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Mau hálito é um problema bucal ou estomacal?


- Atualizado no dia 30 de dezembro de 2022 -

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            O mau hálito, cientificamente conhecido como halitose, é um problema muito comum, afetando algo entre 20 e 50% da população mundial em alguma extensão ou forma - mas com a prevalência podendo variar substancialmente de região para região. Apesar de ser retratado frequentemente na mídia popular com um tom humorístico, o mau hálito pode afetar muito negativamente a qualidade de vida do indivíduo, especialmente por gerar constrangimento coletivo durante momentos íntimos e de conversações. Devido ao fato de ser uma condição comum, a halitose está associada a muitas desinformações, crenças populares e mitos. E um mito comum é a persistente ideia de que o estômago é o culpado pela maioria dos quadros de halitose, especialmente aqueles mais severos.

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  TIPOS DE HALITOSE

         Uma real halitose, basicamente, é caracterizada pela exalação persistente de um mau odor pela via oral. O problema, contudo, pode ser classificado em três tipos:

- Halitose genuína: um óbvio mau odor exalando da cavidade oral em um nível além do aceitável socialmente. Essa exalação de mau odor pode ter origem oral ou extraoral.

- Pseudo-halitose: Não existe um óbvio mau odor percebido por outras pessoas, mas o paciente acredita que o possui. É comum pacientes com pseudo-halitose exibirem também sintomas de depressão.

- Halitofobia: O paciente reclama de um mau odor, o qual não é percebido por outros. Mas, diferente da pseudo-halitose, a crença do paciente é persistente, mesmo após tratamentos, aconselhamentos e válidas garantias da inexistência de um mau hálito. Basicamente, é um medo extremo de ter mau hálito.

         Além da halitose, temos também o que é classificado como mau hálito temporário (exógeno). Aqui, substâncias externas ingeridas pelo indivíduo, como alimentos (alho e cebola, por exemplo) e bebidas, quando são absorvidas e caem no sistema circulatório acabam liberando odores através da respiração e saliva. Nesse caso, o mau hálito irá durar no máximo 72 horas e é facilmente prevenido limitando ou evitando o consumo desses agentes odoríferos.

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> Diferentes fatores fisiológicos e psicológicos podem afetar a percepção de mau hálito; enquanto muitas pessoas desenvolvem uma ideia errônea sobre terem halitose, outras que realmente possuem halitose não desconfiam da condição. Essa relação é chamada de paradoxo do mau hálito. A percepção subjetiva do mau hálito é um problema complexo e ainda pouco esclarecido. Aliás, o massivo uso de máscaras durante a pandemia mostrou-se um notável fator alterando a percepção de mau hálito das pessoas (Ref.18).
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   CAUSAS DO MAU HÁLITO
 
         Ao contrário do que as pessoas costumam pensar, o mau hálito/halitose, como regra geral, não possui provável origem no estômago. Esse talvez seja o maior mito sobre o assunto, e, mesmo quando se sabe de outras fontes da halitose, muitos assumem que os quadros mais severos possuem origem necessariamente da cavidade estomacal. Aliás, muitos acreditam que existe uma contínua passagem de ar entre o estômago e a boca, mas isso é incorreto: o esôfago, o qual conecta o estômago com a boca, não é um tubo aberto, e normalmente se encontra colapsado, prevenindo que gases odoríferos escapem do interior estomacal para a região oral. Existe associação entre estômago e halitose, mas em uma parte minoritária dos casos de mau hálito, e é incerta a real extensão dessa associação (!).

