O que é o Desvio para o Vermelho na Astronomia?
- Atualizado no dia 14 de julho de 2023 -
Compartilhe o artigo:
Quem gosta de Astronomia sempre se depara com o termo 'Desvio para o vermelho', ou Redshift ou Redshifting em inglês. Galáxias muito distantes possuem velocidade e distância relativas estimadas a partir desse desvio, mas o que exatamente esse desvio significa?
Todos aqui já devem ter notado que o som da sirene de uma ambulância ou de um carro de polícia, à medida que o veículo vai se afastando ou se aproximando de você, muda de forma significativa. Isso ocorre por causa de uma mudança de frequência das ondas sonoras associadas. Assim, quando o carro de ambulância vem com sua sirene ligada (fonte do som) ao seu encontro (receptor do som), as ondas sonoras são "amontoadas" e, consequentemente, o comprimento de onda associado diminui, aumentando a frequência (som percebido mais agudo). Já quando a ambulância está se afastando de você, as ondas sonoras são "afastadas", aumentando o comprimento de onda associado e, consequentemente, a frequência diminui (som percebido mais grave).
De forma similar, isso acontece com a luz emitida pelos corpos no Universo. A luz, formada por fótons, é também uma onda e possui uma frequência característica para cada tipo de região do espectro de radiação eletromagnética (1). No espectro visível, a cor azul, por exemplo, possui uma maior frequência que a cor vermelha e, portanto, possui também maior energia. Caso uma fonte luminosa esteja indo de encontro a você, a frequência dos fótons emitidos aumentará, e caso a mesma fonte luminosa esteja se afastando de você, a frequência diminuirá. Mas como a velocidade da luz é altíssima (~3x108 m/s), não observamos um efeito Doppler no nosso cotidiano, porque as velocidades de objetos observáveis aqui na superfície do nosso planeta são muito pequenas. Mas quando consideramos o contexto intergaláctico, as enormes velocidades de afastamento das galáxias, por exemplo, produzem um efeito Doppler na luz emitida (melhor chamado de Desvio para o Vermelho, ou Redshift) bem notável.
O Desvio para o vermelho é representado pela letra z na astronomia e relaciona a diminuição da frequência das partículas de fótons com a velocidade de afastamento das galáxias. E é válido notar neste ponto que esse desvio não necessariamente tende a ir apenas para a região do vermelho no espectro e, sim, apenas indica que a frequência da radiação eletromagnética está diminuindo. Mas cuidado! Esse afastamento das galáxias não indica a velocidade intrínseca dessas estruturas, mas, em maior grau de importância, a expansão do Universo, prevista já em 1929 por Edwin Hubble. Em outras palavras, duas galáxias podem estar paradas relativamente entre si, mas a expansão do espaço entre elas força o afastamento uma em relação à outra (2). Por isso fica melhor dizermos que a velocidade de afastamento entre as galáxias provoca o redshift. O alargamento do espaço no Universo acarreta no alargamento do comprimento de onda dessas radiações.
Porém, no final desse assunto, precisamos ficar atentos com três pontos:
I. Assim como no efeito Doppler para as ondas sonoras, o desvio para o vermelho pode ser um desvio para o azul, ou seja, um aumento de frequência, em certas situações. No Universo, veremos mais um redshift por causa da expansão do mesmo, mas planetas, estrelas e galáxias próximas podem produzir um ´blueshift´, caso estejam vindo de encontro a nós.
II. Existe também o redshift gravitacional, onde um fóton perde energia ao tentar escapar de um campo gravitacional. Com a perda de energia, a frequência dos fótons nesse campo diminui. Quanto mais forte o campo, mais energia será perdida durante a resistência criada, aumentando o redshift. Esse fenômeno é resultado direto da dilatação gravitacional do tempo - prevista na Teoria da Relatividade Geral - onde o tempo é acelerado à medida que nos movemos para longe de uma fonte gravitacional isolada. Como a frequência é o inverso do tempo (1/t), esta é reduzida em uma área de maior potencial gravitacional (3).
III. A Lei de Hubble pode sofrer desvios consideráveis em largas escalas, o qual estará associado com a massa total do Universo. Aliás, os desvios no plot do gráfico esperado da velocidade (redshift) vs distância dá importantes informações sobre a quantidade de matéria no Universo, algo com grande utilidade para o entendimento da estranha matéria escura, por exemplo.
