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DIU é seguro e efetivo como contraceptivo?


- Atualizado no dia 3 de março de 2023 -

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          Um estudo Norte-Americano publicado em 2015 pelo Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC) (Ref.1) mostrou que o número de mulheres usando métodos anticoncepcionais reversíveis de longo prazo, especialmente o DIU, tem aumentado exponencialmente nos últimos anos. De 2,4% em 2002 para 11,6% em 2013, considerando apenas o território dos EUA. Esse é um quadro que deveria se refletir mais pelo resto do mundo, em especial o uso do DIU.
         
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   O QUE É O DIU?

          O DIU (Dispositivo Intra-Uterino) é um método anticoncepcional muito seguro e extremamente eficiente. Constituído geralmente de uma extensão de plástico no formato de T (!), o dispositivo precisa ser colocado no interior do útero, onde pode permanecer - dependendo do tipo e da marca - até 12 anos ininterruptos e fornecendo alto nível de proteção contra gravidez. As dimensões do DIU podem variar de 28 a 32 mm de largura e de 30 até 32 mm de comprimento. Os menores DIUs (28 mm de largura e 30 mm de comprimento) são recomendados para indivíduos jovens do sexo feminino ou aqueles que nunca engravidaram (Ref.5).

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(!)  Existem outros formatos, como o dispositivo intrauterino MCu, na forma de V, baseado em cobre.
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          Antigamente acreditava-se que o DIU funcionava principalmente ao impedir que o óvulo fertilizado (concepção) se implantasse no útero (gravidez). Porém, mais tarde, os pesquisadores mostraram que o DIU funciona com base em dois mecanismos primários. Primeiro, qualquer objeto inserido no útero leva a uma resposta inflamatória, onde glóbulos brancos (leucócitos, células de defesa) são desviados para a área e acabam atacando os espermatozoides que chegam após a ejaculação, tanto de forma direta quanto de forma indireta (resíduos gerados por essas células de defesa são tóxicos para os espermatozoides). O DIU aumenta as quantidades de leucócitos na região uterina em cerca de 1000%, dificultando enormemente a passagem do espermatozoide ao encontro do óvulo. Já o segundo mecanismo irá depender do tipo do DIU. Nesse sentido, o dispositivo tipicamente pode vir em três formas:

1. ParaGard, também conhecido como Cobre T, é feito com o metal cobre enrolado sobre um suporte de plástico em formato de T. A presença do suporte, fixado no útero, induz a formação dos leucócitos e também de prostaglandinas, os quais contribuirão para a formação de um ambiente pouco favorável à presença dos espermatozoides. O cobre também promove uma ação espermicida. Sua efetividade dura 10 anos. É o único modelo de DIU que começa a surtir efeito logo depois do implante; os modelos hormonais necessitam de cerca de 1 semana para promover a ação anticoncepcional.


Na foto, um DIU de cobre.

2. Mirena (LNG-DIU), é um dispositivo intrauterino que libera o hormônio levonorgestrel (uma progestina, composto sintético com efeitos similares aos da progesterona). Fornece alta efetividade contraceptiva por até 5 anos, e funciona de forma similar às mini-pílulas contendo levonorgestrel, mas necessitando de uma quantidade muito menor do hormônio. O cilindro do dispositivo contém 52 mg de levonorgestrel, liberando inicialmente 20 μg do hormônio dentro da cavidade uterina a cada 24 horas, e eventualmente 14 μg na média a cada 24 horas até próximo do final do período de uso, quando essa taxa de liberação é reduzida para 11 μg/dia. Após absorção do levonorgestrel pelo epitélio endometrial, o muco cervical engrossa e a proliferação endometrial é suprimida. Esses dois efeitos criam um ambiente hostil para a sobrevivência dos espermatozoides, inibindo motilidade e capacitação, e prevenindo fertilização. Além disso, no improvável cenário de fertilização, o LNG-DIU também promove afinamento endometrial com vasos frágeis vasos superficiais, impedindo implantação. 


Ilustração retratando um DIU Mirena.

DIU Mirena dentro de um molde de útero, mostrando a posição correta de uso; taxa de falha é de apenas 5-8 gravidezes para cada 1000 mulheres ao longo de 5 anos de uso.

