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Qual é a relação entre Hemocromatose e a Grande Fome?

Figura 1. (A) Biópsia do fígado 19 dias após o transplante hepático mostrando pesada deposição de ferro em hepatócitos e células de Kupffer, além de colestase (coloração histológica: azul da Prússia de Perls 940). (B) Biópsia do fígado 2 anos após o transplante, mostrando pesada deposição granular de ferro (hemossiderose estágio 4) com fibroses portal e periportal (coloração histológica: azul da Prússia de Perls 940). Ref.1

          Uma paciente (sexo feminino) de 56 anos de idade foi submetida a um transplante ortotópico de fígado após uma falha hepática fulminante secundária a uma reativação do vírus da hepatite B (HBV) seguindo tratamento quimioterápico para câncer de mama. A operação de transplante ocorreu sem complicações e o curso pós-operatório seguiu sem significativos eventos adversos exceto pelo desenvolvimento de diabetes tipo 2 que foi bem controlada com medicamento hipoglicêmico oral. A paciente também foi submetida a biópsias do fígado ao longo de 2 anos após a operação para investigar potencias funções hepáticas anormais. Essas biópsias revelaram uma infiltração inflamatória crônica leve, esteatose e, mais notavelmente, um acúmulo progressivo de ferro no tecido transplantado e deposição granular pesada de ferro com fibrose portal e peri-portal (estágio 2 de 6) (Fig.1B).

          Análises bioquímicas do sangue da paciente foram consistentes com sobrecarga de ferro: ferro no soro em 39,4 umol/L (faixa normal de 9-32 umol/L), capacidade ferro-ligante total de 46 umol/L (faixa normal de 50-85 umol/L), saturação de transferrina em 86% (faixa normal de 20-55%) e ferritina acima de 1500 umol/L (faixa normal de 20-100 umol/L). 

           Médicos investigaram a potencial causa desse acúmulo excessivo de ferro no fígado e no sangue da paciente, mas não encontraram nenhum óbvio culpado, incluindo suplementação de ferro ou abuso alcoólico. O histórico médico da paciente e da sua família não apontou nenhuma doença ou anormalidade causativa de sobrecarga de ferro no corpo ou registro de níveis anormais de ferro no sangue.

            Os médicos suspeitaram de hemocromatose preexistente na paciente. Porém, análise genética do sangue da paciente não revelou nenhuma mutação comum que causa essa doença.

            Então, os médicos resolveram investigar o tecido hepático transplantado. O doador do fígado era uma mulher de 55 anos sem significativo histórico médico. Em particular, a doadora não possuía histórico para doença hepática crônica, diabetes, abuso alcoólico, e serologia para hepatites B e C deu negativo. Análise genética em uma amostra do fígado doado, porém, confirmou que a doadora era homozigótica para a mutação C282Y, a causa mais comum para hemocromatose.

            A paciente, nesse sentido, foi diagnosticada com hemocromatose adquirida. Tratamento com flebotomia (remoção de sangue a partir de uma veia) conseguiu reduzir o nível de ferritina (proteína produzida pelo fígado que armazena ferro) no sangue da paciente para 616 umol/L.

          O caso foi reportado e descrito em 2011 no periódico Liver International (Ref.1)


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   METABOLISMO NORMAL DO FERRO

          Sob condições fisiológicas normais, o epitélio do intestino delgado absorve a quantidade correta de ferro para manter o balanço desse micronutriente no corpo. O principal regulador desse processo é o peptídeo hepcidina, o qual é sintetizado no fígado em resposta a demanda e atua sobre os domínios basolaterais de enterócitos para importar ferro para a circulação sanguínea (Fig.2). Apesar da absorção intestinal de ferro ser sujeita à modulação homeostática, perda de ferro corporal é inteiramente desregulada, ocorrendo principalmente na forma de descamação do epitélio intestinal e, na população feminina, também via menstruação. Macrófagos - um tipo de célula imune - também possuem um importante papel no metabolismo do ferro, porque reciclam ferro após fagocitose de eritrócitos (glóbulos vermelhos ou hemácias). Liberação de ferro de macrófagos é também controlada pela hepcidina, a qual se liga à proteína ferroportina na superfície celular para inibir a liberação de ferro de macrófagos e enterócitos na circulação sanguínea.

