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Anunciado bebê gerado a partir do DNA de três pessoas



        Utilizando um método inédito, cientistas criaram um bebê misturando o DNA de três pessoas para eliminar uma doença genética da qual a mãe era portadora. Segundo os envolvidos na pesquisa, isso abrirá uma nova era na medicina, podendo ajudar inúmeras famílias que possuem raras doenças genéticas, essas as quais seriam passadas, de forma obrigatória, para os seus filhos.

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        A técnica, basicamente, remove o DNA nuclear do óvulo da mãe alvo e o insere no óvulo de uma mãe doadora, esse o qual teve apenas o seu DNA nuclear excluído, mas onde foi mantido as mitocôndrias. Com o óvulo agora contendo o DNA (mitocondrial e celular) de duas mães, junta-se ele com o espermatozoide do pai, gerando um filho híbrido de 3 pessoas. Com isso, doenças transmitidas através do DNA mitocondrial (o qual é passado dos pais para o filho apenas a partir da carga genética da mãe) são prevenidas, caso um doador saudável esteja envolvido.



           Procedimento similar já foi usado na década de 1990, nos EUA, para gerar outros filhos de três pessoas, apesar de ter sido banido alguns anos mais tarde pela Agência de Drogas e Alimentos dos EUA (FDA) (Ref.3), por causa de possíveis riscos e problemas bioéticos envolvidos. Só que essa técnica banida era usada de uma forma diferente, visando apenas tratar infertilidade ao misturar o citoplasma e organelas do óvulo de uma doadora com o material genético nuclear da futura mãe. Com isso, mitocôndrias do doador acabavam indo para o novo embrião, carregando material genético dessa terceira pessoa. É estimado que entre 30 e 50 pessoas no mundo, desde aquele período, nasceram através dessa técnica. Agora, o método foi revitalizado, otimizado e visa somente a transferência específica do material genético do núcleo da mãe para um óvulo doador, com o objetivo de tratar doenças genéticas ligadas à mitocôndria.

Alana Saarinen é uma das poucas dezenas de pessoas no mundo com o DNA de três pessoas e hoje leva uma vida normal e saudável. Foto: BBC

       A mãe do novo bebê de três pessoas, da família Jordanian, possuía genes de uma rara doença chamada de Síndrome de Leigh, a qual pode ser fatal para o bebê e proporciona uma expectativa de vida muito baixa para o afetado. Atingindo em torno de 1 em cada 40 mil recém-nascidos, a doença é uma desordem neurológica severa e, na maior parte das vezes, se torna aparente durante o primeiro ano de vida da criança. A mãe envolvida no novo experimento já tinha tido 4 abortos espontâneos, e a morte de duas crianças, um de 8 meses e a outra de 6 anos de idade, vítimas da doença. São conhecidos hoje cerca de 75 mutações de genes envolvidos com a síndrome, em maioria ligados ao DNA do núcleo celular. Mas cerca de 20% dos casos estão diretamente associados com genes do DNA mitocondrial. Portanto, caso a falha genética esteja nas mitocôndrias e estas forem trocadas por versões saudáveis, a doença não mais poderá ser transmitida. Por isso a família Jordanian resolveu encarar o procedimento.

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          Porém, para fugir dos banimentos, os pesquisadores e a família tiveram que ir para o México, onde a lei permite tais experimentos. E, após serem criados 5 embriões usando o novo método, um deles vingou e se desenvolveu de forma normal. Esse embrião, então, foi inserido no útero da mãe, dando sequência à gravidez. Obtendo-se grande sucesso, o bebê nasceu saudável, carregando 0,1% de DNA da doadora (mitocondrial), e o restante do DNA dos pais. Hoje, a criança já está com 5 meses de idade, ainda saudável e sem a terrível síndrome. Com isso, os especialistas esperam também que a legalização da técnica supere problemas éticos e que ela seja disseminada para outros países no mundo, gerando, inclusive, mais avanços na área. Com o potencial de salvar a vida de inúmeras crianças, o Reino Unido já está caminhando para legalizar a técnica no país, apesar das discussões éticas do procedimento realizado no México estarem fervorosas dentro da comunidade médica internacional (!).

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(!) ATUALIZAÇÃO (15/12/16): O procedimento foi legalizado no Reino Unido, mesmo enfrentando pressões bioéticas contrárias. É um passo que pode abrir a porta para a aceitação da técnica em outros países. (Ref.6

(!) ATUALIZAÇÃO (28/09/22): um compreensivo estudo conduzido na China e publicado no periódico PloS Biology (Ref.7) reportou que o procedimento parece ser seguro e não afeta negativamente o desenvolvimento do embrião humano. Os resultados do estudo corroboraram estudos clínicos prévios conduzidos em animais não-humanos e as evidências observacionais associadas ao desenvolvimento dos bebês humanos gerados pelo procedimento.
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Mitocôndria: Organela celular responsável pela fabricação de energia nas células eucarióticas. Encontradas em quase todas as células do corpo, as mitocôndrias possuem um DNA diferente do DNA da célula na qual ela está instalada e, por isso, é um consenso dentro da comunidade científica de que essas organelas foram incorporadas nas células eucarióticas primeiramente como bactérias capturadas do ambiente, estabelecendo-se uma relação de simbiose desde então. Para mais informações, fica a sugestão de leitura: Afinal, as mitocôndrias são sempre herdadas da mãe?

> Na foto de capa deste artigo, podemos ver o Dr. John Zhang, o pesquisador líder no projeto, segurando o novo bebê fruto da mistura de 3 pessoas.
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Artigo relacionado:  Primeiro caso registrado de gêmeos idênticos entre cães!


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://www.bbc.com/news/health-37485263
  2. http://www.bbc.com/news/magazine-28986843 
  3. http://www.fda.gov/ohrms/dockets/ac/02/briefing/3855b1_01.pdf 
  4. http://www.hfea.gov.uk/ 
  5. http://www.nature.com/news/three-parent-baby-claim-raises-hopes-and-ethical-concerns-1.20698 
  6. http://www.bbc.com/news/health-38328097
  7. Qi et al. (2022) Single-cell multiomics analyses of spindle-transferred human embryos suggest a mostly normal embryonic development. PLoS Biol 20(8): e3001741. https://doi.org/10.1371/journal.pbio.3001741