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Por que o Tiranossauro rex tinha braços tão pequenos?


- Atualizado no dia 10 de janeiro de 2024 -

            Sem sombra de dúvidas, o Tiranossauro rex (Tyrannosaurus rex) é um dos mais conhecidos e populares dinossauros. Grande "vilão" do clássico filme Jurassic Park (1993), o T. rex foi um dos maiores e mais temidos carnívoros de todos os tempos, e o primeiro fóssil da espécie foi descoberto no início do século XX pelo curador do Museu Americano de História Natural, Dr. Barnum Brown


Em 1902, Barnum Brown, na época um curador assistente do departamento de paleontologia vertebrada no Museu Americano de História Natural, escavou o primeiro esqueleto parcial de um Tiranossauro rex na Formação Hell Creek, Montana. Nos próximos anos, ele e seu time de campo (imagem - Barnum no centro) encontraram outros espécimes no Oeste.


          Com comprimento e altura que podiam ultrapassar 12 metros e 4 metros, respectivamente, e massa corporal entre 5 e 7 toneladas (5000-7000 kg), esse era um superpredador que você não iria gostar de ver pela frente (1-2). Aliás, evidências científicas recentes inclusive sugerem que essa espécie possuía alta capacidade cognitiva (3). As características mais marcantes dos T. rex eram a grande cabeça; grandes, grossos e afiados dentes; e pequenos braços. É também sugerido que, diferente das reconstruções tradicionais, os tiranossauros possuíam lábios, ou seja, os dentes não ficavam aparentes do lado de fora quando fechavam a boca (4). E muito relevante, o T. rex pertencia ao grupo não-aviário dos terópodes (clado Theropoda), este o qual deu origem às aves (dinossauros terópodes aviários).

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IMPORTANTE: Historicamente, o T. rex tem sido o único descrito para seu gênero (Tyrannosaurus). Porém, existe evidência mais recente de que esse gênero  - associado aos fósseis até o momento descritos (!) - pode ser representado por três distintas espécies. Em um estudo publicado no periódico Evolutionary Biology (Ref.13), analisando fósseis de 37 espécimes de Tiranossauro, pesquisadores sugeriram mais duas espécies (além do Tyrannosaurus rex): Tyrannosaurus regina e Tyrannosaurus imperator. Por outro lado, é ainda possível que as diferenças observadas entre conjuntos de fósseis possam ser causadas por variações extremas entre indivíduos, ou dimorfismo sexual atípico.

(!) Atualização: Uma nova espécie do gênero [Tyrannosaurus mcraeensis] foi descrita a partir de um fóssil encontrado no Novo México. Para mais informações: Nova espécie de Tiranossauro é descrita

> Alguns fósseis de T. rex estabelecidos como juvenis têm sido recentemente reclassificados como adultos de uma espécie distinta de tiranossaurídeo, Nanotyrannus lancesis, com comprimento máximo de 5 metros e massa ao redor de 900-1500 kg. Para para mais informações, acesse a Ref.15

(1) Evidências fósseis indiretas e diretas sugerem que os Tiranossauros e outros tiranossaurídeos ocupavam dois nichos ecológicos distintos ao longo da vida: como mesopredadores na fase juvenil e como superpredadores na fase adulta. Entenda: Incrível fóssil de um jovem tiranossaurídeo revela sua última refeição

Para mais informações: 

> Apesar de filmes e outras obras de entretenimento representarem vocalizações do T. rex e de outros dinossauros não-aviários terópodes de grande porte como poderosos rugidos de boca aberta, é mais provável que esses animais produziam sons variados e específicos para circunstâncias diversas, como observado nas aves modernas. Isso inclui vocalização com a boca fechada e inflando tecidos moles na garganta para a produção de sons de baixa frequência, específicos em rituais de acasalamento (traço sexualmente selecionado). Vocalizações com boca aberta plausivelmente coocorriam, produzindo sons em frequências diversas para várias situações (ex.: estresse e combates intraespecíficos). Filhotes provavelmente produziam sons agudos para comunicação com os pais, similar ao observado nos arcossauros modernos (aves e crocodilianos). É ainda muito especulativo afirmar como tiranossauros e outros dinossauros vocalizavam, mas provavelmente não era via "rugidos de leão". O único fóssil conhecido de uma laringe ("caixa de voz") de dinossauro não-aviário pertence a uma espécie de anquilossauro* (Pinacosaurus grangeri), e a estrutura desse órgão nessa espécie - laringe grande e cinética -, somada a pulmões imóveis, aponta para uma vocalização similar às aves modernas. Ref.16-19