Figura 2. De 1 mg a 2 mg de ferro são absorvidos por dia pelo epitélio duodenal, que apresenta estruturas vilosas para ampliar a superfície de absorção. Em situações em que há falta de ferro ou aumento da necessidade (gravidez, puberdade ou hemólise, por exemplo), há uma maior absorção de ferro. Para responder a essa maior demanda, há uma maior expressão das proteínas envolvidas nesse processo, como a proteína transportadora de metal divalente (DMT-1) e a ferroportina (FPT). A inibição da captação do ferro pelos enterócitos se dá pela inibição da transcrição da DMT-1 induzida pela hepcidina. Como a maior parte do ferro no organismo está associada à molécula de hemoglobina, a fagocitose e degradação de hemácias senescentes representam uma fonte importante de ferro (de 25 a 30 mg/dia). Essa quantidade de ferro reciclado é suficiente para manter a necessidade diária de ferro para a eritropoiese. Ref.3

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> A proteína da hemocromatose (HFE) está fortemente relacionada com a regulação da absorção intestinal do ferro. Interage com o receptor da transferrina (TfR) e detecta o seu grau de saturação, sinalizando para o enterócito se há maior ou menor necessidade de absorção do ferro na luz intestinal.

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           Sob circunstâncias fisiológicas normais, a proteína transferrina no plasma se liga a aproximadamente 0,1% do total de ferro no corpo, o qual em si equivale a 4 g quando a idade adulta é alcançada. A maior parte do ferro no corpo (aproximadamente 60%) é armazenada dentro do éritron (órgão responsável pela produção de hemácias). Durante deficiência de ferro, a produção de hepcidina é reduzida para facilitar o fornecimento de ferro circulante para a produção de hemácias. Já em resposta fisiológica ao excesso de ferro, existe aumento da síntese de hepcidina, a qual previne a entrada de ferro a partir do intestino e de macrófagos. 

          Portanto, hepcidina é um hormônio regulatório crítico no controle da homeostase de ferro no corpo.

Leitura recomendada:


   HEMOCROMATOSE HEREDITÁRIA

           Hemocromatose hereditária (HH) é uma doença genética caracterizada por desregulação no metabolismo de ferro (Fe), levando ao acúmulo de excessivo de íons Fee2+ em vários órgãos através do corpo. Existe uma associação próxima entre o gene regulador homeostático de ferro (HFE), no cromossomo 6 do genoma humano (Ref.4), e a HH. Como previamente mencionado, esse gene atua na regulação do metabolismo de ferro ao interagir com a transferrina, uma proteína responsável pelo transporte de íons ferro. A transferrina se liga ao receptor TFR1 na superfície celular para transportar íons ferro nas células. A proteína codificada pelo gene HFE pode se ligar ao TFR1 e inibir o consumo de transferrina, reduzindo a demanda celular de ferro e balanceando a absorção intestinal e o armazenamento hepático de ferro. No entanto, mutações no gene HFE causam disrupção nesse mecanismo regulatório, levando à absorção intestinal excessiva de ferro.

          Duas mutações comuns associadas com a HH são C282Y e H63D. A mutação C282Y envolve a substituição de um resíduo de cisteína com um resíduo de tirosina na posição 282 da proteína HFE. Essa mutação interfere com a interação normal entre a proteína HFE e a TFR, a qual é responsável por controlar o consumo de íons ferro pelas células. Como resultado, a mutação C282Y sabota a habilidade de perceber e regular os níveis de íons de ferro, levando ao acúmulo excessivo de ferro nos tecidos. Por outro lado, a mutação H63D envolve a substituição de um resíduo de histidina com um resíduo de ácido aspártico na posição 63 da proteína HFE. Enquanto o exato mecanismo não é ainda totalmente esclarecido, acredita-se que a mutação H63D prejudica de forma similar a interação entre HEF e TRF, resultando em prejuízo na regulação de íons ferro e uma assimilação elevada de ferro. 

           O risco para o desenvolvimento de HH está associado com a herança ou de duas mutações nas duas cópias gene HFE (C282Y/C282Y) ou uma mutação C282Y e uma mutação H63D nesse gene (C282Y/H63D). A presença dessas mutações leva ao metabolismo anormal de ferro, o que por sua vez e ultimamente causa uma deposição excessiva de ferro em vários órgãos como o fígado, coração, pâncreas, articulações e glândulas como tireoide e pituitária.

