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Ching Shih: A mais poderosa pirata da história


- Atualizado no dia 7 de outubro de 2022 -

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          No início do século XIX, o governo imperial Chinês estava apavorado com o poderio de batalha acumulado pelos piratas, levando-o a implorar por ajuda dos "bárbaros" estrangeiros, notavelmente os Portugueses e os Britânicos. Então, em setembro de 1809, dois navios Portugueses saíram do porto de Macau, atravessando a noite carregado de canhões, rifles, homens e uma missão: dar início ao plano de parar o temível Esquadrão Bandeira Vermelha, o qual dominava os mares da China há anos, liderando uma verdadeira confederação pirata, e longe do alcance da Marinha Chinesa. E quem comandava essa sanguinária confederação foi um dos piratas mais poderosos e de maior sucesso da história. Não, não estamos falando do Barba Negra, ou mesmo de um homem. E, sim, de uma mulher: Ching Shih, uma jovem e bela ex-prostituta que se transformou na líder de dezenas de milhares de piratas, e tudo isso com menos de 35 anos de idade.

  • Obs.: A parte inicial deste artigo ('China e o comércio marítimo') é uma introdução explorando a situação comercial da China nos mares no contexto da pirataria. Na segunda parte ('Ching Shih') a história de Shih é explorada.

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   CHINA E O COMÉRCIO MARÍTIMO

          Até o final da Dinastia Yuan (1279-1368) as atitudes oficiais dos Chineses em relação ao comércio marítimo eram, em geral, de suporte e encorajadoras. Porém, esse cenário mudou completamente na década de 1360, quando o imperador fundador do regime Ming (1368-1644), Chu Yuan-chang, promoveu a ideia de que o mar era uma fronteira natural ao invés de um ambiente válido de exploração. Em 1368, o governo Ming organizou um sistema de "tributo comercial", e também proibiu a participação Chinesa no comércio marítimo internacional. Nesse sentido, o comércio no mar com estrangeiros ficou permitido apenas quando embaixadas estrangeiras viessem para pagar tributo à corte imperial Chinesa; em quaisquer outras situações, os estrangeiros ("bárbaros") eram proibidos de entrarem na China. O mesmo valia para a população Chinesa: todos eram proibidos de saírem da China. Essas ações governamentais visavam, de forma relativamente ingênua, submeter as nações estrangeiras às rédeas imperiais Chinesas e também proteger as costas de ataques externos.




          As proibições marítimas, portanto, construíram uma barreira invisível separando o mundo 'civilizado' dos mundo 'bárbaro' (os bárbaros, especialmente os Europeus, eram detestados pelos Chineses). Ao suprimir o contato entre Chineses e estrangeiros, e ao estabelecer o controle governamental do comércio marítimo, os primeiros governantes Ming acreditavam que propósitos maliciosos por parte dos comerciantes estrangeiros seriam barrados, e que a paz na costa Chinesa seria assegurada.

          Entre 1405 e 1433, porém, o regime Ming tinha começado a revelar um grande interesse nas atividades marítimas ao financiar sete viagens lideradas pelo eunuco Cheng Ho (1371-1433). A frota da quarta viagem (1413-1415) consistiu de 63 grandes embarcações e uma tripulação de 22670 homens, e a quinta (1421-1422) alcançou tão longe quanto a costa do Leste Africano. Apesar dessas pequenas aventuras por parte do governo, este manteve-se firmemente contrário à participação civil nas atividades marítimas. De qualquer forma, o custoso projeto de expedições foi abandonado em 1433, em parte devido ao fator financeiro. De qualquer forma, essa iniciativa demonstrou que os Chineses eram mais do que capazes de explorarem os mares e que essa exploração possuía um enorme potencial econômico.

          Com a continuação das proibições marítimas nas décadas seguintes, oficiais dentro do governo Chinês começaram a fomentar calorosos debates sobre essas políticas, porque problemas começaram a ficar rapidamente bem expostos. Além das políticas altamente restritivas estarem irritando cada vez mais as nações estrangeiras, principalmente os Britânicos - séculos mais tarde inclusive dando origem à tão famosa Guerra do Ópio (1839-1860) -, uma ameaça negligenciada ascendeu nos mares: piratas! No início do século XVI, o tráfico nos mares explodiu, e piratas Japoneses e Chineses começaram a tocar o terror nas costas da China. Armados até os dentes, os piratas foram ficando cada vez mais fortes, e as campanhas militares do governo Chinês falharam repetidas vezes em contê-los. Na década de 1560, o General Yu Ta-yu (1503-1579), reconhecido por várias vitórias contra os piratas Japoneses, abertamente chegou a admitir a qualidade superior das embarcações à vela e da tripulação Japonesa pirata. O tráfico de mercadorias valia ouro com as políticas restritivas de comércio, e isso encorajava o apelo à pirataria marítima e o grande investimento no "setor" pirata.