           Entre 85 e 90% dos casos, a halitose possui um origem da própria região oral, frequentemente com o dorso da língua sendo o culpado único ou concomitante com outros problemas bucais. O formato irregular e as mais profundas fissuras dessa região [dorso da língua] fornecem condições favoráveis para o crescimento de bactérias e, inclusive, hospeda o maior número de bactérias anaeróbicas, o que pode explicar o porquê desse ser o local mais comum para a halitose. Sua grande superfície exposta também facilita a dispersão dos gases produzidas pelas bactérias ali presentes. Outros locais como potenciais fontes de halitose são os sulcos da gengiva e bolsos periodontais. Pessoas com periodontites, cáries e gengivite são conhecidas por terem mais halitose. Porém, mesmo em indivíduos que mantêm uma excelente higiene bucal, boa dentição e periodôntio saudável, o problema também pode surgir.




        Outros fatores na boca que contribuem para a halitose incluem restaurações dentais imperfeitas, impacto alimentar e abscessos. Dentaduras são também uma potencial causa, particularmente se são usadas durante a noite (pessoas que dormem com essas próteses). Nesse caso, o odor normalmente é doce, mas desagradável, e facilmente identificável, especialmente se as dentaduras são colocadas em um saco plástico e o ar ali cheirado após vários minutos.

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> Doenças periodontais e língua saburrenta são os principais fatores etiológicos intraorais para a halitose (Ref.19). Baixa ou inadequada higiene hora contribui de forma importante para o desenvolvimento de mau hálito.
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          A halitose também está relacionada com o fluxo salivar. O nível de mau hálito durante o dia é inversamente proporcional ao fluxo de saliva. Boca seca (xerostomia) é considerado um grande contribuidor para a produção de mau odor devido ao fato de que o menor fluxo salivar enfraquece os mecanismos de limpeza da boca e predispõe a região bucal à proliferação bacteriana indesejável. Aliás, o tão famoso 'hálito da manhã' é considerado ser um mau odor causado pela redução do fluxo salivar durante o sono, onde a falta de alimentação e consumo insuficiente de água leva ao aumento de intensidade da halitose devido à menor produção de saliva. Certos medicamentos (ex.: antidepressivos, antipsicóticos, diuréticos e anti-hipertensivos), radioterapia e quimioterapia também reduzem o fluxo salivar e podem acabar causando o desenvolvimento de uma halitose. Algumas doenças (ex.: sinusite, diabetes e síndrome de Sjorgen) podem também gerar um menor fluxo salivar. Na sinusite, a pessoa acaba respirando mais pela boca durante congestões nasais. Respirar pela boca facilmente resulta em uma significativa redução na quantidade de saliva na cavidade bucal.

          Nesse sentido, as bactérias são as culpadas na maioria esmagadora dos casos de halitose, ao produzir gases odoríferos após a digestão de restos de alimentos, células epiteliais descamadas, saliva e sangue na cavidade bucal. Temperaturas que podem superar 37° - faixa de 34 e 37°C durante o dia - e grande taxa de umidade - acima de 91% - geram um ambiente ideal na boca para a proliferação bacteriana. Entre os gases relacionados com o mau hálito, podemos citar o sulfeto de hidrogênio (H2S), metanotiol (CH4S), dimetil sulfeto (CH3)2S, ácidos orgânicos (ácido butírico, por exemplo), compostos aromáticos (indole e escatole) e aminas (putrescina, cadaverina), todos compostos orgânicos voláteis. Desses, os mais frequentes representantes da halitose são aqueles gases contendo enxofre (S), como o sulfeto de hidrogênio. As bactérias produzem esses últimos através de reações enzimáticas de aminoácidos que contêm enxofre (L-cisteína e a L-metionina). Somando-se a isso, algumas bactérias também produzem sulfeto de hidrogênio e metil mercaptanas através do soro (parte fluída do sangue).

          Em geral, a halitose reflete uma complexa interação entre várias bactérias na boca, principalmente as anaeróbicas (crescimento na ausência de oxigênio gasoso), Gram-negativas, e não apenas específicas cepas. Estudos já mostraram que são cinco as mais comuns bactérias responsáveis pelo mau hálito na saliva e no dorso da língua: Porphyromonas gingivalis, Tanerella forsythia, Fusobacterium nucleatum, Prevotella intermedia, e Treponema denticola. O metabolismo das bactérias Gram-positivas contribuem muito pouco para o mau odor, com os representantes quase exclusivos da halitose sendo as já citadas Gram-negativas.      
           
