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Supercomputador dá suporte à Teoria Camaleão


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          A natureza física da gravidade, da energia escura e da matéria escura (1) é um dos problemas centrais não resolvidos na Física moderna. A gravidade em específico, gerada tanto por matéria normal quanto por matéria escura, é explicada mecanisticamente (teoria gravitacional) pela Relatividade Geral, formulada pelo Físico Alemão Albert Einstein e publicada em 1915 (2). Até o momento, mais de 100 anos depois da sua publicação, a Relatividade Geral continua sendo continuamente validada por diversos experimentos, especialmente astronômicos. O próprio sistema de GPS (3) só funciona ao obedecer a teoria relativística (geral e especial). O único grande problema é que que a Relatividade Geral entra em conflito com a Teoria Quântica.

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Para mais informações, acesse:

          No entanto, apesar do sucesso da Relatividade Geral em explicar o fenômeno gravitacional com notável alta precisão em relativas pequenas escalas locais e astronômicas, em escalas cosmológicas os testes disponíveis para validá-la não são suficientemente rigorosos. Novos dados astronômicos mais acurados podem oferecer suporte de validação para a Relatividade Geral ou mesmo para teorias gravitacionais alternativas mais abrangentes. Modelos alternativos inclusive chegam a prever sistemas multi-dimensionais, como a famosa Teoria das Cordas (ou Hipótese das Cordas) (4).

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(4) Leitura recomendada: O que é a Teoria das Cordas?


          Nesse sentido , Físicos da Universidade de Durham, Reino Unido, simularam recentemente sistemas galáticos usando um modelo alternativo para a gravidade - a 'f(R) gravidade', também chamada de Teoria Camaleão. As imagens produzidas nessas simulações mostraram que as galáxias ainda podem se formar no Universo mesmo com diferentes leis da gravidade. Em outras palavras, a Teoria Camaleão também parece explicar as estruturas do Universo sem a necessidade da Relatividade Geral. O achado foi publicado esta semana na Nature (Ref.1).

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   TEORIA CAMALEÃO

           A Teoria Camaleão, oficialmente chamada de 'f(R) gravidade', é uma teoria gravitacional modificada, a qual prevê diferentes comportamentos gravitacionais dependendo do ambiente. Essa teoria estabelece velocidades idênticas de propagação para as ondas gravitacionais e os fótons, e, portanto, é compatível com as recentes detecções de ondas gravitacionais com contrapartes ópticas (5). Essa teoria introduz também um grau escalar extra de liberdade que media uma quinta força entre partículas da matéria, otimizando a gravidade em até 4/3 em ambientes de baixa densidade, enquanto regiões com profundos potenciais gravitacionais podem ser visualizados a partir de tais otimizações via mecanismo camaleônico de triagem.

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(5) Especificamente a observação simultânea de ondas gravitacionais e explosões de raios gama em um sistema binário de estrelas de nêutrons em processo de fusão (GW170817 e GRB 170817A). Para mais informações, acesse: O que são as Ondas Gravitacionais?

> A chegada próxima em termos temporais das ondas gravitacionais e dos sinais de fótons (<1,7 s de diferença) limita a diferença relativa de fótons e grávitons a uma unidade na escala de 10-15, com incertezas associadas ao tempo de emissão dos fótons e das ondas gravitacionais.
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           Mecanismos de triagem (screening mechanisms) utilizam dinâmicas não-lineares para efetivamente desacoplar escalas do sistema solar e cosmológicas. A base central dos mecanismos de triagem é a existência de 29 ordens de magnitude separando as densidades cosmológicas e terrestres e 20 ordens de magnitude separando suas escalas de distância. Como resultado, as propriedades do escalar pode variar bastante em diferentes ambientes



          Para uma apropriada escolha de parâmetros, o modelo corrobora rigorosamente a dinâmica gravitacional no Sistema Solar e ainda deixa assinaturas detectáveis em grandes escalas, tornando-o uma excelente ferramenta para explorar como possíveis desvios da Relatividade Geral seriam observáveis.

> Para mais informações e detalhes matemáticos sobre os mecanismos de triagem e a teoria gravitacional do camaleão, acesse a Ref.3.