3.Skyla, é o mais recente em uso nos EUA. Esse dispositivo funciona como o Mirena, mas libera a progestina em menor quantidade e seu tamanho é reduzido. Alta efetividade persiste até três anos.

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> IMPORTANTE: Para não criar confusão entre as variações de DIU usando progestinas, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que esses dispositivos sejam coletivamente chamados de DIU hormonal (Ref.20).

> Mais recentemente, foi proposto o DIU de zinco (Zn-DIU) como um método contraceptivo de longo prazo alternativo ao DIU de cobre e ao DIU hormonal. Testes em ratos sugerem alta eficácia e menos efeitos adversos (Ref.32).
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          Todos os três modelos podem ser removidos a qualquer momento, com a capacidade da mulher de engravidar permanecendo a mesma daquela antes do DIU ser inserido. Os efeitos colaterais são mínimos e limitados ao início do uso, onde pode surgir um certo desconforto na região uterina e dor durante o implante. No primeiro ano, o DIU pode, raramente, sair espontaneamente do útero e descer pela vagina, especialmente se a mulher nunca teve filhos. Nesse caso, não se pode tentar, por conta própria, colocá-lo de volta. Um profissional de saúde especialista na área torna-se necessário.


Posicionamento do DIU dentro do útero; a corda é para facilitar a retirada do dispositivo

             
          O DIU é 17 vezes mais eficaz em prevenir uma gravidez do que mulheres usando as pílulas. A cada 100 mulheres usando o dispositivo, menos do que 1 engravida por ano. No primeiro ano de inserção, taxas de falhas para o DIU de cobre e o DIU hormonal são de aproximadamente 0,8% e 0,2%, aproximadamente (Ref.5, 33-34). O DIU e os implantes subdérmicos hormonais são os métodos contraceptivos mais efetivo do mundo, só perdendo, obviamente, para a esterilização ou a abstinência ao sexo. Aliás, todas essas formas de contraceptivos reversíveis de longa duração possuem eficácias similares - e até superiores (ex.: DIU hormonal) - ao procedimento cirúrgico de ligação tubária (!) (Ref.5). Com o implante do DIU, preocupações com o esquecimento de tomar regularmente a pílula deixam de existir. Além disso, a médio e a longo prazo, a economia financeira é enorme, e a mulher chega até a esquecer que está carregando o dispositivo por não ser necessário manutenções ou troca por vários anos.

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(!) Importante salientar que o procedimento cirúrgico de salpingectomia bilateral - remoção das tubas uterinas - é provavelmente e significativamente mais eficaz do que o DIU hormonal, e tem sido um método contraceptivo permanente cada vez mais recomendado (Ref.39).
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          Em um recente estudo prospectivo de mundo real publicado no periódico The European Journal of Contraception & Reproductive Health Care (Ref.36), pesquisadores acompanharam por 1 ano 555 mulheres na Espanha com idades entre 18 e 30 anos que livremente escolheram o uso de DIU hormonal (LNG-DIU) para contracepção. Após 12 meses, 92,4% das mulheres estavam satisfeitas ou muito satisfeitas com o DIU, e a taxa de descontinuação por causa de eventos adversos mostrou-se muito baixa (2,2%).

          No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza para as mulheres o DIU TCu 380 (DIU de cobre), existindo também incentivo do governo para a ampliação do seu uso desde 2017. Mesmo com essa disponibilidade há vários anos, enquanto que no resto do mundo 13,9% das mulheres em idade fértil usam DIU, aqui no Brasil esse método contraceptivo é ainda muito pouco utilizado (3% das mulheres) (Ref.37). 

