YouTube

Artigos Recentes

Bebidas alcoólicas e Gravidez: Tolerância zero!



- Atualizado no dia 17 de maio de 2023 -

Compartilhe o artigo:



           Boa parte do público, infelizmente, desconhece esse alerta, mas o consumo de bebidas alcoólicas durante a gravidez pode ser extremamente prejudicial em qualquer estágio de desenvolvimento fetal, não importando a  quantidade ingerida e a frequência.  A recomendação das agências e especialistas de saúde é cortar completamente o consumo alcoólico pelas mulheres grávidas.

         Entre diversos danos que o consumo alcoólico pode causar para o embrião/feto destaca-se o FASD (Espectro de Desordens Alcoólicas no Feto, na sigla em inglês). O FASD engloba diversos sintomas que incluem problemas físicos, comportamentais e prejuízos intelectuais que duram o resto da vida. Além disso, existe um risco aumentado para o aborto espontâneo, nascimento prematuro, morte no nascimento e SIDS (Síndrome da Morte Infantil Súbita, na sigla em inglês). É sugerido também que indivíduos do sexo masculino com essa síndrome são 29% mais prováveis de reportarem sérias tentativas de suicídio (Ref.2). E qualquer quantidade de etanol (o álcool presente nas bebidas) pode passar pela placenta e representa um grande risco para o desenvolvimento do feto. Nos EUA, é estimado que até 5% das crianças são afetadas pelo FASD (Ref.3). Mesmo consumo alcoólico leve a moderado  pode mudar significativamente a estrutura cerebral do feto e atrasar o desenvolvimento do cérebro - algo demonstrado em estudos com humanos e roedores (Ref.2,12).



           Adolescentes que foram expostos ao etanol enquanto estavam no útero possuem conexões cerebrais alteradas consistentes com uma performance cognitiva deficiente. Isso foi apontado em um estudo analisando 19 pacientes com FASD e 21 participantes sem FASD, através da complexa técnica de magnetoencefalografia (MEG) e aplicação da teoria do caos (Ref.4). A robusta análise computacional revelou várias áreas do cérebro com falhas de conectividade entre o grupo com FASD. 

           Para cada semana de consumo alcoólico pela grávida durante as primeiras 5 a 10 semanas de gravidez, existe um aumento acumulativo de 8% no risco de aborto espontâneo em comparação com as grávidas que zeraram o consumo alcoólico (Ref.10). E não importa o nível alcoólico consumido, ou o tipo de bebida alcoólica. Na Finlândia, uma substancial redução nos preços das bebidas alcoólicas em 2004 (-33%) parece ter levado a um aumento significativo nas taxas de aborto espontâneo e de efeitos adversos no nascimento (parto prematuro, baixo peso no nascimento) (Ref.15).

            O consumo alcoólico pelas grávidas também pode alterar os genes do feto e também da grávida. Um estudo publicado no Alcoholism: Clinical and Experimental Research (Ref.5), analisando 359 crianças e 30 mulheres grávidas, reportou mudanças (metilação no DNA) em dois genes com o consumo moderado a elevado de bebidas alcoólicas durante a gravidez: POMC - o qual regula o sistema de resposta ao estresse - e o PER2 - o qual influencia o relógio biológico do corpo. Já um estudo publicado no periódico BMC Medicine (Ref.14), explorando a exposição de células embriônicas ao álcool no início da gestação, encontrou mudanças epigenéticas no feto - no caso hipometilação - afetando em especial o gene DPPA4, importante no desenvolvimento embrionário.

          Aliás, o consumo alcoólico pré-natal está associado até mesmo com anormalidades na morfologia facial do feto, mesmo envolvendo doses leves a moderadas (Ref.12). 

          Em um estudo publicado em 2020 no periódico Proceedings of National Academy of Sciences (Ref.9), pesquisadores mostraram diretamente os danos no tecido cerebral do feto de um primata não-humano devido à ingestão de etanol (álcool de bebidas alcoólicas) pela mãe. Via imagem por ressonância magnética, os danos ficaram visíveis no cérebro em desenvolvimento durante o terceiro trimestre de gravidez, mesmo com o feto sendo exposto ao etanol apenas durante o primeiro trimestre. O estudo analisou um total de 28 macacos Rhesus fêmeas grávidas, onde metade consumiu uma quantidade de 1,5g/kg de etanol ao longo de 60 dias (período total de gestação de 168 dias). No segundo semestre, danos não foram observados, mas a partir do 135° dia de gestão, os efeitos adversos emergiram nas regiões cerebrais associadas com o controle motor, incluindo volume reduzido na haste do cérebro e do cerebelo.