          Mas além da cavidade oral, existem outras fontes menos comuns para o mau hálito que respondem por 10-20% dos casos. Compostos voláteis mau cheirosos, nesse cenário, são exalados tanto pela boca quanto pelo nariz.

          Entre os fatores extraorais, podemos citar infecções na região ouvido-nariz-garganta (ONG) - também de origem bacteriana e representando em torno de 8% dos casos de halitose - ulcerações e tumores no trato respiratório ou gastrointestinal, certas doenças sistêmicas, distúrbios metabólicos e carcinomas. Uma outra causa interessante pode emergir durante o período da menstruação, onde mudanças hormonais no corpo feminino intensificam ou produzem a halitose (halitose menstrual), possivelmente devido ao menor fluxo salivar observado nessa fase. A região nasal também pode ser a culpada em duas situações. A primeira pode ser devido a uma secreção crônica de muco da parte de trás da cavidade nasal na nasofaringe; apesar de não cheirar mal no início, o acúmulo do muco e subsequente degradação pelo microbioma na parte posterior da língua acaba gerando mau odor. Já na segunda situação, a condição manifestada não é uma halitose e, sim, uma rinohalitose, onde infecções nasais ou espessa secreção de muco nas vias aéreas podem gerar gases odoríferos, eventualmente exalados pelo nariz. 

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> Causas extraorais estão na maioria dos casos relacionadas com as áreas do ouvido, nariz e garganta, e tratos gastrointestinais ou renais (Ref.19).
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           Problemas intestinais, como colite ulcerativa e doença de Cronhn, podem também afetar a cavidade oral, fomentando a multiplicação de bactérias patogênicas e aumentando a produção de compostos voláteis mau-cheirosos (Ref.21). O mesmo é válido para problemas de refluxo (ex.: doença de refluxo gastroesofágico). Em situações de obstrução intestinal, é possível, mas raro, que um odor fecal seja exalado pela boca, onde gases intestinais forçariam saída pela via oral, já que a anal está congestionada. Esse caso já foi documentado em dois irmãos que sofriam de obstrução duodenal extrínseca causada por bandas peritoneais congênitas (Ref.11).

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> Fígado: Esse órgão também pode estar envolvido com mau cheiros devido a uma redução nas funções hepáticas, fazendo com que metabólitos residuais no organismo sejam eliminados pelo pulmão e causando o fetor heptcus: um odor doce de excrementos, conhecido como 'O Hálito da Morte'. Nesse sentido, falhas hepáticas causadas por cirrose, hepatite viral, doenças autoimunes, entre outras patologias, impedem uma adequada desintoxicação do corpo. Devido ao fenômeno de hipertensão portal e circulação colateral, substâncias causando halitose podem entrar na circulação sistêmica através da conexão entre a veia cava inferior e a veia portal contornando o fígado, e entrar diretamente nos pulmões a partir de onde ocorre difusão para o ar expirado. Substâncias associadas incluem, em particular, CH4S, compostos nitrogenados (ex.: amônia) e compostos orgânicos voláteis (acetona, 2-butanona e isopropanol).
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   (!) ESTÔMAGO E HALITOSE

            Apesar de representar uma minoria dos casos, gases mau cheirosos da halitose pode ter origem da cavidade estomacal, em especial associados com a infecção pela bactéria Helicobater pylori. Essa bactéria infecta parte significativa da população, está fortemente associada com o desenvolvimento de câncer gástrico e é capaz de produzir gases sulforosos de mau hálito (CH4S e H2S). É reportado que a prevalência de halitose em infetados pela H. pylori pode cair dramaticamente após tratamento erradicando essa bactéria do estômago (Ref.21).