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> O Projeto de Lei 1328/22 garante o fornecimento gratuito de DIU hormonal (Mirena e Kyleena) às mulheres em situação de vulnerabilidade pela rede pública de saúde, e já tramita em caráter conclusivo. Para mais informações: https://www.camara.leg.br/noticias/891474-proposta-garante-fornecimento-de-diu-hormonal-a-mulheres-em-situacao-de-vulnerabilidade/
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   CONTRACEPTIVO DE EMERGÊNCIA

           O DIU também pode ser usado como contraceptivo de emergência - aliás, é o mais efetivo nesse sentido (Ref.11-13) -, já que após uma relação sexual desprotegida, o tempo mínimo para uma gravidez efetiva é em torno de 1 semana (1). Eficácia reportada para o DIU (hormonal ou cobre) como contraceptivo de emergência é de 90% (Ref.18), alcançando uma eficácia de 99% dentro de 120 horas (5 dias) para o DIU de cobre após a relação sexual desprotegida (Ref.38), mas taxa de falha pode ser tão pequena quanto 0,1% (Ref.5). Geralmente as mulheres usam o DIU para a concepção de emergência e aproveitam para deixá-lo como contraceptivo de longo prazo. No entanto, as mulheres tendem a preferir o DIU de levonorgestrel para uso contraceptivo a longo prazo - provavelmente porque essa opção reduz o sangramento menstrual e o desconforto -, e atualmente os médicos oferecem apenas o DIU de cobre para o uso como método contraceptivo de emergência, devido à falta de dados de eficácia sobre o DIU de levonorgestrel para esse propósito.   


          Em um estudo clínico randomizado publicado recentemente no periódico The New England Journal of Medicine (Ref.10), 638 voluntárias com idades de 18 a 35 anos e com ciclos menstruais regulares foram divididas aleatoriamente em dois grupos (e sem saberem qual dispositivo estavam recebendo) para receberem um DIU como contraceptivo de emergência: 317 receberam um DIU de levonorgestrel 52 mg e 321 um DIU de cobre T380A. O resultado avaliado foi a taxa de testes de urina dando positivo para gravidez 1 mês após a inserção do DIU. Teste positivo ocorreu para 1 mulher no grupo do DIU de levonorgestrel, e 0 no grupo do DIU de cobre.

           Os pesquisadores concluíram que o DIU de levonorgestrel não é inferior ao DIU de cobre como contraceptivo de emergência. Taxas de eventos adversos que necessitaram de atendimento médico 1 mês depois da inserção do DIU foram similares em ambos os grupos: 5,2% no DIU de levonorgestrel e 4,9% no DIU de cobre. Os resultados, portanto, fornecem suporte para os médicos também recomendarem a opção hormonal do DIU como método contraceptivo de emergência.

           O DIU pode ser inserido até 5 dias após a relação sexual. O principal mecanismo de ação do DIU de cobre é de prevenir a fertilização devido ao efeito dos íons cobre sobre a viabilidade e função dos espermatozoides. No entanto, efeitos sobre o oócito e o endométrio (reações inflamatórias) podem contribuir para a sua alta eficácia e, nesse sentido, também prevenir a implantação (gravidez) se o ato sexual desprotegido aconteceu quando a ovulação já ocorreu (Ref.14-15). De  qualquer forma, o DIU, em termos médicos, não é abortivo mesmo quando usado como contracepção de emergência, ou seja, não possui efeitos sobre um óvulo fertilizado já implantado. 

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> Mulheres com um teste positivo de gravidez e usando corretamente um DIU devem ser consideradas com um alto risco de gravidez ectópica, ou seja, a implantação do embrião fora da cavidade uterina  (Ref.30). Gravidez ectópica carrega um elevado risco de complicações caso não seja resolvida de forma precoce. Ruptura de gravidez ectópica é a principal causa de mortalidade materna no terceiro trimestre (Ref.31). O diagnóstico de gravidez ectópica deve ser sempre suspeito em pacientes com dor abdominal, sangramento vaginal ou síncope. Por exemplo, podemos citar um caso reportado em 2019 no periódico Cureus (Ref.32) de uma mulher de 36 anos de idade com um DIU-Mirena corretamente posicionado que desenvolveu uma forte dor abdominal e sangramento vaginal persistindo por 4 semanas devido a uma gravidez ectópica apresentando-se como uma massa de 2-3 cm na tuba uterina. 

> Importante também lembrar que existem casos de falsos-positivos para testes de gravidez. Para mais informações, leitura recomendada: Quais são as causas de um teste urinário de gravidez falso-positivo?
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   DÚVIDAS FREQUENTES

          Perguntas respondidas em março de 2017 pela professora e especialista Juliana Silva Barra, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de Federal de Minas Gerais (UFMG), durante uma entrevista para o Blog da Saúde, associado ao Ministério da Saúde (Ref.9):

- O DIU é seguro?
Sim, a eficácia [geral] do DIU é de 99,3% ·.

