YouTube

Artigos Recentes

Fórmulas modernas são equivalentes ao leite materno?


- Atualizado no dia 4 de setembro de 2023 -

Compartilhe o artigo:



          O leite materno é o alimento ideal para o bebê. Esse líquido, em todas as espécies de mamíferos (1), contém uma mistura nutritiva perfeita para o desenvolvimento dos filhotes recém-nascidos, fornecendo vitaminas, minerais, proteínas, gorduras, anticorpos, microrganismos simbiontes benéficos e diversos outros nutrientes perfeitamente balanceados. Infelizmente, a amamentação, de um modo geral, não é tão valorizada quanto deveria, e muitas mães recorrem com frequência às fórmulas infantis - preparações artificiais que tentam imitar a qualidade nutricional do leite materno. Não apenas responsabilidade das mães, a indústria das fórmulas infantis utiliza várias táticas para empurrar esses produtos aos consumidores, frequentemente utilizando marketing sem suporte científico e enganoso.

(1) Leitura recomendadaHomens [sexo masculino] podem produzir leite?

          Ainda mais preocupante, em significativa parte dos casos o abandono da amamentação é devido a fatores de comodidade, falta de paciência, desconfortos durante a lactação e interação bebê-aréola-mamilo, mitos ainda muito disseminados (ex.: "leite fraco") e até certos tabus sócio-culturais. São poucos os problemas de saúde que realmente proíbem a mulher de amamentar, mas mesmo assim as fórmulas continuam muito populares. Campanhas de conscientização mais efetivas - governamentais e não-governamentais - para esclarecer desinformações nesse cenário são necessárias.

> Amamentação materna deve ser exclusiva até os 6 meses de idade e, após esse período, continuada até os 2 anos de idade complementada adequadamente com outros alimentos. Fórmulas infantis só devem ser usadas em casos muito específicos e sob expressa orientação médica especializada.

- Continua após o anúncio -



   LEITE MATERNO

         Os benefícios da amamentação são muitos, e se estendem tanto para os bebês quanto para as mães. Para começar temos a liberação do colostro, o qual é o primeiro leite formado durante a gravidez e dura até um pouco depois do nascimento da criança (1). Ele é bem espesso e muito rico em nutrientes - alta concentração de proteínas bioativas e de oligossacarídeos -, além de possuir diversos anticorpos indispensáveis à boa saúde da criança. Após 3 a 5 dias, o colostro começa a se transformar no típico leite de amamentação, o qual é branco e possui proporções dinâmicas e perfeitas entre gordura, água, vitaminas, minerais, açúcares e proteínas (ex.: caseínas). O leite materno, sem dúvida, é um alimento praticamente perfeito, fruto de centenas de milhões de anos de evolução no clado Mammalia, além de ser único em promover diversos benefícios extras que não são alcançados por nenhum outro alimento destinado ao recém-nascido, como o fortalecimento máximo do sistema imunológico do bebê e o desenvolvimento de um microbioma saudável. 

          O leite materno permite o desenvolvimento saudável do cérebro e previne desnutrição, doenças infecciosas e mortalidade. Estudos fortemente suportam que a amamentação pode reduzir significativamente o risco infantil de:

- Asma;
- Leucemia infantil;
- Obesidade infantil;
- Infecções;
- Eczema;
- Diarreia e vômito;
- Doenças respiratórias;
- Síndrome da morte infantil súbita (SIDS);
- Doenças gastrointestinais;
- Diabetes tipo 2;
- Alergias futuras;
- Doenças cardíacas;
- Síndrome metabólica na adolescência.

----------
> O vírus respiratório sincicial é a causa principal causa de infecções agudas do trato respiratório inferior entre bebês ao redor do mundo, e uma importante causa de morbidade, hospitalização e mortalidade. Um estudo publicado em 2022 no BMJ Global Health (Ref.25) encontrou que o aleitamento materno exclusivo está associado com uma frequência e uma severidade significativamente menor de infecção pelo vírus sincicial respiratório.

> Em um recente estudo publicado no periódico Paediatric and Perinatal Epidemiology (Ref.26), analisando 921 bebês hospitalizados com bronquiolite e um grupo de controle contendo 719 bebês saudáveis, encontrou que a amamentação materna exclusiva estava fortemente associada com proteção contra hospitalização devido à bronquiolite - condição caracterizada pela inflamação dos bronquíolos (pequenas ramificações pulmonares críticas para a respiração) e uma das principais causas de problemas de saúde em bebês. 

(1) O colostro é um fluído espesso amarelado produzido pelas glândulas mamárias durante os primeiros poucos dias após o parto. Sua quantidade é pequena (30-100 mL/dia) e contém alto conteúdo de proteínas, vitamina A, leucócitos, lactoferrina e lisozima. O colostro possui baixo conteúdo de gordura e de lactose, e exibe leve efeito laxativo, o qual ajuda a limpar o intestino do mecônio (matéria fecal estéril verde-escura produzida no intestino antes do nascimento). Além disso, elimina bilirrubina do intestino, ajudando a prevenir icterícia (!).

-----------

           Para as mães os benefícios da amamentação podem incluir menor risco de desenvolver diabetes tipo 2 - inclusive após quadros de diabetes gestacional -, certos tipos de câncer de mama, cânceres de ovários, doenças cardiovasculares e artrite reumatoide. Os hormônios e metabólitos liberados durante a amamentação, como a oxitocina e a prolactina, fortalecem o laço afetivo e reduzem o estresse entre mãe e bebê (2), promovem amenorreia de lactação (interrupção natural dos ciclos menstruais) e podem contribuir para reduzir sintomas e manifestação de depressão pós-parto (Ref.27). Estudos também mostram que as mulheres conseguem perder o excesso de gordura corporal acumulada na gravidez mais facilmente e são mais prováveis de recuperar o índice de massa corporal (IMC) pré-gravidez se prolongarem o tempo de amamentação o máximo possível (a própria produção do leite demanda um gasto energético bem alto, ajudando a queimar muita caloria - e gordura - extra) (3). 

----------
(2) Leitura recomendada: Qual a função da ereção dos mamilos?  

(3) No começo da lactação, cada mama humana produz, em média, 450 g de leite diariamente. Após 15 meses, a produção diária ainda alcança até 200 g, dependendo da intensidade da amamentação. Para acomodar esse gasto extra de energia, a mãe precisa aumentar seu consumo calórico diário em ~25%, tipicamente quase compensando as ~625 kcal requeridas para uma produção diária de 700-900 g de leite. E esse processo de conversão energética (nutrientes calóricos → leite materno) é eficiente, estimado de alcançar 80% de eficiência (Ref.3). O gasto energético extra para a lactação é comparável ao consumo calórico diário do cérebro humano.