       


         Oficiais dentro do governo começaram a perceber que a legalização do comércio civil era mais compatível com as necessidades de segurança do que a supressão militar. Em 1567, quando o Imperador Lung-ch´ing (1567-1572 de governo) foi entronado para substituir seu intransigente pai, o Imperador Chia-ching (1522-1566 de governo), o governador da província de Fukien, T´u Tse-min (d. 1569), submeteu um memorial pedindo a abertura dos portos para o comércio marítimo. Com o apoio de diversos outros representantes governamentais já revoltados com as práticas anti-mercantilistas, a petição foi rapidamente aprovada pela corte imperial, terminando a agressiva política de restrição comercial.

          No entanto, a nova política implantada em 1567 continuava ainda bastante limitada. Apesar dos civis Chineses terem ganhado permissão para comercializar via mar, ainda era proibido aos estrangeiros comercializarem livremente na China. Para piorar, no início da década de 1590, a invasão da península Coreana pelo Japão reascendeu a vontade de alguns no governo de voltar com as rígidas proibições marítimas, sob o temor da forte Marinha Japonesa. A questão não foi levada adiante até que, em 1644, o regime Ming foi derrubado por um exército de camponeses, estes os quais, por sua vez, acabaram sendo rapidamente retirados do poder de Pequim pelos Manchus (grupo étnico com origem no nordeste da Manchúria), os quais estabeleceram a dinastia Qing (Ch´ing) no mesmo ano.

          Para deter a resistência Ming, liderada pelo lealista Cheng Ch´eng-kung - o qual ocupou a região costeira da província de Fukien -, o regime Manchu, já detendo efetivo controle continental, reviveu a política de grande restrição comercial, levando a um bloqueio marítimo para ferir a superioridade de Cheng nos mares. E, para enfraquecer ainda mais Cheng, o governo Manchu decretou, em 1661, que todos os habitantes das costas da China saíssem da região e viessem para o interior do continente. Essas políticas continuaram firmes até 1683, com a rendição de Cheng, cujo regime estava baseado em Taiwan.



        Com o fim da ameaça de Cheng, o governo Ch´ing, em 1684, voltou a liberar o comércio marítimo para os civis e inclusive permitiu que estrangeiros comercializassem em Canton, Amoy, Ningpo e Shanghai. Porém, esse maior liberalismo teve fim em 1757, quando o governo Chinês resolveu reforçar as rédeas do controle marítimo, limitando os estrangeiros/bárbaros Europeus a comercializarem livremente apenas em um único porto de Canton. Essa restrição foi imposta porque os Ingleses estavam sistematicamente evitando o comércio em Canton para se verem livres de certas demandas de costume/culturais dos oficiais Cantoneses, o que levou estes à fúria e a reclamarem com o governo central. Essa política durou até 1842, quando os Britânicos forçaram sua entrada comercial em todos os cinco portos Chineses com seus canhões, durante a Guerra do Ópio (1).


          Em meio a esse conturbado cenário político de incertezas e grandes restrições quanto à exploração comercial do mar Chinês, os piratas continuaram se proliferando ferozmente ao longo dos séculos XVI, XVII, XVIII e início do XIX. E, na costa do Sul da China, uma inesperada figura ascendeu ao poder.

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   CHING SHIH

          Apesar de existirem vários exemplos de poderosas mulheres na China, como a temida e vilanizada Chinang Ch´ing, esposa do Ditador Mao Tse-tung e líder da violenta Gangue dos Quatro, praticamente todas elas apenas conseguiram grande influência e poder sob as asas de uma elite masculina, limitadas ao poder associado e oferecido pelos seus maridos. De fato, em uma sociedade altamente patriarcal como a China, especialmente nos séculos passados, era difícil a ascensão ao poder de mulheres com real liberdade e fonte de sólida liderança, ou seja, capazes de inverter o status de dominância e influência masculina. E a mais notável exceção surgiu completamente fora da elite, em meio aos piratas.

         Ching Shih é frequentemente considerada a mais poderosa pirata que já existiu e a organização pela qual ela subiu ao poder consistia de uma confederação cujos membros chegaram a ultrapassar duas vezes mais o total de forças envolvidas na Armada Espanhola. Aproximadamente 70 mil piratas distribuídos em cerca de 1200 embarcações estavam sob a liderança direta de Ching Shih ao longo da costa da Província de Kwangtung entre 1802 e 1810. Sua influência e poder correram do submundo pirata até as entranhas do governo Chinês.


   ORIGEM DA MULHER PIRATA

          No final do século XVII, os piratas Chineses estavam servindo ao Rei do Vietnã como corsários (navios de guerra a serviço de um país com o objetivo exclusivo de pilhar navios de outros países). Essa estranha parceria teve origem a partir da Rebelião de Tayson, a qual vinha assolando o país. Na verdade, o Vietnã já vinha atravessando uma pesada crise desde 1717. Mesmo em 1789, quando os rebeldes conseguiram unificar e tomar o controle do reino Tailandês, a batalha por um herdeiro legítimo continuou. Então, em 1792, o novo governante Tayson, a fim de fortalecer o reino, tomou para seu serviço os piratas da fronteira Sino-Vietnamita.

