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Matéria Escura, Energia Escura e Massa Negativa


- Atualizado no dia 26 de junho de 2024 -

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         O Universo é vasto e cheio de mistérios. E entre os mais notáveis mistérios temos a existência teoricamente prevista de duas entidades apelidadas de Matéria Escura e de Energia Escura. Mas o que seriam essas "entidades" e como sabemos que elas aparentemente existem? 

        Já de início é importante dizer que, apesar dessas entidades serem consensualmente aceitas hoje na comunidade científica, alguns cientistas ainda acham que modificações especiais nas leis que governam a física podem explicar certas anomalias no universo atribuídas a essas entidades, especialmente em relação à Matéria Escura (1). Porém, o suporte científico para essas vozes discordantes na comunidade científica é geralmente muito limitado e inconsistente; mas isso não quer dizer que a inexistência da Matéria Escura ou da Energia Escura seja improvável. Observações recentes de ondas gravitacionais pelo LIGO (2), por exemplo, colocaram em dúvida alguns modelos de Energia Escura (Ref.18).

A Via Láctea, e a nossa localização dentro dela (seta indicativa); grande parte da massa da nossa galáxia parece ser composta de matéria escura

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(1) ATUALIZAÇÃO (08/10/19): Os modelos teóricos que consideram a matéria escura como essencial para explicar as estruturas galácticas foram corroborados com a primeira observação direta dos preditos filamentos de gás que alimentam os proto-agrupamentos de galáxias. Para saber mais, acesse: Finalmente as Teias Cósmicas foram observadas no Universo 

(2Leitura recomendada: O que são as ondas gravitacionais?
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   MATÉRIA ESCURA

         O Universo é constituído por inúmeras galáxias*, as quais abrigam diversos sistemas de estrelas, planetas e outros corpos e estruturas. Essas galáxias possuem movimentos de rotação e de translação, e podem estar muito isoladas uma das outras ou em agrupamentos com relativa proximidade entre si. Quando isoladas, a rotação observada da galáxia responde à distribuição da sua massa pelo seu raio. Se fôssemos considerar a massa observável nessas galáxias, ou seja, a massa normal que conhecemos e que emite radiação eletromagnética (ou interage com esta), veríamos a velocidade galáctica diminuindo à medida que o raio aumenta, já que a massa visível - e, à princípio, a única presente - está também diminuindo. Só que, surpreendentemente, à medida que o raio aumenta, a velocidade aumenta, indicando que existe uma gigantesca quantidade de massa aumentando ao longo do raio de dada galáxia.

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*O valor estimado mais recente é em torno de 2 trilhões de galáxias. 

Para saber mais, acesse: O Universo possui ~10 vezes mais galáxias do que antes previsto
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          Nossa galáxia, a Via Láctea, é um exemplo claro nesse sentido. Quando vamos nos afastando do seu centro, a matéria visível diminui dramaticamente. Além da órbita do Sol, existe muito pouca massa observável. Porém, essa massa segue o mesmo padrão de aumento de velocidade com o raio, indicando que algo muito grande produzindo efeitos gravitacionais está presente ali. Esse 'algo' seria justamente a Matéria Escura. Aliás, a partir de dados obtidos pelo Telescópio Espacial Hubble e do satélite Gaia da Agência Espacial Europeia, pesquisadores estimam que a Via Láctea possui ~1,5 trilhão de massas solares (1 massa solar = massa do Sol) (Ref.14). E apenas uma pequena porcentagem dessa massa corresponde às ~200 bilhões de estrelas na nossa galáxia - incluindo o supermassivo buraco-negro em seu centro de 4 milhões de massas solares -, com o restante correspondendo à misteriosa matéria escura. Na Via Láctea é estimado que para cada 1 kg de matéria normal existe 15 kg de matéria escura (Ref.). 