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   TESTANDO O CAMALEÃO

          No trabalho publicado na Nature, os pesquisadores exploraram um tipo popular da f(R) gravidade, o modelo Hu-Sawicki, o qual pode explicar a expansão acelerada tardia do nosso Universo sem a necessidade de uma constante cosmológica explícita (apesar dessa constante ainda entrar na teoria como um parâmetro). Além de ser teoricamente bem entendido, esse modelo também têm sido estudado extensivamente em simulações cosmológicas envolvendo matéria escura e hidrodinâmicas não-radiativas. Porém, até agora, esses estudos eram substancialmente limitados devido a modelos bariônicos de feedback pouco eficientes, os quais possuem uma natureza não-trivial e computacionalmente exigente. Recentes avanços no campo computacional - especialmente com o uso de supercomputadores - começaram a superar essas limitações.

          Para o estudo em específico, os pesquisadores utilizaram o SHYBONE (Simulating HYdrodynamics BeyOND Einstein), um conjunto de simulações cosmológicas hidrodinâmicas do f(R) gravidade Hu-Sawicki. As simulações incluíram os processos de formação galática (hidrodinâmicas de gás, campos magnéticos, formação de estrelas e buracos negros, feedback de supernovas e de núcleos galáticos ativos, aquecimento de gás, processos de resfriamento e ventos galácticos) de forma a reproduzir as principais estruturas observáveis das galáxias.

          Os resultados do estudo mostraram que a f(R) gravidade permite que galáxias realísticas como a nossa Via Láctea sejam formadas e demonstrou também que essa teoria pode ser distinguível da Relatividade Geral em escalas cosmológicas muito grandes.




          Em entrevista (Ref.2), o co-autor principal do estudo, Dr. Cristian Arnold, do Instituto para Cosmologia Computacional da Universidade de Durham, disse: "A Teoria Camaleão permite que as leis da gravidade sejam modificadas para que possamos testar o efeito de mudanças na gravidade durante a formação de galáxias. Através das nossas simulações, nós mostramos pela primeira vez que mesmo se você mudar a gravidade, isso não preveniria discos galácticos com braços espirais de serem formados."

          "Nossa pesquisa definitivamente não significa que a Relatividade Geral está errada, mas mostra que essa teoria não necessariamente é a única forma de explicar o papel da gravidade na evolução do Universo", adicionou Dr. Arnold.

          Os pesquisadores também exploraram a interação entre gravidade na Teoria Camaleão (f(R) gravidade) e buracos negros supermassivos que ficam no centro das galáxias. Os buracos negros são cruciais na formação das galáxias porque o calar e material que esses corpos ejetam quando assimilam matéria nas proximidades pode esgotar o gás necessário para a formação das estrelas, efetivamente parando a formação estelar. A quantidade de calor emitido pelos buracos negros é alterada por mudanças gravitacionais, afetando como as galáxias são formadas.

          No entanto, as simulações usando o SHYBONE mostraram que mesmo levando em conta as mudanças na gravidade geradas pela Teoria Camaleão, as galáxias ainda continuaram sendo formadas efetivamente.

           No caso do problema relacionado à expansão acelerada do Universo - a qual é considerada um produto da ação da misteriosa energia escura - os pesquisadores também encontraram que a f(R) gravidade pode ajudar a explicá-la. De acordo com o também co-autor principal do estudo Baoiu Li, do Instituto para Cosmologia Computacional da Universidade de Durham: "Na Relatividade Geral, os cientistas levam em conta a expansão acelerada do Universo via introdução de uma misteriosa forma de energia chamada energia escura - a mais simples forma a qual pode ser uma constante cosmológica, cuja densidade é uma constante no tempo e no espaço. No entanto, alternativas a uma constante cosmológica que expliquem a expansão acelerada via modificação da lei gravitacional, como a f(R) gravidade, são também amplamente consideradas quando levamos em conta o quão pouco sabemos ainda sobre a energia escura."

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          Os pesquisadores agora esperam que seus achados possam ser testados na prática através de observações usando o telescópio SKA (Square Kilometre Array), o qual compreende um sistema de observação astronômica baseado na Austrália e na África do Sul,  e está programado para entrar em operação em 2020. O SKA será o maior telescópio de rádio do mundo e visa desafiar a Teoria da Relatividade Geral, ao observar como as primeiras estrelas e galáxias se formaram após o Big Bang. O SKA ajudará também a comunidade científica a entender a natureza da energia escura.



REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. https://www.nature.com/articles/s41550-019-0823-y]
  2. https://www.dur.ac.uk/research/news/item/?itemno=39308
  3. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5856913/