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Qual é a relação entre Radiação UV, Danos na Pele e Bronzeamento?


- Atualizado no dia 30 de novembro de 2023 -

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             A pele humana, ao longo da evolução, desenvolveu dois principais mecanismos de defesa contra os perigosos efeitos da radiação ultravioleta (UV) do Sol: engrossamento da epiderme e a estimulação da síntese de melanina. Com relação à proteção específica contra a radiação solar, a presença da melanina é a mais importante, tanto aquela constituinte (já presente naturalmente na pele do indivíduo) quanto aquela facultativa (cuja produção é influenciada por fatores externos, como hormônios e exposição ao UV). Quanto mais escura a pele - maior densidade de melanina -, menor o risco para o desenvolvimento de um câncer de pele, pelo menos como regra geral. Mas como os raios solares causam danos na pele? Apenas pessoas de pele clara devem ficar preocupadas? Como ocorre o processo de bronzeamento e por que a pele demora várias horas até dias para mudar de cor após exposição solar? E existe algum produto que induz bronzeamento sem necessidade de exposição solar?

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   RAIOS UV: VILÃO E HERÓI?

          Os raios solares são compostos por um espectro contínuo de radiação eletromagnética - essa última constituída de pacotes de energia chamados de fótons - exibindo diferentes frequências/comprimentos de onda. Quanto menor o comprimento de onda da radiação, maior é a frequência e, consequentemente, mais energéticos e penetrantes são os fótons. Dentro desse espectro, a radiação mais energética e danosa para a nossa pele - por representar parte significativa dos raios solares (em torno de 9%) que chega à superfície da Terra e exibir alta energia por fóton - é a ultravioleta (UV). O UV pode ser dividido em três principais faixas de interesse correspondentes a diferentes comprimento de onda: UVA (320-400 nm), UVB (280-320 nm) e UVC (100-280 nm). A maior parte do UV que atinge a superfície terrestre é o UVA, em segundo lugar (5%) é o UVB e o UVC, virtualmente, não atinge a superfície, sendo refletido pelo oxigênio atmosférico de volta ao espaço ou absorvido na camada de ozônio.

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> O UVB é também facilmente bloqueável em importante extensão pela camada de ozônio e por condições meteorológica, assim como sua incidência é fortemente afetada pela inclinação dos feixes solares, latitude, estação do ano e horário do dia.

> Os raios UVA podem ser divididos em UVA de ondas curtas (UVA2, 320-340 nm) e UVA de ondas longas (UVA1, 340-400 nm). Considerando que comprimentos de onda maiores dificultam o bloqueio dos fótons, o UVA1 possui a maior incidência na superfície terrestre na faixa UV: aproximadamente 75% da radiação UVA e até 80% do total de UV. Ref.27
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           Nesse sentido, o UVA e o UVB são a maior preocupação. O fotodano na pele causado por essas duas faixas de radiação mostram diferentes propriedades biológicas. O UVB é mais citotóxico e mutagênico do que o UVA e entre 3 e 4 ordens de magnitude mais efetivo por área (J/cm2) na geração de danos no DNA, eritema (vermelhidão na pele), bronzeamento e câncer de pele, quando analisamos modelos in vivo (ratos). Enquanto o UVB é absorvido diretamente pelo DNA, induzindo danos na sua base estrutural (a faixa 245-290 nm é o máximo de absorção da molécula de DNA, e onde se tem os maiores efeitos mutagênicos). O UVA é responsável principalmente por danos indiretos no DNA, através da geração de espécies oxigenadas reativas (ROS), incluindo ânions superóxidos, peróxido de hidrogênio e oxigênio singleto (O que são os radicais livres?), os quais resultam em quebras indesejáveis nas ligações moleculares do DNA, produzindo mutações. Apesar do UVA ser menos danoso do que o UVB, este último é melhor absorvido por materiais diversos, como o vidro, fazendo com que o UVA atinja a pele em maior quantidade mesmo na sombra e em outros ambientes não iluminados diretamente pelos raios solares atravessando a atmosfera.

        Esses danos causados pelo UV podem gerar mutações em vários genes críticos para o bom funcionamento do maquinário celular, como o gene p53, cuja proteína codificada é responsável por proteger o DNA durante as divisões celulares - reduzindo o risco para o desenvolvimento de tumores. Mas além dos danos diretos e indiretos no DNA e consequentes efeitos mutagênicos, o UV também possui um papel de induzir imunossupressão na pele, reduzindo a capacidade de vigília contra potenciais células cancerígenas, antígenos virais e outros agentes deletérios nesse órgão.

         O câncer de pele é o mais frequente no Brasil, representando cerca de 30% dos tumores malignos registrados anualmente no país. São três tipos principais: o melanoma cutâneo maligno (MCM), o carcinoma celular basal (CCB) e carcinoma celular escamado (CCE). Esses dois últimos são os mais comuns de longe, sendo que o MCM - bem mais grave e com maiores chances de metástase - corresponde a apenas 3% dos cânceres na pele. O nome desses tumores fazem referência aos tipos de células que dão origem aos diferentes cânceres; por exemplo, o melanoma tem origem dos melanócitos. Apesar de fatores genéticos representarem cruciais determinantes para o desenvolvimento de um câncer de pele, e existirem múltiplos outros fatores também associados em menor ou maior extensão, grande parte dos casos são diretamente relacionados com a exposição excessiva ao UV.