 
        Os primeiros trabalhos que abriram o campo de estudo sobre a matéria escura emergiram na década de 1930, especialmente com o astrônomo Suíço-Americano Fritz Zwicky. O nome 'Matéria Escura' refere-se ao fato de que, apesar dessa matéria apresentar efeitos gravitacionais, inexiste interação com ou emissão de radiação eletromagnética (luz visível, infravermelho, raios X, etc.). Assim, é muito difícil detectarmos a matéria escura, e só podemos inferir sua presença através da observação de efeitos gravitacionais anômalos influenciando no comportamento das galáxias. Estudando as galáxias no contexto do paradigma da matéria escura fria, os cientistas já mostraram que a massa do halo de matéria escura e a massa estelar total estão ligadas através de uma função que varia diretamente com a massa. A razão média Mhalo/Mestrelas possui um valor mínimo em torno de 30 para galáxias com massas estelares próximas daquela da Via Láctea (1-2 x 1012 massas estelares) e aumenta tanto em direção a massas menores quanto em direção a massas maiores. A dispersão nessa relação não é bem esclarecida, mas é geralmente aceito ser menor do que um fator de dois para galáxias massivas e muito maior para galáxias-anãs (!).

        Além da presença dessa matéria especial na estrutura individual das galáxias, temos outro comportamento muito estranho quando observamos agrupamentos de galáxias (galaxy clusters e galaxy groups), que emergem quando as galáxias permanecem relativamente próximas devido ao efeito gravitacional de atração entre elas. Na verdade, a maioria das galáxias no Universo são deste tipo, com grupos formados por dezenas, centenas ou milhares delas. Porém, a velocidade dessas galáxias dentro desses agrupamentos (entre 800 e 1000 km/s) em relação umas às outras é alta demais para mantê-las unidas. Novamente, 'algo' precisa estar ali no meio das galáxias para mantê-las agrupadas, ou seja, matéria escura. O enorme efeito gravitacional extra necessário para manter estável os agrupamentos de galáxias é tão alto que entre 85 e 95% da massa desses sistemas precisa ser constituída de matéria escura.
 

          Agora, fica a pergunta: do que seria constituída a matéria escura? Ninguém ainda sabe a resposta, e responder essa pergunta é um dos grandes desafios da astronomia moderna. Será, por exemplo, que essa matéria é apenas uma matéria normal - também conhecida como bariônica (2) -, mas "fria"? Se esse for o caso, existem quatro especulações principais, mas todas com grandes limitações:

- Estrelas de Nêutrons: Esses corpos são formados quando estrelas muito grandes (com massa de 10 a 29 sóis) colapsam, dando origem a supernovas quando as camadas exteriores são expulsas. Depois desse processo, sobra um núcleo composto só de nêutrons (aquelas partículas sem carga elétrica presente no núcleo de átomos). São um dos corpos mais densos do Universo, podendo exibir a massa de dois sóis presa em um raio de apenas 11 km. Essas estrelas são quase impossíveis de serem detectadas, por não emitirem mais radiação eletromagnética detectável com a nossa atual tecnologia, exceto quando estão em um sistema binária ou outras situações especiais. Bem, se tivéssemos muitas dessas estrelas espalhadas pelo Universo, elas seriam boas candidatas como constituintes da misteriosa matéria escura. Só que o Universo é muito jovem para ter muitas estrelas de nêutrons (formação de uma leva muito tempo). Aqui na Via Láctea, por exemplo, é estimado que "apenas" 100 milhões dessas estrelas existem, algo ínfimo para sequer arranhar a quantidade de matéria escura prevista na nossa galáxia. (Para mais informações: O que são as Estrelas de Nêutrons?)

- Anãs Negras: Se a massa de uma estrela não é grande o suficiente para transformá-la em uma estrela de nêutrons após o colapso, o corpo estelar pode ser tornar uma Anã Branca. As anãs brancas são estrelas luminosas, mas não por causa de fusão nuclear, mas sim por causa da imensa quantidade de calor acumulado no núcleo pelas partículas elementares dos átomos ali presentes (elétrons, nêutrons e prótons), as quais ficam livres, criando um meio condutor de calor [cargas livres] quase perfeito. Esse calor começa então a ser irradiado na forma de radiação eletromagnética e, à medida que a energia térmica vai diminuindo e a Anã Branca vai esfriando, os comprimentos de onda vão ficando cada vez maiores (menor frequência, menor energia), até que ínfima ou nenhuma radiação seja emitida, produzindo uma Anã Negra. As anãs negras, assim como a matéria escura, só poderiam ser observadas de forma indireta, através de interação gravitacional. O problema é que o tempo para as Anãs Brancas se resfriarem até atingir esse estágio de "escuridão" é milhares de vezes maior do que a idade do universo, ou seja, provavelmente ainda não existem Anãs Negras no universo, apenas na teoria. (Para mais informações: Várias estrelas que vemos no céu são bolas de cristal)