*Para mais informações sobre os anquilossauros: Gliptodontes eram tatus gigantes?
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          Com base em dentes fossilizados, estes os quais eram afiados e serrados, acredita-se que os tiranossauros adultos não mastigavam a comida e, sim, engoliam pedaços inteiros (talvez tão massivos quanto 230 kg), quebrando os ossos ali presentes. Em adição a isso, uma junção encontrada na mandíbula inferior provavelmente ajudava esses animais a absorver os impactos de choque de presas que se debatiam quando capturadas. A enorme cabeça (cerca de 1,5 metros)  do T. rex gerava poderosas mordidas - com força entre 13520 e 14335 N em um único dente (Ref.9) - e o forte pescoço ajudava esse dinossauro a arrancar os pedaços de carne da carcaça de presas.

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          Partindo desse último ponto, um número de hipóteses têm sido propostas para explicar o tão notável aspecto anatômico do temido Tiranossauro rex: seus pequenos braços, comparado ao seu massivo corpo que podia superar 12 metros de comprimento e alcançar 7 toneladas. Um T. rex de 13 metros, com uma cabeça de 1,5 metro, tinha braços com menos de 90 cm de comprimento; é algo equivalente a um humano de 1,8 metro com um braço de apenas 10 cm. Além disso, esses braços tinham mobilidade articular reduzida. Enquanto isso, ancestrais tiranossaurídeos possuíam longos braços, assim como outros dinossauros terópodes (bípedes) de pequeno-médio porte. Esses tiranossaurideos (ex.: gêneros Gualong, Yutyrannus e Sinotyrannus) possuíam porte muito inferior, entre 1 e 3 metros de comprimento, mas braços tipicamente com 50% do comprimento dos membros traseiros. 



          Entre as hipóteses, é sugerido um meio para melhor segurar a fêmea durante o acasalamento ou a presa durante a caça ou alimentação, ou mesmo para virar um Triceratops e alcançar as partes moles (no sentido de explicar a persistência evolutiva dos pequenos membros). Porém e obviamente, é contra-argumentado que essas funções provavelmente seriam otimizadas com braços longos e mais fortes.

          Em um estudo publicado no periódico Acta Palaeontologica Polonica (Ref.14), o paleontólogo Kevin Padian, da Universidade da Califórnia, EUA, analisou a questão sob outra perspectiva: quais as vantagens que o T. rex teria com um braço tão curto ou mesmo a ausência de um braço? Após uma revisão da literatura acadêmica, Padian propôs uma nova hipótese: os braços do T. rex encolheram em tamanho no sentido de prevenir amputações acidentais ou intencionais durante o ataque de um bando de Tiranossauros sobre uma carcaça, em meio às massivas cabeças e poderosas bocas cheias de grandes e afiados dentes mordendo para todos os lados. 

            Com uma cabeça e mordida tão poderosas, seria desnecessário um braço longo para a caça (especialmente considerando alimentação sobre carcaças). Um braço vítima de uma poderosa mordida poderia resultar em uma grave infecção, hemorragia, choque e, eventualmente, morte. Em outras palavras, uma forte pressão evolutiva contra braços longos e de maior exposição.

           E, mais importante: outros terópodes gigantes carnívoros (até maiores que os Tiranossauros), incluindo abelissaurídeos e carcarodontassaurídeos, também possuíam braços altamente reduzidos, mesmo não possuindo relação evolutiva próxima entre si e muito menos com os Tiranossauros (!).

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(!) Braços pequenos em grandes terópodes carnívoros evoluíram de forma independente e convergente pelo menos três vezes (reforçando que o fenótipo é provavelmente adaptativo). Sugestão de leitura: Descoberto terópode gigante carnívoro na Argentina com braços pequenos similares ao T. rex
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         É ainda incerto se os terópodes macrocefálicos como os Tiranossauros eram primariamente predadores ou carniceiros, mas é plausível assumir que possuíam uma estratégia alimentar oportunística. Por exemplo, assim como ocorre hoje na África, esses dinossauros de grande porte poderiam se aproveitar da caça feita por outros predadores menores, afugentando-os como leões fazem com hienas. Essa proposta entraria em linha com a locomoção provavelmente limitada em relação a corridas. E mesmo se os Tiranossauros não fossem primariamente carniceiros, a caça ativa por esses animais geraria carcaça a ser disputada por outros Tiranossauros ao redor.

