Cuidado ao lidar com o abacate, alertam médicos

- Atualizado no dia 25 de julho de 2024 -

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Nos últimos anos, um fenômeno vem chamando a atenção da comunidade médica e ganhando recorrente destaque na mídia popular, especialmente nos EUA. Recebendo o apelido de 'Avocado Hand' (literalmente 'Mão de Abacate'), muitas pessoas estão reportando profundos cortes nas mãos resultados do manuseio inapropriado dessa fruta, esta a qual está se tornando muito popular em diversos países.

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ABACATE

O abacate (Persea americana) é um planta nativa da América Central e das Ilhas da Índia Ocidental. Registros históricos sobre a fruta datam do início dos anos de 1500 quando os conquistadores Espanhóis conquistaram os Impérios Inca e Asteca e encontraram o abacate sendo extensivamente cultivado. Registros arqueológicos do seu consumo datam de 12000 a.C. Se espalhou para os EUA a partir do século XIX e hoje é encontrado ao redor de todo o mundo onde as condições de cultivo são favoráveis.

De acordo com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), o Brasil é o terceiro maior produtor de frutas do mundo - ficando atrás apenas da China (1°) e da Índia (2°) -, englobando também uma grande produção de abacate (12° entre as frutas mais cultivadas), principalmente as variedades Avocado, Breda, Fortuna, Geada, Margarida e Quintal. Porém, o consumo percapto dessa fruta aqui no território brasileiro é ainda baixo (0,301 gramas/ano) comparado com cerca de 8 quilos/ano no México e 7 quilos/ano nos EUA.

Amadurecendo apenas depois de colhido, o abacate está se tornando cada vez mais popular no mundo após ganhar o título de 'super-alimento', por conter grande quantidade de lipídios saudáveis (60-84% do seu óleo é composto de ácidos graxos insaturados), e ser rico em vitaminas lipossolúveis A, D, E e K, vitaminas do complexo B e em proteínas (1-3%). Nos EUA, por exemplo, o consumo percapto dessa fruta subiu de <1 quilos/ano no período de 2001-2003 para aproximadamente 4,5 quilos/ano em 2020.

Produção, importação e consumo de abacate nos EUA. Nos últimos 20 anos, o consumo de abacate triplicou no país. Fonte: USDA, Ref.7

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AVOCADO HAND

Com o crescimento do consumo e devido às características físicas dessa fruta, os hospitais vêm atendendo um crescente número de casos envolvendo pessoas que estão se cortando seriamente ao manusear o abacate. Mas isso não é culpa da fruta em si, mas sim do descuido das pessoas - principalmente aquelas sem experiência de manuseio com a fruta - ao cortá-la com facas. Ao segurar a fruta em um mão (não-dominante) e aplicar o corte de faca com a outra (dominante), a pessoa pode acabar se cortando facilmente se a foça aplicada for muita: a polpa é muito macia e a casca é facilmente cortável. Os acidentes mais comuns parecem ocorrer quando o indivíduo tenta retirar a grande semente no centro da polpa com a faca, aplicando grande força perpendicular e desnecessária.

Em 2018, ganhou destaque o comentário do cirurgião plástico Britânico Simon Eccles (Ref.5), descrevendo o atendimento de ~4 pacientes por semana no Hospital Chelsea e Westminster, Reino Unido, para o tratamento dos cortes acidentais envolvendo o abacate, com alguns deles bem sérios. A equipe médica do hospital também passou a referenciar o fenômeno de 'Avocado Hand'. O que no começo parecia ser apenas um boato infundado, rapidamente se confirmou uma real e relativamente significativa preocupação de saúde pública. Aliás, casos de destaque do Avocado Hand já eram reportados desde 2012, quando a famosa e premiada atriz Meryl Streep se cortou ao lidar com a fruta e em coletivas de fotos chegou até a esconder a mão machucada. Vários outros casos envolvendo celebridades também têm realçado o problema na mídia.

Em dezembro de 2018, no periódico Irish Medical Journal (Ref.6), foi publicado o primeiro reporte na literatura médica alertando sobre o Avocado Hand, no caso descrevendo uma mulher de 32 anos de idade que deu entrada no Hospital de Beaumont, Dublin, Irlanda, com um sério corte na mão feito durante o preparo de um abacate. A paciente recebeu um reparo no nervo digital sob anestesia local e teve uma completa recuperação.

Em 2020, um estudo publicado no periódico The American Journal of Emergency Medicine (Ref.8) classificou os casos crescentes de lesões na mão envolvendo abacates como uma epidemia nos EUA. Analisando dados de registros médicos do Sistema Eletrônico Nacional de Vigilância a Lesões (NEISS) entre os anos de 1998 e 2017, os pesquisadores estimaram mais de 50,4 mil acidentes relacionados ao manuseio de faca durante a preparação de abacates, além de uma dramático aumento na taxa de acidentes: 3143 em 1998-2002 para 27059 em 2013-2017. Esse aumento na taxa provavelmente acompanhou o aumento de consumo da fruta nos EUA. Acidentes eram muito mais comuns na mão esquerda (e provavelmente na mão não-dominante). Quase 33% dos acidentes envolveram pessoas do sexo feminino na faixa de 23-39 anos de idade - provavelmente os consumidores mais comuns de abacate e/ou mais prováveis de buscar atendimento médico após lesões.

Outro estudo também publicado em 2020, analisando dados de hospitais nos EUA, encontrou mais de 49,3 mil casos em departamentos de emergência envolvendo lesões de Avocado Hand entre 2000 e 2017 (Ref.9). Os autores do estudo estimaram que nos últimos anos esse tipo de lesão [abacate] têm constituído quase 2% de todas as lesões atendidas nos departamentos de emergência dos hospitais nos EUA. Em muitos dos casos as lesões eram relativamente severas, incluindo laceração de tendões, nervos ou artérias.

Um estudo Britânico publicado em 2020 no periódico The Journal of Hand Surgery (Ref.10), analisando dados prospectivamente coletados de três centros hospitalares no Reino Unido ao longo de 4 anos, descreveu 35 pacientes e 42 lesões relacionadas ao ato de cortar abacates. A maioria dos pacientes (88%) eram do sexo masculino e a maior parte das lesões (85%) ocorreram durante a remoção da semente. Todas as lesões ocorreram na mão não-dominante e precisaram de intervenção cirúrgica. Estruturas vitais como tendões, nervos dos dedos, polias e cápsulas articulares eram frequente implicadas, requerendo exploração ou reparo.

Considerando o amontoado de casos reportados na mídia e nos hospitais, e a severidade das lesões, os cirurgiões da Associação Britânica de Cirurgias Plásticas Reconstrutivas e Estéticas passaram a pedir para que avisos de segurança sejam colocados nas embalagens de abacates ou em locais onde a fruta é vendida.

Em entrevista recente ao Wral News (Ref.11), uma cirurgiã Norte-Americana da Universidade de Washington realçou o crescente problema ao relatar que estava atendendo de 15 a 20 casos de lesões anualmente envolvendo cortes na mão durante preparo do abacate, apenas no hospital onde atua, e apontando também que um número muito grande de casos que não buscam atendimento médico provavelmente estão ocorrendo. Esse relato suporta a noção de uma epidemia de Avocado Hand nos EUA.

Portanto, fique atento: se vai saborear um nutritivo e saboroso abacate, cuidado com a faca!

REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS