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Saturno é o único planeta no Sistema Solar com anéis?


- Atualizado no dia 11 de janeiro de 2024 -

           Localizado 30 vezes mais distante do Sol do que a Terra, Netuno orbita em uma região na parte externa do Sistema Solar. Pelo seu tamanho, composição química do seu interior e grande distância do Sol, Netuno é classificado como um gigante gelado. Comparado com os gigantes gasosos Júpiter e Saturno, Netuno é rico em elementos mais pesados do que o hidrogênio e o hélio; aliás, é especulado que existam "chuvas" de diamante no planeta devido às grandes pressões sobre hidrocarbonetos. A tradicional aparência azul de Netuno quando capturado na faixa do visível (ex.: Telescópio Espacial Hubble) é devido às nuvens de metano gasoso em sua superfície (Fig.3).


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          Com a Câmera de Infravermelho-Próximo (NIRCam) do Telescópio Espacial James Webb (Fig.1-3) (1), Netuno perde seu vistoso azul e se torna bem escuro (devido à grande absorção do infravermelho pelo metano gasoso), com exceção de manchas e faixas muito brilhantes nas altas altitudes formadas por nuvens de metano sólido, as quais refletem o espectro solar antes de absorção ocorrer pelo metano gasoso. Podemos ver também uma linha brilhante no equador do planeta, refletindo padrões da circulação atmosférica Netuniana: a atmosfera descende e é aquecida no equador, emitindo muito infravermelho.

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(1) O James Webb é o mais avançado observatório espacial já construído pela humanidade. Entrando em operação este ano, esse telescópio espacial realiza observações em uma ampla faixa do infravermelho. Para mais informações, acesse: Primeira imagem histórica do Telescópio James Webb é finalmente liberada

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          E talvez o mais notável, com o James Webb podemos ver claramente os anéis de Netuno. Sim, contrário à crença popular, não apenas Saturno, mas também Urano, Júpiter e Netuno possuem um sistema de anéis; em outras palavras, todos os gigantes gelados e gasosos do Sistema Solar possuem anéis (Fig.4-8). Netuno, em específico, possui 5 anéis principais, constituídos em grande parte por poeira.



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Importante: Na imagem acima, à esquerda, a cor "azul escura" de Netuno é artificial. No final deste artigo, fotos mais recentemente processadas mostrando a real coloração desse planeta, a qual é similar àquela de Urano.
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           Apenas pelo final da década de 1970, tornou-se definitivamente reconhecido que três dos quatro planetas gigantes tinham um sistema de anéis: aqueles de Saturno já tinham sido observados por séculos, enquanto aqueles de Urano foram encontrados após uma ocultação estelar em março de 1977 e aqueles de Júpiter foram revelados pela sonda espacial Voyager 1 no início de 1979. Os anéis de Netuno foram confirmados na década de 1980, através de dados obtidos com as observações da missão espacial Voyager 2. 




[Atualização] Anéis de Urano registrados pela Câmera de Infravermelho-Próximo do James Webb, em comprimentos de onda de 1,4 e 3,0 micrômetros - e coloridos em azul e laranja, respectivamente. O sétimo planeta a partir do Sol, Urano também possui uma característica única: rotaciona "deitado", a cerca de 90° do plano da sua órbita; isso causa um clima global com estações extremas, já que cada um dos polos do planeta fica vários anos voltado para o Sol seguido por vários anos na completa escuridão (Urano demora 84 anos para orbitar a nossa estrela). Ref.16
 

    
  
  

Imagem de Saturno produzida pelo Telescópio Espacial James Webb. Três dos satélites naturais do planeta também podem ser facilmente observados: Dione, Encélado e Tétis. Em contraste com a atmosfera, os anéis de Saturno não possuem metano, sendo constituídos basicamente de gelo, e, nesse sentido, refletem fortemente o comprimento de onda de IV em questão. Isso inclusive permite um grande detalhamento das distintas regiões dos múltiplos anéis. 

  

          Cada um dos planetas gigantes é acompanhado por uma distinta família de anéis e de satélites naturais. Anéis geralmente dominam a região mais próxima de cada planeta, onde as forças de maré (1) podem superar a auto-gravidade e a força interna de corpos maiores, desintegrando-os ou prevenindo que eles sejam formados. Além disse, o Limite de Roche define a fronteira interna aproximada para corpos sólidos maiores, os quais são mantidos juntos pela gravidade própria; aqui, anéis e satélites naturais tendem a ser intercalados (!). Além dos limites observados na Fig.10 estão os sistemas de satélites "clássicos".