- Buracos Negros: Se a massa da estrela colapsada é exageradamente grande, então ao invés de termos uma Estrela de Nêutrons, teremos a formação do corpo mais denso do universo, o qual gera um campo gravitacional tão absurdo que nem ao menos a luz consegue escapar da sua superfície. Ou seja, assim como a matéria escura, os buracos negros não emitem radiação por conta própria e, no geral, são detectados de maneira indireta pelos seus efeitos gravitacionais (apesar de alguns terem disco de acreção de matéria muito luminosos que emitem com muita intensidade na faixa dos raios-X). De qualquer forma, mesmo os buracos negros que não podem ser detectados por observação direta, também caem no mesmo problema das Estrelas de Nêutron: são eventos muito raros no Universo. Para explicar toda a matéria escura, precisaríamos que mais de 90% das estrelas do universo fossem transformadas em buracos negros, algo totalmente fora da realidade. Por outro lado, existe uma janela para que buracos negros primordiais (BNPs) - corpos hipotéticos formados não pelo colapso gravitacional de uma estrela, mas pela extrema densidade da matéria presente durante a expansão inicial do universo - sejam os constituintes da matéria escura se a massa dos buracos negros em geral caíssem em uma faixa entre 20 e 100 milhões de massas solares.

          Nesse caso, BNPs com massas maiores do que 1015 g - os quais não teriam evaporado completamente via radiação de Hawking - seriam os candidatos, já que, como foram formados no Universo na era dominada por radiação, tais corpos não seriam sujeitos às limitações da Nucleossíntese do Big Bang (BBNS, na sigla em inglês) que os bárions podem ter a 5% da massa crítica. Os PBHs seriam, portanto, classificados como não-bariônicos e se comportariam como qualquer outra forma de matéria escura fria (3). Múltiplos estudos nos últimos anos têm trabalhado com essa possibilidade (Ref.15-16). No entanto, ainda não existem sólidas evidências que confirmem a existência dos PBHs, apesar desses hipotéticos corpos fazerem sentido em vários modelos matemáticos da cosmologia moderna.

          Um estudo publicado em 2021 no periódico Physical Review Letters trouxe evidência teórica de suporte para o mecanismo de nucleação de bolhas no falso vácuo durante a inflação do universo como responsável pela formação dos buracos negros primordiais, e que esse cenário pode explicar toda a matéria escura já detectada, sinais não-explicados de ondas gravitacionais e eventos observados de semeação pesada de buracos negros supermassivos. Para mais informações, acesse: Matéria Escura pode ser constituída de Buracos Negros Primordiais, implicando um multiverso

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ATUALIZAÇÃO: Buracos negros primordiais no halo de matéria escura da Via Láctea deveriam causar eventos de microlente gravitacional [desvios relativísticos da luz] de longo prazo, durante anos. Em um estudo publicado recentemente na Nature (Ref.30), analisando dados astronômicos acumulados ao longo de 20 anos (2001 a 2020) envolvendo quase 80 milhões de estrelas localizadas em uma galáxia próxima [Grande Nuvem de Magalhães] observadas com o observatório OGLE, no Chile, encontrou apenas 13 eventos de microlente - e provavelmente ligados a estrelas na Via Láctea. Se toda a matéria escura da Via Láctea fosse composta de buracos negros primordiais com o espectro de massas teoricamente previsto, mais de 600 eventos de microlente seriam esperados nos dados acumulados. Os resultados do estudo apontam que buracos negros constituem no máximo 1,2% da matéria escura dependendo do modelo teórico de disco galáctico. Em outras palavras, e considerando os resultados do estudo conclusivos, buracos negros primordiais podem explicar de forma plausível apenas uma parte muito pequena da matéria escura na nossa galáxia.

