Artigos Recentes

Raposa-do-Ártico





A Raposa-do-Ártico (Vulpes lagopus) é considerada um dos mamíferos mais bem adaptados ao rigoroso frio das regiões do extremo norte do globo. Enfrentando temperaturas que podem chegar a 50-70°C negativos, elas são um dos mais reconhecíveis habitantes do Ártico - em áreas de tundra -, junto com os ursos-polares. É um dos dois canídeos que habitam a região norte circumpolar, com o o outro sendo a raposa-vermelha (Vulpes vulpes).

Medindo entre 46 e 55 cm de comprimento, cauda de ~30 cm, e massa corporal de 3-5 kg quando adulta, o corpo dessa raposa é altamente adaptado para os rigorosos invernos do seu habitat. A raposa-do-Ártico possui:

- uma densa camada de pelos considerada um dos melhores isolantes térmicos entre os mamíferos;

- uma farta reserva de gordura no corpo;

- uma área superficial pequena em relação ao volume do corpo (pernas e orelhas curtas, dando um formato mais compacto, o que garante menor perda de calor para o ambiente);

- um sistema especial de circulação sanguínea que ajuda a "prender" o calor interno;

- e, similar aos ursos-polares, possuem uma pele escura sob a pelagem, capaz de melhor absorver calor da radiação solar incidente.

Com todas essas adaptações, a V. vulpes é um dos poucos mamíferos da região Ártica que não hibernam durante os períodos de clima mais severo. Expectativa de vida é tipicamente de 3-5 anos no ambiente selvagem, mas em cativeiro a raposa-do-Ártico pode alcançar 9-12 anos.

Mantendo-se ativa o ano todo, as raposas-do-Ártico se alimentam de uma ampla variedade de presas, incluindo roedores da subfamília Arvicolinae (em especial lêmingues), aves, peixes, ovos e até mesmo carcaças de animais como cervos e alces deixadas por outros predadores da região, como lobos e ursos polares. Durante os períodos mais quente do ano, com maior fartura de alimento, elas chegam a aumentar a massa do corpo em cerca de 50%, visando reserva calórica extra para o inverno.

A pelagem dessa espécie varia ao longo do ano. Durante o inverno, onde a quantidade de neve é abundante, a pelagem fica branca ou creme ("tipo branco"), e proporciona uma excelente camuflagem. Durante os períodos de verão, a pelagem se torna bem escura, assumindo um tom bem amarronzado ou acinzentado, como observado nas fotos abaixo. Algumas variações apresentam uma pelagem meio cinza-zulada o ano inteiro ("tipo azul"), ficando mais escura no verão, geralmente em regiões de clima menos severo. A pelagem do tipo branca é a mais comum (até 90% dos indivíduos); variantes no gene MC1R controlam a coloração da pelagem nessa espécie (Ref.6).


À esquerda, uma pelagem do tipo azul, no verão, e, à direita, uma pelagem do tipo branca, no inverno. 

Fotos ilustrando os dois polimorfismos de cor mais comuns da raposa-do-Ártico: (a-b) Tipo branco: em (a), pelagem de verão e, em (b) pelagem de inverno; (c-d) Tipo azul: em (c), pelagem de verão e, em (d), pelagem de inverno. Ref.: DOI

De modo geral, a população de raposas-do-Ártico não está em perigo de extinção. Mas nos países Nórdicos, um dramático declínio populacional foi historicamente testemunhado.

No final do século XIX, na Escandinávia (Noruega, Finlândia, Dinamarca, Suécia) a população experienciou um forte gargalo demográfico e genético devido à intensa caça e comércio de pele. Nesse processo, a população foi reduzida de >10 mil indivíduos para apenas algumas centenas persistindo de forma altamente fragmentada na região. Ao longo da primeira metade do século XX, a espécie foi ganhando status de proteção nos países Nórdicos, mas mesmo assim a população de raposas-do-Ártico continuou declinando, situação agravada pela baixa diversidade genética e competição por recursos alimentares com outros predadores, como raposas-vermelhas (Ref.7). É estimado que no final do século XX, apenas 40-60 indivíduos sobraram em toda a Escandinávia (Ref.8). Esforços de conservação começaram a dar resultados positivos a partir de 2006.

O WWF vem fazendo campanhas para promover ações de conservação desses animais na Escandinávia (Ref.3). Algumas subespécies encontradas no norte da Rússia também encontram-se em perigo de desaparecer. Existem atualmente 8 subespécies reconhecidas de V. lagopus (Ref.9). Os principais inimigos da raposa-do-Ártico são as atuais mudanças climáticas e a persistente caça humana pela sua pele, cujo valor continua alto no mercado ilegal.

As populações modernas de raposas-do-Ártico são geneticamente similares, com exceção de grupos em regiões isoladas nas Ilhas Commander, as quais não são conectadas ao continente por gelo marinho. A habilidade dessas raposas de migrar por longas distâncias (~90 km/dia) é uma possível causa para essa similaridade genética de diferentes populações (Ref.10). Um único indivíduo fêmea chegou a viajar continuamente por 3500 km, da Noruega até o Canadá (Ref.9).




*´Peso´, neste artigo, está se referindo ao uso popular da palavra, ou seja, para indicar a ´massa´ do corpos aqui na Terra (já que a variação da força-peso na superfície do nosso planeta é bem pequena)