          Publicado em 2020 no International Journal of Epidemiology (Ref.8), um robusto estudo de revisão sistemática analisando tanto estudos observacionais quanto testes clínicos randomizados (incluindo 9 randomizações Mendelianas) encontrou que o consumo alcoólico durante a gravidez afeta negativamente as habilidades cognitivas futuras da criança, e pode também levar a um baixo peso no nascimento. Não existe dúvida: o consumo alcoólico deve ser zerado em todos os trimestres da gravidez.


- Continua após o anúncio -



           O maior problema nas ações de prevenção aos danos causado pelas bebidas alcoólica às grávidas é que cerca da metade das gravidezes não são planejadas, e, mesmo se planejadas, grande parte das mulheres não percebem que estão grávidas até períodos entre 4 e 6 semanas de gravidez. Com isso, o consumo alcoólico pode estar elevado durante o período inicial da gravidez, aumentando fortemente o risco de muitos danos irreversíveis. Por isso é importante o investimento em métodos preventivos de gravidez, como pílulas anticoncepcionais, DIU e camisinhas (especialmente aqui no Brasil, onde o aborto é ilegal em quase todas as situações).

          Aliás, um estudo publicado em 2019 no periódico Development (Ref.5) encontrou que mesmo exposições às bebidas alcoólicas pouco antes da fertilização (entre 4 dias antes e 4 dias depois) causa danos à placenta ao restringir seu crescimento e funções. A bebida alcoólica em torno do tempo de concepção reduz a formação de vasos sanguíneos na placenta, levando a insuficiências na entrega de nutrientes para o embrião. A placenta de embriões do sexo feminino foram os que mais expressaram danos no estudo, com redução de até 17% no tamanho e 32% menos formação de vasos.

-----------
ATENÇÃO: E não são apenas as mulheres que precisam evitar o consumo alcoólico antes de tentarem engravidar. Um estudo de revisão sistemática e meta-análise encontrou que os prejuízos para a estrutura cardíaca do feto pode ser maiores para o consumo alcoólico paterno do que o materno. Os pesquisadores desse estudo recomendaram que os homens que pretendem ser pais fiquem pelo menos 6 meses prévios à concepção sem consumir bebidas alcoólicas. Para saber mais, acesse: Homens querendo ser pais devem evitar bebidas alcoólicas seis meses antes da concepção

> Existe também evidência científica - limitada a estudo experimental com ratos - de que o consumo alcoólico durante a amamentação pode impactar de forma deletéria a saúde do bebê, com efeitos adversos de longo prazo no desenvolvimento corporal e cerebral. Especialistas recomendam que mulheres evitem o consumo alcoólico durante a lactação até que mais estudos esclareçam a questão (Ref.13).
-----------

           Caso você enfrente problemas com o alcoolismo e esteja querendo engravidar, procure urgentemente ajuda profissional para parar e peça para as pessoas ao seu redor a não te incentivarem a beber durante o período de gravidez ou de busca da gravidez. O consumo deve ser zerado, sem exceções.


Artigo recomendado: A verdade por trás dos supostos benefícios à saúde oriundos do consumo alcoólico


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://www.cdc.gov/vitalsigns/fasd/index.html 
  2. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/bdr2.1465
  3. https://www.nih.gov/news-events/news-releases/study-first-graders-shows-fetal-alcohol-spectrum-disorders-prevalent-us-communities
  4. https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fnbeh.2017.00183/full 
  5. https://dev.biologists.org/content/146/11/dev172205
  6. https://aip.scitation.org/doi/10.1063/1.5089527
  7. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/acer.14148
  8. https://academic.oup.com/ije/advance-article/doi/10.1093/ije/dyz272/5716483
  9. https://www.pnas.org/content/117/18/10035
  10. https://www.ajog.org/article/S0002-9378(20)30725-0/fulltext
  11. https://press.rsna.org/timssnet/media/pressreleases/14_pr_target.cfm?id=2384
  12. https://academic.oup.com/humrep/article/38/5/961/7035056
  13. https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fnins.2023.1147274/full
  14. https://www.auanet.org/guidelines-and-quality/guidelines/disorders-of-ejaculation
  15. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/add.16119