Impressão artística de um evento de microlente gravitacional - associado a um buraco negro primordial no halo galáctico da Via Láctea - desviando a luz de uma estrela na Grande Nuvem de Magalhães. Nesse tipo de evento, a direção de trajetória da luz muda por causa de efeitos gravitacionais no espaço-tempo, aumentando o brilho aparente da estrela. A duração desse aumento de brilho depende da massa do objeto no caminho da luz: tipicamente dura várias semanas em objetos com massa estelar, e por alguns anos quando temos buracos negros 100 vezes mais massivos do que o Sol. Ref.30

> Especificamente o estudo encontrou que, na Via Láctea, objetos compactos (ex.: buracos negros) na faixa de 0,00018 a 6,3 massas solares não podem constituir mais de 1% da matéria escura e aqueles na faixa de 0,000013 a 860 massas solares não podem constituir mais de 10% da matéria escura. Ref.29
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- Anãs Marrons: Essas estrelas possuem massas relativamente muito pequenas e, portanto, são incapazes de fundir significativa quantidade de hidrogênio para produzir hélio (e, consequentemente, energia), no máximo pequenas quantidades de lítio-7 e de deutério (isótopo do hidrogênio) caso tenham massa acima da média. Por isso, a maior parte das anãs marrons não conseguem emitir significativa quantidade de radiação eletromagnética para serem detectadas. Porém, para contarem como matéria escura, essas estrelas deveriam ser extremamente abundantes, e isso não é observado.

- Planetas e rochas: Ora, planetas e rochas (meteoroides, asteroides, etc.) não emitem significativa quantidade de radiação por conta própria e caso uma imensa quantidade desses corpos estivessem vagando pelo universo, longe da iluminação de estrelas, seria difícil detectá-los. Porém, assim como as Anãs Marrons, não conseguimos observar indiretamente essa imensa quantidade de planetas e rochas, ou mesmo temos qualquer evidência nesse sentido.

- Monopolos Magnéticos Escuros: Em 2019, Físicos da Universidade da Califórnia, Davis, propuseram que monopolos acoplados com fótons escuros massivos podem compor a matéria escura cosmológica (Ref.21). Magnetos tradicionalmente sempre possuem dois polos, norte e sul. Um monopolo é uma partícula que age como apenas um dos polos de um magneto, mas que, apesar de serem previstos na teoria quântica, nunca foram observados naturalmente ou experimentalmente. Nesse sentido, os monopolos escuros se comportariam como monopolos normais, porém só interagindo eletromagneticamente com partículas-ondas escuras, e interagindo entre si através de fluxo magnético escuro.

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            Considerando as opções acima listadas e as evidências até o momento acumuladas, é muito pouco provável que a matéria escura seja em sua maior parte formada por matéria normal ou buracos negros primordiais. Aparentemente, a matéria escura é primariamente formada por partículas ou entidades físicas ainda não descritas ou especiais/exóticas. Neutrinos são as únicas partículas já observados na prática que podem ser candidatos na constituição da matéria escura, especialmente da Matéria Escura Quente (3). Os neutrinos possuem muito pouca massa (próxima de zero) e interagem apenas por forças Fraca (4) e gravitacional. Mas mesmo considerando neutrinos mais massivos, a quantidade requerida dessas partículas durante o Big Bang para responder por parte considerável da matéria escura não seria possível sem "comprometer" a estrutura do atual universo. Outra possibilidade são as Partículas Massivas de Fraca Interação (WIMPs), e um dos candidatos nesse caso são os áxions, partículas exóticas de baixíssima massa primeiro propostas em 1977 e que resolvem problemas associados à Força Forte. Áxions constituiriam a Matéria Escura Fria.