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> Aliás, é relevante mencionar que a bactéria H. pylori é a causa de 60% dos cânceres gástricos. Para mais informações, fica a sugestão de leitura: Importante lista de carcinógenos agora soma 256 substâncias
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          Mas como infecção pela H. pylori na cavidade estomacal produz halitose considerando que normalmente o esôfago fica colapsado?

          É sugerido que os gases mau cheirosos produzidos pela H. pylori no trato gastrointestinal podem sofrer difusão no pulmão após serem carregados ao tecido pulmonar pelo circulação sanguínea. Mudanças erosivas  e inflamatórias na mucosa associadas ao esôfago, estômago e duodeno pode facilitar a difusão desses gases no sangue (Ref.22). Outro potencial mecanismo é a infecção na boca por bactérias H. pylori oriundas da cavidade estomacal (ex.: através de refluxo).

           Nesse mesmo caminho, retenção de conteúdos gástricos observada em condições como divertículo esofágico, acalasia, estenose pilórica, câncer esofágico e câncer gástrico podem estimular a produção de compostos voláteis de enxofre por bactérias anaeróbicas Gram-negativas (Ref.21).
          

   CÁSEO E HALITOSE
  
           Um bom exemplo de complexa interação bacteriana causando a halitose fora da região bucal são os cáseos, também conhecidos como cáseos amigdalianos ou pedras das amígdalas. Basicamente, os cáseos são protuberâncias de material calcificado nas amígdalas, glândulas situadas na parte de trás da garganta. Essas protuberâncias possuem em grande parte das vezes a contribuição de bactérias na boca para a sua formação e, mais raramente, de fungos (ex.: Leptothrix buccalis). Afetando cerca de 8% da população, segundo alguns estudos, os cáseos geralmente são pedras que se originam do depósito de cálcio sobre células descamadas e crescimento bacteriano nas criptas de qualquer uma das amígdalas, afetando pacientes com ou sem histórico de inflamação nessas regiões. Geralmente são únicos e unilaterais, mas podem ser múltiplos ou bilaterais.

          Os sintomas que podem acompanhar os cáseos são irritação na garganta, tosse, disfagia, otalgia, gosto ruim na boca e, principalmente, uma halitose crônica - com alguns estudos apontando essa ser a causa em torno de 3% das halitoses, englobada na ONG. A atividade bacteriana ali - os cáseos são, praticamente, um biofilme - acabam gerando os gases de mau odor. É fácil identificar o mau cheiro exalando dos cáseos quando estes são retirados do paciente e pressionados.



            A patogênese dos cáseos é ainda pouco esclarecida. Porém, existem várias hipóteses sobre a formação dessas pedras tonsilares. A principal e com maior suporte científico defende que os cáseos emergem como resultado de repetidas amigdalites (ou tonsilites) - amígdalas inflamadas devido a infecções virais ou bacterianas -, as quais levam a fibroses associadas aos dutos de criptas na região amigdalar e retenção de detritos epiteliais. Esses detritos epiteliais formam um meio ideal para o crescimento de bactérias e de certos fungos. Finalmente, calcificação distrófica causando o endurecimento do acumulado de detritos ocorre como resultado de deposição de sais inorgânicos (ex.: carbonato de cálcio) presentes na saliva.

> Recorde: Em um caso reporte publicado em 2008 no periódico Cases Journal (Ref.16), pesquisadores reportaram o maior cáseo já descrito na literatura médica Inglesa: uma pedra branco-amarelada com dimensões de 4,2 x 3,6 x 2,1 cm, constituída de carbonato de cálcio e oxalato. A paciente tinha 12 anos de idade, um histórico de 6 anos de dor de garganta recorrente e reclamando de dor leve-moderada ao engolir (odinofagia). Nenhum outro sintoma associado foi reportado. O enorme cáseo foi prontamente identificado e removido sob anestesia. Como as amígdalas da paciente estavam inflamadas, uma tonsilectomia foi também recomendada e realizada. 