- Quem pode usar o DIU?
O DIU pode ser utilizado desde a adolescência até a menopausa. Hoje já se sabe que uma mulher que nunca passou por uma gestação, mesmo adolescente, e aquela que passou por uma cirurgia cesariana, podem ser candidatas ao uso do DIU. Além disso, pode ser usado por mulheres que estão amamentando e não interfere na produção, quantidade e qualidade do leite materno

- Quem não pode usar o DIU?
O DIU é contraindicado para mulheres que estejam apresentando no momento Doença Inflamatória Pélvica, infecções sexualmente transmissíveis, miomas [ou anormalidades congênitas] que distorçam a cavidade uterina, sangramento vaginal sem diagnóstico, malformações uterinas e estreitamento do canal do colo uterino, câncer do colo de útero e do endométrio. [Além disso, é naturalmente contraindicado para indivíduos com hipersensibilidade aos componentes do DIU (ex.: cobre)].

- O DIU é abortivo?
Não, o DIU não é abortivo. É um método contraceptivo que, por sua presença física e efeitos no útero, impede o encontro do óvulo com o espermatozoide. Ou seja, o DIU, no uso a longo prazo, age antes mesmo do processo de fecundação do óvulo, não havendo razões para a associação. Porém, no caso do uso para contracepção de emergência, o dispositivo pode atuar após fecundação, mas não antes da concepção (real gravidez). Portanto, em nenhum cenário o DIU é medicamente abortivo.

- O DIU pode deixar a mulher infértil?
Não. O DIU não provoca infertilidade. Se a mulher quiser engravidar, o DIU pode ser retirado a qualquer momento. [Após a descontinuação do DIU, ao contrário do que é frequentemente alegado, a taxa de efetiva fertilidade permanece alta, e estudos reportam taxas de gravidez variando de 92% até 100% dentro de 3 anos, e de 85% do retorno de fertilidade até 12 meses (Ref.15)].

- O DIU influencia na menstruação?
O DIU de cobre pode intensificar o fluxo menstrual e até causar mais cólicas nos primeiro três meses após à inserção sendo esse sintoma de caráter transitório, na maioria das mulheres.

- Quando se deve colocar o DIU?
Para mulheres que estejam menstruando regularmente, o DIU pode ser inserido a qualquer momento durante o ciclo menstrual, desde que haja certeza de que a mulher não esteja grávida, que não tenha malformação uterina e não existam sinais de infecção. Pode ser inserido, preferencialmente, durante a menstruação, pois tem algumas vantagens: se o sangramento é menstrual, a possibilidade de gravidez fica descartada; a inserção é mais fácil pela dilatação do canal cervical; qualquer sangramento causado pela inserção não incomodará tanto a mulher; a inserção pode causar menos dor.

Após o parto, o DIU pode ser inserido durante a permanência no hospital, se a mulher já havia tomado essa decisão antecipadamente. O momento mais indicado é logo após a expulsão da placenta. Porém pode ser inserido a qualquer momento dentro de 48 horas após o parto. Passado esse período, deve-se aguardar, pelo menos, quatro semanas.

Após aborto espontâneo ou induzido, o DIU deve ser colocado imediatamente, se não houver infecção e caso a mulher deseje utilizar o método.

- Dói para colocar o DIU?
Esta é uma questão que depende da sensibilidade de cada mulher a dor. Em pessoas que já tiveram parto normal, por exemplo, a dor não é um relato comum. De qualquer forma, o procedimento, em geral, é simples e indolor,  podendo trazer apenas um leve incômodo para a implantação. A retirada do DIU também é um procedimento simples e em geral indolor. [Uso de analgésicos locais como misoprostol vaginal ou creme de lidocaína-prilocaína pode ser uma opção para a inserção do DIU (Ref.35)].

- O dispositivo pode incomodar ou doer no útero após a implantação?
No primeiro mês, sim, pois o dispositivo pode ficar mal posicionado e vai se acomodando com o tempo. Depois desse período, incômodos ou dores na região do útero devem ser investigados.