        O UVB é eficientemente absorvido pela camada de ozônio, e os danos que essa última sofreu  no passado - e ainda sofre hoje em grande extensão nos trópicos (!) - facilitam a passagem dessa faixa de radiação para a superfície terrestre. Tem sido estimado que a perda de 1% na camada de ozônio leva a um aumento de mortalidade por melanoma de 1 a 2%. Incidência de câncer de pele - particularmente carcinoma de células escamosas - continua aumentando nas regiões de média latitude (próximas do equador) e com maior prevalência de melanoma em populações mais jovens (Ref.25). Contudo, apesar de ser reconhecido atualmente que existe uma crescente epidemia de câncer de pele nas últimas décadas, existem múltiplos fatores biológicos, ambientais e sociais associados com esse processo epidêmico diretamente, indiretamente e até inversamente ligados ao aumento de exposição ao UVB (Ref.12-13, 24)    

(!) Para mais informações: 

        Outro tipo de dano sobre a pele associado à exposição excessiva ao UV é o envelhecimento precoce. Quanto maior a exposição ao UV, mais rápido a pele tende a envelhecer, favorecendo o surgimento de rugas, pontos pretos e outras sinais de velhice. Exposição ao UV pode também causar ou acelerar problemas ligados  visão, como a catarata.

         Apesar dos vários potenciais danos à pele, ótima exposição solar é essencial para a síntese saudável de quase 90% dos níveis de vitamina D no corpo. Exposição insuficiente ao UVB - no contexto de ausência de suplementação vitamínica e alto consumo de certos alimentos relativamente ricos em vitamina D (ex.: gema de ovo) - está ligado a deficiências dessa vitamina em humanos, com múltiplos efeitos deletérios para a saúde humana.

         A exposição adequada ao UV também promove o bronzeamento da pele (melanogênese), aumentando o conteúdo de melanossomos e melanina que agem como protetores solares naturais, atuando como escudos do núcleo celular (e DNA) contra a própria radiação solar excessiva. Outras importante função da melanina, especialmente eumelanina, inclui proteção contra estresse oxidativo nas células da pele, atuando contra radicais livres e superóxidos (Ref.26). Como vários fatores afetam a incidência solar e absorção de UV na pele (ex: latitude, horário do dia, cor da pele, etc.), recomendações médicas ótimas de exposição solar são limitadas e controversas. Evidências acumuladas sugerem exposição solar de 10-30 minutos ao sol do meio-dia pelo menos 2-3 vezes por semana, com pessoas de pele escura requerendo um tempo maior; exposição do rosto e dos braços e das pernas ao sol por 15-30 minutos entre 11: 00 am e e 3:00 pm pode ser suficiente para manter um nível adequado de vitamina D no corpo (Ref.26). Exposição ao UV também parece estar associada a um efeito de melhora do humor e melhora de energia, com mecanismos propostos envolvendo aumento da produção do opioide beta-endorfina (Ref.26).

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IMPORTANTE: Converse com um dermatologista sobre as melhores formas de exposição solar dependendo do seu tipo de pele, suscetibilidade genética e estilo de vida. Em alguns casos, suplementação vitamínica pode ser necessário no contexto de contra-recomendação à ou impossibilidade de exposição solar por tempo estendido e ótimo para produção adequada de vitamina D. 

> Para mais informações sobre a síntese endógena de vitamina D no corpo: Qual é a relação entre Vitamina D, Ácido Fólico e Cor da Pele
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           Por fim, existe uso médico de fototerapia baseada em radiação UV para o tratamento de várias desordens cutâneas, como psoríase, vitiligo e dermatite atópica. Esse tipo de terapia envolve efeitos de modulação imune via interação do UV e vários elementos na pele, como cromosferas, subprodutos metabólicos, receptores da imunidade inata, neurotransmissores, precursores de vitamina, e mediadores como quimiocinas, peptídios antimicrobianos,  D e fator ativador de plaquetas (Ref.26). 


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    MELANINA E COR DA PELE

          A cor da pele é determinada principalmente pela mistura de carotenoides, oxi-/desoxihemoglobina e, mais importante, pelos diferentes tipos, distribuição e empacotamento do pigmento melanina. A produção de melanina ocorre em organelas ovoides específicas conhecidas como melanossomos, os quais são produzidos em melanócitos dendríticos que respondem por somente 1% das células da epiderme. Depois de produzida - a partir do aminoácido tirosina -, a melanina é transportada via dendritos para queratinócitos adjacentes e acumulada na área perinuclear na forma de "chapéu", provavelmente como um escudo otimizado de proteção do DNA contra os danos do UV.



         Mas diferente do que muitos pensam, a cor da pele não é influenciada pelos diferentes números de melanócitos, mas, sim, pelas diferenças de atividade melanogênica, o tipo de melanina produzida nos melanossomos e o tamanho, número e empacotamento desses últimos. Outro erro comum é achar que a melanina é uma substância única: na pele, sua composição é uma complexa mistura de feomelanina (composto sulforoso de um tom vermelho/amarelo claro e álcali solúvel) com eumelanina (composto preto/marrom escuro e insolúvel). Indivíduos ruivos ou loiros costumam ter uma alta concentração de feomelanina e indivíduos com pele mais escura acabam exibindo uma quantidade maior de eumelanina (apesar de, geralmente, a eumelanina sempre estar em maior quantidade, independente da cor de pele). Como a feomelanina fornece significativamente menor proteção contra o UV, quem possui maior quantidade de eumelanina na estará sob um risco menor de desenvolver um câncer de pele.

 
Detecção histológica do conteúdo de melanina usando marcadores Fontana-Masson. A quantidade de melanina nas camadas basais da epiderme é substancialmente maior na pele preta quando comparada com a asiática e a caucasiana/branca, apesar do número de melanócitos serem, virtualmente, idênticos, mas sendo ativados em diferentes intensidades de indivíduo para indivíduo.


          Enquanto a quantidade de melanina na pele "asiática" é ~2 vezes maior do aquela observada na pele "branca", a pele preta possui uma alta quantidade de melanina (de 3 a 6 vezes maior), bem mais eumelanina, e maiores e mais melanosomos. A pele preta acaba sendo muito mais fotoprotetora, com a epiderme associada deixando passar apenas 7,4% do UVB e 17,5% do UVA, enquanto a pele branca deixa penetrar 24% do UVB e 55% do UVA. Estudos já mostraram que indivíduos brancos possuem 70 vezes mais chances de desenvolverem um câncer de pele do que indivíduos de pele escura. E desde 1960, a incidência de CCB, CCE e melanoma entre a população branca tem aumentado a uma taxa de 5 a 8% anualmente, enquanto entre a população de pele escura tem se mantido relativamente constante. Além da eumelanina - e maior quantidade de melanina em geral -, outras diferenças morfológicas na pele preta parecem garantir maior proteção contra danos solares.