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          Aproveitando a menção da velocidade de corrida, não existe ainda um consenso entre os pesquisadores, mas analisando registros fósseis de pegadas, extrapola-se que os T. rex eram corredores lentos, desenvolvendo velocidades em torno de 16 km/h, algo que se aproxima da média de um corredor profissional humano. Quando primeiro foi analisado, seu esqueleto - especialmente as longas e poderosas pernas - chegaram a sugerir um animal que poderia ultrapassar velocidades de 70 km/h. Mas subsequentes análises biomecânicas, considerando massa corporal, altura e estrutura óssea, concluíram que o T. rex era relativamente lento e talvez nem mesmo conseguisse correr, no máximo andar rápido. Por outro lado, estudos acumulados nas últimas décadas têm fortemente sugerido que os dinossauros não-aviários possuíam sangue entre frio e quente - "morno" - o que pode ser traduzido em maior capacidade para manter moderada velocidade. Essas evidências sugerem que o T. rex provavelmente corriam, mas com velocidades que não ultrapassavam muito ~16 km/h.


Lentos ou rápidos na corrida? 


           De fato, um estudo publicado em 2020 no periódico PLOS ONE (Ref.12) concluiu que os dinossauros terópodes de grande porte - como o Alossauro e os Tiranossauros - evoluíram grandes e poderosas pernas traseiras para uma economia máxima de energia, visando resistência e eficiência à medida que se moviam/caminhavam ao longo do dia na busca de presas. Terópodes de menor porte, sim, teriam evoluído poderosas pernas traseiras para a corrida, como os raptores, visando não somente a caça mas também a fuga de predadores de maior porte. Ou seja, tiranossauros eram mais como maratonistas, se movimentando a velocidades moderadas e otimizando o gasto energético. Nesse sentido, presas mais lentas e energeticamente mais fartas, como saurópodes, seriam o alvo dos grandes terópodes adultos, provavelmente com a dieta suplementada com carcaças. E uma vez capturada a presa ou a carniça, o grande porte e força seriam suficientes para assegurá-la. É possível também que os indivíduos mais jovens, entre 10 e 15 anos de idade, pudessem ser muito velozes, antes do robusto acúmulo de massa corporal limitasse o potencial de velocidade.

          Outra controvérsia em relação ao T. rex é a já longa discussão sobre a presença ou não de penas em seu corpo. Ao contrário de diversas outras espécies de dinossauros terópodes, que claramente tinham penas por todo o corpo, existem poucas evidências para garantir que o T.rex também as tinham. Um estudo publicado na Biology Letter (Ref.3) concluiu que os Tiranossauros não tinham penas como outros terópodes próximo-relacionados. O grupo de pesquisa, liderado pelo Dr. Phill Bell, da Universidade de New England, Austrália, analisou impressões fósseis de pele da espécie encontradas em Montana e também outros terópodes que viveram no período final do Cretáceo na Ásia e partes da América do Norte, incluindo o Albbertosaurus e o Gorgosaurus. No final, os pesquisadores concluíram que o Tiranossauro rex parece ter tido escamas, como os répteis modernos, não uma plumagem pelo corpo inteiro. Segundo os pesquisadores responsáveis pelo novo estudo, o T. rex era muito grande para precisar de uma cobertura penosa com o objetivo de dificultar a perda de calor para o meio ao redor, portanto os novos achados fariam sentido. Mas outros pesquisadores são mais céticos. Para esses últimos, o T. rex poderia apenas ter menos penas do que o normal, assim como ocorre com os elefantes: os asiáticos, por serem menores e viverem em áreas florestais, são bem mais "cabeludos" do que os seus grandes parentes africanos, estes muito grandes e vivendo em áreas mais quentes.



Pele fossilizada de um T. rex 

Cobertos de penas?

           Em relação à expectativa de vida, os cientistas estimam que esses animais chegavam a um máximo de idade em torno dos 30 anos, a partir da análise de anéis encontrados em seus ossos fossilizados - assim como em troncos de árvores, às vezes anéis (figura abaixo) marcam períodos próximos de 1 ano ao longo do crescimento ósseo do animal. No T.rex, em específico, parece que seu crescimento era acelerado na adolescência - alcançando o tamanho adulto entre os 14 e 18 anos - e acabava morrendo jovem. 


Anéis de crescimento presentes na amostra óssea de um T. rex

          Habitando o Oeste da América do Norte - fósseis foram encontrados em Estados como Montana e a Dakota do Sul e também em Alberta, Canadá -, os Tiranossauros rex viveram durante o final do período do Cretáceo , entre cerca de 100 e 65,5 milhões de anos atrás.


