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O que é a Morte Térmica do Universo?


- Atualizado no dia 12 de agosto de 2020 -

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           Nosso Universo possui cerca de 13,8 bilhões de anos de idade e teve um início hoje aceito como 'Big Bang'. E como sabemos que o nosso Universo teve um início? Como rejeitar a ideia de que ele não está por aí desde "sempre", ou seja,  que tenha uma idade infinita? Bem, é fácil justificar essa afirmação com duas observações. A primeira envolve o mistério associado à escuridão do nosso céu à noite (Por que o céu é escuro à noite?). Já a segunda lida com o simples fato de existir a 2° Lei da Termodinâmica. E é nessa lei onde a nossa Morte Térmica entra. Segundo a Termodinâmica, nosso Universo está fadado à escuridão e inatividade total, e com a Mecânica Quântica garantindo um show de mega-explosões de Anãs Negras antes do fim.


     2° LEI DA TERMODINÂMICA

          Primeiro, vamos entender um pouco a 2° Lei da Termodinâmica. Basicamente, essa lei nos dá a direção do fluxo de calor e nos diz que a transformação de trabalho mecânico em calor pode ser completa, mas que calor em trabalho precisa ser incompleta. Desse modo , todos os processos visíveis no Universo envolvem a conversão de pequenas quantidades de trabalho ou energia em calor, caracterizando-os como processos irreversíveis, com esse calor fluindo espontaneamente da fonte quente para a fonte fria. Aqui, entra também a entropia, a qual, dentro de um sistema isolado, estará sempre aumentando até chegar a um estado máximo, ou permanecer constante caso o sistema esteja, desde o início, em um equilíbrio termodinâmico ou estiver sob um processo reversível. E o Universo é um sistema isolado.
          Apesar do termo entropia ser constantemente e erroneamente associado à ideia de desordem e caos, sob o ponto de vista tanto qualitativo quanto quantitativo, a entropia é melhor descrita como uma medida de dispersão energética dentro de um sistema a uma determinada temperatura. Em termos de termodinâmica molecular, podemos também dizer que um aumento de entropia implica no aumento do número de microestados acessíveis, onde mais energia dispersada pode alcançá-los. Para exemplificar, se jogarmos uma pedra de gelo e um volume de café quente em um sistema isolado, espontaneamente energia irá fluir do café quente para o gelo, eventualmente derretendo esse último, com a temperatura do café diminuindo e aquela da água associada ao gelo aumentando, até atingirmos o equilíbrio térmico e uma temperatura uniforme. Esse processo ocorre com um contínuo aumento de entropia, porque a maior energia térmica associada inicialmente ao café é continuamente dispersada dentro do sistema café-gelo. 

           Não dependendo do caminho seguido pelo sistema, a variação de entropia será a mesma se o estado final de um processo reversível e irreversível é o mesmo. Já se a variação de entropia for maior, o trabalho disponível diminui e a possibilidade de conversão de calor em trabalho diminui. Isso é resumido nas equações matemáticas abaixo. 

          Sem a presença de trabalho externo, a entropia dentro de um sistema isolado nunca diminui como um todo. Pode ser que algumas partes desse sistema tenham sua entropia diminuída, mas isso é compensado pelo aumento de entropia em outras partes. Em outros palavras, um sistema isolado tende ao equilíbrio termodinâmico (com temperatura homogênea em todo o sistema), onde, neste ponto, a entropia encontra o seu limite. Aqui, então, entramos com o conceito de Morte Térmica.

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     MORTE TÉRMICA

           A Morte Térmica é o fenômeno no qual todos os processos no Universo irão, eventualmente, parar, consequente da ação do fluxo temporal na entropia, ou seja, com esta continuamente crescendo. Em outras palavras, com bastante tempo, a energia irá ser distribuída de forma igual por todo o Universo, passando a inexistir fontes quentes e fontes frias para a realização de trabalho, porque tudo terá a mesma temperatura. Quando o Universo alcançar seu estado de máxima entropia - estado de equilíbrio termodinâmico - nenhum trabalho será possível de ser realizado e toda a energia disponível será convertida em energia indisponível. Além disso, desde o momento do Big Bang, a temperatura média do Universo decresce constantemente 10-43 segundos. A temperatura inicial do Universo era de 1032 K, mas agora está em torno de 2,73 K (1) na média. Ou seja, o Universo também está caminhando para muito próximo do zero absoluto (0 K ou -273,15°C), seguindo a entropia que tende ao "infinito" (máxima). Por isso a Morte Térmica também é conhecida como o 'Grande Frio'.

