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Micênicos e a Origem quase mítica dos Gregos


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       Glorificados pelos Gregos modernos e pós-Era do Bronze, e exaltados nos épicos contos de Homero, os Micênicos sempre foram tidos esperançosamente pelos gregos como os reais ancestrais da sua sociedade antiga e moderna. Seguidos pelos Deuses, os guerreiros e reis de Micenas teriam protagonizado a mais do que famosa Guerra de Troia e os responsáveis por tornar a Grécia uma região sofisticada e temida.

         Agora, cientistas descobriram que os atuais gregos realmente são descendentes diretos dessa tão poderosa civilização que dominou a Grécia continental e o Mar Egeu entre os anos de 1600 a.C. e 1200 a.C.

ATENÇÃO: A primeira parte do artigo dá um breve resumo da civilização Micênica e a influência de Homero. A parte final foca no novo estudo publicado na Nature (Ref.8).


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  CIVILIZAÇÃO ESQUECIDA

         Homero foi um poeta épico da Grécia Antiga, ao qual tradicionalmente se atribui a autoria dos poemas épicos Ilíada e Odisseia. Existe uma intensa discussão entre os acadêmicos relativa à natureza existencial desse suposto autor. Seria ele realmente uma real pessoa e, consequentemente, um gênio, capaz de produzir tais fantásticas obras? Ou será que Homero pode ter sido somente um símbolo para um processo de criação envolvendo diversos poetas ao longo da história? Seria Homero o ancestral mítico dos Homeridae (Filhos de Homero), uma corporação rapsódica (formada por cantores profissionais da poesia Homérica) associados à ilha de Quios?


        Tradicionalmente tidos como contos retransmitidos por bardos - sem muito importar a autoria, uma preocupação apenas moderna -, a Ilíada e a Odisseia são obras centrais da cultura europeia e trazem importantes informações sobre a Grécia Antiga, apesar das claras licenças artísticas. Como são obras bem distintas, a suposta autoria única de Homero torna-se novamente abalada. Muito provavelmente os contos presentes nessas obras possuíram grande base de transmissão oral, talvez sendo escrito - por Homero ou outros - em torno do século VIII a.C., quando a escrita estava significativamente disseminada na Grécia. Traços de repetições e fórmulas nas obras sugerem isso também.

         De qualquer forma, assim como Homero, os Gregos pós-século XIII a.C. não cansavam de contar histórias sobre o Micênicos, e, em seus olhos, essa civilização original era maior do que a vida. Heróis, imponentes reis, afeição dos Deuses e exuberantes cidades reforçavam os contos.

          Porém, assim como os Minoicos - cuja civilização floresceu a partir do ano de 3000 a.C. na Ilha de Creta - os Micênicos eram uma civilização perdida para o mundo moderno. Nenhuma evidência de Micenas ou da cidade de Troia tinha sido encontrada, até que na década de 1860 um arqueólogo amador alemão, Heinrich Schliemann, ficou convencido de que os Troianos e os Micênicos de fato existiram. Então, fascinado pela Ilíada, com sua cópia literária em mão e em companhia da esposa, Schliemann foi em busca da antiga cidade de Troia em 1868, orientado pelo conteúdo das obras épicas.

            Com base nas descrições poéticas, o nosso explorador - auxiliado pelo fato de ser bastante rico - encontrou uma colina na moderna Turquia se se encaixava perfeitamente com as narrações de Homero. Imediatamente ele iniciou os trabalhos de escavação, revelando a antiga Troia. Empolgado, ele então foi para a Grécia e conseguiu encontrar também a cidade perdida de Micenas, nas montanhas.

          Troia e a Civilização Micênica eram reais, o que reforçou ainda mais as obras de Homero e a partir daí novos estudos arqueológicos cada vez mais avançados foram revelando os segredos que marcaram o Bronze na Grécia.

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  MICÊNICOS

          Durante a Era do Bronze, duas proeminentes culturas arqueológicas emergiram no Egeu. A cultura da Ilha de Creta, frequentemente referida como 'Minoica', foi a primeira civilização letrada da Europa e geralmente é descrita como a "primeira grande experiência europeia com uma civilização." No entanto, a ideografia silábica e os manuscritos hieroglíficos Cretanos usados por essa cultura permanecem indecifrados, obscurecendo suas origens. Igualmente importante foi a civilização da cultura 'Micênica' na Grécia continental, cuja linguagem (um grego arcaico) e utilização do manuscrito Linear B foram um berço para a cultura grega que se seguiu a partir desse período.