           Somando-se ao fato de absorver de forma eficiente a radiação UVA e UVB dos raios solares, a melanina também atua como um antioxidante (combatendo os ROS) e possui a habilidade de capturar perigosos radicais. Em outras palavras, a melanina age sobre um amplo espectro de danos gerados pelo UV na pele.

           E a melanina não só é responsável pela cor da pele. Cabelo e a íris do olho também possuem sua coloração determinada por esse pigmento. Indivíduos que possuem ínfima ou nenhuma quantidade melanina no corpo são chamados de albinos (Para saber mais: Albinos na África: terror e medo).

           Porém, apesar dessa aparência de herói inabalável e perfeito, a melanina pode também ser um fator carcinogênico quando exposta aos danos induzidos pelo UV. Há um longo tempo esse possível efeito era debatido entre os cientistas, e um estudo publicado em 2015 na Science, confirmou a suspeita (Ref.15). No estudo, os pesquisadores mostraram que os danos no DNA causados pelo UV continuam a ser gerados horas depois de cessada a exposição, por exemplo, aos raios solares. Além dos fotoprodutos gerados imediatamente após o banho de UV na pele, as espécies reativas oxigenadas e nitrogenadas criadas principalmente pelo UVA acabam também excitando um elétron em fragmentos da melanina. Isso cria um estado quântico de tripleto que possui a energia de um fóton UV que acaba sendo transferida ao DNA, como um ataque direto do UVB, e gerando produtos mutagênicos. E esse processo foi encontrado ocorrendo até >3 horas após a exposição ao UV. A extensão e significado desses danos mediados pela melanina ainda é um ponto pouco esclarecido.

Leitura complementar:


   SINAIS DE UM CÂNCER DE PELE

          A maioria dos casos de câncer de células escamosas e células basais podem ser curados se encontrados e tratados o mais cedo possível. Até mesmo o mais agressivo melanoma pode ser frequentemente tratado efetivamente se descoberto de forma muito precoce. Por isso é importante ficar atento aos sinais na pele que podem indicar o desenvolvimento inicial de um câncer cutâneo e saber reconhecê-los, especialmente aqueles associados ao melanoma. 

          Entre as principais medidas de automonitoramento temos:      

MUDANÇAS NA PELE: Uma mudança na pele é o mais comum sinal de câncer de pele. Pode ser um novo crescimento de tecido, uma ferida que não cicatriza ou uma mudança em antigos sinais/pintas/verrugas na pele. Nem todos os cânceres de pele possuem a mesma aparência. Às vezes o desenvolvimento do câncer pode ser doloroso, mas frequentemente não o é. Sempre que notar novas mudanças atípicas na pele, avise ao seu médico. Abaixo, algumas imagens de sinais na pele indicando o crescimento de cânceres.

UM NEVO SANGRANDO: Os nevos, comumente chamados de pintas ou sinais de nascença, são pequenas manchas marrons regulares na pele, salientes ou não, geralmente determinados pela genética ou exposição solar. Se um nevo começa a sangrar ou se outros começam a crescer a sua volta, isso pode ser sinal de um câncer. Na grande maioria das vezes, os nevos são inofensivos e não precisam ser tratados, e mesmo mudanças em sua estrutura podem não significar um problema sério. Mas nunca baixe a guarda, e avise imediatamente ao médico/a caso note mudanças.



          Existem também os nevos atípicos - ou displásticos - caracterizados por serem lesões maiores, podendo ser irregulares no formato e possuir vários tons. Pesquisas mostram que pessoas com 10 ou mais nevos displásticos possuem 12 vezes mais chance de desenvolverem um melanoma.

SINAIS DO MELANOMA: Como já dito, o melanoma é o câncer de pele mais difícil de ser tratado e o mais letal, e, por isso, é importante ficar de olho nos seus sintomas iniciais. Existe uma regra - ABCDE - recomendada de ser seguida para melhor identificar um melanoma, sendo necessário visitar um médico com urgência se você tem um nevo, marca de nascença ou outra área pigmentada na pele, nova ou antiga com tais características:

A = Assimetria: uma metade do nevo é diferente da outra metade;

B = Bordas: as margens da área pigmentada frequentemente são irregulares, cortadas ou embaçadas na linha delimitadora. O pigmento pode se espalhar para a pele ao redor;

C = Cor: a área pigmentada possui mais de uma cor, podendo variar em diferentes tipos marrons e pretos, mas também podendo apresentar colorações rosa, cinza, azul, branca e vermelha;

D = Diâmetro: ocorre uma mudança no tamanho, geralmente um aumento ou seu diâmetro é relativamente grande. Melanomas podem ser bem pequenos ou ultrapassar comprimentos de 6 milímetros;

E = Evolução: a área pigmentada sofreu alguma mudança nas últimas semanas ou meses.
Fotos de melanomas. (a, c) imagens simples e (b,d) imagens dermatológicas. (a-b) melanomas benignos e (c-d) melanomas malignos. Melanoma maligno é um dos tumores de pele mais letais devido à sua alta capacidade de metástase e alta resistência a tratamentos quimioterápicos. Referência: DOI 

Relato de caso: Paciente apresentou-se a um consultório de dermatologia reportando que um grande nevo (pinta) que ele tinha no abdômen tinha se modificado, exibindo múltiplas cores, atípico padrão pigmentar, despigmentação similar a cicatrizes e bordas irregulares, como pode ser observado na foto. Devido ao alto nível de suspeita clínica para melanoma, uma biópsia foi realizada e a amostra enviada para análise patológica detalhada. Sob microscópio, um melanoma de nível 3 foi confirmado, emergindo de um nevo pré-existente. Remoção cirúrgica do tumor foi realizada, com uma margem de 1 cm para fora das bordas. Referência: acesse aqui.