> Um estudo de grande porte e de longo prazo, publicado em 2018 no JAMA Internal Medicine, concluiu que o ato de amamentar por seis meses ou mais corta o risco de desenvolvimento da diabetes tipo 2 quase pela metade. Para mais informações, acesse: Estudo de 30 anos mostra que mulheres amamentando por 6 meses ou mais reduzem o risco de diabetes quase pela metade

> Aliás, o aleitamento materno é benéfico para a saúde cardiometabólica e redução do risco de doenças cardiovasculares décadas após a lactação, incluindo efeitos positivos no controle da pressão sanguínea e no perfil de colesterol sanguíneo (Ref.64).

> O contato pele-com-pele ocorrendo durante a amamentação suporta mecanismos de maturação, incluindo controle de temperatura, metabolismo e adaptação diurna. Esse mesmo contato entre o recém-nascido e o pai também tem sido incentivado após a separação temporária entre a mãe e o bebê subsequente a um parto via cesárea. Para mais informações: Contato pele-com-pele entre pais e bebês precisa ser incentivado após parto via cesárea
-----------

           Somando-se a tudo isso, estudos nos últimos anos têm isolado diversas bactérias provavelmente probióticas do leite materno e de secreções no complexo aréola-mamilo. Essas bactérias parecem ser também muito importantes para o desenvolvimento de uma microbiota saudável no corpo da criança, especialmente no intestino. 

          De fato, alimentar o recém-nascido exclusivamente com leite materno pelos primeiros 6 meses de vida é uma das medidas preventivas mais poderosas contra mortalidade em crianças com menos de 5 anos de idade. Amamentação inadequada é estimada de resultar em cerca de 600 mil mortes infantis por pneumonia e diarreia e 100 mil mortes maternas devido a cânceres de ovário e de mama todos os anos (Ref.50).

           Mas será que encontramos esses mesmos benefícios nas fórmulas? A resposta é um óbvio NÃO. Aliás, estudos nos últimos anos estão continuamente revelando novos segredos do leite materno, implicando que as fórmulas tradicionalmente vendidas estão muito longe de simular adequadamente esse fluido (!). Aliás, existe evidência sugestiva que o leite humano é o mais complexo entre todos os mamíferos. Enquanto em ratos e em vacas o leite exibe uma média de 30-50 moléculas de carboidratos simples ('açúcares'), nos humanos são mais de 200 moléculas diferentes desse macronutriente (Ref.3).

------------
(!)  Por exemplo, bebês alimentados com leite materno parecem sofrer significativamente menos com condições alérgicas, como eczema e alergias alimentares, do que bebês alimentados com fórmulas. Um estudo publicado no final de 2022 no periódico American Journal of Clinical Nutrition (Ref.28) encontrou que pequenas moléculas conhecidas como ácidos micro-ribonucleicos (miRNAs) presentes no leite humano - particularmente o tipo miR-375–3p - podem reduzir o risco de bebês desenvolverem alergias. Existem mais de 1000 tipos de miRNAs no leite materno, frequentemente empacotadas dentro de vesículas protetoras - tornando-as estáveis no líquido e transferíveis para o intestino - aparentemente atuando como reguladores de caminhos imunes no bebê.

> Um estudo prévio, publicado em 2020 na PLOS ONE (Ref.23), analisando 50 mães e seus bebês, encontrou que um oligossacarídeo (2'-fucosilactose) encontrado no leite materno positivamente influencia o neurodesenvolvimento, especialmente no primeiro mês de amamentação. No mesmo sentido, outro componente ausente nas fórmulas é a a membrana dos glóbulos de gordura do leite, cuja complexa composição traz importantes nutrientes para o desenvolvimento do bebê. A estrutura proteína-fosfolipídica dessa membrana é altamente conservada entre os mamíferos, e reveste gotículas de gordura no leite materno. Estudos clínicos nos últimos anos vêm mostrando que essa membrana possui papel muito relevante a nível de neurodesenvolvimento e funções cognitivas (Ref.6).
------------
 
NUNCA opte pelas fórmulas quando a amamentação natural é possível de ser feita. As fórmulas infantis são desenvolvidas para se assemelharem ao leite materno e podem ser prescritas em condições médicas e/ou nutricionais bem específicas, na maioria das vezes, por um período limitado de tempo e igualando-se ao status de fármaco. No entanto, a composição das fórmulas infantis não se iguala às propriedades fisiológicas e nutricionais do leite humano, além de impactar negativamente no sucesso e na duração do aleitamento materno.

          Essa história de que as fórmulas modernas de leite são quase a mesma coisa que o leite materno vem sendo repetida desde o início do século XX (Ref.29). Fórmulas modernas são apenas superficialmente similares ao leite materno. Fórmulas não contêm anticorpos, não contêm células vivas, e não possuem enzimas e hormônios. Aliás, existem milhões de células vivas no leite materno, especialmente lactócitos. As fórmulas contêm muito mais alumínio, manganês, cádmio, ferro e significativamente mais proteína do que o leite materno (ou seja, composição nutricional desbalanceada). As proteínas e gorduras são também fundamentalmente diferentes daquelas encontradas no leite materno. E, extremamente importante, a composição nutricional e físico-química das fórmulas não variam do início ao fim da alimentação, ou do dia 1 ao dia 7 ao dia 30, ou de mulher para mulher, ou de bebê para bebê, ou durante uma única mamada, como ocorre durante o aleitamento materno (4). 

-----------
(4) Um estudo publicado em 2022 no periódico PNAS (Ref.30) encontrou que a expressão de genes responsáveis pela produção de leite nas glândulas mamárias muda continuamente durante o período de amamentação, provavelmente ajustando dinamicamente o conteúdo nutricional, hormonal e bioativo em geral do leite para atender as diferentes necessidades do bebê ao longo do seu desenvolvimento e como adaptação a fatores ambientais variáveis.
-----------

          Aliás, fatores de imunidade transferidos para o bebê podem persistir muito além do período de alimentação. Um estudo publicado na Sciente Advances (Ref.22) mostrou que essa imunidade transferida pode ser vitalícia e envolver a transferência de células imunes, não apenas anticorpos e outros componentes imunogênicos temporários, como citocinas e antígenos. Essa conclusão veio após a análise de ratos fêmeas e seus subsequentes filhotes. Antes de ficarem grávidas, as fêmeas infectadas por um verme helminto (Nippostrongylus brasiliensis) geravam filhotes com defesas imunes contra esse tipo de infecção mesmo após a amamentação e persistindo na fase adulta, sem nunca antes terem sido infectados. Os pesquisadores mostraram que essa imunidade foi passada de mãe para filhote via células imunes (no caso, células-T CD4 TH2-competentes).

          Ainda falando em sistema imune, fórmulas não apresentam proteínas abundantes no leite materno (S100A8, S100A9 e S100) que regulam de forma crucial o desenvolvimento da microbiota intestinal e, por consequência, o sistema imune dos recém-nascidos (Ref.31). Microrganismos colonizando o intestino do bebê fornecem instruções críticas para a maturação imune pós-natal, e esse co-desenvolvimento resulta em uma homeostase balanceada entre hospedeiro e microbiota, e alterações negativas nessa parceria promovem o desenvolvimento de doenças inflamatórias e metabólicas.