JAMES WEBB E GALÁXIAS DISTANTES
(2) Isso também é importante para esclarecer a confusão que muitos fazem ao afirmarem que diversas galáxias no Universo quebram as "regras" da Teoria da Relatividade Especial por alcançarem uma velocidade de afastamento maior do que a velocidade da luz, esta a qual deveria ser o limite máximo de velocidade no Universo. Porém, enquanto existem galáxias se afastando de nós, por exemplo, a velocidades maiores do que aquela da luz, isso não representa a velocidade intrínseca desses corpos, mas, sim, isso ocorre devido à expansão do próprio espaço entre as galáxias (O que é a Expansão do Universo?).
(3) Para saber mais sobre o assunto, acesse: Qual a relação entre GPS, Núcleo Terrestre e Teoria da Relatividade?
Quem gosta de Astronomia sempre se depara com o termo 'Desvio para o vermelho', ou Redshift ou Redshifting em inglês. Galáxias muito distantes possuem velocidade e distância relativas estimadas a partir desse desvio, mas o que exatamente esse desvio significa?
Todos aqui já devem ter notado que o som da sirene de uma ambulância ou de um carro de polícia, à medida que o veículo vai se afastando ou se aproximando de você, muda de forma significativa. Isso ocorre por causa de uma mudança de frequência das ondas sonoras associadas. Assim, quando o carro de ambulância vem com sua sirene ligada (fonte do som) ao seu encontro (receptor do som), as ondas sonoras são "amontoadas" e, consequentemente, o comprimento de onda associado diminui, aumentando a frequência (som percebido mais agudo). Já quando a ambulância está se afastando de você, as ondas sonoras são "afastadas", aumentando o comprimento de onda associado e, consequentemente, a frequência diminui (som percebido mais grave).
Esse efeito de mudança da frequência sonora dependente das velocidades relativas entre os referenciais adotados (emissores e receptores), é chamado de Efeito Doppler, primeiro descrito em 1842 pelo Físico Austríaco Christian Doppler. Se uma fonte sonora e um receptor estão se movendo, um em relação ao outro, a frequência recebida não é a mesma frequência da fonte. Se eles estão se aproximando, a frequência recebida é maior do que a frequência da fonte; se eles estão se afastando, a frequência recebida é menor do que a frequência da fonte.
Esse efeito é amplamente usado para se medir velocidades, geralmente pela reflexão de uma onda transmitida por um objeto em movimento (ex.: ultrassom para o sangue nas artérias e radar para detectar a rapidez de um veículo). No caso dos radares de trânsito, as ondas emitidas pelo transmissor atingem o carro em movimento; o carro, então, atua tanto como um receptor em movimento quanto como uma fonte em movimento, quando a onda reflete nele de volta para o receptor do radar. A relação entre frequência emitida e percebida e velocidade do receptor e da fonte no efeito Doppler para ondas sonoras é dada pela equação abaixo:
- Continua após o anúncio -
De forma similar, isso acontece com a luz emitida pelos corpos no Universo. A luz, formada por fótons, é também uma onda e possui uma frequência característica para cada tipo de região do espectro de radiação eletromagnética (1). No espectro visível, a cor azul, por exemplo, possui uma maior frequência que a cor vermelha e, portanto, possui também maior energia. Caso uma fonte luminosa esteja indo de encontro a você, a frequência dos fótons emitidos aumentará, e caso a mesma fonte luminosa esteja se afastando de você, a frequência diminuirá. Mas como a velocidade da luz é altíssima (~3x108 m/s), não observamos um efeito Doppler no nosso cotidiano, porque as velocidades de objetos observáveis aqui na superfície do nosso planeta são muito pequenas. Mas quando consideramos o contexto intergaláctico, as enormes velocidades de afastamento das galáxias, por exemplo, produzem um efeito Doppler na luz emitida (melhor chamado de Desvio para o Vermelho, ou Redshift) bem notável.