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CURIOSIDADE: No Vale de Nubra, na Índia, é reportado que ~80% da população local que busca atendimento odontológico exibe severa halitose - enquanto a incidência de halitose severa a nível global é de apenas 5% (Ref.23). Nessa região, as pessoas comumente consomem uma mistura de tabaco mastigável com excremento seco de vaca, chamada de "SUVIDHA". A mistura - na forma de uma bolinha - é colocada debaixo da língua e rotineiramente sugada por 15-20 minutos. Existe uma crença entre o povo local que o SUVIDHA ajuda a manter a boca úmida e a aliviar dores (!), e, nesse sentido, as pessoas são estimuladas a iniciar o consumo desse produto de tabaco desde muito cedo, ao redor dos 15 anos de idade. O SUVIDHA causa impactos adversos na cavidade oral, e a presença de excremento de vaca leva a um peculiar cheiro pungente e podre. Ambos, tabaco e excremento, fomentam o crescimento de bactérias na boca, enquanto que a hipoxia associada com a alta altitude da região (~3 mil metros acima do mar) estimula o crescimento de microrganismos anaeróbicos. Isso resulta em patologias periodontais, cáries, escurecimento dos dentes, erosão dentária e forte halitose.


Processo de obtenção do produto final (SUVIDHA) após mistura de tabaco e excremento seco de vaca, em uma proporção de 3:1. Referência: Sud et al., 2022


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    DETECÇÃO

          É importante diagnosticar a halitose para o conhecimento da sua intensidade ou real existência. Nesse último caso, a pseudo-halitose ou halitofobia podem estar presentes, e o tratamento irá requerer auxílio psicológico. Para identificar os gases de mau odor emanados da boca e, portanto, confirmar a halitose, vários testes . Entre eles, os principais são:

1. Análise Organoléptica: Essa é a forma mais antiga de se identificar o mau hálito, ou seja, identificando o cheiro pelo nariz. Bem, independentemente da sensibilidade desse método, geralmente as pessoas que possuem mau hálito não o sabem porque, provavelmente, irão se acostumar com o cheiro sendo gerado a todo momento ou, em casos mais raros, sofrem de distúrbios olfativos. Nesse caso, amigos e outras pessoas mais próximas serão aqueles que provavelmente identificarão o mau hálito, ou o médico/dentista, caso você suspeite de halitose e procure por profissionais de saúde antes.

          Em um consultório apropriado, um profissional de saúde poderá identificar o problema cheirando o seu hálito através da sua expiração por tubos distantes cerca de 20 cm do examinador. Devido ao fato de que essa situação pode causar um constrangimento para a pessoa sendo examinada, outra forma do exame ser feito é através da expiração de ar em um saco plástico, este o qual será depois analisado pelo profissional de saúde. O nível do odor será medido em uma escala pré-determinada (0-5, por exemplo).

          Esse método é considerado o ideal (gold standard), em termos relativos, por ser simples, prático e sem custos. Porém, a sensibilidade não será excelente, o examinador precisa ter uma boa experiência para medir os níveis de halitose e o paciente precisa estar a 48 horas sem ter ingerido nada que possa gerar fortes odores na boca (incluindo uso de cigarro).

2. Cromatografia gasosa: Aqui temos uma técnica de análise química extremamente eficiente e sensível. Ao invés do ar exalado pelo paciente ser sentido pelo nariz de um examinador, amostras da saliva e raspas da língua são evaporadas sem se decomporem ou ar expirado pelo paciente são passados por uma coluna cromatográfica a 70°C. Gases que causam a halitose, como os compostos orgânicos voláteis de enxofre, são detectados com alta precisão durante o processamento da coluna, mesmo estando em baixíssimas concentrações. Apesar da grande eficiência, a cromatografia gasosa é cara, seus resultados demoram e requer profissionais altamente treinados para operá-la.