          A HH tem sido classificada em cinco tipos baseados em genótipo:

- Tipo 1, é a forma mais comum e está associada com mutações no gene HFE. O tipo 1 exibe três subtipos com distintas mutações: tipo 1a, homozigótico (C282Y/C282Y); tipo 1b, heterozigótico (C282Y/H63D); e tipo 1c, com a presença do alelo S65C. O subtipo 1a é o mais comum neste grupo (83% dos casos). No Tipo 1, existe um excesso de absorção intestinal de ferro alimentar, resultando em um aumento generalizado nas reservas corporais de ferro, inicialmente no fígado e na sinóvia das articulações (líquido viscoso que lubrifica as junções articulares). 

- Tipo 2, também conhecido como hemocromatose juvenil, e associado com mutações recessivas nos genes HJV (hemojuvelina) e HAMP (peptídeo hepcidina antimicrobiano). Inclui os subtitpos 2a (HJV-relacionado) e 2b (HAMP-relacionado). A proteína hemojuvelina atua no processo celular que estimula a transcriação do gene HAMP. O termo "juvenil" faz referência à manifestação inicial dos sintomas, que pode ocorrer na infância e causar problemas na puberdade (ex.: amenorreia prematura) devido à secreção insuficiente de hormônios sexuais causada pelo excesso de ferro no corpo. Tipicamente afeta indivíduos jovens entre 10 e 30 anos de idade.

- Tipo 3, associado com mutações no gene do receptor da transferrina 2 (TFR2). Manifestação sintomática geralmente começa entre 20 e 40 anos de idade.

- Tipo 4, também conhecido como doença da ferroportina, e está associado com mutações autossômicas dominantes no gene SLC40A1, responsável por codificar a ferroportina 1, uma proteína na membrana celular responsável por transportar ferro do interior para o exterior das células. Existem dois subtipos baseados na ausência ou na presença de sintomas: tipo 4a (assintomático) e tipo 4b (sintomático).

- Tipo 5, associado a mutações no gene FTH1 (proteína H-ferritina) e tipicamente se manifesta aos 50-70 anos de idade.

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> A hemocromatose pode ser também adquirida. A hemocromatose adquirida é geralmente secundária a doenças que perturbam o metabolismo de ferro. Podemos citar a talassemia, anemia falciforme, deficiência em piruvato quinase, suplementação excessiva de ferro, consumo alcoólico e condições que requerem transfusões repetidas de sangue. E, como descrito no relato de caso no início deste artigo, transplante hepático de um paciente com hemocromatose hereditária é outra possibilidade. Ref.5

> Independente das formas de hemocromatose, o excesso celular de ferro é causado por um aumento nas concentrações de ferro no plasma sanguíneo, o qual leva ao acúmulo de ferro em células parenquimatosas, particularmente hepatócitos, células pancreáticas e cardiomiócitos.

> Embora prevalência pode ser relativamente alta para mutação C282Y homozigótica em certas populações, apenas uma minoria dos indivíduos com esse genótipo irão acumular ferro suficiente para danificar órgãos. Ou seja, a penetrância não é alta. Por outro lado, indivíduos C282Y-homozigóticos estão associados com redução significativa na expectativa de vida e aumento de risco para diabetes (Ref.6-7). Outros fatores, como modificadores genéticos, sexo, fatores ambientais ou estilo de vida podem modificar a suscetibilidade para a hemocromatose. Por exemplo, mulheres são menos prováveis de experienciar efeitos tóxicos devido à perda regular de sangue com menstruação, elevada demanda de ferro na gravidez e potencial perda de sangue no parto. E uma única mutação C282Y (heterozigotos) não é suficiente para causar acúmulo excessivo significativo de ferro no corpo sem outros fatores concomitantes (ex.: alcoolismo ou síndrome metabólica). 

> Um estudo publicado ainda como preprint (Ref.8), ou seja, sem revisão por pares, reportou o que parece ser um novo tipo de hemacromatose hereditária com aparente padrão autossômico dominante de transmissão. No caso, uma família australiana, com ancestralidade sul europeia, exibia uma condição similar à hemacromatose tipo 4, incluindo elevada concentração de ferritina no soro (1907 µg/L), mas sem mutações nos genes conhecidos ligados à hemacromatose.

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          Essa diversidade genotípica e fenotípica da HH pode tornar o diagnóstico da condição difícil. Aliás, até 18% dos indivíduos do sexo masculino e até 5% dos indivíduos do sexo feminino podem ter níveis hepáticos excessivos de ferro sem qualquer aparente sintoma clínico. Sintomas iniciais comuns da HH incluem fatiga e artralgia (dores articulares). Fatiga pode variar de intensidade de leve até debilitante, e pode ser aliviada com tratamento. 