(1) Leitura recomendadaComo são formadas as ondas e marés?

          Os anéis desses planetas podem ser estreitos ou largos, opticamente espessos ou opticamente finos, estruturados ou sem padrão. A evolução desses anéis é fortemente dependente das interações gravitacionais entre partículas constituintes, satélites e planetas, e fornece importantes informações sobre os sistemas planetários. Além disso, os exuberantes anéis de Saturno, e também os anéis de Netuno e de Urano em menor extensão, interagem de forma significativa com a atmosfera, ionosfera e magnetosfera desses planetas através do contínuo transporte de partículas. Aliás, os anéis de Saturno - formados em maior parte por gelo (>95-98%) - estão sendo puxados a taxas consideráveis para sua superfície como uma chuva de finas partículas de gelo sob a influência do campo magnético e do campo gravitacional do planeta. Nesse sentido, estima-se que todo o sistema de anéis de Saturno terá desaparecido em menos de 100 milhões de anos - um tempo relativamente curto comparado com a idade do planeta (~4,5 bilhões de anos) (2).

(2) Para mais informações: NASA revela que Saturno está perdendo seus anéis de forma muito acelerada

          Ainda sobre os anéis de Saturno, um estudo publicado em 2022 no periódico Science (Ref.14) propôs que há cerca de 160 milhões de anos um satélite natural extra de gelo - apelidado de Chrysalis - orbitando o planeta foi gravitacionalmente desintegrado quando aproximou-se demais desse último, levando eventualmente à formação dos anéis e ajudando a explicar o estranho eixo de rotação muito inclinado de Saturno (~26,7° de inclinação). Esse cenário também corrobora razoavelmente a idade estimada de 100 milhões de anos para os anéis Saturnianos. Aliás, um estudo recente publicado na Science Advances (Ref.19) determinou de forma conclusiva que os anéis de Saturno não possuem mais do que 400 milhões de anos de idade, e também trouxe suporte para uma idade aproximada de 100 milhões de anos.

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> A massa total dos anéis de Saturno é um pouco inferior do que metade da massa de Mimas, o menor satélite natural de Saturno, também constituído quase que inteiramente de água congelada (Ref.17). Mimas, por sua vez, é 8,8 vezes menor do que a Lua (Ref.18).

Os principais anéis de Saturno se estendem até 140 mil quilômetros distante do planeta, mas possuem uma espessura máxima de apenas 1 km e é esperado que sejam quase impossíveis de serem vistos da Terra a partir de 2025 (devido a mudanças na inclinação do sistema de anéis); voltarão a ser visíveis da Terra até 2032, durante a próxima fase da órbita Saturniana de 29 anos. Ref.20

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   (!) CORPOS TRANS-NETUNIANOS

          Anéis planetários não são observados apenas ao redor de planetas gigantes, mas também ao redor de pequenos corpos como Chariklo e o planeta-anão Haumea. Tipicamente, todos os anéis densos conhecidos são localizados dentro ou, no máximo, um pouco além do Limite de Roche, onde forças de maré previnem que o material nessas estruturas se agreguem para a formação de um satélite. Porém, em um estudo recentemente publicado na Nature (Ref.15), pesquisadores descreveram um anel não-homogêneo ao redor do corpo Quaoar cuja órbita fica muito além do Limite de Roche (Fig.11). Esse objeto trans-Netuniano possui um raio estimado de 555 km e um satélite natural (Weywot) que orbita a uma distância de 24 raios de Quaoar. O anel orbita a uma distância de 7,4 raios do corpo central. Aparentemente, colisões elásticas e processos de ressonância são responsáveis por manter o anel estável tão longe de Quaoar, desafiando o modelo padrão de formação de anéis planetários e argumentando por um novo modelo teórico visando corpos planetários de pequeno tamanho. 

Figura 11. Gráfico mostrando o Limite de Roche para alguns corpos planetários de pequeno tamanho no Sistema Solar, incluindo representação do anômalo anel de Quaoar.