         A civilização Micênica recebeu esse nome em homenagem à cidade-estado de Micenas, uma cidade palácio e um dos mais poderosos estabelecimentos da região. Localizados em sua maior parte em Peloponeso, no sul da península Grega, os Micênicos são, basicamente, os primeiros gregos, ou seja, eles foram os primeiros a falar a linguagem Grega. Persistiram na Grécia continental entre os anos de 1600 a.C. e 1200 d.C.


         As escavações de Schliemann na década de 1870 trouxeram à luz objetos cuja opulência e antiguidade parecem corresponder, de fato, às descrições de Homero do Palácio do famoso Rei Agamenon, aquele que teria liderado os Gregos na Guerra de Troia. A extraordinária riqueza de material depositada nos túmulos de Micenas (em torno de 1550 a.C.) atestam uma poderosa sociedade de elite que floresceu nos subsequentes quatro séculos. Durante o período Micênico, a Grécia continental experienciou uma era de prosperidade centrada em poderosas bases de cidadelas como Micenas, Tirintos, Tebas e Atenas. Oficinas locais produziam objetos de utilidade a partir de cerâmica e bronze, assim como itens de luxo, como gemas entalhadas, jóias, vasos de metais preciosos e ornamentos de vidro.


         Sem sombra de dúvidas, os Micenas foram influenciados pelos Minoicos na Ilha de Creta - nomeados em homenagem ao mítico Rei Minos -, uma civilização ainda mais antiga (2600 a.C. até 1400 a.C.). O contato como o povo de Creta marcou um decisivo papel em moldar e desenvolver a cultura Micênica, especialmente nas artes, podendo ser vista nos palácios, roupas, frescos e no sistema de escrita. E com base em evidências arqueológicas (especialmente vasos), as mercadorias da civilização Micênica circulavam por todo o Mediterrâneo, da Espanha até Levante (países do leste do Mediterrâneo oriental), incluindo óleo, vinho e outros produtos de consumo como prováveis artigos de principal comércio.

          Além de ávidos comerciantes, os Micênicos foram poderosos guerreiros e grandes engenheiros, projetando e construindo impressionantes pontes, muralhas de fortificação e túmulos em forma de colmeia (tholos) - tudo utilizando avançadas técnicas que empregavam grandes blocos de pedra irregulares (monumentos ciclópicos) -, além de elaborados sistemas de drenagem e irrigação. Devido aos blocos de pedra usados, de tão grandes dimensões, muitos na Antiguidade julgaram - posteriormente aos Mecênicos - que elas só poderiam ter sido manejadas pelos míticos gigantes de um só olho, conhecidos como Ciclopes (daí o estilo de construção se chamar 'ciclópico').



           Os Micênicos eram pessoas bastante ligadas às atividades marítimas e todas as cidades-estados eram localizadas próximas do mar, mas à uma distância segura que evitasse ataques surpresas. Como a Grécia é montanhosa, a melhor forma de transporte era pelo mar e também era ali a rota de guerra preferida. Eles eram uma civilização ávida pelas batalhas, atacando outros povos e lutando entre si. Apesar de falarem a mesma língua e adorarem aos mesmos Deuses, os Micênicos foram separados em cidades-estados independentes, cada uma das quais com o seu próprio rei. Os Micênicos faziam armas e armaduras de Bronze, dando inclusive o nome moderno para a era desse período: A Idade do Bronze. Enquanto os Minoicos eram uma civilização mais pacífica, os Micênicos adoravam as artes da guerra, e promoveram várias campanhas de conquista, incluindo a região de Creta.

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  GUERRA DE TROIA

         A Ilíada nos conta sobre o ataque da citadela de Troia, na Ásia Menor, pelos Gregos (muito provavelmente os Micênicos de acordo com a narração de Homero). A história tem como um dos focos Helena, rainha da cidade-estado Micênico de Esparta, a qual é sequestrada e traga para Troia pelo príncipe Troiano Paris. As cidades-estados Gregas responderam enviando uma grande frota para atacar Troia em uma tentativa de trazer Helena de volta para casa. Sendo uma citadela, Troia era muito difícil de atacar, e a guerra durou por dez anos.