- Continua após o anúncio -



   ABANDONO DA AMAMENTAÇÃO

            A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que a mãe amamente o recém-nascido, de forma exclusiva, até os seis meses de idade. A partir dessa idade, a amamentação deveria continuar até 2 anos de idade, complementada com outros alimentos adequados. Ótima amamentação deve ser iniciada dentro da primeira hora após o parto. Mas os dados globais mostram uma realidade bem diferente da ideal. 

          Na média, apenas ~40% das mães no mundo amamentam seus filhos, de forma exclusiva, até os 6 meses de idade; e apenas ~44% dos recém-nascido são amamentados dentro da primeira hora (Ref.32). Nos EUA, Canadá e na China, são reportados, respectivamente, que 26%, ~36% e 18% das mães continuam amamentando de forma exclusiva até os 6 meses de idade; nos países Nórdicos, a taxa varia entre 2% e 25%. No Japão, apenas 50% das mães continuam amamentando exclusivamente até 3 meses de idade. No Reino Unido, apenas 0,5% das mães continuam amamentando seus filhos até 1 ano de idade. 

          No Brasil, a prevalência de amamentação exclusiva até os 6 meses de idade aumentou expressivamente entre 1986 e 2020, elevando de ~3% para ~46%, mas ainda bem abaixo do ideal (Ref.33). Em um estudo conduzido no Recife, Pernambuco, e publicado em 2019 no periódico Ciência & Saúde Coletiva (Ref.34), a média de alimentação exclusiva encontrada em crianças até 2 anos de idade atendidas em Unidades Básicas de Saúde (UBS) foi de apenas 2 meses. 

----------
> Em 2012, a 56ª Assembleia Mundial da Saúde estabeleceu seis metas globais de nutrição para 2025, incluindo aumentar a taxa de aleitamento materno nos primeiros seis meses de vida para, pelo menos, 50,0%,8 e, para 2030, 70,0% da amamentação na primeira hora de vida, 70,0% de amamentação materna exclusiva (AME), 80,0% no primeiro ano de vida e 60,0% até os dois anos, parâmetros ainda distantes de serem alcançados no Brasil e no restante do mundo.

> A OMS e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) recomendam que os recém-nascidos sejam colocados precocemente em contato pele a pele contínuo com suas mães, sem roupa, em decúbito ventral sobre o tórax da parturiente, entre os seios também despidos, logo após o nascimento, por pelo menos uma hora, encorajando-as a identificar quando seus bebês estiverem prontos para serem amamentados, promovendo auxílio, caso necessário. Essa prática na primeira hora de vida, que corresponde ao quarto passo da Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC), aumenta a prevalência e a duração do AME, além de reduzir a morbimortalidade neonatal.

> A sucção iniciada precocemente estimula a hipófise materna a produzir ocitocina e prolactina, levando a uma maior produção e ejeção do leite pelo organismo, além de oferecer ao bebê benefícios imunológicos e psicossociais e proporcionar o fortalecimento do vínculo materno-infantil. Tal prática eleva, ainda, a probabilidade de a criança receber o colostro, que contém propriedades imunológicas importantes para essa fase da vida, sendo extremamente nutritivo e de fácil digestão e acelerando a maturação da mucosa intestinal.
-----------

           É estimado que >820 mil mortes de crianças com menos de 5 anos de idade deixariam de ocorrer todos os anos se adequada amamentação fosse praticada por todas as mães (Ref.35). Globalmente, 74% dos casos de síndrome da morte infantil súbita (5), 27% dos casos de diarreia, 9% das infecções respiratórias agudas e 13% da mortalidade infantil podem ser prevenidas pela amamentação adequada (Ref.35-37). Bebês amamentados exclusivamente com leite materno até 6 meses de idade são 14 vezes menos prováveis de morrer nos primeiros 6 meses do que bebês que não recebem amamentação no mesmo período (Ref.35).

(5) Leitura recomendadaQual a posição mais segura para o bebê dormir?
     
           Muitas mulheres que podem e desejam amamentar seus bebês acabam encarando várias barreiras sócio-ecológicas que levam ao abandono parcial ou mesmo completo da amamentação. Entre os principais fatores que desestimulam as mães a abandonar o aleitamento materno, exacerbados perigosamente pela errônea crença de que as fórmulas são "substitutos perfeitos", estão:

- Questões trabalhistas: Essa é a mais comum causa para as mães que desistem de amamentar o bebê, já que o trabalho acaba exigindo um tempo integral do qual o bebê "não respeita". Para tentar humanizar esse sistema, grande parte das empresas garante a licença maternidade, algo obrigado por lei em diversos países. Aqui no Brasil, de acordo com a CLT (artigo 392), a empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias sem prejuízo do emprego e do salário. Se o empregador participar do Programa Empresa Cidadã, a licença poderá ser prorrogada por mais 60 (sessenta) dias (o ideal para garantir ou facilitar um aleitamento materno exclusivo até 6 meses). 

- Parto via cesárea: A cesariana é uma importante barreira para manter a exclusividade da amamentação materna. Certos tipos de anestesia possuem um efeito negativo na lactação, levando ao atraso da amamentação e a introdução precoce das fórmulas nos hospitais. Dor pós-operatória pode aumentar o desconforto durante a amamentação do recém-nascido, atrasando sua iniciação. Contato pele-com-pele entre o recém-nascido e a mãe pode facilitar a iniciação da amamentação após a cesárea, mas ainda é algo incomum na prática clínica. Crucialmente, o início precoce da amamentação é um fator que contribui significativamente para maiores taxas de amamentação exclusiva até os 6 meses de idade.

"Leite insuficiente": É reportado que 44% das mães possuem uma percepção de leite materno insuficiente, fomentando a busca por fórmulas para complementar a dieta do bebês mesmo antes dos 6 meses de idade. A introdução das fórmulas, por sua vez, acaba reduzindo a frequência de lactação. Essa percepção muitas vezes é alimentada por desinformações, mitos e inadequada orientação de profissionais de saúde. Por exemplo, choro do bebê após a amamentação é frequentemente e erroneamente considerado um sinal de insaciedade pelas mães. Outro fator similar e comumente reportado como empecilho para o aleitamento materno exclusivo é a errônea crença da mãe de que o seu leite possui baixa qualidade nutricional (leite "fraco") para atender as necessidades do bebê. Em climas e tempos mais quentes e secos, a mãe também pode achar que o bebê precisa de uma hidratação extra, e acaba oferecendo bebidas como chás ou água filtrada para complementar o aleitamento; aliás, em países como Gâmbia, mães que 'negam' água aos bebês são acusadas de negligência pelo público (Ref.38). Por fim, persiste o mito de que mamas pequenas, como regra, produzem menos leite do que mamas grandes. No Canadá, é reportado que enquanto 50% das mães reportam insuficiência de leite, biologicamente menos do que 5% delas realmente são incapazes em alguma extensão de produzir leite para atender as necessidades do bebê (Ref.39).