- O DIU pode sair do lugar?
Sim. Porém, são raras as situações, tanto do DIU sair do lugar como também o útero expulsar o dispositivo. [Mais informações nas notas no final deste tópico].

- Na relação sexual, o homem pode sentir o DIU?
Não. O que pode ser sentido pelo parceiro na relação sexual é o fio de nylon que acompanha o dispositivo, se ele for cortado muito curto depois da colocação. Nestes casos, deve-se trocar o DIU.

- Uso do DIU necessita de outro método adicional?
É sempre recomendada que seja realizada a dupla proteção, ou seja  , que seja utilizado também o preservativo feminino ou masculino em todas as relações sexuais (oral, anal ou vaginal), pois são os únicos métodos que protegem de infecções sexualmente transmissíveis, inclusive HIV/Aids, sífilis e hepatites virais.

- Mulheres com doenças crônicas podem utilizar o DIU?
Sim. Mulheres com doença cardíaca valvar, diabetes e câncer de mama, entre outras situações,  podem utilizar o DIU de cobre. O dispositivo não aumenta o risco de infecções pélvicas.

- O uso do DIU pode causar câncer?
Não há evidências de que o DIU aumenta o risco de neoplasia intra-epitelial cervical ou câncer de colo uterino (!).

- Métodos de imagem como Ressonância Magnética podem ser realizados em usuárias de DIU?
Sim. Mulheres que utilizam DIU de cobre podem realizar ressonância magnética da pelve com segurança. Não há alteração significativa da temperatura intrauterina nesses casos.  Ainda assim, é importante lembrar ao radiologista que vai fazer o exame que a mulher utiliza o DIU.

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(!) O DIU de levonorgestrel está associado a uma redução no risco de câncer endometrial, e não parece influenciar o risco de câncer ovariano (Ref.17). Em 2017, um estudo na Dinamarca encontrou um pequeno aumento no risco de desenvolvimento de câncer de mama com o uso de DIUs hormonais (Métodos hormonais contraceptivos, incluindo pílulas e DIU, aumentam um pouco o risco de câncer de mama), uma associação que persistiu em uma revisão sistemática mais recente (Ref.24). Portanto, mulheres com predisposição ao desenvolvimento de câncer de mama (ex.: histórico familiar positivo) talvez prefiram o uso do DIU de cobre. Lembrando aqui que o consumo alcoólico e a obesidade são um dos principais fatores de risco modificável para o desenvolvimento de câncer de mama (e outros tipos de câncer), algo frequentemente ignorado pela população (Qual é a relação entre consumo alcoólico e câncer?).

> Relevante também reforçar que não existe relação causal entre DIU e doença pélvica inflamatória, e nem evidência suportando associação entre DIU e infecções do trato urinário (Ref.21). Existe, porém, um aparente maior risco de vaginose bacteriana associado com o uso de DIU de cobre (Ref.22).

> Complicações são muito raras com o DIU. Maior preocupação nesse sentido envolve um risco muito baixo de que o DIU migre [translocação] para outras partes do útero ou do corpo (ex.: bexiga, ao perfurar a parede uterina) (Ref.25-27, 40). Nesse último caso, geralmente a causa é uma inserção inadequada do DIU. Em casos também muito raros, o DIU pode se quebrar durante o procedimento de remoção (por exemplo, quando parte dele se torna embebida na parede uterina após tempo muito longo de uso e maior força é exigida para removê-lo) (Ref.28).

> Um estudo publicado em 2021 no periódico Journal of Pediatric and Adolescent Gynecology (Ref.29), analisando 642 mulheres adolescentes e jovens adultas que tiveram um DIU inserido, encontrou uma taxa de expulsão de ~9%. Entre aquelas que escolheram ter um segundo DIU inserido, a taxa de expulsão foi de 27,6%. Um histórico de sangramento uterino, anemia, desordens hemorrágicas e/ou elevado índice de massa corporal (IMC) mostrou estar associado com um maior risco de expulsão do DIU. Inserção do DIU logo após o parto (inserção pós-placentária) também está associada com uma significativa taxa de expulsão (Ref.41).