          Fomentada pelas políticas restritivas Chinesas e pelo financiamento Vietnamita, a pirataria ao longo da costa do Sul da China explodiu ao ponto onde associações de várias centenas de pessoas e várias dezenas de juncos (embarcações tradicionais Chinesas) emergiram. Porém, apesar desse terreno fértil para os piratas se tornarem organizados, nenhum comandante das inúmeras associações despontaram entre dez ou doze líderes em potencial.

          Essa situação mudou no início do século XIX, quando, em 1801, uma jovem e bela mulher deixou sua carreira de prostituta em um dos bordeis flutuantes de Canton e resolveu marcar seu nome na história, casando-se com o pirata Cheng I (também conhecido como Zheng Yi) e se tornando uma pirata (válido lembrar que no Oriente não era considerado má sorte ter uma mulher a bordo de uma embarcação). Mas antes do casamento, Shih estipulou com Yi que ela teria o mesmo poder que ele na sua frota - o Esquadrão Bandeira Vermelha - e que as riquezas acumuladas seriam repartidas igualmente entre ambos. Cheng I, na época do casamento, era apenas um dos vários aspirantes a comandante pirata, mas sem muitas expectativas de subir ao poder. Porém, dentro de poucos meses, Cheng e Shih conseguiram planejar todo o caminho para a subida do casal ao trono, com Shih transformando a figura do seu marido na mais popular e influente entre os piratas, e ajudando a expandir sua frota inicial de dezenas para 300 juncos.






          Em julho de 1802, as forças de Tayson foram derrotadas e depostas, e a pirataria Chinesa no Vietnã chegou ao seu fim. Cheng I, auxiliado pela sua esposa, conseguiu administrar a crise que se instaurou entre os piratas, conseguindo liderá-los em um restabelecimento de poder ao longo da fronteira Chinesa. Enquanto seu marido era a principal voz e figura de liderança, Shih arquitetava e organizava as ações visando a unificação de pequenas gangues de piratas em uma grandiosa confederação que, pelo ano de 1804, chegou a englobar 400 juncos e cerca de 70 mil homens. O casal dividiu os piratas em seis esquadrões de bandeiras: Vermelha, Preta, Branca, Verde, Azul e Amarela. Cada bandeira era comandada por um líder semi-autônomo o qual, através de uma complexa série de obrigações pessoais e familiares, devia obediência à família Cheng, a qual detinha o controle direto da bandeira Vermelha. Shih e Cheng tiveram tanto sucesso em estabelecer os piratas na Província de Kwangtung  (Guangdong) que, dentro de um ano, eles levaram à queda do comandante provincial e à morte de um dos seus principais generais, Huang 'Velho Tigre'.




         Em novembro de 1807, Cheng I acabou morrendo misteriosamente. E quando todos pensaram que Shih abandonaria o cargo de liderança para dar lugar a um novo líder homem e viver o resto dos seus dias como uma viúva desconsolada, ela se impôs firmemente em frente ao trono, tomou as rédeas do Esquadrão da Bandeira Vermelha e calculou meticulosamente todos os seus passos para assegurar o seu lugar no topo da hierarquia pirata.


   A MAIS PODEROSA PIRATA

          Pouco depois de se tornar viúva, Shih intensificou suas relações pessoais de modo a legitimar seu lugar de supremacia aos olhos das dezenas de milhares de piratas sob o comando da Bandeira Vermelha e, ao mesmo tempo, fortalecer sua autoridade. Já de início, prevendo surtos de oposição à presença exclusiva de uma mulher na liderança, ela assegurou o apoio dos mais poderosos chefes a serviço de Cheng I, homens como Cheng Pao-yang e Cheng An-pang. Em seguida, e cuidadosamente balanceando todas as facções ao seu redor e habilmente fazendo sua presença ser indispensável para cada uma delas, Shih foi capaz de reter a aliança entre todas as bandeiras dos esquadrões piratas, evitando que forças de desestabilização as dispersassem e consolidando sua autoridade absoluta.

          Shih deixou duas escolhas aos líderes das bandeiras: abandonarem a confederação e morrerem, ou se unirem sob a liderança de uma mulher e se tornarem os mais poderosos piratas que já existiram.

          Para solidamente assegurar sua posição no topo da hierarquia pirata, Shih resolveu criar um novo líder para substituir a figura do seu marido como o comandante da mais poderosa frota pirata, o Esquadrão Bandeira Vermelha. Consistindo de 300 juncos e entre 20 mil e 40 mil homens, o controle desse esquadrão era um pré-requisito para o controle de toda a confederação. Nesse sentido, Shih queria alguém manipulável e que fosse da sua total confiança para comandar o Bandeira Vermelha, acatando e levando com fervor suas ordens à confederação pirata, mas que, ao mesmo tempo, impusesse autoridade por si próprio. E para essa posição só havia um homem na mente de Shih: Chang Pao.