- Dores, infecções e dificuldades físicas na amamentação: Mães podem experienciar dores ao amamentar, acompanhadas de fissuras e inflamação no complexo aréola-mamilo, prejudicando em alguns casos a continuidade do aleitamento materno. Até cerca de 10% das grávidas desenvolvem a mastite, a qual é uma infecção causada, normalmente, pela invasão das bactérias da pele para dentro do tecido mamário, através de feridas no bico do seio. As bactérias encontram um local ideal para se proliferarem apenas se existir leite retido nos canais do tecido mamário, o qual se acumula devido a um esvaziamento incompleto da mama após a amamentação do bebê. Esses problemas podem se somar à ou serem causados pela falta de experiência da mãe (ex.: primeiro parto), incluindo pouco domínio na técnica de sucção do bebê (dificuldade de "pega") e desconfortos associados a má postura corporal. Dor prolongada ao longo da amamentação não é normal e precisa de investigação médica.

- Nível educacional: Baixo nível educacional aumenta significativamente as taxas de abandono da amamentação exclusiva até os 6 meses de idade, e independentemente do nível sócio-econômico, provavelmente por dificultar o entendimento de explicações científicas e orientações médicas que devem ser seguidas visando o aleitamento materno adequado. Nesses sentido, deletérias crenças populares e pessoais, e marketing abusivo da indústria de fórmulas, podem acabar prevalecendo. Maiores esforços de conscientização e de esclarecimento das mães por profissionais de saúde capacitados e campanhas governamentais podem aumentar a aderência ao aleitamento materno (Ref.4).  


Vergonha da amamentação em público pode ser outro fator desestimulando a amamentação exclusiva do bebê com leite materno até os 6 meses de idade; vício em drogas (incluindo alcoolismo) e infecções nas mães (ex.: HIV) também pode desfavorecer o aleitamento materno exclusivo por receio da mãe em prejudicar a qualidade do leite com o consumo das substâncias de abuso ou de infectar o bebê.

          É estimado que 1 em cada 3 recém-nascidos recebem alimento diverso (fórmula, água, açúcar, infusões, mel, etc.) além de leite materno nos primeiros 3 dias pós-parto em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, e, nesses mesmos países, apenas ~50% dos recém-nascidos recebem aleitamento materno dentro da primeira hora de vida (Ref.45). No Brasil, em estudo longitudinal de base populacional conduzido em Cruzeiro do Sul, no Acre, os autores constataram que 63% das crianças tinham recebido outros alimentos ou líquidos que não o leite materno no primeiro mês de vida, tais como chá (39%), água (31%), leite não humano e fórmula infantil (30%), além de massa de macaxeira (10%) (Ref.46).


   FÓRMULAS INFANTIS: INDÚSTRIA E CONFLITO DE INTERESSES

          Aqui entramos em um sério problema, e envolvendo crime contra a saúde pública. A indústria das fórmulas comerciais exploram as preocupações dos pais e as diversas desinformações e mitos sobre a produção do leite materno para empurrar seus caros produtos aos consumidores - e acabam trazendo prejuízos para as mães e os bebês. Violando o Código Internacional para Marketing da OMS, essa indústria também promove alegações cientificamente infundadas para seus produtos, distribuição de amostras em hospitais e recomendações injustificadas para introduzir as fórmulas na alimentação do bebê (Ref.45). É reportado que, nos EUA, >60% das maternidades suplementam mais de 20% dos bebês sob amamentação com fórmula durante a estadia no hospital; no mesmo sentido, quase 1/3 dos recém-nascidos na Austrália recebem suplementação intra-hospitalar (Ref.45). Estamos falando de centros de saúde que deveriam ter conhecimento avançado sobre a importância da amamentação exclusiva no pós-parto até 6 meses de idade.

          Fórmulas só devem ser usadas em caso de real impossibilidade da mãe amamentar ou oferecer leite materno para o bebê. E NÃO existe evidência científica que introduzir alimentos que não sejam leite materno antes dos 6 meses de idade melhora a saúde do bebê, e isso é válido para as fórmulas. Inclusão de alimentos sólidos e semi-sólidos e de água só deve ser feita após 6 meses, acompanhados idealmente de leite materno até os 2 anos de idade.  

           Com os diversos avanços tecnológicos conquistados nas últimas décadas, muitas pessoas tendem a acreditar que as fórmulas são equivalentes ao leite materno, uma ideia mais do que absurda e alimentada pela indústria.

          Adaptações comuns do recém-nascido ao ambiente pós-parto, incluindo choro persistente, comportamento agitado e durações curtas de sono noturno, são frequentemente confundidas como sinais de problemas na alimentação - especialmente insuficiência auto-reportada de leite. Por exemplo, é estimado que menos do que 5% dos bebês identificados pelos pais como exibindo choro excessivo não possuem qualquer problema de saúde requerendo tratamento (Ref.45). Pais com menos experiência ou inadequadamente orientados podem não conseguir identificar as corretas razões e necessidades associadas a diferentes choros e comportamentos do bebê (fome, mudanças de temperatura, ou outros desconfortos), associando comumente a causa com a qualidade e/ou quantidade de leite materno produzido.  A indústria das fórmulas reforça e exacerba essas errôneas ideias e produzem alegações sem suporte científico de que seus produtos podem melhorar esses comportamentos ao reduzir alergias, ajudar com cólicas e prolongar o tempo de sono ao longo da noite (Ref.47).

           De fato, mais da metade das mães ao redor no mundo justificam a introdução das fórmulas antes dos 6 meses de idade pós-parto com esse tipo de argumento (sinais de aparente choro e agitação excessivos no bebê), assim como por 1/3 das mães que param de amamentar (Ref.45).

          "A indústria das fórmulas infantis usam ciência de baixa qualidade para sugerir, com pouca evidência de suporte, que seus produtos são soluções para problemas comuns de saúde de de desenvolvimento dos bebês," disse em entrevista (Ref.48) a professora Dra. Linda Richter, da Universidade de Wits, na África do Sul, e coautora em uma importante e recente série de três estudos publicados no The Lancet sobre o tema (Ref.45, 47, 49). "Anúncios alegam que fórmulas infantis especializadas aliviam agitação, ajudam com cólica, prolongam sono ao longo da noite, e até promovem inteligência superior. Embalagens usam palavras como 'cérebro', 'neuro' e 'QI' com imagens destacando o desenvolvimento inicial do bebê, mas estudos não mostram nenhum benefício dos ingredientes desses produtos na performance acadêmica ou cognição de longo prazo. Essas táticas de propaganda violam o código de conduta estabelecido pela OMS, no qual os países concordaram que alegações nas embalagens não deveriam idealizar o uso de fórmula, e nem explorar ciência de baixa qualidade para criar uma narrativa visando vender mais produtos".

