YouTube

Artigos Recentes

PeRP: O medicamento que previne a infecção pelo HIV


- Artigo atualizado no dia 12 de julho de 2020 -

Compartilhe o artigo:



          Ainda hoje, muitos não sabem que já existe uma opção medicamentosa de prevenção à infecção pelo HIV - vírus causador da AIDS. O PrEP (Preexposure Prophylaxis, traduzido do inglês como 'Profilaxia de Preexposição') é um medicamento para uso diário usado na prevenção dessa doença, sendo de especial interesse para os indivíduos incluídos nos grupos de risco em relação à contaminação com o vírus HIV. Se usado diariamente, a droga diminui os riscos de contrair o vírus em mais de 90%, com estudos clínicos encontrando uma eficácia que varia de 92% a 100%!

         O medicamento em questão visa os grupos de maior risco de contrair o HIV, e entra como mais uma arma de combate à Aids (1). Entre eles, podemos citar os gays e bissexuais (o sexo anal aumenta ainda mais os riscos de contaminação), usuários de drogas injetáveis, e pessoas que fazem sexo desprotegido com múltiplos parceiros (2). O PrEP deve ser usado somente em indivíduos que não possuem o HIV (um teste deve ser feito antes) e o uso deve ser diário. Esse método se torna ainda mais efetivo se combinado com outras medidas de prevenção, como as camisinhas, tratamento dos soropositivos, intervenção de grupos de ajuda para o abandono do vício de drogas, PEP e circuncisão (a retirada cirúrgica da pele recobrindo a glande do pênis diminui bastante o risco de transmissão do HIV).


        Após o início do uso da PrEP o efeito protetivo só começa após o sétimo dia de uso diário do medicamento para as relações envolvendo sexo anal. Já para as relações envolvendo sexo vaginal, a proteção só começa após 20 dias de uso diário. É preciso frisar que o remédio, evidentemente, só tem esse efeito protetivo para quem não tem o vírus. Quem já tem o vírus, não deve tomar a PrEP, porque o esquema para tratar é diferente do esquema para a profilaxia.

        A PrEP, comercializada nos Estados Unidos como “truvada”, é uma combinação de dois medicamentos em um único comprimido de uso oral: o fumarato de tenofovir desproxila (TDF – 300mg) e a emtricitabina (FTC – 200mg). Embora atualmente somente essa combinação esteja aprovada para uso, estudos sobre a PrEP utilizando outros medicamentos e vias de administração vêm sendo desenvolvidos (!).

----------
ATUALIZAÇÃO (12/07/2020): Pesquisadores do HIV Prevention Trials Network (HPTN) anunciaram no 23° Encontro do AIDS 2020: Virtual que um regime medicamentoso contendo cabotegravir de longa-ação (CAB LA) injetado uma vez a cada 8 semanas mostrou-se muito superior ao uso diário de tenofovir/entricitabina (TDF/FTC) como profilaxia pré-exposição contra o HIV. O estudo associado - randomizado controlado duplo-cego (ou seja, da mais alta qualidade) - envolveu 4570 homens cisgêneros e mulheres transgêneras que mantêm sexo com homens em regiões da Argentina, Brasil, Peru, África do Sul, Tailândia, EUA e Vietnã. Do total de participantes, ~66% tinham menos de 30 anos de idade e 12% eram transgêneros. Foram 52 infecções por HIV ocorridas ao longo do estudo, 13 delas no grupo recebendo CAB LA e 39 delas no grupo recebendo TDF/FTC. O resultado significa uma redução de 66% no risco de infecção com o CAB LA em comparação com o uso de TDF/FTC.
---------

- Continua após o anúncio -



   DESCONHECIMENTO

          O uso de PrEP por HSH em situação de risco já é uma realidade em países desenvolvidos, e conta com a anuência de agências governamentais Norte-Americanas, além de órgãos regulatórios de países como Reino Unido, Austrália e França. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também emitiu recomendações e diretrizes para uso da PrEP por populações mais vulneráveis de países em desenvolvimento, em combinação com outras formas de prevenção.

          Mesmo assim, o PrEP é ainda bastante desconhecido entre população inclusive entre muitos profissionais de saúde, apesar do seu crescente uso ano após ano  ao redor do mundo. Em uma pesquisa publicada em 2015 pelo CDC (Centro de Controle de Doenças dos EUA), foi mostrado que 34% dos médicos e enfermeiros não sabiam da existência do PrEP! Ou seja, 1 em cada 3 dos principais profissionais de saúde nunca tinham ouvido falar desse medicamento há menos de três anos. A cidade de New York, EUA, tinha iniciado inclusive uma forte campanha no final de 2015 para popularizar o PrEP entre os hospitais e grupos de risco. Só no território Norte-Americano, 40 mil pessoas são diagnosticadas com o HIV todos os anos, isso sem contar o número possivelmente maior de contaminações não alardeadas.

