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Como amenizar e prevenir, naturalmente, uma dor de cabeça?

                           
- Atualizado no dia 12 de abril de 2022 -

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           As dores de cabeça são uma das reclamações mais frequentes do mundo. Um estudo de revisão publicado recentemente no periódico The Journal of Headache and Pain (Ref.9) concluiu que 52% da população global é afetada por uma desordem caracterizada por dor de cabeça anualmente, com 14% reportando enxaquecas e 4,6% reportando uma dor de cabeça por 15 dias ou mais por mês. Em um dado dia, os pesquisadores estimaram que próximo de 16% da população experiencia dor de cabeça e quase metade desse total reportando uma enxaqueca. Todos os tipos de dor de cabeça mostraram-se mais comuns em indivíduos do sexo feminino do que no sexo masculino, mais notavelmente para enxaquecas (17% e 8,6%, respectivamente) e dores de cabeça durante 15 dias ou mais por mês (6% e ~3%, respectivamente).

          Não importa onde ou em quem, o maldito incômodo na cabeça, principalmente ao redor dos olhos, frequentemente aparece para nos atormentar. Com isso, a procura por analgésicos é enorme. Aqui no Brasil, somente em 2015, 36% de todo OTC (Over-the-counter Drugs, ou seja, medicamentos vendidos diretamente ao consumidor sem um prescrição médica) veio do comércio de analgésicos, totalizando uma movimentação de mais de R$ 5,5 bilhões. E isso em plena recessão econômica.

          Porém, entupir-se de analgésicos está longe de ser um bom hábito, principalmente porque isso gera um vício, e cada vez mais resistência farmacológica às dosagens usuais. Somando-se a isso, o abuso desses fármacos pode até mesmo gerar episódios mais intensos e frequentes de dores com o tempo. Todo medicamento carrega riscos de sérios efeitos colaterais, e o uso em excesso pode aumentar de forma desnecessária as chances de preocupantes prejuízos para a saúde  (1). E apesar de opções medicamentosas para a enxaqueca terem melhorado na última década, muitos pacientes continuam experienciando substancial dor e debilidade mesmo tomando múltiplos fármacos.

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           No sentido de reduzir o consumo de medicamentos para dor de cabeça e enxaqueca, existem estratégias simples e não-farmacológicas que podem ser testadas para amenizar e até prevenir essas cefaleias. Porém, é preciso reforçar que essas estratégias são mais efetivas para dores de cabeça casuais, especialmente aquelas derivadas do stress e resultadas de tensões nos músculos dos ombros, maxilar, escalpo e pescoço. Fortes crises de enxaqueca e dores de cabeça acompanhadas por outros sintomas devem ser tratadas seguindo orientação médica.

           Bem, vamos às dicas:

1. O consumo de cafeína, em bebidas como chás e cafés, podem ajudar bastante a aliviar a dor. Alguns analgésicos, por exemplo, até usam essa substância para potencializar seus efeitos. Porém, o excesso pode disparar enxaquecas em pessoas que sofrem com a forma crônica desse problema, e mesmo um consumo leve ou moderado dessa substância pode causar o mesmo efeito adverso em indivíduos que não consomem bebidas cafeinadas de forma regular. Artigo recomendado: Devo me preocupar com a cafeína?

2. Apesar do uso de cafeína poder ajudar em alguns casos, em outros pode piorar, como já mencionado. Enxaquecas, as quais atingem bastante as mulheres, podem ser disparadas por diversos alimentos que variam de pessoa para pessoa. Para ser mais exato, cerca de 50% das enxaquecas são disparadas por componentes na alimentação. Fazer uma lista diária dos alimentos ingeridos antes de uma enxaqueca pode ser bastante útil para identificar e evitar alguns deles.

3. Em específico, um recente estudo publicado no European Journal of Neurology (Ref.6), analisando 2197 pacientes que experienciavam enxaquecas, mostrou que o consumo de bebidas alcoólicas era reportado como um gatilho por 35,6% deles. Em um terço desses pacientes a enxaqueca emergia em menos de 3 horas após o consumo alcoólico, o que claramente mostra que os mecanismos são diferentes daqueles vistos na ressaca. No entanto, mais estudos são necessários para investigar se o etanol está agindo como um gatilho isolado ou concomitante com outros fatores.