           Desde a criação do código de conduta pela OMS - como resposta em especial à investigação The Baby Killer denunciando o marketing abusivo e antiético da Nestlé -, as práticas abusivas da indústria das fórmulas continua em quase 100 países, com um comércio avaliado anualmente em $55 bilhões (Ref.49). Esse poderoso setor influencia decisões políticas nos países e interfere com processos regulatórios nacionais e internacionais. Na África do Sul, por exemplo, o código de conduta da OMS só foi implementado em 2012, após 9 anos de barreira imposta pelo pesado lobby da indústria. Aliás, na África do Sul, os produtores de fórmula infantil criaram um novo grupo de lobby (Infant Feeding Association) que promove pressão no sentido de aliviar as medidas de regulação dos seus produtos (Ref.49).

-----------
> A maior parte das principais marcas de fórmulas infantis hoje no mercado emergiram na década de 1920. A Nestlé se tornou rapidamente a líder do mercado global nesse setor, criando 80 fábricas e 300 agências e escritórios de venda dentro de 50 anos. A partir de meados do século XX, a promoção agressiva das fórmulas infantis foi firmemente emaranhada nos sistemas de saúde de vários países. Quando as vendas estagnaram nos países desenvolvidos, a indústria começou a promover as fórmulas como superiores ao leite materno e distribuir amostras grátis, levando a mesma estratégia de marketing anticiência para países de menor renda - inclusive empregando vendedores vestidos de enfermeiros para engajar com novas mães nos hospitais e nas casas! Essa campanha irresponsável e criminosa é estimada de ter aumentado a mortalidade infantil em 9,4 para cada 1000 nascimentos vivos (Ref.49).

> Hoje, o mercado global de fórmulas infantis é dominado por seis companhias: Abbott Nutrition [Chicago, IL, USA], Danone [Paris, França], Feihe [Pequim, China], Freisland Campina [Amersfoort, Holanda], Nestlé [Vevey, Suíça], e Reckitt Benckiser [Slough, Reino Unido]. Essas companhias dominam 60% das vendas de fórmulas, disputam o mercado agressivamente, exploram as dificuldades enfrentadas pelas mães para adequada amamentação e atuam em conjunto promovendo pesado lobby contra leis regulatórias que prejudicam seus lucros. Outros setores, como a indústria de laticínios e governos de países que são grandes produtores de fórmulas infantis e de laticínios (ex.: EUA, Austrália, União Europeia e Nova Zelândia) também têm atuado em favor dos fabricantes de fórmulas (Ref.) (6).

(6) Por exemplo, as Filipinas possuem uma das mais fortes leis de proteção da amamentação materna no mundo (o Código do Leite). Em 2006, quando o governo Filipino resolveu endurecer o Código do Leite, um grupo político corporativista representado a indústria Norte-Americana de fórmulas infantis apelou à Suprema Corte para barrar as novas regulações, resultando em um atraso de >1 ano para a implementação dessas regulações. As atividades lobistas visaram o Presidente, membros do Congresso, oficiais de saúde, comércio e indústria, a embaixada dos EUA nas Filipinas, e até escritórios da UNICEF. O lobby persiste nas Filipinas atacando o Código do Leite.
-----------

          "A criação de um ambiente permitindo que as mães amamentem adequadamente seus bebês precisa da união de toda a sociedade, com monitoramento e aplicação mais fortes das regulações visando controlar o marketing de fórmula infantil para bebês," disse em comentário ao The Lancet o Dr. Chantell Witten, da Universidade do Cabo Ocidental (Ref.50). 

          As vendas de fórmulas infantis estão inversamente associadas com o aleitamento materno até 1 ano de idade (Ref.47). Os fabricantes de fórmulas infantis, em um contexto geral, atuam como as indústrias de tabaco/e-cigarro (7), alcoólica (8) e de alimentos ultra-processados no sentido de encorajar através do marketing o consumo de produtos deletérios à saúde humana. Aliás, a indústria das fórmulas tende a retratar a amamentação materna como genérica, ultrapassada e antifeminista, mesmo com um robusto corpo de evidências científicas mostrando o abismo de diferença entre o as fórmulas e o leite materno.

Para mais informações:

          Em um estudo publicado no periódico BMJ (Ref.51), pesquisadores analisaram 757 fórmulas infantis comercializadas no período de 2020-2022 em 15 países (Austrália, Canadá, Alemanha, Índia, Itália, Japão, Nigéria, Noruega, Paquistão, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul, Espanha, Reino Unido e EUA), explorando as alegações feitas nesses produtos (ex.: "fortalece o sistema imune"). Eles identificaram que múltiplos ingredientes eram alegados de ter efeitos nutricionais similares, múltiplas alegações eram feitas para o mesmo tipo de ingrediente, a maioria dos produtos não forneciam referências científicas suportando as alegações, e as alegações com referências não eram suportadas por robusta evidência clínica. Dois terços dos produtos com pelo menos uma alegação não forneciam uma referência a qualquer evidência, e, quando testes clínicos registrados eram citados, estes possuíam um alto nível de conflito de interesses e de financiamento da indústria, além de carregarem alto risco de viés.

A indústria das fórmulas infantis continua empurrando alegações de que seus produtos reduzem o risco de alergias, sem sólido suporte científico e visando atrair mais consumidores. Por exemplo, na China, o maior mercado e de mais rápido crescimento para as fórmulas, a Nestlé pesadamente promove fórmulas NAN HA (com proteína parcialmente hidrolisada) como um produto que reduz o risco de alergias. A Danone faz um marketing enganoso similar no leste Europeu. Ref.52


             Na Índia, especialistas de saúde têm denunciado que a indústria das fórmulas está empurrando seus produtos junto a "novos profissionais de saúde especializados em alergias" através de um marketing que explora doenças alérgicas associadas ao leite - com formulações que visam prevenir o desenvolvimento de alergias nos bebês (Ref.65). Alergia ao leite materno está sendo diagnosticada em excesso e existe evidência de conflito de interesses. Atualmente, existe uma alta taxa de amamentação materna na Índia, e a amamentação exclusiva até 6 meses e amamentação continuada até pelo menos 2 anos de idade é uma prática comum. 
 
         Em um comentário ao estudo no BMJ, especialistas postaram (Ref.53): "[...] Em um momento, a ciência está falando sobre terapia genética e medicamentos personalizados baseados em vários perfis genéticos, e, ao mesmo tempo, fórmulas infantis estão sendo empurradas nos mercados e na barriga dos bebês. Um bebê é diretamente e geneticamente relacionado à mãe, e a saúde do bebê é em grande extensão dependente dos genes da mãe. Portanto, servir a mesma fórmula de leite para diferentes bebês de diferentes origens genéticas não pode justificar as necessidades medicinais atendidas pelo próprio leite materno. Precisamos pensar melhor na saúde dos bebês, 'as futuras gerações do mundo'."