           Finalmente, Odisseu, um Grego e Rei de Ítaca, bolou um truque para enganar os Troianos e quebrar a poderosa fortificação das paredes de Troia. Para isso deixou uma grande cavalo de madeira para trás, enquanto os Micênicos, fingindo estarem derrotados e em fuga, se esconderam. Os Troianos, acreditando que o cavalo era um presente deixado pelos Gregos derrotados, moveram o gigantesco objeto para dentro da cidade. Depois de uma celebração, Odisseu e outros Gregos, escondidos dentro do cavalo, abriram os portões para os outros Micênicos entrarem, dando início à devastação de Troia e recuperação de Helena.

           Alguns dos Deuses, pegando um ou outro lado no intenso conflito, sentiram que Odisseu tinha trapaceado na vitória. Nisso, quando o rei rumou pelo mar para Ítaca, uma viagem que deveria ter durado apenas algumas semanas acabou levando dez anos, devido aos obstáculos criados pelos Deuses ao longo do caminho. Enquanto isso, sua fiel esposa, Penélope, esperava pacientemente pelo seu retorno. Essa parte da história é chamada Odisseia, este termo o qual acabou se transformando em uma palavra que exprime longas e difíceis jornadas.

           Bem, sob um ponto de vista arqueológico, parece que a cidade de Troia foi de fato destruída por uma força inimiga em torno do ano de 1200 a.C. Pode ser que esse evento tenha representado os eventos narrados por Homero, em termos de que foi um ataque por razões diversas efetuado pelos Gregos Micênicos. No entanto, como a única fonte de detalhes é a obra Ilíada, fica difícil dizer o que realmente aconteceu naquele período, onde distorções, amálgamas temporais e exageros podem estar fortemente presentes nos poemas de Homero, especialmente considerando uma tradição oral servindo de base inicial para a feitura das obras. Em relação às amálgamas, muito dos detalhes de contextualização nos poemas claramente representam o contexto histórico de um período inicial da Idade do Ferro Inferior, entre os séculos IX e VIII a.C, e não da Idade do Bronze.

           De qualquer forma, mesmo levando isso tudo em conta, podemos aceitar que os poemas preservam algumas memórias genuínas do período de domínio Micênico: a ausência de trabalhos com ferro (Era do Bronze), uso de carruagens nas batalhas (apesar da forma de uso não ser acurada), e certos tipos de armaduras e armas. Além disso, muitos dos nomes de heróis mencionados nas obras eram plausíveis de terem existido no período descrito, e alguns daqueles no lado Troiano, incluindo Paris e Prian, eram genuinamente Asiáticos.

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  QUEDA DE MICENAS

           Ao redor de 1200 a.C., registros arqueológicos mostram que os Micênicos começaram a aumentar o tamanho das paredes ao redor das suas cidades. Algo estava ameaçando a civilização. Talvez foram uma escalada de conflitos entre as cidades-estados, ou mesmo uma invasão estrangeira a partir do Norte da Grécia. Pode ser possível que uma real e custosa Guerra de Troia tenha trago grandes danos aos Gregos. Seja qual for a razão, a civilização Micênica colapsou ao redor do ano de 1100 a.C., existindo evidências de que as grandes cidades foram queimadas por aqueles que substituíram os Micênicos.

          Depois da queda Micênica, a Grécia entrou em uma Idade das Trevas (período onde não existem registros históricos escritos e também um tempo de medo, incertezas e violência). Aqueles que tradicionalmente substituíram os Micênicos foram chamados de Dórios, Gregos do Norte que, segundo a mitologia, eram filhos de Hércules, os quais foram expulsos pelos Micênicos e juraram um dia retornar. Os Dórios usavam armas de ferro, enquanto os Micênicos o bronze, cuja natureza proporcionava uma maior beleza e valor artístico, mas não eram equivalente em poder ao poderoso ferro Dórico. Nesse sentido, o ferro acabou substituindo o bronze durante essa Idade das Trevas.

           Com o controle completo da Grécia, os Dórios teriam levado à destruição do que tinha sobrado da civilização Micênica, obrigando muitos Micênicos a fugirem dos novos conquistadores pelo Mar Egeu para a Ásia Menor. Interessante também mencionar que Atenas acabou sendo poupada da invasão destrutiva dos Dórios, com os seus costumes e cultura sendo mantidos mesmo após o colapso da sua civilização original.

           Estabilidade e crescimento na Grécia tiveram início a partir da Idade do Ferro, entre os séculos IX e VIII a.C. Aqui a estabilidade política dos reis emergiu do desenvolvimento de um sistema feudal, onde em troca de defesa dos seus territórios, os senhores feudais concediam terras para os habitantes.
 