> Válido mencionar que para muitos cientistas planetários, os critérios para a classificação de um corpo como um planeta são muito mais abrangentes. Por exemplo, a Lua é considerado um planeta sob critérios mais abrangentes, assim como pelo menos outros 44 corpos no Sistema Solar! Para mais informações, fica a sugestão de leitura: Decisão de excluir Plutão como planeta é baseada em folclore, astrologia, conclui estudo


   REAIS CORES DE NETUNO

          Quando foram liberadas as fotos de Urano e de Netuno pela missão espacial Voyager 2 [NASA] em 1986 e 1989, as cores desses planetas foram inseridas artificialmente no sentido de melhor realçar características superficiais (a e b). Apesar disso ter sido alertado ao público na época, essas cores acabaram ficando marcadas no conhecimento popular, e as pessoas até hoje possuem a errônea noção que Netuno possui uma coloração escura e azulada (b). Na Fig.12, em c e d, as mesmas fotos tiradas pela Voyager 2 e mais recentemente processadas, mostrando que ambos os planetas possuem uma coloração relativamente similar (Ref.).

Figura 12. Acima, fotos primeiro liberadas para o público de Urano (a) e Netuno (b); abaixo, mesmas fotos [dados da Voyager 2] de Urano (c) e de Netuno (d) com real coloração superficial.



> Leitura recomendada: Qual é o tamanho da Grande Mancha Vermelha em Júpiter?


REFERÊNCIAS

  1. https://www.nasa.gov/feature/goddard/2022/new-webb-image-captures-clearest-view-of-neptune-s-rings-in-decades
  2. Showalter, M. R. (2020). The rings and small moons of Uranus and Neptune. Philosophical Transactions of the Royal Society A: Mathematical, Physical and Engineering Sciences, 378(2187), 20190482. https://doi.org/10.1098/rsta.2019.0482
  3. https://www.nasa.gov/image-feature/goddard/2017/hubble-spots-auroras-on-uranus
  4. https://apod.nasa.gov/apod/ap220923.html
  5. https://www.nasa.gov/mission_pages/hubble/news/hubble-20070823.html
  6. https://nssdc.gsfc.nasa.gov/imgcat/html/object_page/vg2_2685219.html
  7. https://www.nasa.gov/feature/goddard/2022/new-webb-image-captures-clearest-view-of-neptune-s-rings-in-decades
  8. https://www.nasa.gov/multimedia/imagegallery/image_feature_995.html
  9. https://www.nasa.gov/centers/goddard/multimedia/largest/rings.html
  10. https://blogs.nasa.gov/webb/2022/07/14/webb-images-of-jupiter-and-more-now-available-in-commissioning-data/
  11. https://solarsystem.nasa.gov/resources/12536/small-particles-in-saturns-rings/
  12. https://solarsystem.nasa.gov/resources/2490/saturns-rings-shine-in-hubble-portrait/
  13. Hsu et al. (2021). Planetary Science and Astrobiology Decadal Survey 2023-2032 white paper e-id. 182; Bulletin of the American Astronomical Society, Vol. 53, Issue 4.
  14. Wisdom et al. (2022). Loss of a satellite could explain Saturn’s obliquity and young rings. Science, Vol 377, Issue 6612, pp. 1285-1289. https://doi.org/10.1126/science.abn1234
  15. Morgado et al. (2023). A dense ring of the trans-Neptunian object Quaoar outside its Roche limit. Nature, 614, pages239–243. https://doi.org/10.1038/s41586-022-05629-6
  16. https://www.nasa.gov/feature/goddard/2023/nasa-s-webb-scores-another-ringed-world-with-new-image-of-uranus
  17. https://solarsystem.nasa.gov/moons/saturn-moons/mimas/in-depth/
  18. https://solarsystem.nasa.gov/moons/saturn-moons/mimas/by-the-numbers/
  19. Kempf et al. (2023). Micrometeoroid infall onto Saturn’s rings constrains their age to no more than a few hundred million years. Science Advances, Volume 9, Issue 19. https://doi.org/10.1126/sciadv.adf8537
  20. Xystouris et al. (2023). Estimating the optical depth of Saturn’s main rings using the Cassini Langmuir Probe. Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, Volume 526, Issue 4, Pages 5839–5860. https://doi.org/10.1093/mnras/stad2793
  21. Irwin et al. (2024). Modelling the seasonal cycle of Uranus’s colour and magnitude, and comparison with Neptune, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, Volume 527, Issue 4, Pages 11521–11538. https://doi.org/10.1093/mnras/stad3761