          Aliás, o grupo BMJ (British Medical Journal), responsável por alguns dos periódicos de medicina de maior fator de impacto no mundo, anunciou em 2019 que não irá mais veicular anúncios de fórmulas infantis em seu site (Ref.21) tanto para evitar problemas de conflito de interesses quanto para prevenir a promoção tendenciosa do produto. Junto a essa declaração, a BMJ reforçou que as fórmulas infantis só devem ser utilizadas em substituição ao leite materno em casos de específica necessidade médica.

          Aqui no Brasil, em um estudo publicado em 2021 no periódico Einstein (Ref.54), pesquisadores investigaram a situação de aleitamento materno e da adequação de prescrição de fórmulas infantis a lactentes assistidos por um programa de Atenção Secundária do Sistema Único de Saúde, na cidade de Viçosa, Minas Gerais. Um total de 350 lactentes de zero a 6 meses foram analisadas. Os pesquisadores encontraram que 97% das mães eram capazes de amamentar, e que nenhuma delas apresentava condição médica aceitável impedindo o aleitamento materno. Apesar disso, apenas ~47% dos casos estavam em aleitamento materno exclusivo antes do encaminhamento ao programa. Em relação aos motivos da introdução das fórmulas infantis, a complementação ao leite materno foi o mais presente (~76%), seguido da volta da mãe ao mercado de trabalho (~20%). E mais preocupante: os pesquisadores encontraram altas e excessivas taxas de prescrição e de distribuição gratuita de fórmulas para as lactantes; o custo estimado dos cofres públicos para a aquisição de fórmulas infantis que poderia ser evitado foi estimado em quase R$90 mil pelos pesquisadores apenas nessa pequena amostragem.
           
----------
> Referente às fórmulas infantis, o Ministério da Saúde no Brasil ressalta como sendo "absolutamente condenável a distribuição em larga escala desses produtos, em especial em serviços de saúde" (Ref.55).

ALERTA: Bebês com intolerância à frutose podem correr risco de desenvolverem falhas hepáticas agudas caso sejam alimentos com fórmulas infantis contendo frutose. Segundo especialistas, os responsáveis pela produção das fórmulas devem remover a frutose e a sucrose dos ingredientes, ou deixar esses carboidratos adicionados bem explícitos nas embalagens para permitir que os pais possam evitá-los se necessário. Em um estudo publicado em 2018 no periódico Molecular Genetics and Metabolism (Ref.19), pesquisadores reportaram quatro casos de bebês com intolerância hereditária à frutose (HFI, na sigla em inglês). Os quatro bebês apresentavam grave falha hepática aguda, a qual foi resolvida quando a fórmula da qual eles se alimentaram foi trocada por uma sem frutose. É estimado que a HFI ocorre em 1 de cada 20 mil nascimentos, e é oriunda de mutações no gene aldolase B (ALDOB) que resultam em uma inabilidade de metabolização de frutose. Sintomas iniciais incluem náusea, vômitos, dor abdominal e dificuldade no ganho de massa corporal. Se não diagnosticado a tempo, consequência vão de graves danos no fígado e nos rins até a eventual morte.
-----------

- Continua após o anúncio -



DÚVIDAS FREQUENTES (ALEITAMENTO MATERNO) Ref.56-63

1. Após o parto, para emagrecer, a gestante deve fazer dieta?

O foco após o parto precisa ser voltado para a amamentação e cuidados gerais com o recém-nascido. Uso de estratégias irresponsáveis e extremistas de emagrecimento, e de medicamentos para a perda rápida de gordura corporal apenas irão prejudicar a mãe e o bebê. Siga uma alimentação saudável e boa hidratação, e confie na produção de leite: quanto mais leite produzido para o bebê, mais calorias gastas pela mãe para produzi-lo. Não exagerando na alimentação, praticando exercícios físicos regulares e deixando o leite ser livremente produzido irão ajudar muito no emagrecimento. 

2. Para ficarem bem alimentados, os bebês devem mamar de 3 em 3 horas?


Não siga horários específicos para a amamentação. Apenas se oriente pelo desejo de alimentação do bebê: quando ele quiser mamar, deixe-o mamar.

3. A mãe deve sempre oferecer os dois seios na mesma mamada?


Não. O recomendado é que se ofereça uma mama até que esta se esvazie. Se o bebê quiser mamar mais, ofereça a outra mama. Se ele não quiser, não tem problema, ofereça a outra mama na próxima mamada. Isso porque durante a amamentação, o primeiro leite que sai é o leite anterior, rico em água e importante para a imunidade do bebê. Mata a sede, porém, sozinho, esse leite não supre as necessidades da criança. Já o leite posterior, que vem no final da mamada, é rico em proteína e gordura. É o leite posterior que mata a fome e é essencial para o ganho de peso do bebê. O recomendado é que o bebê mame pelo menos 15 minutos na mesma mama até atingir o leite posterior. Esse tempo, no entanto, só poderá ser avaliado adequadamente por um profissional de saúde especializado. Se o bebê só mamar um pouco em uma mama e mudar para a outra, ele estará consumindo somente o leite anterior e não ficará bem alimentado.

4. Amamentar dói?


Não, o ato de amamentar não deveria ser acompanhado de dor. Se isso ocorre, é porque algo deve estar de errado - apesar de no começo da amamentação ser relativamente comum algum nível de dor (grande sensibilidade do mamilo/aréola). Se dor no complexo aréola-mamilo não desaparecer após 3-4 dias e durar além de 5-6 dias, ajuda médica especializada deve ser procurada. NÃO substitua o aleitamento materno por fórmula infantil por esse motivo.

5. Nos primeiros seis meses pós-parto, se necessário, deve-se oferecer água ou chazinhos caseiros ao bebê?


Não. Especialmente até os seis meses de vida, tudo de que o bebê precisa é do leite materno. Fome e sede são saciados com a amamentação, independentemente do clima regional e temperatura ambiente. A introdução de novos alimentos antes dos seis meses de vida pode aumentar o risco de uma série de doenças para o bebê.

6. Mamas pequenas produzem pouco leite?

Isso é um mito ainda muito disseminado. Como regra geral, o tamanho natural das mamas depende da quantidade de tecido adiposo ("gordura"), não das glândulas mamárias responsáveis pela produção de leite. O tecido mamário cresce em resposta à gravidez independente do tamanho das mamas da mãe. Mamas pequenas tipicamente possuem capacidade similar de produção de leite materno em comparação com mamas grandes. E a produção de leite é fomentada pela amamentação: quanto mais o bebê suga o bico das mamas, mais prolactina é produzida e mais leite é produzido. Quase todas as mães produzem leite em quantidade mais do que suficiente para o bebê, e já nos primeiros dias pós-parto.