O Desvio para o vermelho é representado pela letra z na astronomia e relaciona a diminuição da frequência das partículas de fótons com a velocidade de afastamento das galáxias. E é válido notar neste ponto que esse desvio não necessariamente tende a ir apenas para a região do vermelho no espectro e, sim, apenas indica que a frequência da radiação eletromagnética está diminuindo. Mas cuidado! Esse afastamento das galáxias não indica a velocidade intrínseca dessas estruturas, mas, em maior grau de importância, a expansão do Universo, prevista já em 1929 por Edwin Hubble. Em outras palavras, duas galáxias podem estar paradas relativamente entre si, mas a expansão do espaço entre elas força o afastamento uma em relação à outra (2). Por isso fica melhor dizermos que a velocidade de afastamento entre as galáxias provoca o redshift. O alargamento do espaço no Universo acarreta no alargamento do comprimento de onda dessas radiações.
E como esse efeito pode ser traduzido para a medição da distância e da velocidade das galáxias em relação à Terra?
Primeiro, é preciso entender que o redshift não pode ser calculado a partir da equação adotada para o efeito Doppler de ondas sonoras, isso porque a velocidade da luz (c) é constante em um meio independentemente do referencial. Além disso, o intervalo de tempo entre a emissão de cristas sucessivas, que é T=1/f no referencial da fonte, é diferente no referencial do receptor quando os dois referenciais estão em movimento relativo, por causa da dilatação do tempo e da contração do comprimento relativísticos. Nesse sentido, o tratamento matemático é baseado em cálculos relativísticos, derivados da Teoria da Relatividade Especial. No 'efeito Doppler relativístico', a frequência recebida depende apenas da rapidez relativa de aproximação (ou de afastamento) u, e relaciona-se com a frequência emitida por:
(!) Leitura recomendada: Qual a diferença entre as Teorias da Relatividade Geral e da Relatividade Especial?
Finalmente, recorrendo à Lei de Hubble, é possível medir a distância onde se encontra galáxias distantes se conhecermos a velocidade de afastamento desses corpos, através da fórmula v = H x d, onde v é a velocidade da galáxia, H é a constante de Hubble e d é a distância da galáxia em relação ao nosso planeta. A constante de Hubble é ainda um tanto incerta em seu real valor, mas fica em torno de 65 km/s para cada megaparsec de distância (1 megaparsec é igual a 3 milhões de anos-luz). Ou seja, uma galáxia a 1 megaparsec de distância de nós estará se afastando a uma velocidade de 65 km/s, enquanto uma a 100 megaparsec estará com uma velocidade de afastamento 100 vezes maior. Para, então, determinar a velocidade de um corpo no Universo, precisamos apenas conhecer sua velocidade e esta pode ser estimada pelo redshift associado à radiação eletromagnética emitida por esse corpo. Ao analisar o espectro luminoso sendo emitido pelas galáxias, por exemplo, os astrônomos conseguem determinar a intensidade do redshift e, portanto, podem estimar a velocidade de afastamento. Jogando o valor encontrado na fórmula acima mencionada, encontramos a distância entre essa galáxia e nós (Fig.1).
Figura 1. Relação entre redshift [desvio para o vermelho] e distância em anos-luz (e idade do universo associada à fonte luminosa). |
- Continua após o anúncio -
Porém, no final desse assunto, precisamos ficar atentos com três pontos:
I. Assim como no efeito Doppler para as ondas sonoras, o desvio para o vermelho pode ser um desvio para o azul, ou seja, um aumento de frequência, em certas situações. No Universo, veremos mais um redshift por causa da expansão do mesmo, mas planetas, estrelas e galáxias próximas podem produzir um ´blueshift´, caso estejam vindo de encontro a nós.
II. Existe também o redshift gravitacional, onde um fóton perde energia ao tentar escapar de um campo gravitacional. Com a perda de energia, a frequência dos fótons nesse campo diminui. Quanto mais forte o campo, mais energia será perdida durante a resistência criada, aumentando o redshift. Esse fenômeno é resultado direto da dilatação gravitacional do tempo - prevista na Teoria da Relatividade Geral - onde o tempo é acelerado à medida que nos movemos para longe de uma fonte gravitacional isolada. Como a frequência é o inverso do tempo (1/t), esta é reduzida em uma área de maior potencial gravitacional (3).
III. A Lei de Hubble pode sofrer desvios consideráveis em largas escalas, o qual estará associado com a massa total do Universo. Aliás, os desvios no plot do gráfico esperado da velocidade (redshift) vs distância dá importantes informações sobre a quantidade de matéria no Universo, algo com grande utilidade para o entendimento da estranha matéria escura, por exemplo.
