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Por que fico com tontura ao me levantar e como amenizar o problema?

- Atualizado no dia 8 de novembro de 2023 -

          Imagine que você está sentado em uma cadeira assistindo a uma aula na escola e, subitamente, resolve se levantar por um motivo qualquer. Então, ao ficar de pé, imediatamente uma sensação de tontura emerge, a qual pode acompanhar outros sintomas e ser severa em alguns casos. Esse fenômeno é comum, pode ser incômodo para muitas pessoas, pode inclusive levar a um desmaio, e ainda não é totalmente entendido. Em específico, a condição descrita é chamada de hipotensão ortostática inicial - caracterizada por uma diminuição transiente na pressão sanguínea e aumento na taxa cardíaca. 

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          Um estudo publicado em 2022 no periódico Hearth Rhythm (Ref.1) descreveu duas técnicas simples, sem custos e sem a necessidade de medicamento para efetivamente aliviar os sintomas da condição.


   HIPOTENSÃO INICIAL ORTOSTÁTICA

           Hipotensão ortostática inicial (HOI) é uma forma de intolerância ortostática (1) definida por uma redução transiente na pressão sanguínea sistólica (>40 mmHg) e/ou uma pressão diastólica (>20 mmHg) dentro dos primeiros 15-30 segundos após o indivíduo assumir uma posição ereta ("ficar de pé"). Essa queda na pressão sanguínea tipicamente é associada com sintomas de pré-síncope (incluindo tontura, náusea, visão embaçada, e fraqueza ou instabilidade) e ocasionalmente síncope (desmaio) (2) como resultado de hipoperfusão cerebral. Após a manifestação sintomática, geralmente a recuperação ocorre dentro de 45-60 segundos devido à ativação do barorreflexo arterial. Outros sintomas podem também ser englobados, como dor de cabeça, palpitação e dor no peito (Ref.2).

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(1) O termo ortostático faz referência à posição ereta. Existem três tipos de hipotensão ortostática: inicial, atrasada e clássica. Na forma clássica, a queda na pressão sanguínea ocorre dentro de 3 minutos. O diagnóstico de hipotensão ortostática é feito ao se medir a pressão sanguínea e a taxa cardíaca do paciente após cinco minutos na posição supina e três minutos após movimentação ativa para uma posição ereta. A condição está associada a vários fatores causais, desde neurogênicos até idiopáticos. 

(2) Síncope é caracterizada por uma perda transiente de consciência e tônus postural seguida por rápida recuperação, tipicamente durando menos do que 60 segundos. É uma causa frequente para visitas ao departamento de emergência, e o fenômeno possui uma prevalência populacional de 40% ao longo da vida. Em outras palavras, seja por causa de calor excessivo, fome, grande estresse, medo de algo ou intolerância ortostática, 4 em cada 10 pessoas irão desmaiar em algum ponto da vida.

> Um estudo divulgado mais recentemente na Nature (Ref.9) revelou um caminho neural que controla o processo de síncope, envolvendo um grupo de neurônios sensoriais (NPY2R VSNs) que conectam o coração ao tronco cerebral (ou encefálico) - e caracterizando um reflexo cardíaco distinto. Em experimentos com ratos, ativação desses neurônios faziam os animais pararem de se mover e cair quase imediatamente, e exibindo sintomas observados durante síncope humana, como rápida dilatação da pupila, trabalho cardíaco reduzido, hipoperfusão cerebral e rolar dos olhos. A hipotensão ortostática pode ser um gatilho para o reflexo cardíaco associado ao mecanismo neural da síncope.

> Tradicionalmente era sugerido que simples redução no fluxo sanguíneo do cérebro era responsável por eventos de síncope. Porém, o estudo na Nature mostrou que essa redução no fluxo sanguíneo parece apenas coincidir com o mecanismo neural responsável pela síncope, através de superativação parassimpática.

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          A queda exagerada da pressão sanguínea caracterizando a HOI é mais provavelmente explicada por uma rápida e excessiva vasodilatação ocorrendo nos músculos ativos dos membros inferiores requeridos para o estabelecimento da posição ereta, consequente de caminhos metabólicos locais. 

