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Mulher de 68 anos com ceratodermia palmoplantar pontuada


          Em um relato de caso reportado e descrito no periódico The New England Journal of Medicine (Ref.1), uma mulher de 68 anos de idade apresentou-se ao hospital com um histórico de 40 anos de progressivo e lento desenvolvimento de placas e pápulas hiperceratósicas amareladas nas suas mãos (Foto A) e pés (Foto B). A paciente não apresentava qualquer sensação de dor e de coceira, mudanças nas unhas, ou fragilidade na pele. Lesões epidérmicas similares estavam presentes na sua mão, filho e neta. Biópsia das lesões foram realizadas, e análises histopatológicas mostraram ortohiperceratose com hipergranulose. Essa apresentação foi consistente com o diagnóstico de ceratodermia (ceratose) palmoplantar pontuada.

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          Sequenciamento genético de próxima-geração mostrou uma mutação nonsense (c.370C->T) no gene AAGAB (determinando o aparecimento de um códon de terminação no mRNA, impedindo a síntese completa da cadeia polipeptídica codificada pelo gene afetado). O gene AAGAB codifica a proteína de ligação alfa e gama adaptina - associada à estrutura da membrana plasmática celular -, e o diagnóstico de ceratodermia palmoplantar pontuada Tipo 1 hereditária autossômica dominante foi feito. Esse tipo de ceratodermia palmoplantar Tipo 1 pode estar associado com certos tipos de câncer. Na paciente em questão, os resultados de recentes radiografia, endoscopia superior, colonoscopia, teste Papanicolau e mamografia não geraram resultados sugestivos ou marcantes.

           Tratamento com pomadas tópicas de ureia (40%) e ácido salicílico (20%) foi iniciado, o qual levou a uma leve redução na hiperceratose. Rastreamento regular (preventivo) de câncer foi recomendado, considerando o maior risco de desenvolvimento de tumores malignos associado à paciente.


   CERATODERMIA PALMOPLANTAR PONTUADA

          Ceratose se refere a uma hiperplasia da camada córnea, moderada ou considerável (hiperceratose). É uma alteração quantitativa da camada córnea, cujas células se multiplicam normalmente, sem núcleos (hiperceratose ortoceratósica). Na ceratose, existe um acúmulo coerente de células córneas normais, com simples espessamento hiperplásico da camada córnea. A lesão elementar das hiperceratoses é a pápula córnea. Portanto, no sentido clínico-morfológico, a ceratose é uma modificação circunscrita ou difusa da espessura da pele, que se torna mais consistente, dura, inelástica, dando ao toque da lesão a sensação de aspereza e rugosidade. 

          As ceratoses palmoplantares se referem a um grupo grande e heterogêneo de doenças que apresentam como manifestação principal essa hiperplasia, localizada primordialmente em região palmar e plantar. Com relação à morfologia, as ceratoses palmoplantares podem se apresentar como difusa, focal e pontuada.

           A ceratose palmoplantar pontuada - também conhecida como ceratose palmoplantar papulosa, Doença de Busche-Fisher-Brauer e Doença de Davies-Colley - é uma ceratodermia caracterizada por múltiplas e pequenas lesões, geneticamente determinada e com transmissão autossômica dominante com penetrância variável. Pode aparecer em qualquer fase da vida, mas preferencialmente entre os 10 e 30 anos de idade, e com prevalência em todas as populações humanas. Também podem ocorrer casos não-hereditários que provavelmente representam mutação gênica. 

            A ceratodermia palmoplantar pontuada Tipo I é um subtipo da condição, e pode ser causada por uma mutação no gene AAGAB. Todas as pessoas afetadas por esse subtipo de

            As múltiplas lesões são restritas às superfícies palmoplantares. São circunscritas, preservando sempre, mesmo que pequena, uma faixa de pele não acometida entre uma lesão e outra, por mais que elas tendam a se confluir (fundir). Podem ser de tamanhos variados, mas sempre pequenas. Normalmente dolorosas - mas não uma regra -, especialmente por estarem submetidas a pressão, e podem eventualmente acometer as unhas (apesar de não ser algo comum). 

           Em algumas famílias, a ceratose palmoplantar Tipo 1 parece estar associada com um aumento no risco para vários tipos de câncer, incluindo doença de Hodgkin, carcinoma de células escamosas, e cânceres de rins, mamas, pancreático e de cólon. A incidência desses cânceres nos afetados pode alcançar 30-79%. Todos com essa condição manifestam hiperceratose palmoplantar pontuada, e 88-99% espessamento das palmas e das solas.

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           As lesões da ceratose palmoplantar pontuada possuem um crescimento bastante lento, mais piorando com o avançar da idade. Inicialmente, são pequenas cornificações puntiformes na epiderme que se hipertrofiam, tornando-se superficiais e deprimidas. Com o tempo, se não tratadas, tendem a ser tornar grandes pápulas hiperceratóticas, em alguns casos verdadeiros cornos cutâneos. Complicações podem incluir prejuízo de locomoção, possíveis alterações ósseas, transtornos de ordem psicossociais, carcinomas e, possivelmente, maior risco de infecções fúngicas e bacterianas nas regiões epidérmicas afetadas.

           Apesar de não possuir atualmente cura, a condição é tratável (ex.: terapias a base de ceratolíticos tópicos, retinoides orais, desbastamento mecânico das lesões maiores), e, se manejada adequadamente, leva a uma importante melhora na qualidade de vida do paciente.                


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS

  1. https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMicm2032907
  2. https://www.ufjf.br/hurevista/files/2016/11/selection.pdf
  3. https://rarediseases.info.nih.gov/diseases/3103/punctate-palmoplantar-keratoderma-type-i