3. Aplicar gelo na área da dor também pode ser de grande ajuda, já que a constrição dos vasos sanguíneos causados pelo resfriamento alivia os sintomas.

4. Executar exercícios físicos intensos durante uma dor de cabeça é um tiro certeiro. A liberação de hormônios de prazer e analgésicos, como a endorfina, aumentam bastante depois dos exercícios, o que acaba com qualquer dor de cabeça padrão. Mas é melhor escolher musculação ou bicicleta para resolver o problema. Atividades como a corrida, por exemplo, movimentam demais a cabeça com impactos, podendo piorar a dor.

5. Fome e desidratação induzem a dores de cabeça. Pessoas que passam muito tempo sem comer ou ingerir líquidos tendem a ter mais dores de cabeça. Ou seja, para prevenir, evite passar fome (muitas mulheres passam longos períodos com bastante fome em dietas irresponsáveis) e mantenha-se sempre hidratado.

6. Evite estresse desnecessário e poucas horas de sono. Técnicas de manejamento de estresse e reservar momentos tranquilos só seu durante o dia são também de grande ajuda;

7. Massagear a região do pescoço, escalpo, ombros e têmporas pode trazer grandes alívios. Quanto melhor a habilidade de massagem, melhor os resultados.

8. Um bom banho quente ou aplicação de compressas quentes e úmidas na parte de trás do pescoço podem aliviar os sintomas em algumas situações;

9. Em último recurso, se a dor de cabeça for suportável e coincidir com sua hora de sono, tente dormir, porque uma boa noite de sono pode acabar com qualquer dor enjoada no corpo.

10. Para finalizar, é válido citar que o uso de placebos pode trazer resultados tão bons quanto o uso de medicamentos. Você pode tentar essa estratégia com familiares e terceiros próximos que estejam enfrentando uma dor de cabeça. Artigo recomendado: Placebos se mostram tão eficientes quanto potentes fármacos analgésicos

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   ÁCIDOS GRAXOS E DIETA

           Os ácidos graxos ômega-3 (n-3) e ômega-6 (n-6) são componentes principais de tecidos implicados na patogênese das enxaquecas, onde servem como precursores para várias famílias de lipídios mediadores bioativos que regulam dor (e.: prostaglandinas, leucotrienos, resolvinas e maresinas), coletivamente chamados de oxilipinas. Devido ao fato dos humanos não serem capazes de sintetizar esses dois ácidos graxos endogenamente, os níveis de n-3 e de n-6, e das oxilipinas derivadas, podem ser alterados pela dieta. 

            Várias famílias de receptores de oxilipinas são enriquecidos nas terminações do nervo trigeminal e nos centros de processamento central de dor, onde regulam a sensibilização e a liberação do neuropeptídeo calcitonina, relacionado à dor de cabeça. Isso implica uma ligação direta entre ácidos n-3 e n-6 e a patogênese das cefaleias. De fato, várias oxilipinas derivadas de ácidos graxos n-6 possuem propriedades pronociceptivas (promoção de dor). Por exemplo, infusão de prostaglandinas derivadas do ácido n-6 araquidônico evoca ataques similares a enxaqueca em humanos. Em contraste, várias oxilipinas derivadas dos ácidos n-3 eicosapentaenoico (EPA) e docosahexaenoico (DHA) possuem propriedades antinociceptivas (redução de dor).

           Evidências acumuladas nos últimos anos sugerem que intervenção alimentar que aumentam o consumo de n-3 (EPA+DHA) e reduzem o consumo de ácido n-6 linoleico promovem redução no número de episódios de dor de cabeça.

            Em um estudo clínico mais recente, publicado no periódico BMJ (Ref.7), pesquisadores analisaram 182 participantes com enxaqueca (ataques 5-20 dias por mês, com ou sem aura), dividindo-os de forma randomizada em três grupos: consumo de uma dieta com alto nível de n-3 (H3), consumo de uma dieta com alto nível de n-3 e baixo nível de n-6 (H3-L6) e dieta típica de um Norte-Americano padrão (controle). Do total de participantes, 67% tinha enxaqueca crônica, a qual é uma condição notoriamente difícil de ser tratada.