        Pao era um humilde filho de pescador que tinha se juntado aos piratas aos 15 anos de idade, após ter sido capturado no mar por Cheng I, tornando-se pouco tempo depois seu protegido. Após iniciá-lo à ordem pirata - de acordo com alguns autores via relações homossexuais (atividades homoeróticas pareciam ser frequentes entre gangues piratas) - Cheng I o adotou como um filho e também como um amante e, por cinco anos, Chang Pao, como uma extensão da família líder, funcionou como um membro júnior da confederação, assimilando técnicas de pirataria do seu pai adotivo, e ficando conhecido como Chang Pao Tsai (literalmente, 'A Criança Chang Pao').

        Nesse sentido, em 1807, quando Shih precisava de um tenente, o então jovem Chang Pao, de 21 anos de idade, se tornou uma escolha natural, especialmente considerando que ele já tinha demonstrado ter qualidades de um bom líder, sendo também bem respeitado entre os membros da Bandeira Vermelha. Além disso, existia outra expressiva vantagem nessa escolha. Como Pao entrou na confederação como um "estrangeiro", ele não tinha desenvolvido relações de lealdade com nenhum outro líder entre as bandeiras. Tomada a decisão, Shih resolveu dar outro passo mais do que ousado para fortalecer a lealdade de Pao: passou a manter relações sexuais com seu próprio filho adotivo e ex-amante do seu falecido marido. Dentro de semanas, os dois se tornaram amantes e, mais tarde, marido e mulher.

          Assegurado o controle do Bandeira Vermelha, Shih passou a reforçar progressivamente a confederação, via a administração de um severo código de leis que otimizou a organização do sistema de trabalho e das relações pessoais entre líderes e seguidores. Através da criação desse código de leis, Shih transformou uma série de relações pessoas em uma estrutura de poder mais formal e ainda trouxe algo nunca antes visto entre os piratas: duras penalidades para quem violentasse mulheres ou as desrespeitassem no casamento. Sim, o poder de Shih era tal que ela conseguiu implementar ações feministas entre piratas chineses do início do século XIX.

         O código era sangrento e não perdoava, levando à punição e morte de vários piratas que ousassem pisar fora da linha. Segundo a nova lei:

Qualquer um dando comandos independentes ou desobedecendo os superiores seria imediatamente decapitado. Quem desafiasse a autoridade de Shih, imediatamente perdia a cabeça.

- Roubar do tesouro comum ou do fundo público (kung-hsiang), ou roubar dos moradores das vilas - os quais supriam os piratas - também eram consideradas ofensas capitais. Se você não entregasse todos os tesouros e mercadorias capturadas durante um ataque para os superiores, você era chicoteado. Se a má conduta se repetisse, você era decapitado.

- Deserção ou ausência do trabalho sem licença resultava no desfile do ofensor através dos esquadrões após ter suas orelhas cortadas. Se a má conduta se repetisse, o ofensor era decapitado.

Agressões sexuais contra mulheres prisioneiras eram também severamente punidas. Se um pirata cometesse um estupro, ele era violentamente morto.

- Se um pirata casado traísse sua mulher via mútuo consentimento entre as partes do relacionamento extra-conjugal, ambos eram sentenciados à morte (apesar de ter sido comum para os piratas tomarem as mais belas prisioneiras como prostitutas ou esposas, uma vez que um pirata escolhesse se casar, ele era obrigado a ser fiel à sua mulher).


         Além de reforçar seu novo código de lei, Shih exerceu uma ampla influência sobre os piratas ao coordenar e administrar as transações comerciais. Todos os negócios feitos, sendo feitos ou para serem feitos precisavam ter sua ciência e passar por sua aprovação. Após o fim de qualquer missão, o espólio era inspecionado por um grupo especial nomeado por Shih, e era registrado em um livro de contabilidade pelo comissário (sui-k´u). Apoiada pelo domínio militar do Esquadrão Bandeira Vermelha, Shih, sozinha, decidia para quem dar recompensas e para quem dar as punições. Quando ela falava, todos os piratas ouviam e obedeciam.

         Somando-se a isso, Shih começou a investir em um novo projeto de liderança: manipular as crenças religiosas dos seus subordinados. Para esse empreendimento, ela contou com os serviços de Chang Pao. Assim como os habitantes da China continental, os piratas no Mar da China do Sul eram extremamente apegados aos seus Deuses, nunca saindo em uma missão marítima antes da realização de preces. Para facilitar as práticas religiosas dos piratas, Pao ordenou a construção de um magnífico templo a bordo de uma das suas maiores embarcações. O enorme pagode (casa de orações no Extremo Oriente) flutuante construído sempre acompanhava a frota principal e, antes de qualquer viagem, os líderes juntavam a tripulação em frente ao templo para queimar incensos e indagar aos deuses suas chances de sucesso e o que esperar de desafios e descobertas durante a viagem. E é na consolidação desse ritual que Pao e Shih armaram uma jogada de mestre.