          De fato, sintomas de HOI frequentemente emergem durante o levantamento ativo do corpo (ação muscular) mas não com uma mudança de posição passiva (por exemplo, uma pessoa presa e deitada em uma mesa na horizontal, levada à posição ereta ao se mover a mesa verticalmente), reforçando que uma resposta muscular ativa é importante para a patofisiologia da condição. Indução de contrações musculares involuntárias nas pernas através de correntes elétricas enquanto a pessoa está sentada já mostraram inclusive mitigar a queda na pressão sanguínea e reduzir os sintomas associados à HOI (Ref.3)

          Explicações alternativas - também envolvendo ativação muscular - incluem o bombeamento muscular (1), o qual está envolvido nos esforços musculares do ato de se levantar, e o reflexo do receptor cardiopulmonar, o qual é engatilhado em resposta ao aumento na pressão atrial direita a partir do bombeamento muscular. Nesse contexto, a HOI é considerada uma dessincronização de curto prazo entre o esperado aumento no esforço cardíaco e uma grande redução na resistência vascular sistêmica com a mudança ativa para a posição ereta (Ref.4).  

          A HOI é uma síndrome comum que afeta todas as idades e pode resultar em recorrente pré-síncope ou síncope - muitas vezes diariamente e com sintomas podendo ocorrer várias vezes dentro de um único dia. Um estudo publicado em 2018 no periódico International Journal of Cardiology (Ref.5), analisando 250 pacientes consecutivos com desmaio inexplicável, mostrou que 11,2% dos pacientes tinham HOI que explicava o evento de síncope. Entre indivíduos idosos, a prevalência de HOI é alta, em torno de 29% (Ref.6), e com prevalência relativa à manifestação sintomática variando de 24% a 100% dos casos (Ref.2). Sintomas de intolerância ortostática na população idosa estão associados com uma redução na qualidade de vida, maior risco de quedas, desmaio, fraturas, morbidade e mortalidade.

          Tipicamente, indivíduos do sexo feminino com reflexo de síncope possuem uma relativa maior redução no volume do sangue torácico ao se levantarem comparado com o sexo masculino, resultando em uma menor tolerância ortostática e uma maior taxa de reflexo síncope. É importante também ressaltar que quase todo mundo provavelmente já experienciou algum sintoma de tontura ao se levantar em algum momento da vida - causado pela hipotensão ortostática -, sem isso representar uma comorbidade ou preocupação médica.

           Existem também hereditários associados com quadros de hipotensão ortostática. Por exemplo, recentemente foi descrito o caso de uma família no norte da Suécia manifestando uma condição chamada de hipotensão ortostática inicial não-neurogênica isolada ao longo de quatro gerações - através de transmissão autossômica dominante -, condição também acompanhada por taquicardia (Ref.10). Vários membros dessa família, desde muito jovens, experienciam constantemente tonturas e frequentes desmaios ao se levantarem e ficar de pé. A maioria dos membros afetados na família eram altos (>1,90 m de altura) e a intensidade dos sintomas variava ao longo do tempo e entre os indivíduos. A causa da forte intolerância ortostática na família mostrou estar associada com baixa capacidade funcional dos vasos sanguíneos na parte inferior do corpo, com consequente retorno venoso insuficiente do sangue para o coração em uma posição ereta. 

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   TRATAMENTO E PREVENÇÃO

           A hipotensão ortostática inicial (HOI), dependendo da severidade e frequência dos sintomas, pode impactar negativamente várias aspectos da vida do indivíduo afetado, incluindo aspectos sociais, emocionais e ocupacionais (Ref.7). Para quadros em geral de hipotensão ortostática, tratamento inicial foca na causa do problema, incluindo potenciais efeitos colaterais de medicamentos. Estratégias não farmacológicas incluem modificação na dieta, roupas de compressão, manobras físicas, e medidas para se evitar ambientes que exacerbam os sintomas. Tratamentos farmacológicos incluem midodrina e droxidopa; fludrocortisona também melhora os sintomas, mas está associado com preocupantes efeitos de longo prazo.

          No caso específico da HOI, já foi mostrado que períodos mais curtos de tempo sentado (<2 minutos) precedendo o ato de levantar reduz a queda na pressão sanguínea observada na HOI comparado a um período longo de tempo sentado (>2 minutos). Atuais orientações para pacientes com HOI incluem a recomendação para se levantarem devagar ou tensionar os músculos inferiores do corpo após ficarem de pé caso se sintam sintomáticos. No caso da pessoa estar em uma posição de supino (deitada), recomenda-se sentar-se antes sem auxílio das mãos (movimento com maior esforço abdominal) antes de se levantar.

