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Por que algumas pessoas têm covinhas nas bochechas?

 
- Atualizado no dia 18 de junho de 2023 -

           A presença de covinhas no rosto é uma característica facial geralmente associada com beleza e muitas culturas acreditam que represente um sinal de prosperidade, riqueza e sorte. Apesar de serem tipicamente ligadas ao rosto e especificamente às bochechas, covinhas podem ocorrer em diferentes partes do corpo, como ombros, abdômen, costas e membros. As covinhas faciais estão localizadas em tecidos mais móveis, e são observadas principalmente nas bochechas, seguido pelas regiões do ângulo da boca. Nesse sentido, são classificadas como aquelas opostas ao ângulo da boca (para-ângulo), aquelas abaixo do ângulo da boca (para-ângulo inferior), e aquelas acima do ângulo da boca (para-ângulo superior). Covinhas no para-ângulo inferior é o mais comum tipo de covinha facial, e frequentemente está localizada no chamado ponto Khoo Boo-Chai (KBC) - presente na interseção entre uma linha horizontal traçada do canto da boca e uma linha vertical traçado do canto externo do olho. 


          Anatomicamente, covinhas são depressões na pele sobre proeminências ósseas e em áreas acrais, e podem ocorrer em indivíduos normais ou em associação com síndromes dismorfológicas. São três principais covinhas (ou mais comuns) que se manifestam no corpo e sem etiologia patológica, cada uma com um mecanismo distinto de formação.

Covinhas Faciais: Pequenas depressões sobre uma (unilateral) ou ambas (bilateral) as bochechas, as quais ficam evidentes durante expressões faciais, especialmente sorrisos. São causadas tipicamente por um músculo zigomático maior duplo ou bífido, cujos feixes faciais se inserem dentro da derme, podendo levar a uma deformação na pele durante a contração muscular (fibras musculares inferiores exibem conexões com a pele no caminho, fazendo a pele ser puxada quando as fibras são estendidas e criando uma depressão cutânea). Porém, nem todos os indivíduos com uma variante bífida desse músculo irão expressar covinhas faciais. Isso porque é necessário que o feixe inferior do músculo zigomático maior bífido esteja aderido à pele e ao osso da mandíbula. Por isso também algumas pessoas possuem covinha em apenas uma das bochechas, lado onde os pré-requisitos anatômicos foram atendidos.

Covinha no queixo: Deformação no formato de Y sobre o queixo baseada em uma peculiaridade óssea. A fissura no osso sob a deformação é derivada de uma fusão imperfeita de duas metades do osso da mandíbula. Esse tipo de covinha é mais comuns em pessoas de etnia Germânica e Polonesa, mas varia amplamente de prevalência entre diferentes populações (Ref.1).

Covinhas de Vênus: Às vezes visíveis, são depressões sagitalmente simétricas na parte inferior das costas, pouco acima da fissura glútea. Essas covinhas são diretamente superficiais às articulações sacroilíacas. O nome "covinhas de Vênus" (em latim, fossae lumbales), embora informal, é historicamente aceito na literatura médica; o nome faz alusão Deusa Romana da Beleza (Vênus). As depressões associadas são criadas por um curto alongamento de ligamento entre a espinha ilíaca superior e a pele. Parece ser determinada por fatores genéticos. 

           As covinhas na bochecha ou próximas da boca se tornam mais visíveis quanto o indivíduo sorri e contrai os músculos mímicos (puxando mais pele no processo), particularmente o músculo zigomático maior. O tamanho e a forma das covinhas variam de uma pessoa para outra e, às vezes, a forma pode diferir no mesmo indivíduo como resposta a mudanças na massa corporal ou ao processo de envelhecimento (avanço da idade); essa variação intra-individual pode ser causada pela elasticidade dos tecidos moles, tônus muscular facial e pelas inserções cutâneas associadas. Deposição excessiva de gordura, a qual desaparece com o avanço de idade, pode causar covinhas transientes. Bebês, por exemplo, frequentemente possuem covinhas causadas por um excesso de gordura nas bochechas; quando perdem gordura à medida que ficam mais velhos, essas covinhas desaparecem.  

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            A ocorrência das covinhas [permanentes] faciais e no queixo é igual entre indivíduos do sexo masculino e do sexo feminino, e evidências acumuladas [mas ainda limitadas] apontam fatores hereditários de determinação e um fenótipo geneticamente herdado como um traço autossômico dominante (Ref.3,9). Quando um dos pais expressam esse fenótipo, existe uma probabilidade de 25-50% do filho/a também expressá-lo; quando ambos os pais expressam o fenótipo, a probabilidade dobra (50-100%). No queixo, covinhas são associadas ao cromossomo 5 e, na bochecha, ao cromossomo 16, com penetrância variável (Ref.4-5). Na população em geral, a prevalência de um músculo zigomático maior bífido é reportada ser de 22,7% (Ref.6). Presença bilateral de covinhas faciais é mais comum do que a presença unilateral, e pode coocorrer com covinha no queixo. A prevalência de covinhas faciais parece ser muito maior nas mulheres do que nos homens, e parece variar substancialmente entre diferentes populações (ex.: é sugerida prevalência muito menor entre Europeus quando comparado com Asiáticos e Americanos) (Ref.9).