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  ANÁLISE DE DNA

          Bem, quando os Micênicos entraram em colapso e foram substituídos, existia a possibilidade de que a linhagem dessa civilização teria se perdido para sempre. Isso acabou sendo resolvido recentemente com um estudo publicado na Nature, o qual analisou amostras de DNA antigo e mostrou que os Gregos atuais parecem ser, de fato, descendentes dos Micênicos, com apenas uma pequena proporção de DNA de migrações posteriores para a Grécia. Além disso, o estudo mostrou que os Micênicos não eram muito próximos dos Minoicos apenas culturalmente, mas também geneticamente.

          As amostras analisadas vieram dos dentes de 19 pessoas, incluindo 10 Minoicos da Ilha de Creta datando de 2900 a.C. até 1700 a.C., 4 Micênicos de um local arqueológico de Micenas e outros cemitérios da Grécia continental datando de 1700 a.C. até 1200 a.C., e 5 pessoas de períodos ainda mais antigos (5400 a.C. até 1340 a.C.) da cultura Grega e Turca Antigas. Ao comparar 1,2 milhões de letras do código genético do genoma dessas amostras com outras 334 amostras de pessoas aleatórias oriundas do mundo antigo e 30 Gregos modernos, os pesquisadores foram capazes de mostrar quais indivíduos estavam relacionados um com o outro.

         Os resultados mostraram que os antigos Micênicos e Minoicos eram os mais relacionados entre si, e ambos possuíam três quartos do DNA de agricultores que viveram na Grécia e no sudoeste da Anatólia, esta a qual é parte hoje da Turquia. Ambas as civilizações também herdaram DNA de pessoas do leste do Cáucaso, próximo do atual território do Irã, sugerindo uma migração anterior de pessoas do Oriente antes dos Micênicos se separarem dos Minoicos.

           Isso, aliás, corrobora os registros arqueológicos. Tanto os Minoanos quanto os Micênicos eram parecidos entre si, com ambos carregando genes de cabelo e olhos castanhos, sendo que em ambas as culturas as pessoas eram pintadas em frescos e cerâmicas com cabelos e olhos escuros, apesar de falarem e escreverem diferentes linguagens. Devido ao fato dos Minoicos terem utilizado hieroglíficos, alguns arqueólogos acreditavam que eles eram parte egípcios, o que se mostra agora algo falso.


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           No entanto, os Micênicos possuem uma importante diferença: parte do DNA desse povo - de 4% a 16% - vêm de ancestrais do norte, do leste europeu ou da Sibéria. Isso sugere que uma segunda onda de pessoas da estepe Eurasiana veio para à Grécia continental através do leste europeu ou da Armênia, mas não alcançando a Ilha de Creta.

          E, no final, quando os pesquisadores compararam o DNA dos Gregos modernos com aquele dos antigos Micênicos, eles encontraram várias sobreposições. Os Gregos de hoje compartilham proporções similares de DNA das mesmas fontes que os Micênicos, apesar dos primeiros terem herdado um pouco menos de DNA dos agricultores Anatolianos e um pouco mais de traços genéticos de migrações estrangeiras para a Grécia.

            Segundo especialistas, essa continuidade entre os Micênicos e os atuais Gregos é realmente surpreendente, considerando a reciclagem de civilizações na região do Egeu por milhares de anos, incluindo o total colapso da civilização Micênica.

           Bem, e agora que os Gregos modernos sabem que são praticamente descendentes diretos da mítica civilização Micênica, talvez valha a pena pedir por ajuda dos Deuses Gregos para ver se um milagre resolve a profunda crise financeira do país (Risos).




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REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. https://www.metmuseum.org/toah/hd/myce/hd_myce.htm 
  2. http://www.penfield.edu/webpages/jgiotto/onlinetextbook.cfm?subpage=1626039 
  3. http://cerhas.uc.edu/troy/q402.html
  4. http://cerhas.uc.edu/troy/legends.html
  5. http://cerhas.uc.edu/troy/q415.html
  6. https://www.college.columbia.edu/core/content/homer
  7. http://www.sciencemag.org/news/2017/08/greeks-really-do-have-near-mythical-origins-ancient-dna-reveals
  8. https://www.nature.com/articles/nature23310
  9. https://www.brown.edu/Departments/Joukowsky_Institute/courses/greekpast/4870.html