O que é a superfecundação heteropaternal?
Em agosto de 2018, o Grupo de Genética de Poblaciones e Identificación da Universidade Nacional da Colômbia recebeu um pedido do alegado pai para estabelecer a paternidade de um par de gêmeos dizigóticos do sexo masculino (Ref.1). Ambos os gêmeos nasceram após 35 semanas de gestação, o primeiro com 1,70 kg e o segundo com 2,38 kg. A mãe negou ter recebido transfusões de sangue durante a gravidez, mas mencionou consumo de contraceptivo oral antes da concepção e de ter histórico de gêmeos na família do lado materno.
Amostras de sangue foram coletadas dos gêmeos, da mãe e do alegado pai. Análise do DNA extraído das amostras mostrou que todos os 21 marcadores autossômicos e os 17 marcadores do cromossomo Y em um dos gêmeos eram concordantes com paternidade do alegado pai. Porém, no segundo gêmeo, foram observadas significativas discrepâncias em 14 marcadores autossômicos e 14 marcadores do cromossomo Y em relação ao alegado pai.
Como o DNA da mãe mostrou ser compatível com os dois gêmeos, os pesquisadores confirmaram um raríssimo caso de superfecundação heteropaternal humana. Ou seja, os gêmeos dizigóticos tinham uma mesma mãe e diferentes pais.
A notável diferença de massa observada entre os gêmeos têm sido também reportada em outros casos similares, e é explicada por alguns pesquisadores como resultado do tempo decorrido entre a primeira e a segunda fertilização - maior tempo de gestação para um dos gêmeos dizigóticos -, o qual pode totalizar até 14 dias.
SUPERFECUNDAÇÃO HETEROPATERNAL
A superfecundação heteropaternal é caracterizada pela fertilização simultânea de óvulos por espermatozoides de diferentes indivíduos do sexo masculino, e ocorrendo dentro do mesmo ciclo ovulatório. Seguindo a ovulação, existe uma janela de 12 a 48 horas para a fertilização ocorrer, e, além disso, espermatozoides podem permanecer viáveis até 5 dias no trato reprodutivo feminino. Se uma mulher teve relação sexual com pelo menos dois homens durante um período poliovulatório (liberação de dois ou mais óvulos), os diferentes óvulos podem ser fertilizados pelos espermatozoides de dois ou mais parceiros, resultando em gêmeos dizigóticos (não originados de um mesmo zigoto) com diferentes pais, mesmo com um significativo intervalo de dias entre os eventos de coito.
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A superfecundução heteropartenal é muito raramente observada em humanos, e sua frequência na nossa espécie é desconhecida, mas é esperada de aumentar por causa do uso cada vez maior de intervenções terapêuticas de fertilidade. O fenômeno é esperado de ser mais frequente em espécies poliovulatórias (onde é regra o nascimento de múltiplos filhotes). De fato, em um estudo publicado ano passado no periódico Animal Genetics (Ref.5), pesquisadores mostraram que em rebanhos comerciais de ovelhas - onde o acasalamento de uma ovelha fêmea com dois ou mais machos é frequentemente incentivado pelos criadores - a taxa de superfecundação heteropaternal era de 35%.
Em humanos o fenômeno foi primeiro descrito na literatura médica em 1810, com base nas marcantes características fenotípicas distintas entre dois gêmeos dizigóticos. O segundo caso descrito data de 1978, via teste de histocompatibilidade antigênica. Atualmente, testes genéticos conseguem comprovar de forma inequívoca eventos de superfecundação heteropaternal. Até o momento, em torno de 20 casos têm sido descritos e reportados na literatura acadêmica.
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
- http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0120-41572020000400604
- https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1872497320302301
- https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/00450618.2019.1616821
- https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1875176815301736
- https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/age.12939
- https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/00450618.2016.1236291
- https://www.scielo.br/j/ar/a/5CXGxpgcKtPqk5R7Yz7dBcf/