           Em muitos países Asiáticos, como a Índia e a Coreia do Sul, as covinhas faciais são muito valorizadas e existem vários procedimentos cirúrgicos desenvolvidos para a criação artificial de covinhas no rosto, tipicamente no ponto KBC. O propósito geral desses procedimentos cirúrgicos é criar uma cicatriz entre a derme e o músculo bucinador, fazendo com que a derme fique agarrada com as fibras desse músculo (a pele facial, então, pode ser puxada pela extensão do músculo, formando uma depressão cutânea) (Ref.9). Muitos acreditam que as covinhas tornam o sorriso mais alegre e mais atrativo (Ref.5). Por outro lado, algumas pessoas consideram covinhas como algo repulsivo e buscam remoção cirúrgica desse traço; essa aversão é mais frequente em relação a covinhas no queixo (Ref.7). Entre os Nigerianos, acredita-se (crença popular) que cutucar um dedo contra a bochecha de um recém-nascido ajuda na ou é responsável pela criação de covinhas (Ref.7).


          Como todo procedimento cirúrgico, as operação para a criação artificial de covinhas faciais estão associadas com riscos de complicações (infecções, escleroma, danos no nervo facial, etc.)  - apesar de raras. Experiência cirúrgica e alto conhecimento anatômico da região facial pelos cirurgiões são essenciais para a prevenção de complicações. Os pacientes devem ser informados que a aparência das covinhas após a cirurgia pode diferir do resultado final; covinhas criadas por cirurgia geralmente serão observadas tanto com o rosto estático quanto durante expressões faciais; e existe a possibilidade da covinha desaparecer ou ficar menos pronunciada (superficial) com o tempo (Ref.9).

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CURIOSIDADE: Em 1936, uma mulher Norte-Americana residente em New York, chamada Isabella Gilbert, inventou uma "máquina de covinha", basicamente uma armação metálica que as pessoas fixavam no rosto durante a noite para acordarem com duas depressões na pele simulando covinhas faciais.


> Atualmente, esse método de produção temporária de covinhas continua sendo usado, com uma tendência recente no Tik Tok (hashtag #dimplemakers) popularizando massivamente a prática com um dispositivo similar àquele desenvolvido por Isabella Gilbert (Ref.10-11). Apesar de relativamente seguro, esse método requer cuidados: se o dispositivo for usado muito apertado ou por muito tempo, há o risco de bloquear o fluxo sanguíneo para a área comprimido na bochecha e pode levar à morte do tecido adiposo (necrose). Também pode causar um caroço na parte interna da bochecha ou deixar uma cicatriz no local onde as células danificadas da pele morreram. Compressão prolongada e potenciais danos em nervos faciais é outra preocupação. Outra moda preocupante, crescente e no mesmo caminho é o uso de "dimple [ou cheek] piercing", onde dois piercings são inseridos nas bochechas simulando covinhas permanentes. Esses piercings são geralmente inseridos sob condições questionáveis de higiene, por profissionais sem educação formal para a prática e sem regulamentação, com considerável risco para infecções e danos teciduais e nervosos na face (Ref.12).

Influenciadora @saraiqbale ensinando a usar o dispositivo "criador de covinhas".

Mulher usando dimple priercing.



REFERÊNCIAS

  1. Kumar et al. (2014). Skin Dimples. International Journal of Dermatology, Volume 53, Issue 7, Pages 789-797. https://doi.org/10.1111/ijd.12376 
  2. Pessa et al. (1998). Double or bifid zygomaticus major muscle: Anatomy, incidence, and clinical correlation. Clinical Anatomy, 11(5), 310–313.
  3. Chalathadka et al. (2019). Evaluation of Prevalence and Morphology of Dimple among Population of Sullia Taluk. Journal of cutaneous and aesthetic surgery, 12(4), 227–230. https://doi.org/10.4103/JCAS.JCAS_109_19
  4. Kumar et al. (2017). Facial dimple creation surgery: A review of literature. Indian Journal of Dental Sciences, Volume 9, Issue 4, Page 282-286.  
  5. Chung et al. (2020). Analysis of the clinical and aesthetic results of facial dimple creation surgery. Archives of plastic surgery, 47(5), 467–472. https://doi.org/10.5999/aps.2020.00661 
  6. Phan, K., & Onggo, J. (2019). Prevalence of Bifid Zygomaticus Major Muscle. Journal of Craniofacial Surgery, 30(3), 758–760. https://doi.org/10.1097/SCS.0000000000005261
  7. Omotoso et al. (2010). Prevalence of Facial Dimples amongst South-western Nigerians: A case study of Ilorin, Kwara State of Nigeria. International Journal of Biomedical and Health Sciences, Vol. 6, No. 4.
  8. https://medlineplus.gov/genetics/understanding/traits/dimples/
  9. Ahmad et al. (2023). Cheek Dimple Surgery: A Review of Techniques and Complications. Turkish Journal of Plastic Surgery 31(2):p 61-64. https://doi.org/10.4103/tjps.tjps_73_22
  10. https://www.usatoday.com/story/life/health-wellness/2023/10/17/dimple-makers-tiktok-plastic-surgery-trend-viral/71206420007/
  11. https://www.dailymail.co.uk/health/article-12646029/TikTok-trend-dimples-permanent-damage.html
  12. Boyd et al. (2023). Dimple piercings: a concerning trend. British Dental Journal 235, 197. https://doi.org/10.1038/s41415-023-6172-3