            Hiperpigmentação é outra manifestação inicial da HH: depósitos de ferro na pele levam a um aumento na produção e deposição de melanina, resultando no tom de pele metálico ou acinzentado característico da doença (Fig.3). Essa alteração na pigmentação cutânea é tipicamente generalizada, mas é mais frequentemente observada na pele facial, do pescoço, aspectos extensores dos antebraços, costas das mãos, parte inferior das pernas e áreas genitais. 

Figura 3. Em (A), hiperpigmentação nas pernas de um paciente de 68 anos de idade com HH do tipo 1b antes do tratamento com flebotomia. Em (B), aspecto das pernas após tratamento regular com flebotomia. Além da notável hiperpigmentação, a condição no paciente era aparentemente assintomática, mas com níveis levemente elevados de aminotransferase e bilirrubina, arritmia (taquicardia do sino e fibrilação atrial), osteoporose e fatiga. O quadro melhorou após dois anos de flebotomia terapêutica. Ref.9

          Progressão do quadro de HH pode resultar em mudanças severas na pigmentação da pele, arritmias, impotência e, em alguns pacientes, osteoporose. Toxicidade nos órgãos causadas pelo excesso de ferro podem resultar em disfunção hepática (hepatomegalia, cirrose e carcinoma), diabetes e envolvimento cardíaco (cardiomiopatia e arritmias) e/ou hipogonadismo. 

          Dependendo da sobrecarga de ferro, complicações em órgãos específicos podem incluir:

- Fígado: enzimas hepáticas anormais, fibrose, cirrose e carcinoma hepatocelular;

- Glândulas: diabetes, hipotiroidismo e hipopituitarismo;

- Musculoesquelético: osteopenia/osteoporose, artralgia, osteoartrite e artropatia;

- Sistema nervoso: fatiga crônica e letargia;

- Pele: hiperpigmentação (melanoderma), pele seca (xerose);

- Reprodução: hipogonadismo; baixo libido, impotência, amenorreia (ausência de menstruação) e cólica menstrual (dismenorreia);

- Coração: falha cardíaca congestiva, cardiomiopatia e arritmias.

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> Manifestações dermatológicas podem também incluir mudanças na estrutura e na cor das unhas (ex.: a unha pode ficar branca), hipertricose (crescimento excessivo de pelos), porfiria cutânea tardia e prurido resistente. Existe também limitada evidência associando HH e cânceres de pele. Ref.10

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          O fígado é o órgão mais comumente afetado na HH tipo 1, onde dano hepático pode se manifestar como elevações assintomáticas nos níveis de aminotransferase no soro sanguíneo. Por outro lado, a HH pode ser responsável por doença hepática severa que por sua vez pode progredir rapidamente para cirrose ou carcinoma hepatocelular com resultado potencialmente fatal.

          Apesar de manifestações cardíacas resultantes de deposição excessiva de ferro serem relativamente incomuns em pacientes com HH tipo 1, cardiomiopatia permanece a segunda principal causa de morte em pacientes com a condição. Deposição de ferro no coração causa doença cardíaca, incluindo cardiomiopatia restritiva e dilatada, e arritmias cardíacas (ex.: síndrome do sino e fibrilação ventricular).

          O diagnóstico da hemocromatose é baseado na combinação de análises laboratoriais (ex.: ferritina no plasma sanguíneo), análise genética e imagem via ressonância magnética (MRI). Concentrações de ferritina no soro variam de: 1000 a 7000 ng/mL em indivíduos afetados (normal: 20-260 ng/mL para crianças ou adolescentes do sexo feminino, 25-300 ng/mL para indivíduos adultos do sexo masculino, e 25-200 ng/mL para indivíduos adultos do sexo feminino). O MRI, por sua vez, é um método padrão-ouro para a detecção de excesso de ferro em órgão, ou seja, é considerado o mais adequado para esse tipo de avaliação (Fig.4). Aliás, sempre que disponível, MRI deve ser usado para confirmar excesso de ferro no corpo.