           E como dica adicional, tente sempre consultar o dermatologista pelo menos uma vez ao ano para um exame completo.


   PREVENÇÃO AO CÂNCER DE PELE

          Indivíduos com a pele muito clara (ruivos principalmente) e albinos devem ter atenção redobrada, pois possuem uma suscetibilidade muito maior ao desenvolvimento de cânceres de pele. Como recomendação geral, independente da cor da pele, seguir as medidas de prevenção abaixo diminuem consideravelmente as chances de adquirir um câncer por ação do UV:

- Usar chapéus, camisetas e protetores solares.
- Evitar a exposição solar e permanecer na sombra entre 10 e 16 horas (horário de verão).
- Na praia ou na piscina, usar barracas feitas de algodão ou lona, que absorvem 50% da radiação ultravioleta. Aquelas feitas de nylon formam uma barreira pouco confiável: 95% dos raios UV ultrapassam o material.
- Usar filtros solares (ou protetores solares) diariamente, e não somente em horários de lazer ou diversão. Utilizar um produto que proteja contra radiação UVA e UVB e tenha um fator de proteção solar (FPS) 30, no mínimo.
- Reaplicar o produto a cada duas horas ou menos, nas atividades de lazer ao ar livre. Ao utilizar o produto no dia a dia, aplicar uma boa quantidade pela manhã e reaplicar antes de sair para o almoço.

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> Os protetores solares tópicos, ou filtros solares, contêm filtros ultravioleta (substâncias ou ingredientes capazes de absorver, refletir ou dispersar determinada energia proveniente da radiação solar) que são combinados em uma base para veiculação, homogeinização e estabilização destes ativos. Os componentes desses filtros podem ser inorgânicos (ex.: óxidos de zinco e de titânio) ou orgânicos. Os filtros UV precisam ser potentes, oferecer amplo espectro de atuação frente a UVA e UVB e permanecer com aspecto e funcionalidade inalterados perante exposição à radiação (fotoestabilidade). 

> Importante realçar que o fator nos filtros solares - Fator de Proteção Solar (FPS) - reflete em especial o tempo que o produto irá proteger a pele contra uma mesma quantidade de radiação UV. Quanto maior o FPS, mais tempo a proteção irá durar. Porém, quanto maior o FPS, maior tende a ser a intensidade de proteção; por exemplo, um filtro solar FPS 15 absorve 93,3% da radiação UVB; um filtro solar FPS 30 absorve 96,7%; enquanto um filtro solar FPS 50 absorve cerca de 98%. No Brasil, onde o nível de radiação é muito alto, o uso de um filtro solar com FPS maior é importante para reduzir a quantidade de radiação que está passando pelo filtro e chegando à pele. 

> Para uma revisão acadêmica completa e recente sobre os filtros solares (em português), acesse aqui.


Leituras complementares:

      PELE ESCURA E LUZ VISÍVEL

           Luz solar terrestre é a porção da radiação solar que alcança efetivamente a superfície solar. Essa porção engloba três principais componentes: radiação UV (290-400 nm), luz visível (400-700 nm) e infravermelho. Os efeitos deletérios da radiação UV são bem estabelecidos e de conhecimento comum, particularmente sobre aqueles com tons mais claros de pele (tipos de pele I-II na classificação Fitzpatrick). Danos UV-mediados são tipicamente manifestados com queimaduras de variados graus de severidade com a exposição solar. Porém, estudos nos últimos anos vêm mostrando os impactos negativos da radiação (ou luz) visível na saúde da pele, particularmente em indivíduos com cor de pele mais escura (tipos IV-VI na classificação Fitzpatrick) e exposição envolvendo a faixa do azul (mais energética do visível). Agrava a situação a crença comum e errônea que indivíduos de pele escura estão totalmente protegidos da exposição radiação solar excessiva.

          TODOS os tipos de pele são suscetíveis a danos associados à exposição solar. Assim como os indivíduos de pele clara, pessoas de pele escura são beneficiadas ao incorporar medidas fotoprotetoras contra o dano solar (ex.: buscar sombra quando em ambiente aberto, vestir roupas protetivas e usar protetor solar), particularmente para prevenir problemas de pigmentação. E um MITO popular é alegação de que pessoas com pele muito escura ou preta "nunca sofrem queimaduras solares". 

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Importante: A escala classificatória Fitzpatrick visa medir a habilidade de uma pessoa de queimar ou ficar bronzeada após exposição solar; não é um indicador de "raça" (!), etnia ou características fenotípicas diversas. 


(!) NÃO existem raças na nossa espécie (Homo sapiens). Para mais informações: Existem raças humanas?
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           Pessoas de pele escura (tipos IV, V e VI) possuem melanossomos maiores e mais melanizados, os quais são distribuídos individualmente dentro dos queratinócitos ao invés de agregados, e esses melanossomos podem absorver mais energia UV do que aqueles nos tipos I, II e III. Melanina em indivíduos de pele mais escura podem absorver 2 a 5 vezes mais radiação UV do que melanina em peles mais claras, oferecendo um fator intrínseco de proteção solar quase 4 vezes maior em peles escuras comparado com peles claras. Porém, radiação UV ainda pode causar danos em todos os tipos de pele, isso porque o risco não parece depender apenas do grau de pigmentação. Estresse oxidativo, imunossupressão induzida por excesso de exposição solar, e outros fatores também contribuem para a patofisiologia do fotodano. Além disso, uma pele mais clara também permite maior penetração da radiação UV, expondo camadas internas e externas da pele a um maior risco de danos no DNA.