          A dieta H3 foi preparada para a aumento o consumo de n-3 EPA+DHA para 1,5 g/dia, enquanto mantendo o consumo Norte-Americano médio de n-6 ácido linoleico (7,2% de energia/dia). A dieta H3-L6 foi planejada para aumentar n-3 EPA-DHA para 1,5 g/dia e, concomitantemente, diminuir n-6 ácido linoleico para menos de 1,8% de energia/dia. A dieta de controle tentou manter o consumo médio Norte-Americano tanto de EPA-DHA (<150 mg/dia) e de ácido linoleico (7,2% de energia/dia). Todas as três dietas foram arquitetadas para serem eucalóricas (sem promoção de emagrecimento) e isocalóricas (quantidade calórica igual). 

          A intervenção durou 16 semanas, e 85% dos participantes completaram pelo menos 10 semanas. Eles também receberam um diário eletrônico para registrar quantos horas a cada dia dor de cabeça foi experienciada.

           Os resultados mostraram uma significativa redução nas horas diárias de dor de cabeça nos grupos H3 e H3-L6 em relação ao grupo de controle. A maior redução, como esperado, ocorreu no grupo H3-L6: redução média de 1,7 horas de dor de cabeça por dia e 4 dias menos na média com dor de cabeça por mês em relação ao grupo de controle. Entre os participantes com enxaqueca crônica, essa redução (H3-L6) chegou a ser de -4,4 dias por mês; já no grupo H3 essa redução média foi de -1,8 dias por mês em relação ao controle. Os resultados no grupo H3-L6 foram melhores do que intervenções terapêuticas sendo exploradas nos últimos anos (ex.: injeções da toxina botulínica e anticorpos monoclonais).

             Portanto, para quem sofre de constantes dores de cabeça e enxaqueca, vale a pena tentar mudar a dieta para aumentar o consumo de ômega-3 e reduzir o consumo de ômega-6. 

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FONTE DE ÔMEGA-3: DHA e EPA estão presentes em altas quantidades nos peixes marinhos, óleos de peixes e óleo de krill (pequenos crustáceos marinhos). Esses dois ácidos graxos são sintetizados primariamente por microalgas, e estas, após serem consumidas pelos peixes e outros seres marinhos, levam ao acúmulo de ômega-3 nos tecidos desses animais. Arenque, sardinha e salmão são notáveis fontes.
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REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. Gil-Martínez A, Kindelan-Calvo P, et al.  [Therapeutic exercise as treatment for migraine and tension-type headaches: a systematic review of randomised clinical trials]. Rev Neurol. 2013 Nov 16;57(10):433-43 - See more at: http://www.quickanddirtytips.com/health-fitness/medical-conditions/how-to-treat-a-headache-without-drugs?page=1#sthash.a51t89PG.dpuf
    Gil-Martínez A, Kindelan-Calvo P, et al.  [Therapeutic exercise as treatment for migraine and tension-type headaches: a systematic review of randomised clinical trials]. Rev Neurol. 2013 Nov 16;57(10):433-43
  2. http://www.euromonitor.com/analgesics-in-brazil/report
  3.  Ahn AH. Why does increased exercise decrease migraine? Curr Pain Headache Rep. 2013 Dec;17(12):379. 
  4. http://www.ninds.nih.gov/disorders/headache/detail_headache.htm
  5. https://www.nlm.nih.gov/medlineplus/headache.html 
  6. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/ene.13861
  7. https://www.bmj.com/content/374/bmj.n1448
  8. https://ods.od.nih.gov/factsheets/Omega3FattyAcids-HealthProfessional/
  9. Stovner et al. (2022). The global prevalence of headache: an update, with analysis of the influences of methodological factors on prevalence estimates. The Journal of Headache and Pain 23, 34. https://doi.org/10.1186/s10194-022-01402-2