Figura 4. Achados de MRI T2* em quadros de hemocromatose devido a deficiência de hepcidina e doença da ferroportina. (a) Em pacientes com hemacromatose hepcidina-deficiente, fígado 'preto' corresponde a um fígado altamente sobrecarregado com ferro, e baço 'branco' corresponde à ausência de sobrecarga de ferro. A aparência do fígado e do baço é similar em pacientes com hemocromatose tipos 1, 2A, 2B, 3 e 4 hemocromatose. (b) Na doença da ferroportina, o baço aparece preto (altamente sobrecarregado com ferro) e o fígado aparece cinza (moderadamente sobrecarregado com ferro) ou preto (altamente sobrecarregado com ferro) na MRI T2*. Ref.2


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> Indivíduos com sobrecarga de ferro geralmente exibem níveis elevados de ferritina no soro e de saturação de transferrina. O nível de ferritina no soro está correlacionado com o grau de sobrecarga de ferro. Morbidade severa, incluindo cirrose hepática, é rara naqueles com ferritina no sangue inferior a 1000 µg/L. Ref.11

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          O objetivo do tratamento da hemocromatose é remover o excesso de ferro do corpo de forma mais rápida possível e prevenir danos em tecidos. Nesse sentido, a flebotomia continua sendo o principal tratamento da hemocromatose tipo 1 desde 1950 quando foi primeiro introduzida para esse fim. Através da flebotomia, sangue é regularmente removido dos pacientes pela via venosa para estimular eritropoiese (processo de produção de hemácias), o que por sua vez ajuda a remover o ferro se acumulando em tecidos periféricos - sendo coletado e redirecionado para a síntese de hemoglobina. Para hemocromatose não associada com mutações no gene HFE e que não é relacionada com deficiência em hepcidina, flebotomia é o tratamento preferido, mas quelação oral adjuntiva (uso de compostos para a captura molecular e remoção do ferro da circulação sanguínea) (!) pode ser usada nos casos mais severos (ex.: indivíduos com hemocromatose juvenil). 

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(!) Terapia com quelação - a qual envolve o agente quelante deferoxamina -, no geral, não é recomendada, por ser muito custosa e pouco eficiente. A deferoxamina se liga ao ferro e ao alumínio. Esse quelante pode causar vários efeitos adversos, como visão embaçada, tontura, zumbido e diarreia. Ref.2

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           A flebotomia é segura e efetiva como tratamento para quadros de hemocromatose - mas se iniciada antes do desenvolvimento de cirrose (Ref.2). Porém, em indivíduos com doença da ferroportina com perda de função, a flebotomia precisa ser conduzido de forma menos intensa devido ao risco de anemia aumentado como resultado da baixa capacidade de reciclagem de ferro nesses pacientes. Além disso, sintomas articulares respondem fracamente à terapia flebotômica e podem piorar.

          Na flebotomia, pacientes geralmente atendem à área ambulatorial de hospitais onde o tratamento é conduzido por um profissional de enfermagem. Tipicamente, em cada extração, um volume de 400-500 mL de sangue é removido ao longo de 15-30 minutos com o paciente na posição inclinada, visando eliminar 200-250 mg de ferro (Ref.12). O procedimento é realizado semanalmente até o nível de ferritina no soro sanguíneo alcançar ~50 μg por litro. Após esse nível de ferritina ser alcançado, flebotomia é continuada apenas 2-4 vezes ao ano na média para manutenção. Durante a flebotomia, o paciente recebe reposição de fluídos (ex.: bebida hidratante isotônica) em um volume equivalente ao volume de sangue removido visando a manutenção do volume plasmático.

          Efeitos adversos da flebotomia ocorrem em 37-50% dos pacientes e incluem flebite, indisposição e fatiga. Na ocorrência de efeitos adversos, compressas quentes sobre a pele, reposição oral de fluidos e aumento do intervalo entre tratamentos podem ser considerados.

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> Outras estratégias terapêuticas complementares incluem restrição no consumo alcoólico, de suplementos de ferro e de alimentos fortificados com ferro. Na Suécia, o governo proibiu a fortificação de alimentos com ferro. Transplante de fígado é raramente indicado, e geralmente limitado para casos de carcinoma hepatocelular induzido por hemocromatose. Ref.2

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   HEMACROMATOSE E DOAÇÃO DE SANGUE

          Apesar de crença contrária e deletéria, indivíduos com hemocromatose podem doar o sangue removido nas sessões de flebotomia assim como qualquer outra pessoa apta a doar. O sangue de doadores com hemocromatose (doadores terapêuticos) é seguro. Aliás, o procedimento de flebotomia nos pacientes com a condição pode ser inclusive realizado sem custos caso vise doação de sangue ou de plasma. Na Austrália, por exemplo, a organização Australian Red Cross Lifeblood (Lifeblood) reportou que mais de 80% das suas coletas de sangue dos doadores terapêuticos foram aproveitadas para fins clínicos (Ref.13). Quando o sangue é removido dos pacientes fora de um contexto de doação sanguínea, é tipicamente descartado, independentemente da sua qualidade. E isso vem ocorrendo com milhares de pessoas ao redor do mundo com hemocromatose e grande parte delas não sabem que podem doar sangue. Maior conscientização sobre a questão é necessária.