3. Sensores Químicos: Esses dispositivos são usados para a identificação de substâncias através de reações eletroquímicas (oxirreduções). Os sensores geralmente são específicos, determinando compostos de enxofre, amônia, entre outros, na boca do paciente. Apesar de menos sensíveis do que a cromatografia gasosa, são mais simples e práticos de serem manuseados ou custeados. Mais recentemente, no periódico ACS Nano (Ref.17), pesquisadores reportaram o desenvolvimento de um dispositivo do tamanho de um polegar capaz de diagnosticar com alta sensibilidade o mau hálito ao rapidamente detectar exalações do principal gás responsável pelo mau cheiro (sulfeto de hidrogênio). O dispositivo eletroquímico é baseado em nanopartículas de platina, solução de cloreto de sódio e óxido de tungstênio associados com nanofibras, e, em testes laboratoriais com reais baforadas de hálito (80 voluntários), demonstrou acuracidade de 86%. O dispositivo ainda não se encontra disponível comercialmente. 

4. Teste BANA: É um teste composto de benzoíla-DL-arginina-a-naftalamida e detecta cadeias curtas de ácidos graxos e bactérias proteolíticas gram-negativas anaeróbicas obrigatórias - especialmente a Treponema denticola, P. gingivalis e a T. forsythensis, associadas com doenças periodontais. Usando o teste BANA não só torna-se possível a identificação da halitose, mas também os riscos no desenvolvimento de infecções periodontais.

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> É sugerido que câncer oral o carcinoma oral de células escamosas - representante de 90% dos casos de câncer oral - pode alterar a produção de gases sulforosos na boca, especificamente aumentando os níveis de CH4S e H2S e potencialmente sendo um fator causal ou agravante da halitose. Existe inclusive proposta para se medir esses gases como ferramenta de diagnóstico desse tipo de câncer (Ref.24).
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   TRATAMENTOS DO MAU HÁLITO

            Conhecer a origem do mau hálito é imperativo para a resolução do problema. Como explorado, a região bucal é a fonte primária mais comum do mau hálito.

            Devido a uma má higiene bucal, restos de alimentos e placas bacterianas podem se acumular nos dentes e na língua, o que pode gerar inflamações na gengiva e tecidos periodontais, típicas fontes de mau odor. A formação das placas bacterianas também costumam aumentar a severidade da halitose. Portanto, a boa higiene bucal, se possível seguindo as orientações de um profissional de odontologia, é uma arma mais do que eficiente para resolver o mau hálito em grande parte dos casos. A escovação adequada dos dentes e da língua, além do uso de ferramentas para limpar as regiões entre os dentes (ex.: fio dental e escovas interdentais), devem ser seguidos à risca diariamente, principalmente pelos indivíduos que já sofrem com halitose e/ou usam dentaduras. 

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          Além da higiene dentária, a limpeza da língua é muito importante, especialmente naqueles indivíduos com fissuras muito grandes no dorso desse órgão. Estudos têm mostrado que a redução dos gases de enxofre causadores da halitose podem ser reduzidos em 33% com a escovação na língua, 40% com raspador e 42% com limpador de língua.


Raspador de língua

          Mas lembrando que mesmo em pacientes com boa higiene bucal e cavidade oral saudável, o mau hálito pode surgir devido a características morfológicas e anatômicas únicas nessa região entre as pessoas, sendo difícil às vezes evitar a proliferação indesejada de bactérias em algumas áreas. O fluxo salivar variante de indivíduo para indivíduo também é outro fator contribuinte nessa situação. Mas uma maior higiene pode ajudar a minimizar dramaticamente o problema e mantê-lo em um nível tolerável ou pouco significativo. Ajuda médica especializada pode ser essencial nesses casos.