 
          Caminhando para a entropia máxima, sobrarão apenas estrelas, que ainda poderão continuar liberando um fluxo de calor por bilhões de anos, até o combustível para fusão nuclear (Como são formados os elementos químicos?) se exaurir e elas morrerem. Caso a massa seja suficiente, a "morte" delas irá dar origem ou a uma estrela de nêutrons (O que é uma Estrela de Nêutrons?) ou a um buraco negro (O que é um Buraco Negro?). As estrelas de nêutrons irão se esfriar até atingir a temperatura do ambiente ao redor e só sobrarão os buracos negros e um tanto de matéria. Sem energia para o nascimento de novas estrelas, não existirá mais estrelas, galáxia ou vida. Os buracos negros começarão a sugar toda a matéria visível restante e, a partir de 10100 anos após o Big Bang, os próprios buracos negros começarão a "evaporar", devido à emissão da radiação de Hawking (1). Apenas escuridão irá reinar no Universo, marcando sua "morte". Esse seria o provável fim do nosso Universo, pelo menos do ponto de vista de qualquer tipo de vida que nele já existiu.

          Nesse sentido também fica fácil entender porque é tão óbvio a existência de um início para o Universo. Caso contrário, já estaríamos em uma Morte Térmica há muito tempo. Nesse início, a entropia do Universo era tão baixa que se torna algo além da compreensão. Tudo concentrado em uma singularidade, até a explosão na forma de Big Bang. E essa baixíssima entropia é que permite tudo que vemos hoje. Tudo está acontecendo enquanto consome esse baixo valor para um alto, ou seja, o contínuo aumento da entropia. Seu copo de café continua esfriando por  existir possibilidade de aumento da entropia. Nosso metabolismo corporal continua pelo mesmo motivo. Estrelas são permitidas de fundir seus átomos também pelo mesmo motivo. Mas caso o Universo encontre a sua Morte Térmica, a vida e a "visibilidade" do Universo deixarão de existir até o infinito do tempo ou para sempre.

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   SHOW FINAL DE MEGA-EXPLOSÕES

          O fim de vida das estrelas de menor porte, como o Sol, não é caracterizado por uma dramática explosão (supernova), mas por um processo mais lento de perda das camadas mais externas até deixar para traz um núcleo bastante massivo, absurdamente denso, muito quente, e do tamanho aproximado da Terra, conhecido como Anã-Branca. Mesmo com a  drástica redução na capacidade de fusão nuclear, o colapso gravitacional das Anãs-Brancas é impedido pelas forças de contrabalanço causadas pelos elétrons (pressão eletrônica de degenerância). Leis da Mecânica Quântica previnem que os elétrons nos átomos sejam espremidos juntos além de um certo ponto (impossibilidade de ocuparam o mesmo estado), permitindo a estabilidade da massa remanescente.

           Nesse sentido, os átomos dentro de uma Anã-Branca assuem uma estrutura cristalina travada (I) que irradia calor por bilhões-trilhões de anos. Eventualmente, no entanto, esses corpos se tornam extremamente frios, dando emergência a uma Anã-Negra.

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           Como as Anãs-Negras não possuem energia suficiente para realizar ativamente fusão nuclear, pouca coisa ocorre dentro desses corpos sólidos e frios. Por outro lado, a mecânica quântica - via processo de tunelamento - permite que a fusão entre átomos nas Anãs Negras ocorra quando as partículas vencem barreiras energéticas proibidas, mas a uma taxa extremamente lenta.

          Essas sucessivas fusões entre núcleos atômicos eventualmente irão originar átomos de ferro (Fe-56), e com contínua geração de pósitrons nesse processo (II), a antipartícula de um elétron. Esses pósitrons, por sua vez, acabam aniquilando elétrons dentro da Anã Negra, diminuindo lentamente ao longo do tempo a pressão de degenerância. Segundo um estudo publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (Ref.7), para estrelas originais entre 1,2 e 1,4 vezes a massa do Sol - cerca de 1% (1021) de todas as estrelas hoje estimadas de existirem no Universo -, essa progressiva perda de elétrons, acúmulo de ferro no núcleo e consequente enfraquecimento da pressão de degenerância resultariam em um catastrófico colapso gravitacional nesses corpos que, por sua vez, deflagrariam colossais explosões similares a supernovas.

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(II) Para mais informações, acesse: Como são formados os elementos químicos?

           Segundo os cálculos do estudo, essas dramáticas detonações das Anãs Negras começariam a ocorrer daqui a cerca de 101100 anos, um número inimaginável. Essas gigantescas explosões continuariam a ocorrer até 1032000 anos a partir de agora, um número muitas vezes ainda mais inimaginável. E esses números inimagináveis não terminam aqui.

          Como a energia escura terá expandido absurdamente o espaço do universo ao longo de todos esses anos, nenhuma dessas explosões será capaz de ser observada por nenhum outro corpo ou entre as Anãs Negras. Para se ter uma ideia, os pesquisadores no estudo estimaram que o raio do Universo observável terá crescido em mais de e10^1100 ('e' é aproximadamente 2,72) vezes, algo que vai além do inimaginável.

          Ou seja, "pouco" antes do Universo se transformar em total escuridão e inatividade (morte térmica), provavelmente teremos um show de várias mega-explosões de Anãs Negras, e, ao mesmo tempo, silêncio.
 