           É provável que a matéria escura seja formada por partículas exóticas e uma parte menor seja formada por matéria normal (buracos negros, estrelas de nêutrons, etc.). Por outro lado, é válido também lembrar que uma parte minoritária dos físicos teóricos são céticos em relação à existência de matéria escura (!), e argumentam que essa entidade seria apenas uma ilusão criada pelo comportamento diferenciado da gravidade em sistemas de massas muito grandes, como as galáxias. Ou seja, em menor escala, como o Sistema Solar, as leis da gravitação funcionariam como na teoria gravitacional relativística. Só que em escalas muito grandes de massa, como a níveis galáctico e de agrupamento galáctico, os efeitos gravitacionais se desviariam significativamente daqueles esperados (Leitura recomendada: Supercomputador dá suporte à Teoria Camaleão).

Agrupamento (cluster) de galáxias IDCS 1426, um dos maiores já observados e cuja distância da Terra é de ~10 bilhões de anos-luz. É estimado que esse agrupamento tenha ~500 trilhões de massas solares e cálculos teóricos apontam que 90% dessa massa total é constituída de Matéria Escura.
 
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(2) Matéria Normal, ou Bariônica: Por definição, matéria bariônica deveria incluir apenas a matéria composta por bárions, ou seja, deveria incluir prótons, nêutrons e todos os objetos compostos por essas subpartículas atômicas (por exemplo, o núcleo atômico), mas excluir entidades como os elétrons e os neutrinos, os quais são, na verdade, léptons.

Porém, na Astronomia, o termo 'matéria bariônica' é usado de forma mais inclusiva. Como prótons e nêutrons estão sempre acompanhados de elétrons - alcançando uma rede neutra de cargas -, os astrônomos acabam usando o termo para se referir a todos os objetos constituídos de matéria atômica normal, incluindo os elétrons, os quais representam apenas cerca de 0,0005% da massa total. Por outro lado, os neutrinos são excluídos dessa generalização, e acabam sendo considerados não-bariônicos pelos astrônomos.

E apesar dos buracos negros não-primordiais serem também incluídos como matéria bariônica, esses corpos possuem propriedades muitas vezes consideradas distintas das matérias bariônica e não-bariônica. 

De qualquer forma, a matéria bariônica, na astronomia, inclui:

- Nuvens de gás frio;
- Planetas;
- Cometas e asteroides;
- Estrelas
- Estrelas de Nêutrons
- Buracos Negros

(3)  A matéria escura é formada, segundo o atual modelo cosmológico, pela Matéria Escura Quente e  pela Matéria Escura Fria. A primeira possui partículas trafegando a velocidades muito próximas da luz e responde por ~30% da Matéria Escura total. A segunda representaria o restante da matéria escura, e seria composta por partículas mais massivas e lentas.

(4) Existem quatro forças fundamentais no universo: Força FracaForça ForteGravitacionalEletromagnética. A Força Fraca é a responsável pelo decaimento radioativo alfa e beta. A Força Forte é a responsável por manter, por exemplo, a estrutura nuclear atômica coesa, sem a qual os prótons não conseguiriam ficar presos no núcleo, mesmo com a presença dos nêutrons. Outros sistemas de partículas são mantidos coesos pela força forte, como os quarks que formam os nêutrons e prótons. Essa força é aproximadamente 137 mais intensa do que o eletromagnetismo, 1 milhão de vezes mais intensa do que a força fraca e 1038 vezes mais intensa do que a força gravitacional.

Leitura complementar:
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   MASSA DA MATÉRIA ESCURA

         Em um estudo publicado em 2023 no periódico Physics Letters B (Ref.26), pesquisadores da Universidade de Sussex, Inglaterra, estabeleceram uma nova faixa de limites superior e inferior associada à massa da Matéria Escura.

          Os resultados do estudo - baseados em um modelo teórico de gravidade quântica - mostraram que a Matéria Escura não pode ser nem 'ultra-leve' nem 'super-massiva', como algumas hipóteses têm sugerido, exceto se uma misteriosa nova força estiver agindo sobre esse tipo de matéria. Nesse sentido, os pesquisadores assumiram que apenas a gravidade estava agindo sobre a Matéria Escura, calculando que as partículas dessa última precisam ter uma massa entre 10-3 elétron-volts (eV) e 107 eV, uma faixa dramaticamente menor do que antes geralmente teorizado (10-24 eV - 1019 GeV). 