Figura 5. Na foto, paciente australiano com hemocromatose doando plasma sanguíneo durante remoção terapêutica de sangue em uma clínica da Lifeblood. A Austrália é o único país do mundo que aceita doações de plasma de pessoas com hemocromatose. Nos centros de doação da Lifeblood, pessoas com hemacromatose representam 2,5% dos doadores australianos, com ~15 mil doadores fazendo ~37 mil doações anualmente. Ref.14

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   HEMOCROMATOSE E IRLANDA

          A hemocromatose hereditária (HH) é comumente chamada de "Maldição Céltica", à medida que é particularmente prevalente naqueles de ancestralidade Céltica na Europa, em especial na Irlanda, onde prevalência reportada para duas cópias da mutação C282Y é de 1% (Ref.15). Aproximadamente 80-90% dos pacientes com um diagnóstico de HH no norte europeu são C282Y-homozigóticos, enquanto menos de 10% são heterozigotos. A variante C282Y é comum em pessoas de descendência norte europeia, com até ~1 em cada 10 pessoas nessa região exibindo-a em um estado heterozigoto. A Irlanda exibe a maior frequência desse alelo: ~10-11%. Já a prevalência de homozigóticos varia de 0,25% a 1% da população norte-europeia (Ref.16). Variantes genéticas da HH têm sido identificadas em esqueletos datados em mais de 4 mil anos no norte europeu.

Figura 6. Localização cromossômica dos genes envolvidos na hemocromatose hereditária e suas proporções de casos. Mutações no gene HFE causam 95% de todos os casos. Mutações nos outros genes apontados respondem pelos outros 5%. A mutação C282Y é a mais comum entre mais de 100 mutações afetando o gene HFE. Essa mutação pontual é localizada no braço mais curto do cromossomo 6, onde guanina é substituída por adenina. Ref.17

          No geral, a HH afeta aproximadamente 1 em cada 200 indivíduos de ancestralidade europeia. Ao redor do mundo, prevalência de hemocromatose hereditária varia dramaticamente entre diferentes populações, dependendo dos tipos de mutações envolvidas e do grau de ancestralidade europeia. Por exemplo, hemocromatose devido a mutações no gene SLC40A1 é muito rara no geral, mas possui significativa prevalência na África Subsaariana - e acúmulo excessivo de ferro por múltiplas causas pode atingir até 20% da população nessa região (Ref.2). Já na China, apenas ~150 casos de hemacromatose hereditária de têm sido registrados de 1975 a 2024 (Ref.9).

          Mas por que a mutação C282Y é tão comum no norte da Europa?

         Existe evidência sugestiva de que essa mutação primeiro apareceu na Europa central, movendo-se através de fluxo genético com a diáspora Céltica e potencialmente com contribuição dos Vikings. Essa mutação pode ser tão antiga quanto 6 mil anos atrás. As altas frequências da mutação C282Y ocorrem em várias populações norte europeias, particularmente aquelas com conexões Célticas, incluindo Escócia, Wales, Britânia e áreas da Noruega e da Suécia. Na Irlanda em particular, e como mencionado, as maiores frequências de alelo têm sido estimadas (>10%), enquanto a média global de frequência para o alelo C282Y é de apenas 1,9%.

Leitura recomendada:


           A alta prevalência da variante C282Y no norte da Europa pode ter sido resultante de pressão seletiva para reduzir o risco de deficiência de ferro em períodos de fome, favorecendo maior absorção desse micronutriente de fontes alimentares escassas e/ou de baixo valor nutricional. Por outro lado, o favorecimento do polimorfismo C282Y pode ter relação também com defesa contra patógenos: em especial, o peptídeo antimicrobiano hepcidina evoluiu no sentido de segurar ferro durante invasão patogênica do corpo (Ref.2).