ALERTA: Muitos vídeos no Tik Tok têm abordado de forma irresponsável e desinformativa o uso do DIU. Um estudo publicado recentemente no periódico Obstetrics & Gynecology (Ref.42), analisando os 100 vídeos mais assistidos na hashtag #IUD (vídeos na língua inglesa), encontrou que quase 40% deles retratavam o DIU com um tom negativo, e apenas ~19% abordavam o dispositivo de forma positiva, com ~28% dos vídeos mencionando desconfiança de profissionais de saúde em relação ao uso de DIU. Os vídeos tinham um baixo nível de qualidade informativa em termos de ciência médica (pontuação no DISCERN de 1,2/5).

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   POR QUE O DIU AINDA NÃO É POPULAR NO OCIDENTE?

          Na Ásia, o uso do DIU é bastante disseminado, especialmente na China, onde foi o principal método contraceptivo que garantiu a eficácia do programa de planejamento familiar do país (2). Entre as mulheres Asiáticas, cerca de 27% delas usam o DIU. Nesse contexto, o DIU de cobre hoje é a alternativa anticoncepcional reversível mais usada no mundo: cerca de 170 milhões de usuárias, ultrapassando de longe a pílula anticoncepcional que tem cerca de 110 milhões de usuárias, segundo informações da OMS. Porém, em países Ocidentais, o uso é bem menos disseminado. Nos EUA, apenas 6,1% das mulheres usam o dispositivo (12% entre aquelas usando métodos contraceptivos), e menos de 2% na Austrália e na Nova Zelândia.

         A primeira explicação para essa baixa popularidade do DIU é a falta de interesse da indústria farmacêutica em promover esse produto, já que os lucros são muito maiores com a venda das pílulas. No caso da China, por exemplo, houve um grande esforço - em boa parte autoritário - do governo para promover o DIU entre as mulheres.

         Outro motivo é a imagem negativa que muitos associam ao DIU, desde esterilidade e dor menstrual até prejuízos no ato sexual. Essas alegações negativas contra o DIU emergiram no final do século XIX, quando versões mais rudimentares desses dispositivos - feitas até mesmo com ossos de gato - começaram a ser criadas a esmo para serem introduzidas no útero das mulheres na esperança de melhor prevenir gravidezes indesejadas. Até próximo do final do século XX, DIUs seguros e eficientes não surgiriam no mercado, com vários casos prévios de sérios efeitos adversos tendo consequentemente sido registrados. Porém, hoje, esses dispositivos são extremamente seguros, incluindo para adolescentes e mulheres que nunca engravidaram (Ref.19).

          Por último, as mulheres mais jovens podem ter dificuldade de acesso ao DIU por causa dos custos e não praticidade do implante inicial (é necessário um profissional da saúde para o implante e um custo significativo). Quem cobre isso, normalmente, são as seguradoras de saúde (não em todos os casos), e as adolescentes não têm acesso a esse tipo de recurso. Fica mais fácil confiar na camisinha e pílulas para a prevenção nesse caso.

          Nos últimos anos, várias iniciativas têm introduzido o DIU em países socialmente e economicamente mais vulneráveis, especialmente no continente Africano, e obtendo bons resultados de aceitabilidade (Ref.23)

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(1) Em Janeiro de 2015, a política chinesa de Um-Filho passou para Dois-Filhos, devido à pressão internacional e à crescente reclamação interna contra a imposição governamental do limite de apenas 1 filho que uma família poderia ter, algo implementado desde 1978 para controlar o gigantesco crescimento populacional Chinês.
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   CONCLUSÃO

            O DIU é um método anticoncepcional seguro, confiável, muito cômodo e de longa duração, sendo uma alternativa mais do que recomendada a outros métodos anticoncepcionais. Mas é bom sempre lembrar: O DIU NÃO PREVINE DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS! PARA ISSO, É NECESSÁRIO A CAMISINHA! Aliás, usando o DIU em conjunto com a camisinha, o sexo se torna realmente seguro, em todos os sentidos. Por fim, apesar da alta eficácia, existe, obviamente, uma taxa de falhas, e gravidez pode ocorrer com o uso de DIU - mas inferior a 1% dos casos no primeiro ano de uso (!).