Espectro de luz e impacto sobre a pele. Aproximadamente 100 vezes mais UVA alcança a derme do que os fótons de UVB (315-400 = UV; 400-700 = visível, VL). Ref.28


Diferenças na pigmentação da pele devido à distribuição de melanossomos dentro dos queratinócitos epidérmicos. Ref.28

          E importante, exposição da pele a um excesso de radiação visível também atua estimulando eritema, pigmentação da pele, dano térmico e produção de espécies oxigenadas reativas (ROS). E é na pele mais escura que os danos por luz visível são mais intensos, devido à maior capacidade de absorção de fótons na faixa de 400 a 700 nm. Aliás, todos já devem ter observado que uma superfície preta aquece muito mais rápido sob exposição solar do que uma superfície branca, essa última refletindo muito mais luz visível. Portanto, mais energia é transferida para a pele escura via radiação visível, alimentando, por exemplo, produção de espécies reativas. E a ação da luz visível produz redistribuição sustentada de grânulos de melanina da camada basal da epiderme para mais próximo da superfície, induzindo e exacerbando melasma, exacerbando hiperpigmentação pós-inflamatória, entre outros problemas de pigmentação.

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> Melasma é uma hipermelanose adquirida, aparecendo como manchas amarronzadas irregulares na pele, primariamente sobre áreas expostas ao sol no rosto, pescoço e braços. É uma condição mais comumente manifestada em mulheres, particularmente naqueles em idade reprodutiva e com pele do tipo IV ao VI, e parece ser exacerbada por influência de estrógenos e influenciada por fatores genéticos (Ref.28-29). Resulta de exposição às radiações UV e visível estimulando hiperatividade de melanócitos e produção de pigmentos, com um subsequente aumento da melanogênese tirosina-mediada e elevada transferência de melanossomos para queratinócitos epidérmicos, produzindo manchas pigmentadas na pele. Radiação visível de alta energia e UVA-1 atuam de forma especialmente importante na fisiopatologia do melasma. É uma condição de difícil tratamento e seus efeitos estéticos podem causar problemas emocionais, de autoestima, de bem-estar e afetar negativamente interações sociais.  

Duas pacientes com melasma no rosto (Referência, acesse aqui).

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           E enquanto indivíduos com pele escura são bem menos suscetíveis a cânceres de pele, esse risco ainda é significativo em todos os tipos de pele. Além disso, cânceres cutâneos em indivíduos de pele escuro são frequentemente detectados em um estágio mais avançado e são associados com um pior prognóstico (Ref.28, 30). Radiação UV não parece ser um dos principais fatores de risco para melanoma em pessoas com pele escura, afetando em especial áreas da pele tipicamente escondidas da exposição solar, como pele plantar, palmar e abaixo da unha (Ref.28). Carcinomas cutâneos de células escamosas segue o mesmo padrão, ocorrendo mais comumente em áreas não tipicamente expostas à radiação solar, incluindo extremidades inferiores e áreas anal e genital; por outro lado, carcinomas de células basais geralmente ocorrem em áreas da pele expostas ao sol nessa população (Ref.28).

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> Após exposição ao UVB, dano no DNA ocorre principalmente nas camadas superiores da epiderme em peles mais escuras. Melanina nesse tipo de pele protege contra a formação de dímeros de pirimidina ciclobutano, os quais causam as mais mutagênicas lesões no DNA, na epiderme basal. Além disso, a distribuição de melanina em peles escuras parece aumentar a resistência contra respostas inflamatórias induzidas por exposição à radiação UV. Ref.31
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            Existe também uma errônea ideia de que pessoas de pele escura não precisam usar protetor solar - ou precisam usar bem menos do que pessoas com pele clara - durante exposição solar. Indivíduos de pele muito escura que experienciam severas queimaduras solares são 7 vezes menos prováveis de terem usado protetor solar do que pessoas com pele muito clara, e, quando protetores solares são usados, esses indivíduos frequentemente não aplicam suficiente quantidade do produto e não reaplicam com adequada frequência (Ref.28). Indivíduos de pele escura que usam adequadamente e diariamente protetores solares exibem significativamente menos sinais de problemas pigmentares e de envelhecimento precoce da pele associado à radiação solar.


   PARADOXO DOS PROTETORES SOLARES

           Inicialmente, é importante esclarecer: típicos protetores solares de espectro amplo fornecem 90% da proteção contra comprimentos de onda abaixo de 370 nm. Em outras palavras, esses produtos NÃO fornecem boa proteção contra o UVA-1 e significativa proteção contra a luz visível. E, como já realçado, essas faixas de radiação também causam doenças de hiperpigmentação e outros problemas de pele. O UVA1, em especial, mesmo possuindo bem menos energia do que o UVB, são absorvidos por cromóforos, podendo induzir estresse oxidativo em todas as camadas de pele da epiderme até a derme. A geração de espécies oxigenadas reativas levam a peroxidação de lipídios, mudanças proteicas e formação de fotoprodutos de DNA. Nessa linha, exposição excessiva ao UVA-1 pode alimentar fotocarcinogênese humana, envelhecimento precoce da pele, supressão imune e hiperpigmentação*.

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Leitura complementar:

*Para uma revisão completa e recente sobre a ação do UVA longo (UVA-1) na pele, acesse a Ref.32
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          Nesse caminho, um recente estudo publicado no periódico Cancers (Ref.33) levantou o alerta para um fenômeno que os pesquisadores apelidaram de "Paradoxo dos Filtros Solares". O melanoma é o câncer de pele mais agressivo, com alta tendência de metástase e prognóstico ruim. Globalmente, a incidência de melanoma cutâneo está aumentando, com exposição à radiação solar identificada como um crucial fator de risco modificável. Essa tendência de aumento também vem sendo observada no Canadá. No estudo, os autores resolveram investigar os fatores que potencialmente explicam grandes diferenças de incidência de melanoma entre diferentes províncias Canadenses.  

          Eles encontram, inesperadamente, que em duas províncias Canadenses (Nova Scotia e Prince Edward Island) com altas taxas de melanoma (27-31 para cada 100 mil habitantes; média nacional: ~21/100 mil), as pessoas eram mais prováveis de reportar o uso de filtro (ou protetor) solar e estavam mais cientes dos riscos da exposição solar. No entanto, habitantes nessas províncias experienciavam maior exposição solar e exibiam maior tendência de engajar em ocupações e atividades recreativas realizadas em espaço aberto (ex.: banho de sol para bronzeamento).