SUE é o esqueleto do mais bem preservado T. rex já encontrado (90% da constituição óssea conservada) e escavado próximo da cidade de Faith, Dakota do Sul. Está em exibição permanente no Museu de Campo de História Natural, em Chicago, Illinois

Descoberto em 2013, Trix é o esqueleto de T. rex mais velho já encontrado, com idade superior a 30 anos. Está em exposição no Centro Naturalis de Biodiversidade, em Leiden, Holanda



> Usando a técnica de Kinect Scan, pesquisadores em 2017 jogaram por terra as duas prévias hipóteses sobre os misteriosos buracos nos ossos da mandíbula do crânio de SUE. Pelas hipóteses anteriores, ou os buracos foram feitos pela mordida de um dinossauro competidor ou eram frutos de uma infecção por protozoários providos da carne de uma presa contaminada. Mas os padrões irregulares encontrados e outros aspectos dos buracos obtidos do novo escaneamento não corroboram essas hipóteses. Mais pesquisas serão necessárias para decifrar o mistério. (Ref.10)

> Também em 2017, um novo fóssil de tiranossauro foi descoberto na região sul de Utah, EUA, e entregue ao Museu de História Natural de Utah, onde será melhor revelado, preparado e estudado. O fóssil é de aproximadamente 76 milhões de anos atrás e provavelmente representa a espécie Teratophoneus curriei. Essa espécie caminhou pela América do Norte entre 66 e 90 milhões de anos atrás, durante o Período Cretáceo Superior. Com, no mínimo, 75% dos seus ossos preservados, este é o mais completo esqueleto de um tiranossauro já descoberto no sul do território norte-americano (Ref.11).



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REFERÊNCIAS
  1. http://www.amnh.org/dinosaurs/tyrannosaurus-rex
  2. http://www.amnh.org/exhibitions/dinosaurs-ancient-fossils-new-discoveries/theropod-biomechanics/the-problem-of-size
  3. http://rsbl.royalsocietypublishing.org/
  4. https://www.fieldmuseum.org/at-the-field/exhibitions/sue-t-rex
  5. http://www.nms.ac.uk/explore/stories/natural-world/tyrannosaurus-rex/ 
  6. https://t-rex.naturalis.nl/default.aspx
  7. http://www.fasebj.org/content/31/1_Supplement/251.1.short
  8. http://faculty.montgomerycollege.edu/gyouth/FP_examples/student_examples/yang_lin/intro.html
  9. 5th Annual Meeting Canadian Society of Vertebrate Palaeontology,2017
  10. http://news.mit.edu/2017/kinect-3-d-scan-t-rex-skull-0705
  11. https://unews.utah.edu/newly-discovered-tyrannosaur-fossil-represents-the-most-complete-found-in-the-southwestern-u-s/
  12. https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0223698
  13. Paul et al. (2022). The Tyrant Lizard King, Queen and Emperor: Multiple Lines of Morphological and Stratigraphic Evidence Support Subtle Evolution and Probable Speciation Within the North American Genus Tyrannosaurus. Evolutionary Biology.  https://doi.org/10.1007/s11692-022-09561-5
  14. Padian, Kevin (2022). Why tyrannosaurid forelimbs were so short: An integrative hypothesis. Acta Palaeontologica Polonica 67 (1): 63-76. https://doi.org/10.4202/app.00921.2021
  15. Longrich et al. (2024). Taxonomic Status of Nanotyrannus lancensis (Dinosauria: Tyrannosauroidea)—A Distinct Taxon of Small-Bodied Tyrannosaur. Fossil Studies, 2(1), 1-65. https://doi.org/10.3390/fossils2010001
  16. https://www.bbc.com/future/article/20221212-the-mysterious-song-of-the-dinosaurs
  17. Riede et al. (2016). Coos, booms, and hoots: The evolution of closed‐mouth vocal behavior in birds, Evolution, Volume 70, Issue 8, Pages 1734–1746. https://doi.org/10.1111/evo.12988
  18. Hanson et al. (2021). The early origin of a birdlike inner ear and the evolution of dinosaurian movement and vocalization. Science, Vol. 372, Issue 6542, pp. 601-609. https://doi.org/10.1126/science.abb4305
  19. Yoshida et al. (2023). An ankylosaur larynx provides insights for bird-like vocalization in non-avian dinosaurs. Communication Biology 6, 152. https://doi.org/10.1038/s42003-023-04513-x

Peso´, neste artigo, está se referindo ao uso popular da palavra, ou seja, para indicar a ´massa´ do corpos aqui na Terra (já que a variação da força-peso na superfície do nosso planeta é bem pequena)