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     MITO SOBRE A MORTE TÉRMICA

         Algumas pessoas - e cientistas antigamente - acreditam que a expansão do Universo é responsável por grande parte do aumento da sua entropia, já que a expansão do espaço criaria novos estados para novas configurações da matéria, levando a um maior grau de dispersão energética por probabilidade. Porém, a temperatura da radiação micro-ondas  do "pano de fundo" do Universo diminui na mesma intensidade à medida que o espaço cosmológico expande. Nesse sentido, o aumento de entropia devido à expansão é compensado pela diminuição da temperatura. Em outras palavras, essa expansão é adiabática e isentrópica, quase como na expansão adiabática e quasi-estática de um gás.

         A realidade é que o aumento de entropia no Universo é dado, principalmente, por processos que incluem o aquecimento gerado pelo colapso gravitacional de estrelas, conversão de energia nuclear em energia térmica nas estrelas e radiação térmica emanada, mais uma vez, por estrelas. Processos irreversíveis onde é gerado bastante calor que será distribuído para as vizinhanças e além. Por outro lado, a expansão contínua do Universo acelera a morte térmica no sentido em que diminui a interação entre a matéria (ex.: colisões entre galáxias se tornarão menos frequentes).


     BIG CRUNCH?

         Uma outra possibilidade já considerada para o fim do Universo como o conhecemos viria na forma de uma super contração que devolveria novamente o estado de singularidade pré-Big Bang. Esse processo é conhecido como 'Big Crunch' ("Grande Esmagamento", na tradução). Nesse caso, a densidade da matéria total no Universo precisa ser alta, ou seja, maior do que a sua densidade crítica, o que faria com que a expansão estivesse sendo freada e seja, eventualmente, parada pelos efeitos gravitacionais da matéria. A partir desse ponto, toda essa matéria espalhada seria puxada para um ponto, fazendo o Universo entrar em colapso, o Big Crunch. Isso aconteceria se estivéssemos em um Espaço Esférico. Mas como já explicado no artigo sobre a expansão do Universo (O que é a Expansão do Universo?), essa não parece ser a realidade, com todas as evidências astronômicas indicando que temos um Espaço Plano (hoje ideia aceita como um consenso no meio acadêmico). Portanto, o Universo tenderá a se expandir por tempo infinito, e nunca irá contrair. Nesse cenário, a Morte Térmica é a única solução plausível, e não um Big Crunch.

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    SERIA POSSÍVEL IMPEDIR A MORTE TÉRMICA?

           Diversos trabalhos teóricos estão sendo feitos ou já foram publicados ao longo das últimas décadas tentando prever o desenvolvimento futuro do Universo. Para a Morte Térmica, em específico, talvez a única saída para contornar esse processo é se de alguma forma fosse possível conseguir algum método ou mecanismo no Universo que conseguisse criar mais átomos de hidrogênio de radiação eletromagnética ou Energia Escura, por exemplo, para fomentar novas estrelas. Com as reações nucleares de fusão dentro dessas novas estrelas em formação, calor passaria a fluir novamente no Universo. Isso poderia vir de algum evento natural no Universo do qual não conhecemos, ou poderia vir, interessantemente, de algo bastante complexo já bastante familiarizado de nós: a vida!

          Em 1979, o excepcional físico e matemático teórico Freeman Jonh Dyson, hoje com 93 anos, fez uma fascinante declaração: 
   

           Sob esse ponto de vista, não podemos entregar o futuro do nosso Universo apenas às leis naturais da termodinâmica. A inteligência dos seres vivos no Universo pode alcançar um nível não só de domínio de sistemas estelares e de galáxias, mas como também do próprio Universo. Se hoje aqui na Terra os humanos estão trabalhando com a ciência para vencer a morte natural da vida, pode ser que em algum lugar sociedades alienígenas muito avançadas estão já trabalhando em meios para vencer a morte do próprio Universo. Faça-se a luz?

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(1) K (Kelvin) é a medida oficial de temperatura usada nos cálculos científicos, especialmente na termodinâmica. Equivale ao °C (Celsius) subtraindo-se o valor de 273,15 na temperatura medida em Kelvin. Por exemplo, 298,15 K é o mesmo que 25°C.

(2) É uma radiação eletromagnética prevista pelas teorias de Stephen Hawking, a qual seria liberada aos poucos pelos buracos negros e gerada pela captura de pares de partículas-antipartículas criadas espontaneamente próxima do horizonte de eventos desses corpos (O que é um Buraco Negro?)


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REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://physics.bu.edu/~duffy/py105/Secondlaw.html
  2. https://arxiv.org/ftp/physics/papers/0211/0211084.pdf
  3. https://www.researchgate.net/publication/299618320_Heat_Death_The_Ultimate_Fate_of_the_Universe
  4. https://www.grc.nasa.gov/WWW/K-12/airplane/compexp.html
  5. https://van.physics.illinois.edu/qa/listing.php?id=28957&t=entropy-in-universe-expansion
  6. https://www.mso.anu.edu.au/~charley/papers/LineweaverEganParisv2.pdf
  7. https://academic.oup.com/mnras/advance-article-abstract/doi/10.1093/mnras/staa2262/5884975
  8. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0262407920309726
  9. http://entropysite.oxy.edu/entropy_isnot_disorder.html