            Os pesquisadores concluíram que indivíduos com maiores níveis de exposição solar no Canadá também tendem a usar mais protetor solar ou outras medidas de proteção solar, porém em quantidade ou forma inadequada. Lembrando também que o uso de típicos protetores solares não protegem contra faixas no visível e de UVA-1, e não barram completamente o UVB e o UVA em geral. Em outras palavras, pessoas estão se expondo mais à radiação solar devido - entre outro fatores - a uma falsa sensação de segurança. Os achados do estudo corroboram estudos prévios em países Nórdicos sugerindo que maior uso de protetores solares e maior conhecimento sobre os danos solares aumentava a suscetibilidade a queimaduras e exposição solares. Aliás, um estudo genômico também recente, publicado no periódico Cancer Epidemiology, Biomarkers & Prevention (Ref.34), encontrou que o uso de protetor solar estava associado com um risco >2 vezes maior de desenvolver câncer de pele entre os Britânicos. 

          "As pessoas acham que estão protegidas de cânceres solares porque estão usando um produto promovido para prevenir a condição," disse em entrevista o Dr. Ivan Litvinov, um dos autores do estudo e pesquisador na Universidade de McGill, Canadá (Ref.35). "A maioria das pessoas não aplicam protetor solar suficiente ou ficam no sol por horas após aplicá-lo na parte da manhã, dando uma falsa sensação de segurança"

          "Protetor solar é importante, mas também é o meio menos efetivo para proteger a pele quando comparado com roupas de proteção solar e evitar a exposição solar," completou Litvinov. "Pessoas podem e devem desfrutar o ambiente externo, mas sem queimar a pele ou desenvolver bronzeado."

           O estudo realça que campanhas de conscientização sob medidas de proteção solar precisam também adereçar esse fenômeno no Canadá e em outras partes do mundo - em especial nos trópicos, onde o buraco na camada de ozônio continua muito preocupante (!).

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> Para exemplificar o uso tópico inadequado de protetores solares. Em 2018, um estudo publicado no Acta Dermato-Venereology (Ref.23) mostrou que um protetor solar FPS 50 aplicado de forma típica pelas pessoas garante no máximo 40% da proteção esperada porque a camada aplicada é muito fina. Os pesquisadores sugeriram que os consumidores usem protetores solares com um fator de proteção muito maior do que o recomendado para os tipos específicos de pele para garantir uma proteção mais efetiva por um período prolongado de tempo - já prevendo a aplicação sub-ótima desses produtos.


> Medidas fotoprotetoras [reforçando] incluem minimizar a exposição solar durante o pico de radiação UV (10:00 am até 14:00 pm); buscar o máximo possível de sombras durante atividade em ambiente aberto; uso de óculos escuros com proteção contra UV; uso de chapéus de abas longas; roupas cobrindo o máximo de pele no corpo; e aplicação adequada de protetores solares de espectro amplo.

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    GENÉTICA DA MELANINA

           Mais de 120 genes já mostraram serem responsáveis por regular a pigmentação em mamíferos, junto à ação indireta de um complexo sistema de fatores parácrino e autócrino, citocinas e fatores de crescimento. Mas o maior determinante do fenótipo de pigmentação é o receptor melanocortina 1 (MCIR, na sigla em inglês). O produto desse gene, a proteína MCIR, é uma G-proteína de receptor agrupado que é expressa na superfície de melanócitos, e a qual regula a síntese qualitativa e quantitativa da melanina.

Nos humanos, o gene MC1R está localizado no braço longo do cromossomo 16, na posição 24.3

          A atividade do MCIR é regulada pelo agonista fisiológico alfa-MSH e o hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) e por um antagonista conhecido como proteína agouti-sinalizadora (ASP). A ativação do MC1R através da ligação com um agonista estimula a síntese de eumelanina. Se o receptor não é ativado ou é bloqueado, os melanócitos sintetizam feomelanina ao invés de eumelanina. Queratinócitos epidérmicos e melanócitos respondem à exposição ao UV aumentando a expressão do alfa-MSH e do ACTH.

          Variantes do gene MC1R que funcionam fracamente mostram uma relativa inabilidade de bronzeamento (por exemplo, os ruivos não conseguem se bronzear), apesar de, em ratos, algumas drogas - como a forskonina - conseguirem ativá-lo, gerando um profundo escurecimento da pele. Variações comuns (poliformismo) nesse gene são associados com diferenças normais na pele e cabelo dos indivíduos.

           Além dos melanócitos, o MC1R é também ativo em células do corpo envolvidas com o sistema imune e de resposta inflamatória. A função dessa ativação nesses casos ainda é desconhecida.

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     BRONZEAMENTO

           O bronzeamento é o escurecimento da pele a partir da maior produção de melanina no processo final (pigmentação facultativa), primariamente pela exposição ao UV. A intensidade do bronzeamento irá depender do potencial melanogênico de cada um. Porém, a maior pigmentação na pele durante o bronzeamento é um processo que acontece em várias etapas, não apenas uma maior produção de melanina desde o início como muitos pensam.

1°. Escurecimento pigmentar imediato (EPI): O primeiro passo após a exposição da pele ao UV é um fenômeno de transição, o qual ocorre em questão de minutos. A coloração da pele fica acinzentada, esta a qual gradualmente se transforma em uma coloração amarronzada que pode durar de minutos a dias, dependendo da dose de UV e da cor de pele do indivíduo. Mas nessa etapa não temos uma produção de melanina e, sim, a foto-oxidação daquela já existente anterior à exposição e a redistribuição de melanosomos de uma localização perinuclear para uma localização periférica dendrítica. É uma fase mais afetada pelo UVA e não possui uma função biológica ainda conhecida.

2°. Escurecimento pigmentar persistente (EPP): Essa é uma fase prolongada também de oxidação da melanina - gerando uma coloração amarronzada -, que começa a ocorrer horas depois da exposição ao UV e persiste, no mínimo, de 3 a 5 dias. O UVA é responsável pela maior parte dessa fase, a qual também não envolve síntese de melanina.