Língua fissurada: facilita a manifestação de halitose ao favorecer o acúmulo de matéria orgânica nos grandes sulcos da língua e, consequentemente, a proliferação bacteriana

           Os métodos de limpeza bucal são necessários para diminuir a carga bacteriana nessa região, e quando problemas mais sérios estão por trás do excesso de bactérias, o profissional de saúde precisa ser consultado. Gengivite, gengivite ulcerativa necrotizante e periodontite agressiva podem aumentar bastante a carga bacteriana e intensificar a halitose, sendo necessária a intervenção odontológica para tratar o problema. Profundas lesões de cáries não tratadas também podem servir de abrigo para restos de alimentos e outros detritos, gerando ou intensificando o mau hálito. O uso de antissépticos bucais, orientado por dentistas, pode ser um ótimo auxiliar também para manter a flora bacteriana sob controle. Mas abusos ou uso inadequado podem trazer efeitos colaterais desagradáveis.

          No caso de problemas com o fluxo salivar, mascar chicletes (sem açúcar, claro) pode ajudar. A saliva atua como um agente tampão (age mantendo o pH - nível de acidez - da boca normal) e auxilia bastante na limpeza da boca, e, portanto, é importante manter um fluxo normal desse fluido para evitar a proliferação excessiva de bactérias. A mastigação é um dos principais fatores que aumentam o fluxo salivar e o chiclete atua nesse sentido. Obviamente, tratar uma potencial causa patológica do menor fluxo salivar deve ser priorizado. Para quem tem sinusite, o uso de descongestionantes nasais é recomendado para reduzir a respiração pela boca. Se a boca seca (xerostomia) é causada por radioterapia no pescoço ou doenças nas glândulas salivares, produtos contendo saliva artificial podem ser sugeridos ao paciente.

            Os cáseos, se presentes, podem ser retirados (pela via médica é o mais recomendado) para reduzir a intensidade do mau hálito ou até mesmo tratá-lo definitivamente caso sejam a causa exclusiva. Muitos cáseos não passam de 2 milímetros de diâmetro, mas alguns podem ultrapassar 1 cm. Aqueles muito pequenos podem nem ser notados ou causarem problemas, e nem precisam ser removidos - tipicamente, os cáseos não são prejudiciais, apesar de que, em raros casos, podem engatilhar sérias infecções. Mesmo aqueles mais visíveis podem não gerar mau hálito, caso a boa higiene bucal esteja sendo seguida. Apesar disso, no momento em que são retirados e examinados, geralmente irão emitir um cheiro bem desagradável, independentemente se estavam causando halitose ou não.

          Nos últimos anos, diversos estudos (Ref.11-13) também vêm tentando encontrar tratamentos para vários problemas bucais, incluindo a halitose, com o uso de probióticos. Nesse caso, bactérias inofensivas e que não causam mau hálito - principalmente a Streptococcus salivarius (K12), Lactobacillus salivarius ou a Weissella cibaria - seriam utilizadas para povoar a boca e evitarem (por competição) a proliferação excessiva daquelas que causam a halitose. Os resultados desse tipo de terapia ainda são inconclusivos, mas promissores.        

           É relevante também apontar que enxaguantes bucais, balas mentas, pasta de dente (cheiro) e sprays não são tratamentos, apenas mascaram o mau hálito por causa dos fortes aromas. Devem ser considerados como soluções apenas temporárias.

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   CONCLUSÃO

         A halitose, ou mau hálito, é um problema muito comum e com causas multifatoriais. Porém, a cavidade bucal é a origem do mau odor característico na grande maioria dos casos. Uma boa higienização bucal pode ser um importante fator de prevenção ou tratamento do mau hálito em vários casos, mas isso nem sempre será suficiente para prevenir o problema ou resolvê-lo. Análise e diagnóstico médicos para a caracterização exata do problema - identificando a origem do mau cheiro e separando real halitose de casos envolvendo halitofobia e pseudo-halitose - é a melhor opção no sentido de orientar o tratamento ideal.


Artigos Recomendados:

REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
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