           Nesse caminho, é sugerido inclusive que o evento da Grande Fome (1845–52) na Irlanda atuou promovendo uma distinta e maior prevalência da variante C282Y na população (Ref.18). Quando esse alelo foi primeiro introduzido na Irlanda, é provável que foi benéfica entre os primeiros produtores agrícolas, dependentes de dietas baseadas em grãos e leites, em contraste com dietas carnívoras ricas em ferro heme de alta biodisponibilidade associada aos caçadores-coletores. Biologicamente, tanto a lactoferrina quanto o cálcio no leite e os fitatos nos grãos possuem a habilidade de formar complexos com íons ferro no intestino e limitar a absorção desse micronutriente, aumentando o risco para deficiência de ferro e mesmo anemia. 

          A batata (Solanum tuberosum) primeiro emergiu no norte da Europa na década de 1670, quando agricultores ingleses adotaram essa planta domesticada a partir dos Andes como um "cultivar de jardim para a classe alta". Não demorou muito para essa planta se tornar muito popular na região, trazendo uma fonte alimentar farta para a população mais pobre. De fato, a batata foi efetiva em reduzir o risco de fome na Europa no século XVI até o século XVIII, dobrando o suprimento de alimentos e promovendo crescimento populacional. O solo e o clima da Irlanda, em particular, mostraram ser muito favoráveis ao crescimento de batata, especialmente o cultivar irlandês lumper (Fig.7). Somado a fatores coloniais de exportação de alimentos para a Inglaterra, já pela década de 1840, ~40% da população da Irlanda se tornou fortemente dependente da batata para subsistência.

Figura 7. Tubérculos (batatas) do cultivar Lumper. A planta da batata (Solanum tuberosum L.) é nativa da América do Sul - especificamente no sul do Peru e no nordeste da Bolívia -, tetraploide (2n = 4x = 48) e pertencente à família Solanaceae. Essa planta é cultivada em mais de 125 países, cresce em todos os continentes exceto a Antártica e representa um dos principais produtos agrícolas do mundo. A batata (tubérculo) é rica em diversos nutrientes e é uma excelente fonte de carboidratos, proteínas, vitamina C, várias formas de vitamina e minerais (ex.: ferro). Existem centenas de espécies selvagens e cultivadas de plantas formadoras de "batatas" (Solanum sect. Petota) desde o sudoeste dos EUA até o sul do Chile, formando uma série poliploide variando de diploides (2n = 2x = 24) até hexaploides (2n = 6x = 72). Cultivo de batatas por humanos parece ter sido iniciado há ~10 mil anos nos Andes e a primeira espécie a ser domesticada parece ter sido a S. stenotomumRef.19-22

          A dependência da população mais pobre de uma única fonte alimentar expôs as pessoas a um significativo risco de catastrófica crise alimentar e foi isso que infelizmente aconteceu. Em 1843, uma devastadora doença causada pelo fungo patogênico Phytophthora infestans (Fig.8) se alastrou nas plantações de batata dos EUA e, dois anos depois, em 1845, se espalhou também na Europa, causando uma destrutiva epidemia no setor agrícola de 1845 até 1852. Devido à dominância da batata sobre as classes irlandesas mais pobres, a epidemia afetou profundamente a Irlanda, causando a Grande Fome ou Fome Irlandesa, um evento que resultou em ~1 milhão de mortos e emigração de outras 1-2 milhões de pessoas. Cenas horríveis desse evento são historicamente descritas, de corpos decompondo nas estradas, pessoas moribundas sendo enterradas precocemente, cães vagando com partes de corpos humanos na boca e mães desesperadas implorando por enterros dignos para suas crianças mortas. E mesmo após intensa seleção natural e artificial de cultivares mais resistentes ao P. infestans, esse fungo continua ameaçando até hoje plantações de batata e de tomate ao redor do mundo, requerendo extensivo uso de custosos fungicidas para controlá-lo (Ref.23).