3°. Bronzeamento atrasado (BA): Aqui, sim, temos a nossa síntese adicional de melanina. Essa fase se torna aparente entre 2 e 3 dias após a exposição ao UV, e é afetada em grande intensidade tanto pelo UVA quanto pelo UVB. Resulta da estimulação de maior síntese de melanina - em maior quantidade do que antes da exposição - e envolve o aumento no número e atividade de melanócitos funcionais, aumento de dendriticidade, e aumento na síntese, transferência e alteração de empacotamento dos melanosomos (!).

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(!) Segundo um estudo publicado no periódico Journal of Investigative Dermatology (Ref.36), esse atraso no processo efetivo de bronzeamento ocorre porque o maquinário celular prioriza primeiro reparação de danos no DNA causados pela exposição solar (proteção contra danos imediatos UVB-induzidos), inibindo o mecanismo responsável pela produção de nova melanina na pele (proteção contra danos futuros). Os mecanismos de reparação do DNA e de bronzeamento são regulados (inibição e ativação), em especial, pelas proteínas ATM e MITF. O sistema de reparo molecular liderado pela cinase ATM inibe a atividade transcricional da MITF associada a genes de pigmentação - colocando-a no modo de reparação no núcleo celular -, permitindo rápido e eficiente reparo do DNA e, consequentemente, otimizando as chances de sobrevivência das células. 

> De fato, em contraste com o bronzeamento efetivo, mecanismos de reparo de DNA (ex.: ativação da proteína p53), respostas inflamatórias e recrutamento do sistema imune ocorrem imediatamente após a exposição [estresse] ao UV. Hiperpigmentação atrasada é também observada em pacientes durante tratamentos medicamentosos que causam danos no DNA, como quimioterapia, provavelmente um fenômeno também mediado pela cinase ATM. 
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           No geral, quanto mais escura a pele, mais pronunciada se torna sua resposta à exposição UV. Indivíduos com a pele muito clara sempre sofrem queimaduras nesse processo e nunca se bronzeiam quando expostos ao Sol  (como os ruivos). Indivíduos com a pele menos clara queimam menos e se bronzeiam minimamente. E assim, segue a tendência, sendo os tipos de pele classificados em um total de 5, do muito claro ao muito escuro, em relação à sensibilidade ao UV.

           Queimaduras na pele após um excesso de exposição ao UV levam ao vermelhidão característico (eritema) por resposta do sistema imune, o qual induz ao aumento do fluxo sanguíneo na região para ajudar a reparar os danos. Já o processo de coceira e descascamento que se segue depois é devido à ação das células brancas (leucócitos, células de defesa) removendo as células danificadas. Quanto mais clara a pele, mais rápido esses efeitos são notados.

           O bronzeamento da pele desaparece com o tempo à medida que as células com o excesso de melanina produzido se movem em direção à superfície epitelial e acabam sendo eliminadas por descamação.

           E não existe algo do tipo "bronzeamento seguro", caso o UV (solar ou de outra fonte) esteja sendo utilizado para esse fim. O bronzeamento natural é um sinal que a pele sofreu danos, e o aumento posterior de melanina ocorre para prevenir danos mais graves em caso de uma nova exposição em um futuro próximo. Porém, contrário à crença popular, os danos, mesmo com uma pele bronzeada, continuarão sérios, já que a proteção extra dada pelo bronzeamento natural garante um fator de proteção solar (FPS) entre 2 e 4, muito abaixo do fator mínimo recomendado de protetores solares em forma de creme (FPS 15). 

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    INIBIDOR SIK

             Como explorado até aqui, a exposição à radiação UV é o principal fator de risco para o desenvolvimento de diferentes tipos de câncer de pele, incluindo o devastador melanoma. Essa exposição geralmente ocorre a partir da radiação solar no dia-a-dia, com a intensidade aumentando em regiões equatoriais e tropicais. Aqueles com a pele mais clara estão sob um grande risco e muito mais vulneráveis ao UVB (mais energético e mutagênico) do que aqueles com pele escura. Porém, muitas vezes o excesso de exposição ao UV não é involuntário, mas dirigido pela vontade das pessoas de manterem a pele bronzeada, seguindo padrões estéticos estabelecidos. Para isso, procuram as praias e até as perigosas câmaras de bronzeamento artificial.

          O problema é que não existe um bronzeamento seguro a base de UV. O bronzeamento, naturalmente, é um sinal de danos à pele, os quais podem levar ao desenvolvimento de um câncer. Infelizmente, as pessoas não dão muita importância a isso ou subestimam a ação do UV na pele, e acabam expondo o corpo a um excesso dessa radiação. Aqui no Brasil, as câmaras de bronzeamento já foram banidas (As perigosas câmaras de bronzeamento), para tentar combater a enorme incidência de cânceres de pele (30% do total de tumores malignos aqui no país). Mas, infelizmente, para ativar um bronzeamento natural na pele - através da produção de nova melanina pelos melanócitos - é necessário a presença do UV, e é aqui que um promissor medicamento entra em cena (Ref.1).

            Para ativar a produção de eumelanina (o tipo de melanina mais escura no nosso corpo) e promover o bronzeamento, é necessária a ocorrência de danos no DNA causados pelo UV, os quais acionam uma cascata de sinalizadores que ativam o gene MC1R, este o qual é responsável por regular a produção de melanina nos melanócitos. Ou seja, por esse caminho, temos que ter o UV para bronzear a pele. Mas existem outros caminhos bioquímicos que podem ativar essa maior produção de eumelanina, como o uso tópico de forskolina (que funciona inclusive em ratos com deficiência do MC1R) e o fosfodiestesterase PDE4D3, cuja ação leva a uma hiperpigmentação na pele similar à forskolina. Porém, ambas as moléculas, quando testadas em humanos, falham em induzir uma hiperpigmentação/bronzeamento por causa da baixa capacidade de penetração das mesmas em nossa pele, esta a qual é bem mais espessa e intransponível do que aquela presente nos ratos. Então os pesquisadores voltarão seus olhos para outras alternativas.