          Antes de cada reunião em frente ao pagode flutuante, Pao se encontrava com seus sacerdotes em segredo para estabelecer o curso de ações a ser seguido. Através dessas articulações secretas, os planos de viagem e ações durante as explorações e missões marítimas eram sempre "milagrosamente" desenrolados seguindo a "vontade" divina expressa durante os rituais, mesmo incidentes "inesperados". Desse modo, Pao, com sucesso, convenceu os piratas da sua divindade e, no processo, adicionou uma nova camada de estabilidade sobre a confederação.

          Com a autoridade política em uma mão e a autoridade religiosa na outra, Shih ramificou e ampliou ainda mais seu poder ao tomar responsabilidade pela criação de órgãos militares e  financeiros capazes de garantir eficientemente a sobrevivência diária dos piratas, independentemente da sorte. 20% dos espólios conquistados nas missões piratas iam para os agentes diretamente envolvidos e o restante ia para o tesouro conjunto. Para não dependerem apenas de riquezas capturadas e acumuladas, Shih usou seus novos órgãos para gerir o domínio do comércio provincial de sal (um produto valioso na época), estabelecendo um lucrativo negócio e garantindo uma fonte de renda estável para seus subordinados. E, a partir desse ponto, alcançou seu ápice no final da década de 1800.


   SAL E O TERROR PIRATA

          No início do século XIX, a Província de Kwangtung tinha um total de 22 produtores de sal, a maioria dos quais localizados nos municípios de Kao-chou, Lei-chou, Ch´in-chou e Lien-chou, mas com o mais rico concentrado em Tien-pai. Através de uma fortaleza montada na ilha de Nao-chou, os piratas iniciaram sucessivos ataques às embarcações saindo de Tien-pai, capturando uma atrás da outra ao ponto de que apenas 4 das 270 embarcações do governo imperial permaneceram no controle desse último. Com o terror gerado pelos ataques e com mais e mais embarcações imperiais sob o poder dos piratas, os produtores de sal tiveram que se submeter às vontades de Shih.

        Nesse sentido, com o medo de serem atacados ou terem suas mercadorias roubadas, os comerciantes de sal na província começaram a negociar diretamente com os líderes piratas, entregando grandes quantias de dinheiro para a garantia de que suas embarcações não seriam atacadas. O controle do comércio de sal estava tão preso nas mãos dos piratas que qualquer junco saindo de Canton tinha primeiro que comprar deles um certificado de 'condução segura' a um preço de 50 pratas de dólar Espanhol para cada 100 pao de sal.


         Com as enormes somas geradas pelo controle do comércio de sal em Kwangtung, os piratas ficaram cada vez mais poderosos e começaram a estender seus serviços de "proteção" para todos os juncos mercantes e pesqueiros na região, explorando-os com exigências monetárias que iam de 50 a 500 pratas de dólar Espanhol. Eventualmente, a extorsão acabou alcançando o território continental, com vilas ao longo do Rio Delta de Pérola sendo obrigadas a pagar dinheiro e arroz, com o risco de serem destruídas no caso de desobediência.

          Com um gigantesco sistema de operações financeiras no mar e fora dele, Shih resolveu dar mais um passo ousado, construindo verdadeiras centrais para a cobrança de tarifas (shui-chü) nos principais portos sob o controle da sua confederação, como Canton, e estabelecendo o quartel general pirata em Macau, onde agentes dos piratas vendiam documentos de segurança marítima para pescadores e transportadoras. Era de Macau também que os piratas reabasteciam suas munições e armas. Como a confederação também dependia dos produtores de mercadorias e serviços diversos, Shih também estabeleceu parcerias com a sociedade provincial, com os bandidos e com as sociedades secretas nas áreas em que sua organização atuava para compensar pelos altos valores cobrados nas tarifas de extorsão e deixar todo mundo se não felizes, tolerantes com a presença pirata. A esplêndida administração de Shih gerou um inacreditável acúmulo de poder e riquezas.

          Entre 1804 e 1805, a influência pirata já tinha alcançado o governo, com oficiais subornados, piratas em cargos de certos setores governamentais, altos políticos aliados, e o estabelecimento de uma força aparentemente indestrutível na costa do Sul da China. O comando e estratégias militares de Shih eram implacáveis, coordenando primorosamente juncos pesadamente armados, piratas treinados e uma massiva superioridade em números nas áreas de atuação. Dentro do Esquadrão de Chang Pao, uma das maiores divisões operacionais da confederação consistia de 1422 homens, 34 mulheres e crianças, e 36 juncos, estes os quais eram carregados com um arsenal com mais de 200 canhões e quase 1300 peças de facas, anzóis, foices, e outros acessórios. Uma segunda divisão similar consistia de 10 juncos, 670 pessoas, 127 canhões, e quase 800 armas e escudos. Essa força militar não só sustentava o sistema de tarifas como também sobrepujava a Marinha Provincial.