          Um estudo clínico recente, publicado no periódico Hearth Rhythm (Ref.1) e analisando 22 jovens adultos do sexo feminino (idade média de 32 ± 8 anos) com HOI (associada com desmaios e frequentes episódios sintomáticos), encontrou que: 

I - Pré-ativação dos músculos inferiores do corpo (PREACT) antes da pessoa se levantar reduz a queda na pressão arterial média, assim como os sintomas da hipotensão ortostática, ao aumentar a produção cardíaca;

II - Compressão mecânica dos músculos inferiores do corpo seguindo o ato de levantar (TENSE) reduz a queda na pressão arterial média, assim como os sintomas da hipotensão ortostática, ao aumentar o volume sistólico. Esse efeito parece ser resultado da compressão mecânica - incluindo dos músculos abdominais - empurrando sangue dos vasos esplâncnicos de volta ao coração.


          Em outras palavras, o estudo encontrou que elevar repetidas vezes o joelho/coxa antes de se levantar de uma posição sentada (pré-ativação dos músculos inferiores) e cruzar as pernas imediatamente após se levantar (tensionamento das nádegas e coxas) efetivamente ameniza a queda na pressão sanguínea e reduz os sintomas da hipotensão ortostática para quem possui HOI mais severa e frequente. Lembrando que o estudo analisou apenas mulheres, sendo incerto se os resultados podem ser extrapolados para homens (sexo masculino) e pessoas idosas em geral.

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   CONCLUSÃO

          Hipotensão ortostática inicial é uma condição bastante comum entre a população geral, e pode ser bastante incômoda ou mesmo perigosa para algumas pessoas, especialmente idosos. Muitos desmaios sem aparente explicação podem ser explicados pela condição, caracterizada por uma significativa queda na pressão sanguínea seguindo o ato de se levantar de uma posição sentada ou deitada. Sintomas comuns incluem tontura, visão embaçada e náusea. Para amenizar os sintomas, recomenda-se levantar-se devagar, elevar repetidas vezes o joelho/coxa antes de se levantar, cruzar as pernas imediatamente após se levantar, e realizar um movimento abdominal (sentar sem o apoio das mãos) antes de se levantar de uma posição de supino (deitada).


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS

  1. Raj et al. (2022). Lower body muscle preactivation and tensing mitigate symptoms of initial orthostatic hypotension in young females. Heart Rhythm. https://doi.org/10.1016/j.hrthm.2021.12.030
  2. Christopoulos et al. (2021). Initial orthostatic hypotension and orthostatic intolerance symptom prevalence in older adults: A systematic review. International Journal of Cardiology Hypertension, Volume 8, 100071. https://doi.org/10.1016/j.ijchy.2020.100071
  3. Sheikh et al. (2021). Mitigating Initial Orthostatic Hypotension: Mechanistic Roles of Muscle Contraction Versus Sympathetic Activation. Hypertension. 2022;79:638–647. https://doi.org/10.1161/HYPERTENSIONAHA.121.18580
  4. Morillo & Vandenberk (2021). Symptom reduction in initial orthostatic hypotension: Time to get physical! Heart Rhythm. https://doi.org/10.1016/j.hrthm.2021.12.031
  5. Twist et al. (2018). Initial orthostatic hypotension among patients with unexplained syncope: An overlooked diagnosis? International Journal of Cardiology, Volume 271, P269-273. https://doi.org/10.1016/j.ijcard.2018.05.043
  6. Maier et al. (2021). Prevalence of initial orthostatic hypotension in older adults: a systematic review and meta-analysis. Age and Ageing, Volume 50, Issue 5, Pages 1520–1528. https://doi.org/10.1093/ageing/afab090
  7. Nasia A., Sheikh (2021). Initial Orthostatic Hypotension: Underlying Physiology, Symptom Management, and the Patient Experience. University of Calgary (Dissertação). http://dx.doi.org/10.11575/PRISM/38819
  8. Wijnen et al. (2016). Initial orthostatic hypotension in teenagers and young adults. Clinical Autonomic Research, Volume 26, Pages 441–449. 
  9. Lovelace et al. (2023). Vagal sensory neurons mediate the Bezold–Jarisch reflex and induce syncope. Nature 623, 387–396. https://doi.org/10.1038/s41586-023-06680-7
  10. Fagius et al. (2023). Early-onset hereditary isolated non-neurogenic orthostatic hypotension in a Swedish family. Clinical Autonomic Research 33, 421–432. https://doi.org/10.1007/s10286-023-00963-9