             Estudos genéticos em ratos começaram a sugerir a presença de um caminho no qual o co-ativador da transcrição regulada do CREB (elemento-responsivo-ligador-cAMP, traduzido da sigla em inglês) - CRTC - positivamente regula e o sal-indutor da cinase 2 (SIK2) negativamente regula o MITF (um poderoso gene regulador da expressão genética da pigmentação) de forma independente do UV. Foi então que os pesquisadores descobriram o inibidor SIK HG 9-91-01, o qual também regula a pigmentação cutânea, induzindo uma eficiente produção de eumelanina em ratos. Mas, mais uma vez, essa molécula não consegue entrar na pele humana e agir em prol dos melanócitos sem antes existir um grande esforço mecânico. Com isso, teve-se uma ideia: otimizar essa molécula para a mesma entrar mais facilmente na epiderme humana.
Observe o quanto a pele do rato deficiente em MC1R ficou escurecida com o uso do SIK (no caso, o HG 9-91-01), após 7 dias da aplicação inicial; o veículo de controle utilizado (placebo) foi uma solução de 70% de etanol e 30% de propileno glicol; nos ratos albinos, como esperado, o bronzeamento é impossível, devido a impossibilidade na síntese de melanina 

             Seguindo a Regra dos Cinco de Lipinski, a qual prevê uma maior absorção de compostos pelo tecido epitelial se os mesmos contiverem menos do que cinco ligações de hidrogênio doadoras, menos do que dez ligações de hidrogênio aceptoras, um peso molecular menor do que 500 g/mol e log P (CLogP) calculado - ou seja, uma molécula que interage melhor com o perfil lipofílico da pele -, os pesquisadores sintetizaram duas moléculas derivadas do HG 9-91-01: o YKL-06-061 e o YKL-06-062. E o resultado quando testado em ratos? Sim, mantiveram um alto poder de pigmentação. E quando testado na pele humana? Sim, geraram um grande poder de pigmentação e foram facilmente absorvidas por esse tecido! Ambos se mostraram bem poderosos no bronzeamento, como o YKL 06-061 tendo uma eficiência maior, talvez devido ao seu caráter lipofílico mais próximo da Regra dos Cinco de Lipinski.

            Além de regular a produção de melanina através do MITF, a aplicação tópica das moléculas do inibidor SIK parece também disparar a transferência de melanossomos dentro dos queratinócitos da epiderme em uma forma que recapitula o envolvimento perinuclear visto na pigmentação epitelial normal humana. Em outras palavras simula muito bem um bronzeamento causado pelo UV, mas sem a necessidade dos danos desse último! Quando bronzeada, a pele - assim como ocorre com a exposição ao UV -, volta a ter sua coloração normal em algumas semanas. E outro feito incrível dos SIK: como não dependem da atividade do MC1R, pessoas ruivas, as quais têm uma baixa atividade nesse gene, podem se beneficiar de um bronzeamento também, onde antes só encontravam queimaduras do Sol!

Aqui podemos ver o tecido da pele de uma mama humana tratada com o controle (70% de etanol e 30% de propileno glicol), o HG 9-91-01 (como esperado, sem efeito) e o SIK modificado YKL 06-061, onde fica bastante aparente o efeito de bronzeamento, 8 dias após a aplicação da substância

           Essa nova geração de inibidores SIK agora torna real o desenvolvimento de produtos tópicos para serem passados na pele para bronzeá-la sem as pessoas precisarem se expor ao excesso de UV. Somando-se a isso, uma maior quantidade de eumelanina na pele também garante uma proteção extra contra os raios solares. Mas ainda é um pouco cedo para ver esses bronzeadores no mercado, isso porque é a primeira vez que tais substâncias são criadas e introduzidas na pele humana para um aumento na síntese de melanina. Segundo os pesquisadores responsáveis pelo estudo, as moléculas criadas provavelmente são muito seguras para o uso tópico - e não mostraram efeitos negativos até o momento nos modelos experimentais - mas atualmente testes clínicos estão em andamento para comprovar a segurança, especialmente detecção de possíveis efeitos colaterais a longo prazo. Além disso, ainda é preciso desenvolver métodos eficientes de entrega do produto à pele, de forma a otimizar o máximo possível a eficiência das moléculas e as estratégias de doses.

           O estudo, realizado por um time de cientistas do Hospital Geral de Massachusetts e publicado em 2017 no Cell Reports, pode gerar real impacto de prevenção contra o câncer de pele, o qual só vem crescendo dentro da população mundial. Outros danos do excesso de UV também podem ser melhor prevenidos, como problemas na visão e envelhecimento precoce. Um dos objetivos futuros do time de pesquisa é unir a ação do inibidor SIK com cremes de proteção solar, aumentando ainda mais as defesas da pele contra o UV.



Artigos Recomendados:

REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://www.cell.com/cell-reports/pdf/S2211-1247(17)30684-8.pdf 
  2. https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/Melanin#section=Associated-Disorders-and-Diseases 
  3. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2671032/
  4. https://nihseniorhealth.gov/skincancer/skincancerdefined/01.html
  5. https://www.fda.gov/radiation-emittingproducts/radiationemittingproductsandprocedures/tanning/ucm116432.htm
  6. https://ghr.nlm.nih.gov/gene/MC1R#normalfunction
  7. https://medlineplus.gov/ency/anatomyvideos/000125.htm
  8. https://www.cancer.gov/publications/patient-education/skin.pdf
  9. https://medlineplus.gov/ency/article/002256.htm
  10. http://www.inca.gov.br/rbc/n_48/v03/pdf/revisao3.pdf
  11. http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/pele_melanoma/definicao
  12. http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/19381980.2016.1267077
  13. http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/ijd.13065/full
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  16. http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/exd.12618/full
  17. http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/brv.12171/full
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