          No final de 1804, os piratas tinham aterrorizado tanto a Marinha Cantonesa que os almirantes, temendo um confronto direto, gastavam a maior parte do tempo fora do mar, com desculpas geralmente do tipo "estamos esperando por ventos favoráveis para velejar". Os esquadrões de batalha do governo, também não querendo entrar em confronto com os piratas, simplesmente atiravam com suas armas para cima quando viam os juncos piratas se aproximando como sinal de alerta (tipo, "estamos aqui, desviem o curso, por favor") e nunca procuravam detê-los em alto mar. Nos anos seguintes, a situação ficou tão feia que os marinheiros do governo sabotavam suas próprias embarcações para não terem que saírem no mar. O poderio de fogo e resistência de apenas um junco pirata já tinha o poder de quatro daqueles sob o controle da Marinha Provincial.

          Com nada podendo pará-los, os piratas resolveram empreender massivos ataques em terra firme sob a supervisão de Shih. Alvos favoritos eram as guarnições militares costeiras, ricas em provisões e munições, ficando comum grupos de até 300 piratas varrerem e tomar o controle de uma só vez dessas instalações, independentemente se era dia ou noite. Os ataques ocorriam geralmente através de combates corpo a corpo, mas em ocasiões especiais os maiores e mais poderosos juncos piratas vinham dar cobertura, disparando seus canhões sem descanso, enquanto os juncos menores se moviam para um assalto direto. Habitações costeiras não vinculadas aos piratas também eram atacadas, onde vilas, mercados e campos de arroz eram pilhados.

          Em 1808, os piratas alcançaram um novo nível de poder ao matar o comandante geral da Província de Chekiang, o qual estava navegando via Kwatung em uma missão especial. Seis meses depois, os piratas destruíram a maioria das embarcações alocadas para a defesa de Canton, forçando o governo a alugar juncos privados para complementar a força de segurança; dentro do espaço de 1 ano, os piratas destruíram 63 das 135 embarcações empregadas pelo governo. Já em terra firme, no coração da província, em agosto de 1809, Chang Pao levou terror a Canton ao espalhar a notícia de que os piratas pretendiam atacar a região, com o objetivo apenas de manter firme o temor da população em relação à confederação. Poucas semanas mais tarde, dentro do espaço de um dia, os piratas escoltaram cinco escunas Norte-Americanas que passavam na região - dentro da mira dos canhões de Macau -, capturaram uma embarcação pertencente ao governador Português do Timor, e bloquearam uma missão de tributos ao governo Chinês descendo um rio vinda de Siam. Nada fugia do alcance de Shih em seu território, seja Chinês ou estrangeiro.


   SAÍDA ESTRATÉGICA 

          No decorrer do ano de 1809, o poder segurado nas mãos de Shih forçou o governo da China a tomar uma decisão antes nunca cogitada. Vendo que a situação só piorava e que os piratas não conseguiam ser detidos na costa do Sul da China, os oficiais de governo tiveram que engolir o orgulho e entrar em uma série de negociações com os desprezados 'bárbaros' Europeus. Após quase uma década recusando a assistência tanto dos Britânicos quanto dos Portugueses, os Chineses acabaram ficando sem opções.

         No início de setembro, eles contactaram os Britânicos para que estes emprestassem um dos seus imponentes navios para libertar as embarcações de tributos oriundas de Siam. Após duas semanas de complexas discussões, a Companhia da Índia Oriental disponibilizou, relutante, o navio Mercúrio, em 15 de setembro, o qual era equipado com 20 canhões e trazia 50 Norte-Americanos voluntários responsáveis por manobrá-lo. Ao mesmo tempo, os Chineses assinaram um acordo com os Portugueses pela liberação de seis navios de guerra para acompanhar a Marinha Cantonesa por seis meses.




         E não só o governo Chinês estava sendo pressionado pelos piratas. Com a captura e bloqueio de várias embarcações Ocidentais, os estrangeiros também começaram a ficar bastante incomodados, especialmente a Monarquia Britânica. Em 1810, o comércio de ópio e de enlatados tinha virtualmente cessado devido às atividades piratas, forçando os Britânicos a aceitarem a oferta de Chang Pao de negociar um acordo. Nesse sentido, um oficial naval sênior e o capitão de um Indiaman (um grande navio de vela responsável por realizar comércio entre os Britânicos e Indianos) foram enviados para o navio-capitânia de Pao para a negociação. Ao longo das discussões, Chnag Pao prometeu não mais atacar a frota comercial Britânica e, para reforçar a promessa, liberou para eles um jovem Holandês capturado de uma escuna Norte-Americana há quase dois anos.