JAMES WEBB E GALÁXIAS DISTANTES
Em uma série de estudos publicados recentemente no periódico The Astrophysical Journal Letters (Ref.6-8), pesquisadores estão reportando galáxias capturadas pelo Telescópio Espacial James Webb (4) com redshifts fotométricos [desvio para o vermelho] iguais ou superiores a Z = 14, indicando galáxias que emergiram pouco tempo depois do Big Bang, dentro de 300 milhões anos de idade do Universo (estimado ter ~13,8 bilhões de anos de idade). Um desses candidatos galácticos, chamado de Galáxia de Maisie e com Z = 14, foi determinado com alto grau de confiança ter menos de 300 milhões de anos pós-Big Bang, provavelmente 280 milhões de anos (Fig.2). Mais notavelmente, em um total de 88 candidatos galácticos amplificados (lente gravitacional) pelo agrupamento de galáxias SMACS
0723-73, os pesquisadores detectaram valores de Z variando de 11 até 20 (Ref.7). Um valor de Z = 20 significa que o James Webb capturou galáxias que existiram menos de 200 milhões após o Big Bang!
Figura 2. Imagem da Galáxia de Maisie (azul, na sua cor mais realista), obtida pelo James Webb. Ref.6 |
Figura 3. (A) Imagem ampliada captura pelo James Webb na faixa do infravermelho-próximo, com detecção de galáxias tão distantes e antigas quanto 470 milhões a 675 milhões de anos pós-Big Bang (Z ≃ 8−10). (B) Imagem destacada associada à galáxia CEERS 1019, com o mais antigo buraco negro já detectado, no caso um supermassivo buraco negro ativo com 9 milhões de massas solares e formado 570 milhões de anos pós-Big Bang (Z > 6). Ref.8 |
-----------
(1) A luz, visível ou não, é uma radiação eletromagnética formada por pacotes de energia chamados 'fótons'. Os fótons são partículas e, ao mesmo tempo, são ondas, mostrando comportamentos físicos de ambos os perfis.(2) Isso também é importante para esclarecer a confusão que muitos fazem ao afirmarem que diversas galáxias no Universo quebram as "regras" da Teoria da Relatividade Especial por alcançarem uma velocidade de afastamento maior do que a velocidade da luz, esta a qual deveria ser o limite máximo de velocidade no Universo. Porém, enquanto existem galáxias se afastando de nós, por exemplo, a velocidades maiores do que aquela da luz, isso não representa a velocidade intrínseca desses corpos, mas, sim, isso ocorre devido à expansão do próprio espaço entre as galáxias (O que é a Expansão do Universo?).
(3) Para saber mais sobre o assunto, acesse: Qual a relação entre GPS, Núcleo Terrestre e Teoria da Relatividade?
(4) O Telescópio Espacial James Webb faz registros do universo em uma ampla faixa do infravermelho, complementando as observações do Telescópio Hubble. Para mais informações: Primeira imagem histórica do Telescópio James Webb é finalmente liberada
------------
Artigos Recomendados:
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
Artigos Recomendados:
- Nosso Universo possui 10 vezes mais galáxias do que antes previsto!
- O que são as Matéria e Energia Escuras?
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
- http://starchild.gsfc.nasa.gov/docs/StarChild/questions/redshift.html
- http://www.esa.int/Our_Activities/Space_Science/What_is_red_shift
- http://coolcosmos.ipac.caltech.edu/cosmic_classroom/cosmic_reference/redshift.html
- https://einstein.stanford.edu/content/relativity/q56.html
- Paul A.Tipler - Física para cientistas e engenheiros – Quarta edição; V1.
- Finkelstein et al. (2022). A Long Time Ago in a Galaxy Far, Far Away: A Candidate z ~ 12 Galaxy in Early JWST CEERS Imaging. The Astrophysical Journal Letters, Volume 940, Number 2. https://doi.org/10.3847/2041-8213/ac966e
- Yan et al. (2023). First Batch of z ≈ 11–20 Candidate Objects Revealed by the James Webb Space Telescope Early Release Observations on SMACS 0723-73. The Astrophysical Journal Letters, Volume 942, Number 1. https://doi.org/10.3847/2041-8213/aca80c
- https://iopscience.iop.org/collections/apjl-230504-220_Focus-on-CEERS-JWST-Survey