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(!) Gravidezes que ocorrem com um DIU na cavidade uterina possuem risco aumentado para o desenvolvimento de condições severas que podem afetar o feto e a mãe: gravidez ectópica (fora da cavidade uterina), aborto espontâneo no primeiro ou segundo trimestre, parto prematuro e corioamnionite (infecção intra-amniótica caracterizada clinicamente por febre materna taquicardia materna ou fetal, leucocitose materna e odor fétido do líquido amniótico). Porém, remoção do DIU no início da gravidez pode ser feita com alta eficácia e segurança via procedimento histeroscópico, com significativa redução no risco de complicações caso a grávida tenha interesse em continuar com a gestação (Ref.33-34).
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> Artigo relacionado: Posso prevenir a Aids depois de uma relação desprotegida?


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS 
  1. http://www.cdc.gov/nchs/products/nhsr.htm
  2. http://www.cdc.gov/reproductivehealth/unintendedpregnancy/contraception.htm
  3. http://link.springer.com/article/10.1007/s13669-016-0138-2
  4. http://www.jmsjournal.net/article.asp?issn=1735-1995;year=2016;volume=21;issue=1;spage=17;epage=17;aulast=Zhan
  5. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK557403/
  6. https://www.nlm.nih.gov/medlineplus/ency/patientinstructions/000774.htm 
  7. http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/52406-esclarecendo-mitos-sobre-o-diu-de-cobre
  8. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2702765/
  9. https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2022141
  10. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0010782412007500
  11. https://www.magonlinelibrary.com/doi/abs/10.12968/pnur.2020.31.6.254
  12. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0002937802004933
  13. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1521693419300872
  14. https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-3-030-46391-5_10
  15. Beatty & Blumenthal (2009). The levonorgestrel-releasing intrauterine system: Safety, efficacy, and patient acceptability. Therapeutics and clinical risk management, 5(3), 561–574. https://doi.org/10.2147/tcrm.s5624
  16. D'Alessandro et al. (2021). Systematic review and meta-analysis on the impact of the levonorgestrel-releasing intrauterine system in reducing risk of ovarian cancer. Internationl Journal of Gynecology & Obstetrics, Volume 156, Issue 3, Pages 418-424. https://doi.org/10.1002/ijgo.13737
  17. Goldstuck et al. (2021). The intrauterine device versus oral hormonal methods as emergency contraceptives: A systematic review of recent comparative studies. Sexual & Reproductive Healthcare, Volume 28, 100615. https://doi.org/10.1016/j.srhc.2021.100615
  18. Bahamondes & Bahamondes (2021). Intrauterine device use is safe among nulligravidas and adolescent girls. Global Sexual and Reproductive Health. Acta Obstetricia et Gynecologica Scandinavica, Volume100, Issue4, Pages 641-648. https://doi.org/10.1111/aogs.14097 
  19. https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/340378/9789240021730-eng.pdf
  20. Aronoff et al. (2021). Intrauterine devices as an exposure risk for urinary tract infections: A scoping review. Volume 86, Issue 5, e13476. https://doi.org/10.1111/aji.13476
  21. Peebles et al. (2021). Elevated Risk of Bacterial Vaginosis Among Users of the Copper Intrauterine Device: A Prospective Longitudinal Cohort Study. Clinical Infectious Diseases, Volume 73, Issue 3, Pages 513–520. https://doi.org/10.1093/cid/ciaa703
  22. Danna et al. (2022). Introducing the hormonal Intrauterine Device in Madagascar, Nigeria, and Zambia: results from a pilot study. Reproductive Health 19, 4. https://doi.org/10.1186/s12978-021-01300-x
  23. Sarian et al. (2020). Levonorgestrel-releasing intrauterine system and breast cancer risk: A systematic review and meta-analysis. Acta Obstetricia et Gynecologica Scandinavica, Volume 99, Issue 8, Pages 970-982. https://doi.org/10.1111/aogs.13817
  24. Wan et al. (2021). Four cases of heterotopia of an intrauterine device embedded in the bladder muscular layer causing cystolithiasis: case report and review of the literature. Journal of International Medical Research. https://doi.org/10.1177%2F0300060520979444
  25. Liu et al. (2020). Intrauterine devices migrated into the bladder: two case reports and literature review. BMC Women's Health 21, 301. https://doi.org/10.1186/s12905-021-01443-w
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