       Seguindo essa negociação com os Britânicos, os Portugueses também tinham aproveitado a oportunidade para negociarem com os piratas. Inflado pela ambição e poder, Pao chegou a inclusive a considerar a tomada do império Chinês, prometendo aos Portugueses três províncias do país caso eles emprestassem três ou quatro navios de guerra da frota em Macau. Isso foi algo, obviamente, descartado pelos Portugueses - estes os quais já estavam muito irritados com as exigências dos piratas -, mas outros acordos mais pé no chão foram fechados.

          O crescente incômodo gerado pelos piratas uniu ainda mais os Chineses, Britânicos e Portugueses em direção a uma causa comum, e eventualmente resultou em um grande embate na baía de Tigre, onde a Marinha Portuguesa, com seus navios de guerra superiores e auxiliados pelo governo Chinês, conseguiu derrotar o Esquadrão Bandeira Vermelha e expulsar os piratas dessa região, na assim posteriormente conhecida Batalha na Boca do Tigre.
       
        Nessa época, onde o governo Chinês chamava reforços armamentistas de um lado e nações estrangeiras estavam ficando irritadas do outro com a interferência dos piratas no comércio, Shih começou a perceber que era hora de começar a pensar em uma saída estratégica, mas mantendo os privilégios e riquezas conquistados com os anos de pirataria. Somando-se a isso, mesmo com sua magnífica administração, atritos iminentes começaram a despontar entre os líderes das bandeiras piratas, indicando um desgaste natural dentro do sistema. E isso piorou após a derrota na Batalha na Boca do Tigre. A única alternativa para resolver isso, na cabeça de Shih, era a rendição pacífica ao governo Chinês, mediada por um acordo que beneficiasse ambas as partes. Inicialmente os piratas resistiram à ideia de rendição, mas gradualmente começaram a aceitá-la, mas somente com a garantia de que fosse sob seus termos.

        Então, Pao e Shih iniciaram as negociações com o governo, já exigindo de início que também participassem o governador-geral de Liang-kuang, Pai Ling, e o ouvidor e segundo mais alto oficial de Macau, o Português Miguel José de Arriaga Brum da Silveira. Relutante, o governo Chinês aceitou e, em 21 de fevereiro de 1810, 260 embarcações do Esquadrão Vermelho armados com 1200 peças de suprimentos militares e 14 mil homens entraram no Rio Pérola e ancoraram próximo de Chuenpi. Nesse momento, Ling também partiu de Canton e Arriaga de Macau para o histórico encontro.

         Porém, logo após os ritos cerimoniais antes das discussões terem início, os piratas abandonaram furiosos o encontro, porque o governador-geral exigiu que eles entregassem suas embarcações e se estabelecessem pacificamente nas margens do rio. Shih e Pao consideraram os termos inaceitáveis, demandando que, pelo menos, 80 dos juncos e 5 mil dos subordinados que subiram o rio permanecessem sob o controle da confederação. Mas o impasse continuou por várias semanas, com nenhum dos lados aceitando as demandas.

         Então, Shih tomou a iniciativa e resolveu ir desacompanhada (de homens) e desarmada ao encontro do governador-geral em Canton, mesmo contra as objeções dos seus subordinados. Em 8 de abril de 1810, junto com vários outras esposas de piratas e crianças, Shih se apresentou ao mais alto oficial na Província. Através da sua incrível habilidade de argumentação e barganha, ela convenceu Ling que seu marido, Pao, permanecesse com o controle de 80 juncos para defesa e mais 40 para serem empregados no comércio de sal. Shih não cedeu a um acordo até que todas as suas exigências fossem atendidas. Ling também estava ávido por um acordo de paz, porque sabia do enorme poder que os piratas haviam acumulado, onde um conflito direto traria muitos prejuízos para sua Província.

          Fechado o acordo entre Shih e Ling, uma nova reunião foi planejada, dessa vez em Macau. O encontro ocorreu em um pagode e as negociações fluíram bem, com recompensas e benefícios sendo distribuídos no final entre as partes e um procedimento de rendição estabelecido. Mais significativamente, Pao e outros líderes piratas receberam a oferta de ocuparem postos dentro das comissões burocráticas e militares da China, algo fruto das negociações prévias de Shih. Em novembro de 1810, o Imperador recomendou a transferência de Pao para outra província, em Fukien, onde foi promovido à posição de Coronel-Tenente no Regimento Min-an. Pouco tempo depois, Pao foi promovido à Coronel e enviado à região de Pescadores, onde ficou responsável pela defesa dessa estratégica ilha. Essa ascensão meteórica de Pao na hierarquia militar da China inclusive incomodou alguns oficiais de governo, considerando a origem criminal do ex-pirata.