7. E se a mãe tiver um "leite fraco", é preciso oferecer suplementação alimentar para o bebê? 

Não existe “leite fraco”. As mulheres produzem leite de ótima qualidade mesmo tendo uma alimentação relativamente pouco nutritiva ou limitada. Porém, é, obviamente, recomendado que a mãe tenha uma alimentação saudável e balanceada durante a amamentação para não existir risco de quaisquer prejuízos à produção de leite. Aliás, se a mãe está disposta a gastar muito dinheiro comprando "suplementos" e fórmulas para o bebê, faz muito mais sentido melhorar sua própria alimentação. Não existe também suporte científico para a exclusão de alimentos específicos da dieta da lactante, caso sejam saudáveis e bem preparados. No geral, mulheres amamentando podem seguir as mesmas recomendações nutricionais que visam o público como um todo.

7. A mãe que está amamentando deve comer derivados de milho, caldo de carne, cerveja preta entre outros alimentos calóricos para produzir mais leite?

O que aumenta a produção de leite nas mamas é a sucção feita pelo bebê, a extração manual ou o uso de bombinhas. Quanto maior a demanda pelo leite materno, maior a sua produção.

8. Mães com infecção precisam parar de amamentar?

Não. Com raras exceções, a mãe deve continuar amamentando o bebê; a amamentação irá inclusive proteger o bebê. Pelo tempo que a mãe identificou sintomas da infecção (ex.: febre, tosse, espirro, etc.), é provável que o bebê já tenha entrado em contato com o agente infeccioso, e a melhor proteção contra infecção efetiva no bebê é o leite materno. Se o bebê ficar doente, ele irá ficar menos doente se continuar recebendo o aleitamento materno - e isso inclui potencial transferência de anticorpos produzidos no corpo materno. Busque atendimento médico para um diagnóstico preciso da infecção e tratamento adequado - e nunca tome quaisquer medicamentos durante a amamentação sem antes informar ao profissional de saúde.

9. Amamentar é fácil?

Enquanto o bebê já nasce com o reflexo de buscar a mama materna e sugar o leite, muitas mães precisam de suporte profissional ou de outras mães experientes para posicionar de forma adequada o bebê para a amamentação. O aleitamento materno ótimo leva tempo e prática tanto para a mãe quanto para o bebê, e precisa de tempo livre, suporte familiar e espaço adequado.

10. É preciso limpar os mamilos antes da amamentação?

Limpar os mamilos antes de cada amamentada não é necessário. Quando os bebês nascem, eles já estão muito familiarizados com os cheiros e sons da mãe. O complexo aréola-mamilar produz uma substância que o bebê percebe com o olfato e possui bactérias benéficas que ajudam a construir um sistema imune saudável no bebê.

11. Mães podem amamentar após serem vacinadas?

Sim. Se o bebê está saudável, não existe razão para parar a amamentação após receber imunização. Nesse contexto, o risco é praticamente zero para o bebê, e este pode inclusive se beneficiar da vacina. No entanto, em caso de séria deficiência imune no bebê, mães durante amamentação exclusiva não deveriam receber algumas vacinas com vírus atenuados (ex.: pólio oral, rubéola, sarampo) nesse período. Peça orientação médica nesse último cenário.

12. Amamentação deve ser interrompida quando o bebê está com diarreia ou vômito?

Não. O aleitamento materno é o alimento ideal para um bebê doente, à medida que existem vários fatores no leite materno que protegem o sistema gastrointestinal e lutam contra agentes infecciosos. O leite materno também fornece ao bebê fluídos necessários para prevenir desidratação. São raras as exceções nesse sentido. Busque atendimento e orientação médica para entender qual a doença está afetando o bebê, mas não pare a amamentação. 

13. Na fase da introdução do ovo na alimentação da criança, deve-se oferecer primeiro a gema depois a clara?

Antigamente a comunidade científica acreditava que sim, mas estudos posteriores mostraram que a melhor forma de se oferecer o ovo para a criança no início da introdução de outros alimentos - além do leite materno na dieta - é pela forma completa desse alimento, ou seja, clara e gema juntos (!). Peça orientação de um nutricionista especializado durante a fase de introdução de novos alimentos ao bebê.

(!) Leitura recomendadaAfinal, devo me preocupar com o colesterol do ovo?

> Para mais esclarecimentos de desinformações comuns sobre a amamentação, acesse este artigo do Ministério da Saúde: Mitos e Verdades

  
  E ATENÇÃO: Sempre busque orientações de profissionais de saúde especializados. Use artigos como este apenas como base inicial de referência a ser discutida com médicos pediátricos.



Artigo Recomendado: Qual a origem do ato de amamentar?