          Se a real massa das partículas de Matéria Escura estiver fora da nova faixa proposta, significará que existe, de fato, uma força desconhecida agindo sobre essa matéria. 

> Um elétron-volt é a quantidade de energia cinética ganha por um único elétron quando este é acelerado por uma diferença de potencial elétrico de um volt no vácuo. Se lembrarmos da Relatividade Especial, energia é equivalente a massa pela equação E=mc2. A massa das partículas de Matéria Escura teria massa equivalente à energia entre 10-3 e 107 eV.


   GALÁXIAS SEM MATÉRIA ESCURA?

          Como já explicado, a gravidade gerada pela matéria escura é crucial para explicar a estrutura de aglomerados galácticos e a formação estável de galáxias. Algumas galáxias aparentemente livres de matéria escura são tipicamente de curta duração e criadas nos braços de galáxias de maior porte (região onde a matéria escura antes existente é arrancada pela interação com outras grandes galáxias). Porém, em 2018, astrônomos anunciaram duas anômalas galáxias ultra-difusas (DF2 e DF4 no grupo NGC 1052), ambas de grande porte, estáveis e com velocidades de dispersão muito baixas indicando pouca ou nenhuma matéria escura associada. Essa descoberta foi desafiada com trabalhos subsequentes sugerindo erros na determinação da distância entre essas galáxias e a Terra (1).




           Mais recentemente, em um estudo publicado na Nature (Ref.24), pesquisadores não apenas voltaram a afirmar que essas duas galáxias não possuem matéria escura, como também alegaram ter identificado mais 4 a 11 novas galáxias livres de matéria escura (e algumas talvez com muito pouca matéria escura) no mesmo sistema, formando uma espécie de rastro linear. Usando modelos computacionais teóricos de formação galáctica, os autores do estudo sugeriram que essas galáxias se formaram após um evento de colisão de alta velocidade entre galáxias ricas em gás. No evento, o gás teria se separado da matéria escura, com subsequente formação estelar levando à formação de galáxias livres de matéria escura, localizadas em um rastro de >2 megaparsecs de extensão e com um ângulo de ~7° em relação à linha de visão. A violenta colisão explicaria outras anômalas propriedades das galáxias DF2 e DF4 além da ausência de matéria escura. 

               Nesse mesmo sentido, os pesquisadores também identificaram dois candidatos (galáxias RCP 32 e DF7) como remanescentes das galáxias progenitoras (pré-colisão), os quais seriam altamente ricos em matéria escura.

            Porém, outros astrônomos e cientistas estão céticos quanto ao estudo, com alguns alegando que a conclusão do paper não é mais do que uma hipótese (Ref.25). Mas caso confirmado, o achado pode render importantes pistas sobre a real natureza da misteriosa matéria escura.


   (!) NÃO EXISTE MATÉRIA ESCURA?

          Um recente estudo publicado no periódico The Astrophysical Journal (Ref.27) sugeriu que o Universo não possui Matéria Escura. E mais: os resultados do estudo suportariam que o Universo teria 26,7 bilhões de anos de idade, mais do que o dobro do valor estabelecido pelo atual Modelo [Cosmológico] Padrão.

           O estudo - de autoria do físico e professor Rajendra Gupta, da Universidade de Ottawa - é baseado em um modelo híbrido que combina a Teoria da Luz Cansada (TL) com uma variante do modelo ΛCDM no qual a constatante cosmológica é substituída por constantes covariantes acopladas (CCC). Esse modelo (CCC + TL) combina duas ideias - sobre como forças da natureza diminuem ao longo do tempo cósmico e sobre perda da energia da luz quando viaja a longa distância.

          Com o uso desse modelo e análise de dados na literatura científica recente sobre desvio para o vermelho associado à distribuição de galáxias, os resultados do estudo eliminam a existência cosmológica da Matéria Escura.