          Shih tinha alcançado o ápice do seu jogo de poder. Ascendendo como a mais poderosa pirata no início do século XIX, acumulando enormes riquezas e privilégios, lançando terror e acuando o governo Chinês por anos, para, logo em seguida, conseguir perdão por todos os crimes de pirataria e ainda ter sua principal e mais leal peça de manipulação, Pao, ocupando um alto cargo no governo que até pouco anos atrás estava sendo pesadamente atacado pela pirataria. Para garantir o máximo de benefícios oriundos da patente do seu marido, Shih conseguiu também o reconhecimento governamental do seu casamento com um oficial (ming-sao), em 1821, mesmo isso sendo ilegal para ex-viúvas. Isso completou a vitória de Shih.


   DESCANSO FINAL DE SHIH   

         Para o descontentamento de Shih, Pao acabou morrendo em 1822, obrigando-a a retornar para sua casa em Kwangtung e focar na criação do seu único filho, o qual tinha na época 11 anos de idade (é reportado que mais tarde ela também teve uma filha). Ela queria que ele fosse um oficial ainda melhor do que o seu pai e levasse adiante o nome da família com honra e glórias. Ao longo da sua 'aposentadoria', mesmo não possuindo mais influência no governo, viveu em fartura, já que reteve as riquezas acumuladas ao longo da sua vida de pirataria, e chegou a abrir até mesmo uma luxuosa e grande casa de apostas em Kwangtung. Acabou morrendo em 1844, com 69 anos de idade. Seu filho ficou perdido na história.

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   CONCLUSÃO

        Mesmo tendo uma origem humilde, pouca escolaridade e ser uma ex-prostituta, Ching Shih se tornou, por mérito próprio, uma das mais poderosas mulheres na história, unindo os piratas Chineses e Vietnamitas em uma temida confederação; invertendo o papel da mulher na época, ao ser responsável pela construção de dois poderosos e influentes homens (Cheg I e Chang Pao) - não o contrário -; habilmente expandindo as atividades piratas para o setor comercial legal e para dentro do próprio governo; e finalmente conseguindo sair da pirataria sem punições, com uma grande fortuna e ainda regada de privilégios do governo. Infelizmente, devido ao fato dela ter sido uma mulher em um sistema de poder quase exclusivo dos homens, seu nome é por muitas vezes esquecido quando piratas são referenciados, mesmo ela sendo o mais poderoso deles que já velejaram pelos mares. 

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CURIOSIDADE: Ching Shih não foi a única mulher pirata de destaque na história. Anne Bonny (1690-1780) e Mary Read (1680-1721) são dois exemplos a serem citados nesse sentido, e consideradas entre as mais (ou as mais) temidas piratas no Atlântico (Ref.11). Ambas atuaram sob o comando do Capitão "Calico Jack" Rackam no Mar do Caribe. Bonny nasceu em Cork, Irlanda, mas se mudou ainda bem jovem com o pai para uma região de plantação na colônia da Carolina, América do Norte. Ela passou a se aventurar nos mares após ser deserdada pelo seu pai por ter se casado com um marinheiro; o casal fugiu para a Jamaica, onde passaram a se envolver com a pirataria. Read nasceu na Inglaterra e se juntou à tripulação de um navio de batalha ainda adolescente para trabalhar como um 'menino de cabine'; o navio foi eventualmente atacado por piratas e Read decidiu se juntar a eles. Read se encontrou com Rackam e Bonny no Caribe, unindo-se a esses dois. 


          Bonny e Read foram capturadas e julgadas por pirataria junto com Rackam e o resto da tripulação em 1720. No entanto, as duas mulheres escaparam da execução porque estavam grávidas. Read morreu pouco tempo depois na prisão devido a uma doença desconhecida ou por complicações da gravidez. Já sobre Bonny, existe o rumor de que foi libertada da prisão após seu pai pagar a fiança e levá-la para viver com ele na Carolina. 

> Bonny, Read e Rackam foram retratados entre as personagens protagonistas na série Black Sails (Starz, 2014), baseada no romance A Ilha do Tesouro (1883), de Robert Louis Stevenson.
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REFERÊNCIAS ACADÊMICAS
  1. http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/084387148900100105 
  2. https://link.springer.com/chapter/10.1057/9781137339928_8 
  3. https://www.jstor.org/stable/41298765
  4. http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/084387149200400108 
  5. https://museumhack.com/ching-shih-greatest-pirate/
  6. https://www.nmrn.org.uk/research/piracy
  7. http://blog.hmns.org/2011/01/piracy-in-the-far-east-a-family-affair-women-pirates-part-2/
  8. https://girlmuseum.podbean.com/e/ching-shih-fiercest-pirate-on-the-seven-seas/
  9. https://www.nmrn-portsmouth.org.uk/sites/default/files/Piracy.pdf
  10. https://repositorio.animaeducacao.com.br/handle/ANIMA/17468
  11. Vencel, Wendy (2018). "Women at the Helm: Rewriting Maritime History through Female Pirate Identity and Agency". Undergraduate Honors Thesis Collection. 452. https://digitalcommons.butler.edu/ugtheses/452