Artigo Relacionado: Dieta de gravidez



REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://www.womenshealth.gov/breastfeeding/breastfeeding-benefits.html
  2. https://www.betterhealth.vic.gov.au/health/healthyliving/breastfeeding-and-your-diet
  3. Hennet & Borsig et al. (2016). Breastfed at Tiffany's. Trends in Biochemical Sciences, Volume 41, Issue 8, P508-518. https://doi.org/10.1016/j.tibs.2016.02.008
  4. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25160058
  5. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25593150
  6. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24390923
  7. http://www.womenshealth.gov/breastfeeding/pumping-and-breastmilk-storage.html 
  8. http://www.fda.gov/ForConsumers/ByAudience/ForWomen/WomensHealthTopics/ucm117976.htm
  9. http://www.fda.gov/ScienceResearch/SpecialTopics/PediatricTherapeuticsResearch/ucm235203.htm
  10. http://www.fda.gov/Food/FoodborneIllnessContaminants/PeopleAtRisk/ucm089629.htm
  11. http://internationalbreastfeedingjournal.biomedcentral.com/articles/10.1186/1746-4358-3-11
  12. http://www.fda.gov/MedicalDevices/ProductsandMedicalProcedures/HomeHealthandConsumer/ConsumerProducts/BreastPumps/ucm061584.htm
  13. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20823901
  14. http://www.kemh.health.wa.gov.au/brochures/consumers/wnhs0581.pdf
  15. http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs342/en/ 
  16. http://portalsaude.saude.gov.br/dicas-de-saude/sobre-aleitamento-materno.html
  17. http://www.fda.gov/ForConsumers/ByAudience/ForWomen/WomensHealthTopics/ucm117976.htm
  18. https://academic.oup.com/ajh/advance-article-abstract/doi/10.1093/ajh/hpx219/4825441
  19. Li et al. (2018). Acute liver failure in neonates with undiagnosed hereditary fructose intolerance due to exposure from widely available infant formulas. Molecular Genetics and Metabolism, Volume 123, Issue 4, April 2018, Pages 428-432. https://doi.org/10.1016/j.ymgme.2018.02.016
  20. http://www.nutrition.org/N18
  21. https://www.bmj.com/content/364/bmj.l1279
  22. https://advances.sciencemag.org/content/5/5/eaav3058
  23. https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0228323
  24. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1931312820303504
  25. Mineva et al. (2022). Impact of breastfeeding on the incidence and severity of respiratory syncytial virus (RSV)-associated acute lower respiratory infections in infants: a systematic review highlighting the global relevance of primary prevention. http://dx.doi.org/10.1136/bmjgh-2022-009693
  26. Camargo et al. (2023). Case–control study of exclusive breast feeding and severe bronchiolitis in the United States. Paediatric and Perinatal Epidemiology. https://doi.org/10.1111/ppe.12966
  27. Kim et al. (2022). The Impact of Antepartum Depression and Postpartum Depression on Exclusive Breastfeeding: A Systematic Review and Meta-Analysis. Clinical Nursing Research, 31(5):866-880. https://doi.org/10.1177/10547738211053507
  28. Hicks et al. (2022). Infant consumption of microRNA miR-375 in human milk lipids is associated with protection from atopy. The American Journal of Clinical Nutrition, Volume 116, Issue 6, Pages 1654-1662. https://doi.org/10.1093/ajcn/nqac266
  29. https://www.mpft.nhs.uk/services/infant-feeding-support/breastfeeding-myths
  30. Goods et al. (2022). Cellular and transcriptional diversity over the course of human lactation. PNAS, 119 (15) e2121720119. https://doi.org/10.1073/pnas.212172011
  31. Viemann et al. (2020). S100A8 and S100A9 Are Important for Postnatal Development of Gut Microbiota and Immune System in Mice and Infants. Gastroenterology, Volume 159, Issue 6, P2130-2145.E5. https://doi.org/10.1053/j.gastro.2020.08.019
  32. Mäkelä et al. (2023). Exclusive breastfeeding, breastfeeding problems, and maternal breastfeeding attitudes before and after the baby-friendly hospital initiative: A quasi-experimental study. Sexual & Reproductive Healthcare, Volume 35, 100806. https://doi.org/10.1016/j.srhc.2022.100806
  33. Lucchese et al. (2023). Amamentação na primeira hora de vida em município do interior do Rio de Janeiro: fatores associados. Escola Ana Nery, 27:e20220346.  https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2022-0346pt
  34. Santos et al. (2019). Avaliação do aleitamento materno em crianças até dois anos assistidas na atenção básica do Recife, Pernambuco, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 24(3). https://doi.org/10.1590/1413-81232018243.126120171
  35. Wacharasin et al. (2022). Factors influencing exclusive breastfeeding for 6 months postpartum: A systematic review. International Journal of Nursing Knowledge, Volume 33, Issue 4, Pages 290-303. https://doi.org/10.1111/2047-3095.12360
  36. https://www.nature.com/articles/s41598-021-85900-4
  37. North et al. (2022). Breastfeeding in a Global Context: Epidemiology, Impact, and Future Directions. Clinical Therapeutics, Volume 44, Issue 2, Pages 228-244. https://doi.org/10.1016/j.clinthera.2021.11.017
  38. Sosseh et al. (2023). Cultural beliefs, attitudes and perceptions of lactating mothers on exclusive breastfeeding in The Gambia: an ethnographic study. BMC Women's Health 23, 18. https://doi.org/10.1186/s12905-023-02163-z
  39. Ricci et al. (2023). Rates of and factors associated with exclusive and any breastfeeding at six months in Canada: an analysis of population-based cross-sectional data. BMC Pregnancy Childbirth 23, 56. https://doi.org/10.1186/s12884-023-05382-2
  40. Coêlho et al. (2023). FACTORS THAT MAKE EXCLUSIVE BREASTFEEDING DIFFICULT. Health and Society, 3(01), 183–201. https://doi.org/10.51249/hs.v3i01.1125
  41. https://bmcwomenshealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12905-023-02164-y
  42. https://www.scielo.br/j/csp/a/BNcfBWcdjmSWptYdpH8nvtS/
  43. Muluneh MW (2023). Determinants of exclusive breastfeeding practices among mothers in Ethiopia. PLoS ONE 18(2): e0281576. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0281576
  44. Aboul-Enein et al. (2023). Interventions and Programs to Promote Breastfeeding in Arabic-Speaking Countries: A Scoping Review. Maternal and Child Health Journal. https://doi.org/10.1007/s10995-023-03595-7
  45. Pérez-Escamilla et al. (2023). Breastfeeding: crucially important, but increasingly challenged in a market-driven world. The Lancet, Volume 401, Issue 10375. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(22)01932-8
  46. https://www.scielo.br/j/sausoc/a/tFg6C9LkSsjhmtybMmrdBjN/
  47. Rollins et al. (2023). Marketing of commercial milk formula: a system to capture parents, communities, science, and policy. The Lancet. The Lancet, Volume 401, Issue 10375, P486-502. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(22)01931-6
  48. https://www.thelancet.com/series/Breastfeeding-2023
  49. Baker et al. (2023). The political economy of infant and young child feeding: confronting corporate power, overcoming structural barriers, and accelerating progress. The Lancet, Volume 401, Issue 10375, P503-524. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(22)01933-X
  50. Cheung et al. (2023). Health and nutrition claims for infant formula: international cross sectional survey. BMJ, 380:e071075. https://doi.org/10.1136/bmj-2022-071075
  51. https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(23)00095-8/fulltext
  52. https://www.bmj.com/content/376/bmj.o630
  53. https://www.bmj.com/content/380/bmj-2022-071075/rapid-responses
  54. Cândido et al. (2021). Aleitamento materno versus distribuição gratuita de fórmulas infantis pelo Sistema Único de Saúde. Einstein (São Paulo), 19:eAO6451. https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2021AO6451
  55. Ministério da Saúde, 2014. (Secretaria Municipal de Saúde). Aleitamento materno, distribuição de leites e fórmulas infantis em estabelecimentos de saúde e a legislação. Brasília (DF): Ministério da Saúde. 
  56. Koura, H. (2019). Myths about breastfeeding. Al-Azhar Assiut Medical Journal, Volume 17, Issue 2, Pages 109-113. https://www.azmj.eg.net/text.asp?2019/17/2/109/269755
  57. https://www.mpft.nhs.uk/services/infant-feeding-support/breastfeeding-myths
  58. https://www.unicef.org/iraq/stories/busted-14-myths-about-breastfeeding
  59. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5383635/
  60. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/nop2.1298
  61. https://www.scielo.br/j/csc/a/Trz3GfpjZvBfGT3BfFygs4v/
  62. https://www.unama.br/noticias/nao-seu-leite-nao-e-fraco
  63. https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/d/doacao-de-leite/mitos-e-verdades
  64. Wallace et al. (2023). Breastfeeding and Later‐Life Cardiometabolic Health in Women With and Without Hypertensive Disorders of Pregnancy. Journal of the American Heart Association, Vol.12, No.5. https://doi.org/10.1161/JAHA.122.026696
  65. Boyle et al. (2023). Formula milk companies and allergy healthcare professionals in India. Clinical & Experimental Allergy. https://doi.org/10.1111/cea.14355
  66. Colombo et al. (2023). Improved Neurodevelopmental Outcomes at 5.5 Years of Age in Children Who Received Bovine Milk Fat Globule Membrane and Lactoferrin in Infant Formula Through 12 Months: A Randomized Controlled Trial. The Journal of Pediatrics, Volume 261, 113483. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2023.113483