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De onde vem o oxigênio nas máscaras que caem sobre os passageiros nos aviões?

            Apesar de muitos imaginarem que existem grandes tanques de oxigênio suprindo as máscaras de emergência que caem acima dos bancos de aviões, o gás oxigênio (O2) inalado é oriundo de reações altamente exotérmicas (libera energia térmica). Em voos comerciais, tanques de oxigênio ocupariam muito espaço e massa extra.

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            Durante falha de pressurização da cabine a uma altitude acima de um nível seguro (ex.: acima de uma altitude de ~9 km, existe um terço do oxigênio molecular disponível no ar em relação ao nível do mar), máscaras amarelas caem do teto para suplementar a baixa oferta de gás O2 no ambiente. Essas máscaras estão ligadas a um gerador químico de oxigênio (também conhecido como "vela de oxigênio"), basicamente um cilindro contendo frequentemente clorato de sódio (NaClO3), pó de ferro (Fe), peróxido de bário (BaO2) e perclorato de potássio (KClO4); o pó de ferro (ou às vezes pó de estanho, Sn) atua como catalisador. Quando você puxa a máscara, seguindo a orientação dos profissionais de voo, é acionado um dispositivo que causa uma pequena explosão (como o gatilho de uma arma de fogo).


           A explosão fornece calor que inicia a decomposição exotérmica do NaClO3 em cloreto de sódio (NaCl) e gás oxigênio (O2), com a estequiometria mostrada na Fig.1. Parte do gás O2 gerado reage com o pó de ferro, produzindo óxido de ferro II (FeO) e muito calor, este o qual mantém contínua a decomposição do sal NaClO3 (retroalimentação do processo). A outra parte do oxigênio que não reage com o ferro vai para a máscara para ser inalado pelos passageiros. O cheiro que os passageiros sentem de queimado ao respirarem pela máscara é justamente oriundo do processo de decomposição e queima do ferro. O KClO4 está presente em cerca de 1% do conteúdo total de reagentes e também atua como fornecedor de oxigênio após decomposição exotérmica.

           Uma vez iniciado o processo reativo, a reação não pode ser mais parada até o consumo total de NaClO3, algo programado para fornecer entre 12 e 22 minutos de suficiente gás O2 para os passageiros. Nesse período de tempo, é esperado que os pilotos reduzam a altitude de voo até níveis seguros na atmosfera - tipicamente uma descida de emergência até 3048 metros de altitude (Ref.2). 

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> Uma vez colocada a máscara, os passageiros devem respirar o mais normal possível; ar com alta concentração de oxigênio flui para o saco da máscara mesmo que esse não pareça inflar. Tipicamente, existe maior inflação do saco a altas atitudes (maior fluxo de ar/oxigênio e baixa pressão do ar ambiente) e menor inflação a menores altitudes (baixo fluxo de ar/oxigênio e maior pressão do ar ambiente).

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          O processo reativo tipicamente libera pequenas quantidades de gás cloro (Cl2) (Fig.3) que é "absorvido" [reage] pelo BaO2 para não intoxicar os passageiros; esse gás é oriundo também do cloreto metálico (MCl) produzido na reação ou já presente como contaminante no sal perclorato. Outros óxidos metálicos podem ser adicionados como alternativa ao BaO2 (ex.: MgO, Li2O, CaO, CaO2, Na2O2 e KO2). A reação de neutralização do gás cloro pelo óxido de bário seque a equação: BaO Cl2 → BaCl2 + O2. Além disso, o calor total gerado é enorme e leva a temperatura no sistema a superar 500°C (e temperaturas locais a superarem 1000°C devido à ação dos catalisadores metálicos).

           Devido às altas temperaturas presentes no sistema reacional, alguns raros acidentes aéreos já foram reportados por mau uso/funcionamento ou mau armazenamento desses cilindros. O mais trágico deles ocorreu em 1996, quando um avião explodiu e caiu em Everglades, Flórida, matando todas as 110 pessoas a bordo. No caso, 144 cilindros geradores de oxigênio próximos da validade haviam sido armazenados no compartimento de cargas do avião, tapados de forma totalmente insegura. Após 6 minutos de decolagem, um deles foi ativado, iniciando a cascata de reações e provocando um enorme incêndio no local. Geralmente, o local de armazenagem de cargas do avião é mantido selado para suprimir possíveis focos de incêndios (limitando a disponibilidade de O2 no ambiente); porém, além de fornecer muito calor, os geradores de oxigênio justamente geram muito O2! No acidente, é sugerido que houve a eventual explosão de pneus ali também presentes (um grande 'bang' ouvido pelos passageiros).

           Além de aviões, geradores químicos de oxigênio são encontrados também em submarinos e na estação espacial internacional. Aliás, em 2007, ganhou destaque um acidente envolvendo a explosão de um desses geradores em um submarino nuclear da Marinha Real Britânica, culminando na morte de dois ocupantes (Ref.3).


REFERÊNCIAS

  1. Sociedade Americana de Química
  2. Susan et al. (2021). Passenger Oxygen Mask Design Study. ROSAP. https://rosap.ntl.bts.gov/view/dot/57230
  3. Shafirovich et al. (2012). On feasibility of decreasing metal fuel content in chemical oxygen generators. Combustion and Flame, Volume 159, Issue 1, Pages 420-426. https://doi.org/10.1016/j.combustflame.2011.07.004
  4. Ward et al. (2013). Chemical Oxygen Generation. Respiratory Care, 58(1) 184-195.  https://doi.org/10.4187/respcare.01983
  5. Liu et al. (2019). A review on chemical oxygen supply technology within confined spaces: Challenges, strategies, and opportunities toward chemical oxygen generators (COGs). International Journal of Minerals, Metallurgy, and Materials, 26(8), 925–937.