          No Brasil, existe também um grande desconhecimento em relação ao medicamento. Aliás, o PrEP só passou a fazer parte do Sistema Único de Saúde (SUS) em 2017, por causa do seu preço. Mas não são todas as pessoas que podem fazer o uso do medicamento na rede pública no Brasil. Por enquanto a PrEP só está sendo ofertado para as pessoas mais vulneráveis ao risco de infecção pelo HIV que são os homens que fazem sexo com homens (HSH), gays, população trans, trabalhadores e trabalhadoras do sexo e casais sorodiferentes (quando um já tem o vírus e o outro não). Além disso, este não é o único critério que é utilizado pelo Ministério da Saúde: os profissionais de saúde prescrevem a PrEP para pessoas que tenham uma maior chance de entrar em contato com o HIV, principalmente por não usarem preservativos nas relações sexuais.

Truvada, a opção medicamentosa de prevenção à Aids, já é coberto pelo (SUS). A pílula é uma combinação dos medicamentos tenofovir e o entricitabina. O Brasil foi o primeiro país da América Latina a adotar o PrEP


- Continua após o anúncio -


   
   POLÊMICA 

        Existe uma crítica contra a PrPE quanto à sensação de segurança traga com o seu uso. Para alguns especialistas, essa estratégia de prevenção desencoraja as pessoas a usarem a camisinha e a adotarem outras medidas de promoção ao sexo seguro, já que muitos acreditam que a Aids é o único real problema que acompanha o sexo desprotegido. Consequentemente, enquanto a Aids estaria sendo prevenida, outras doenças veriam uma porta de entrada, assim como um aumento no número de gravidezes não desejadas. Por outro lado, várias pesquisas já mostraram que essa suposição não encontra verdade na prática, já que a camisinha, por exemplo, faz parte íntima da sociedade há muito tempo, sendo impossível descartar sua presença de uma hora para outra. E outra: ninguém ficaria querendo tomar medicamento sem necessidade alguma se não faz parte dos grupos de risco, principalmente quando a camisinha já resolve grande parte dos problemas.

         Contudo, um estudo Australiano publicado no The Lancet HIV (Ref.6), analisando quase 17 mil homens que mantêm relacionamento sexual com outros homens - entre homossexuais e bissexuais - em Sydney e Melbourne, durante os anos de 2013 até 2017, mostrou que o uso de camisinhas caiu de 46% para 31% entre esses indivíduos. Essa profunda queda acompanhou o grande aumento no uso da PrEP entre esses homens: em 2013, eram 2% que usavam, número que pulou para 24% em 2017. Esse resultado corrobora alguns outros estudos realizados em outros países que sugeriam um aumento no caso de doenças sexualmente transmissíveis como resposta ao aumento no uso da PrEP. Por outro lado, o estudo não analisou se essa queda no uso de camisinhas foi compensada com a significativa queda nos casos de HIV gerada pela PrEP. Mas considerando que doenças como a gonorreia (2) estão ganhando super-resistência e ficando quase impossíveis de serem tratadas, pode ser difícil acreditar em um balanço positivo entre riscos e benefícios.


      Nesse sentido, talvez políticas públicas de reforço ao uso da camisinha em conjunto com um aumento na oferta e conscientização da população em relação à existência e efetividade da PrEP possam contribuir para manter a balança de riscos/benefícios sempre positiva, e avançar no combate à Aids.


OBS.: Atualmente, o único medicamento recomendado para o PrPE é o Truvada, fabricado pela Gliead Sciences. Um dos princípios ativos do medicamento, o tenovir disoproxil, impede que o vírus HIV incorpore seu material genético dentro das células alvo do indivíduo infectado, bloqueando sua reprodução. Como todo medicamento, deve-se consultar o médico antes do uso, já que reações adversas podem ocorrer no corpo do paciente.

(1) Se você faz parte de qualquer um dos grupos de risco listados acima, procure o serviço médico para saber sobre o PrPE e outras formas de prevenção e tratamento do HIV. Nunca ignore nenhuma doença, buscando sempre tratar qualquer uma delas o mais cedo possível.


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. http://www.cdc.gov/hiv/basics/prep.html
  2. http://www.cdc.gov/hiv/pdf/prep_fact_sheet_final.pdf
  3. http://www.whatisprep.org/
  4. http://www.hivguidelines.org/clinical-guidelines/pre-exposure-prophylaxis/guidance-for-the-use-of-pre-exposure-prophylaxis-prep-to-prevent-hiv-transmission/
  5. https://www.aids.gov/hiv-aids-basics/prevention/reduce-your-risk/pre-exposure-prophylaxis/
  6. https://www.thelancet.com/journals/lanhiv/article/PIIS2352-3018(18)30072-9/fulltext
  7. http://www.sciencemag.org/news/2018/06/pill-protects-people-hiv-may-also-lead-more-sex-without-condoms
  8. http://www.brasil.gov.br/editoria/saude/2017/05/sus-vai-oferecer-medicamento-como-prevencao-ao-hiv-para-populacoes-de-risco
  9. http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/52697-saiba-o-que-e-como-funciona-e-pra-quem-e-indicada-a-profilaxia-pre-exposicao-prep-para-hiv
  10. http://www.scielo.br/pdf/csp/v33n11/1678-4464-csp-33-11-e00112516.pdf
  11. https://www.hptn.org/news-and-events/press-releases/hptn-083-study-demonstrates-superiority-cabotegravir-prevention-hiv