Figura 8. (A) Folha de batata em estágio avançado de infecção com o fungo Phytophthora infestans. (B-C) Esporângios do fungo P. infestans visualizados através de (B) microscopia de luz e (C) de microscopia de varredura eletrônica. Esse fungo infecta as plantas da batata, do tomate e de outras solanáceas com relação próxima. Evidências genômicas mais recentes apontam que a primeira linhagem desse fungo patogênico teve origem na América do Sul, especificamente nos Andes, divergindo a partir do ancestral comum compartilhado com as espécies P. andina e P. betacei, ambas endêmicas da região andina. Ref.24-25

Figura 9. "Destituição na Irlanda. Falha da agricultura de batatas", ilustração publicada em 22 de agosto de 1846 no jornal The Pictorial Times. (Fonte: Biblioteca Nacional da Irlanda). O fungo patogênico chegou primeiro na Bélgica em 1844 e rapidamente se espalhou na Europa via esporos carregados pelo vento, alcançando a Irlanda em agosto de 1845. Quase 1 milhão de pessoas morreram durante a Grande Fome, primariamente os pobres e destituídos. Válido mencionar que a Grande Fome não foi devido apenas à dependência de um único alimento vegetal (batata). Grande parte da produção de alimentos na Irlanda era exportada em detrimento da população irlandesa pobre e marginalizada, resultando em dependência cada vez maior da batata. Essa marginalização era ainda mais intensa contra a população Católica, subjugada pelas autoridades protestantes do governo Britânico no período colonial. Nesse sentido, esse evento é entendido mais como um desastre socioeconômico do que um simples desastre natural. O problema principal na Irlanda nessa época não era a disponibilidade de alimento mas a falta de acesso ao alimento. Ref.26

          Quando as plantações de batata falharam, grande quantidade de alimento foi importada para aliviar a fome da população mais vulnerável na Irlanda. Esse alimento importado era constituído primariamente de farinha de aveia e de milho, suplementado internamente com alguma quantidade de leite e de ovos (Ref.26). Chá preto e pães de trigo também foram introduzidos como importantes fontes alimentares. Porém, as novas fontes de ferro na dieta eram inferiores em termos de biodisponibilidade do que as batatas. Batatas oferecem grande quantidade de vitamina C (ácido ascórbico) e a pele do tubérculo é rica em ferro, uma combinação natural que facilita a absorção de íons ferro no intestino delgado humano. Cozimento em água fervente preserva até 70% do ácido ascórbico nas batatas. Além disso, a batata possui baixa quantidade de anti-nutrientes como oxalatos e fitatos - os quais podem reduzir a biodisponibilidade de micronutrientes minerais - e alta quantidade de pró-nutrientes (beta-caroteno, ácidos orgânicos, entre outros).

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> Existe uma perda regular de 1-2 mg de ferro por dia no corpo humano, compensada pela absorção intestinal de ferro a partir da dieta.

> Ferro só pode ser absorvido no intestino no estado ferroso (Fe2+) ou quando ligado a proteínas, como no caso do ferro heme (oriundo a partir do consumo de carne). Quando o ferro não é heme, a absorção é 90% menor na ausência de fatores pró-nutrientes (ex.: vitamina C).

> Ácido ascórbico é um agente redutor e quelante, promovendo transformação de íons férricos Fe3+  (insolúvel) no trato intestinal em Fe2+ (solúvel) e formando um quelato com esses íons, facilitando absorção.

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          A ausência de batatas na dieta da população irlandesa significou redução importante na biodisponibilidade de ferro não-heme, especialmente no contexto de alto consumo de chá preto - contendo taninas que dificultam a absorção de ferro no intestino - e consumo de cálcio/fosfato (leite). Esses fatores estressantes podem ter favorecido o aumento de prevalência do alelo C282Y na população irlandesa, através de processos seletivos. Indivíduos com esse alelo exibiam maior absorção intestinal de ferro, aumentando a chance de sobrevivência em meio à dramática crise alimentar e brusca mudança na dieta. Esse fator pró-ferro - tanto homozigóticos quanto heterozigóticos do alelo - plausivelmente teria sido benéfico no cenário da Grande Fome. Porém, atualmente, o estado homozigoto aumenta significativamente para hemocromatose.

            Considerando as pessoas mortas e emigradas durante a Grande Fome, e 300 mil nascimentos suprimidos, a população irlandesa foi reduzida em até 25%. Entre 1841 e 1911, um relativo curto período de tempo, a perda cumulativa pode ter sido de 50% da população (Ref.18). Isso implica em um massivo evento de deriva genética (no caso, efeito de gargalo), potencialmente reduzindo a diversidade genética dos humanos que persistiram na Irlanda. Os irlandeses pobres melhor equipados [geneticamente] para sobreviver à fome, múltiplas deficiências nutricionais, anemia por deficiência de ferro e doenças infecciosas incluíam plausivelmente aqueles com o alelo C282Y - engatilhando seleção natural.

Leitura recomendada:


REFERÊNCIAS

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