          Os resultados do estudo também corroborariam outro trabalho recente de Gupta publicado em 2023 no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society (Ref.28), baseado em observações do telescópio espacial James Webb e no modelo CCC + TL e alargando a idade do universo para 26,7 bilhões de anos.

          A proposta teórica oferecida nesse último estudo resolveria o problema das "galáxias precoces impossíveis", onde massivas e luminosas galáxias têm sido observadas pelo James Webb com apenas ~300 milhões de anos pós-Big Bang, algo que desafia o modelo padrão. Mas existe outra hipótese "ousada" que pode explicar essas observações: Cientistas podem ter observado Estrelas Escuras com o James Webb: Estrelas energizadas com Matéria Escura!


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   ENERGIA ESCURA

          Mas independentemente do que é feita a Matéria Escura, temos outro grande problema nas nossas mãos: a expansão do universo. À princípio, essa expansão deveria estar desacelerando desde o evento inicial do Big Bang, só que, pelo contrário, o Universo parece estar se expandindo em ritmo acelerado. Nesse contexto, a matéria normal e a matéria escura, combinadas, apenas responderiam por cerca de 28,6% da energia do universo, incluindo aquela responsável pela aceleração do universo. O restante dessa energia (71,4%) seria constituída por outra entidade, a qual recebeu o nome de Energia Escura.

          A natureza da energia escura é desconhecida, mas essa entidade energética provavelmente constitui a maior parte do universo. Sua distribuição seria homogênea, e permearia tudo, estando relacionada intimamente com o conteúdo do vácuo espacial. A energia escura não teria efeitos gravitacionais, mas de repulsão, e afetaria as forças do Universo como um todo, por mecanismos ainda desconhecidos. Diferente da matéria escura, é difícil tentar ignorar a presença da energia escura, mesmo entre os mais céticos físicos teóricos. Além da aceleração, essa energia escura pode também explicar vários outros processos que ocorrem ao nosso redor, como as transmissões de força gravitacional e elétrica (atrativas), algo ainda pouco compreendido.

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> Quando retiramos o ar de um espaço "vazio", temos um vácuo formado. Só que, ao contrário do popularmente pensado, esse vácuo - mesmo desconsiderando partículas de radiação eletromagnética e neutrinos transitando no espaço associado - não é composto apenas por "nada". Nesse vácuo podemos ter partículas e antipartículas virtuais incrustadas, como já foi demonstrado em aceleradores de partículas, além de energia e matéria escuras.(Sugestão de leitura: Físicos estão construindo um laser capaz de rasgar até mesmo o espaço vazio)

> Evidência recente suporta a possibilidade de que a energia escura no universo está ficando mais fraca com o passar do tempo. Leitura recomendada: O que é a Expansão do Universo?
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           Resultados de estudos teóricos nos últimos anos sugerem que a  Energia Escura pode emergir da interação entre o bóson de Higgs - partícula subatômica teoricamente prevista de ter emergido logo após o Big Bang - e a inflação do Universo (Ref.19). Uma hipótese mais recente, alvo de bastante ceticismo, sugere que os buracos negros supermassivos são a fonte de energia escura, confinando enorme quantidade de energia de vácuo (com efeitos opostos àqueles da gravidade) em seus interiores; isso explicaria a aparente grande discrepância de massa de buracos negros no início do Universo e atuais buracos negros (Ref.26).

          Mais recentemente, através da análise de 756 aglomerados de galáxias no banco de dados espectroscópicos Sloan Digital Sky Survey-DR13 - dentro do espectro de desvio para o vermelho de 0.045 ≤ z ≤ 0.125 - e simulações teóricas, pesquisadores em um estudo publicado no The Astrophysical Journal (Ref.22) determinaram com alta precisão que 31.5±1.3% o da quantidade total de matéria e energia no universo é composto por matéria (escura e bariônica/normal) - com cerca de 80% desse total sendo composto por Matéria Escura. O restante seria composto por Energia Escura.




