermeiras e outros profissionais de saúde fizeram testes variados - de sangue e pressão arterial até urina e função pulmonar - em 177 Amish, os quais chegaram em cavalos e charretes. Apesar de serem um povo bastante tradicional e afastado de outras culturas, muitos concordaram em fazer os testes porque alguns deles possuíam uma grave desordem sanguínea relacionada com o PAl-1 e estavam curiosos em saber do que se tratava.

           Agora, o perfil cognitivo também será analisado em pesquisas futuras, mas experimentos com ratos já mostraram que baixos níveis de PAl-1 podem proteger contra contra patologias neurodegenerativas, como o Alzheimer.


   DUAS CÓPIAS DO GENE MUTANTE

         No início da década de 1990, Dr. Amy Shapiro, um hematologista do Indiana Hemophilia & Thrombosis Center ouviu do caso de uma garota Amish local que tinha batido sua cabeça quando tinha três anos de idade e acabou tendo um grave sangramento anormal a partir da ferida. A criança precisou de cirurgia, a qual disparou ainda mais severos sangramentos e levaram à necessidade de uma transfusão sanguínea. Ela quase morreu. Quando Shapiro aprendeu sobre o caso, a garota já tinha nove anos de idade e, interessada em ajudar sua família, deixou que o médico a examinasse mais atentamente.

         Foi descoberto que o sangramento anormal era devido a uma rara desordem gerada por uma deficiência de PAl-1. A mutação foi caracterizada no laboratório do Dr. David Ginsberg na Universidade de Michigan e publicada no New England Journal of Medicine, em 1992. Os indivíduos afetados por essa desordem sanguínea tinham duas cópias do gene mutante SERPINE1, a qual leva a uma ausência de PAl-1 no sangue e resulta em excessivos sangramentos.

         O PAl-1 possui um papel importante na regulação de parte do sistema de coagulação sanguínea que ajuda a dissolver os coágulos formados. Quando uma pessoa não possui PAl-1 circulante, ela acaba tendo uma maior destruição de coágulos e um maior sangramento de feridas, menstruação e outras situações do tipo.

        Porém, quem possui apenas uma cópia do gene mutante fica apenas com uma menor quantidade de PAl-1 circulante e, pelo que mostra o novo estudo, um corpo mais saudável e com um maior potencial de longevidade.

        Shapiro testou os pais e os parentes da garota afetada pela desordem sanguínea, encontrando mais indivíduos afetados. Uma árvore genealógica foi construída para determinar quem mais podia estar afetado. Até o momento, cerca de 10 mil indivíduos já foram incluídos nessa árvore, representando várias gerações, e com a maior parte carregando apenas um cópia mutante.


   MEDICAMENTO ANTI-ENVELHECIMENTO E ANTI-CALVÍCIE

         Basicamente, baixos níveis de PAl-1, mas não sua ausência, estão associados com uma significativa maior longevidade e enorme melhor do perfil metabólico. Nessa linha, a Universidade de Northwestern entrou em parceria com a Universidade de Tohoku, no Japão, para o desenvolvimento e teste de um medicamento oral - TM5614 - que inibe a ação do PAl-1, reduzindo sua atividade na corrente sanguínea. O medicamento já foi testado em uma fase clínica 1 no Japão - atestando sua segurança e não toxicidade em humanos - e agora está indo para a fase clínica 2. A Northwestern irá aplicar para aprovação no FDA para o início dos testes clínicos nos EUA.

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          Em humanos, os testes irão focar na investigação dos efeitos da nova droga na sensibilidade à insulina e na obesidade. Análises a longo prazo trarão resultados sobre longevidade e outros marcadores associados.

         Em ratos, testes anteriores com o medicamento renderam espécimes com uma longevidade acima de três vez mais do que em grupos de controle, com pulmões e sistema vascular mais protegidos de patologias.

         Somando-se a isso, quando o medicamento foi administrado em ratos carecas, houve um crescimento de pelos nesses. Os pesquisadores já estão trabalhando em um medicamento tópico que pode tratar a calvície de padrão masculino em humanos e os resultados podem ser promissores.

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   CONCLUSÃO

        Apesar de ainda estarmos no início da nossa trajetória para desvendarmos os mistérios do envelhecimento, finalmente parece que alcançamos um avanço para o desenvolvimento de um medicamento antienvelhecimento que realmente funciona (em meio às inúmeras propagandas de produtos suspeitos, principalmente na área estética, que prometem rejuvenescimentos não baseados em evidências científicas). Forte evidência indica que o inibidor PAl-1 nas células está associado com um número de parâmetros que podem refletir o envelhecimento biológico, incluindo o tamanho dos telômeros, metabolismo e longevidade. É mais uma evidência de que os genes estão intimamente ligados com o envelhecimento - apesar de fatores ambientais também atuarem de forma importante nesse processo. 


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REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://advances.sciencemag.org/content/3/11/eaao1617.full
  2. https://news.northwestern.edu/stories/2017/november/amish-live-longer-healthier-internal-fountain-of-youth/
  3. http://www.sciencemag.org/news/2017/11/mutation-blood-clotting-gene-may-extend-human-life-span
  4. http://advances.sciencemag.org/content/2/7/e1600584.full
  5. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2685272/
  6. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2995895/
  7. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28259118
  8. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1369276/
  9. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4292845/
  10. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5676791/
  11. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3370421/
  12. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26348426
  13. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28950166
  14. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3001368/
  15. http://www.pnas.org/content/early/2018/01/26/1720673115
  16. http://science.sciencemag.org/content/early/2018/02/28/science.aam9309
  17. https://febs.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/1873-3468.13156
  18. https://www.genetics.org/content/210/3/1109