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   MASSA NEGATIVA

          Recentemente, em um estudo publicado no periódico Astronomy and Astrophysics (Ref.20), o Físico Jamie S. Farnes da Universidade de Oxford, Reino Unido, propôs um modelo matemático que une matéria escura e energia escura em um único fenômeno: um fluído que possui 'massa negativa'. Essa nova hipótese sugere que o nosso Universo parece ser sempre simétrico em ambas qualidades positiva e negativa, como ocorre com as cargas elétricas (+ e -) e cargas magnéticas (N e S).

          Enquanto que uma massa positiva atrai todas as massas ao redor, uma massa negativa irá repelir gravitavelmente todas as massas ao redor. Se uma força é exercida sobre uma massa positiva, a massa irá se mover no sentido da força aplicada. No entanto, se uma força é exercida em uma massa negativa, a massa irá se mover no sentido contrário e de encontro à força aplicada. De qualquer forma, uma massa negativa na superfície da Terra cairia em sua direção como uma massa positiva.



          Uma das mais notáveis propriedades da massa negativa é que, quando perto de massa positiva com mesma magnitude, é iniciado um processo de runaway motion. A massa positiva é acelerada no mesmo sentido da massa negativa, com esta última sendo atraída pela primeira e esta, por sua vez, sendo repelida. A massa total resultante do par se torna zero, permitindo que o sistema seja acelerado à velocidade da luz. Como a massa negativa é atraída no sentido da massa positiva, ela é capaz de aplicar pressão nessa última, algo que pode possivelmente modificar a curva de rotação de uma galáxia (explicando a ação da matéria escura). E massas negativas - repulsivas entre si - se comportariam como fluídos escuros, obedecendo à equação de estado de um fluído perfeito (p = wpc2). A repulsão entre massas negativas pode explicar a energia escura e a ação desta na expansão do Universo.

          Para permitir a existência de massa negativa, e de forma que ela entre em concordância com as leis da Física e a Relatividade Geral (6),  Farnes aplicou um 'tensor de criação', o qual possibilita que massas negativas sejam continuamente criadas, impedindo que o fluído tenha sua densidade diluída durante a expansão do Universo (7) - algo antes previsto como uma impossibilidade para a existência de massa negativa como candidata a energia escura, esta a qual retém densidade constante mesmo sob expansão (w = -1). Isso faz com que o fluído se comporte exatamente como a energia escura. Aliás, quando usando simulações computacionais, o fluído de massa negativa acoplado com o tensor de criação também mostra se comportar como os halos de matéria escura que mantêm as galáxias em rápida rotação presas umas às outras, como inferido por observações usando telescópios modernos de rádio.

Leitura recomendada:

          Nesse sentido, teríamos as matéria e energia escuras unificadas em uma única substância, com ambos os efeitos sendo simplesmente explicáveis como massas positivas surfando sobre um mar de massas negativas. Einstein, em 1918, procurando uma solução para a constante cosmológica, chegou a propor que o "espaço vazio" estaria fazendo o papel gravitacional de massas negativas, as quais estariam distribuídas por todo o espaço interestelar. No entanto, em 1919, ele descartou essa possibilidade.

          Mais observações astronômicas e trabalhos teóricos serão necessários para corroborar ou derrubar a hipótese.

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   CONCLUSÃO

           Atuais modelos teóricos apontam que ~69% do universo é composto de Energia Escura, 25% de Matéria Escura e apenas 6% é Matéria Normal/Bariônica. E caso a hipótese da massa negativa estiver certa, a resolução do problema sobre o que são exatamente a matéria e a energia escuras passa a ser apenas uma simples troca de sinal.


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REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. https://home.cern/about/physics/dark-matter
  2. http://math.ucr.edu/home/baez/physics/Relativity/GR/dark_matter.html
  3. http://science.nasa.gov/astrophysics/focus-areas/what-is-dark-energy/
  4. http://abyss.uoregon.edu/~js/cosmo/lectures/lec17.html
  5. http://www.nasa.gov/mission_pages/sunearth/news/gallery/galaxy-location.html
  6. http://www.spacetelescope.org/news/heic1201/
  7. http://imagine.gsfc.nasa.gov/ask_astro/index.html
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