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Conscientização: É preciso desestimular a demanda por cães braquicefálicos

- Atualizado no dia 1 de abril de 2024 -

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          Na última década, a popularidade dos cães com focinho extremamente curto (ou cara-achatada) - cientificamente chamados de cães braquiocefálicos - aumentou dramaticamente ao redor do mundo, mesmo com cada vez mais evidências e publicidade internacional realçando os desafios de saúde que essas linhagens caninas enfrentam. Esses cães são fortemente predispostos a um amplo espectro de desordens intrinsecamente relacionadas à conformação dos seus crânios, incluindo doenças respiratórias, doenças oculares, distocia, doenças na coluna espinhal, derrame térmico e pneumonia. De fato, a expectativa de vida média desses cães é reduzida em 4,1 anos em comparação com outras linhagens caninas de focinho longo. 

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         Nesse sentido, muitos veterinários e especialistas consideram os Buldogues (Inglês), Pugs e Buldogues Franceses como tendo saúde e bem-estar muito comprometidos para continuarem sendo procriados. Então por que as pessoas no público em geral continuam apoiando e incentivando cada vez mais a criação dos cães braquiocefálicos?


   CÃES BRAQUIOCEFÁLICOS

           Como todos os mamíferos, os cães (Canis lupus familiaris) nascem com um focinho bem curto, com o alongamento do rosto após o nascimento controlado por vários genes. Nos cães braquiocefálicos, um número de mutações afetam o desenvolvimento do osteoblasto assim como a fusão das suturas cranianas. Essas mutações - acompanhadas provavelmente por mudanças epigenéticas - causam uma inibição do crescimento pós-natal nos ossos dérmicos da região mediana da face (viscerocrânio) e que não parecem simultaneamente afetar as estruturas cranianas internas. Ao invés disso, os turbinais dentro da cavidade nasal continuam o crescimento após o alongamento da face ter parado prematuramente. 


          A presença de cães com focinhos curtos no Antigo Extremo Oriente data de até 2700 anos a.C., e exemplos de linhagens caninas no Leste Asiático nesse sentido são o Pequinês e o Spaniel Japonês (Chin), os quais estão listados em documentos antigos desde do século XVII. Mais recentemente, houve confirmação via análise genômica da origem Chinesa do Pug (Ref.3). Durante a segunda metade do século XIX, o Pug sofreu um encurtamento ainda maior do focinho via seleção artificial, até o extremo fenótipo que observamos hoje. Os Buldogues Francês e Inglês são os outros exemplos de extremo encurtamento do focinho que ocorreu nas últimas décadas a partir de linhagens com focinho curto.



           Esse exagerado encurtamento observado nos Pugs e Buldogues - também observado em menor extensão no Boxer, no Boston Terrier e em  outras linhagens braquicefálicas menos extremas - culminaram em diversos problemas de saúde, os quais são sintetizados como síndrome braquicefálica (síndrome braquicefálica obstrutiva das vias aéreas ou síndrome braquicefálica das vias aéreas). A desproporção no crescimento entre os ossos extremos e os turbinais reduz o espaço para os fluxos de ar e causa um deslocamento adicional de alguns turbinais para dentro da passagem nasal (turbinais aberrantes rostrais) e para dentro do duto nasofaríngeo (turbinais aberrantes caudais), criando uma alta resistência à entrada e saída de ar. Os Pugs modernos também exibem turbinais menores, mais simples e mais soltos.



          O fluxo de ar através da cavidade nasal responde por 76,5% do total de resistência do fluxo de ar no trato respiratório, e não difere entre inspiração e expiração em cães normais. Cães braquicefálicos precisam superar o aumento de resistência nas vias aéreas (~16 vezes maior do que o normal), e, portanto, a exalação é forçada ao invés de ser passiva (como observado em cães não-braquicefálicos). O aumento negativo da pressão criado para superar essa resistência extra faz com que os tecidos moles se tornem inflamados, as amígdalas e os sáculos laríngeos everterem, e a laringe e traqueia colapsarem. Esse aumento de resistência também leva a um turbulento fluxo de ar, edema, e o aumento do barulho inspiratório comumente ouvido com os cães braquicefálicos.  

          Um alongamento do palato mole também é encontrado em 62-100% dos cães braquicefálicos, e seja isso uma consequência ou característica inata desses cães, é um traço anatômico que contribui para a resistência das vias aéreas superiores e para o barulho respiratório. A redução extrema do focinho também reduz de forma preocupante o sono desses animais, por causa da dificuldade respiratória durante o sono (Ref.11).

           Existe evidência recente de significativos danos cerebrais ou prejuízos no desenvolvimento do cérebro causados pela deformação craniana nos cães braquiocefálicos (Ref.13). 

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           Além disso, como pode ser observado na imagem abaixo, as mudanças ocasionadas pela conformação craniana braquicefálica leva a narinas estenóticas, onde a asa de ambas as narinas é deformada e a abertura é anormalmente estreita, às vezes reduzidas a apenas um estreita fenda vertical com quase completa obstrução nasal, o que também força esses cães a respirarem de forma quase contínua com a boca aberta.



          Pelo menos metade dos cães braquiocefálicos com deformações mais extremas (ex.: Pugs) enfrentam graves dificuldades respiratórias, frequentemente possuem problemas oculares e mais de 80% requerem cesárea durante o parto. Devido a esses problemas, esses cães tipicamente vivem 3-4 anos a menos do que seria esperado com base no tamanho corporal. A expectativa de vida dos Buldogues Franceses, por exemplo, é em torno de apenas 4 anos e meio. 

   CAPACIDADE TERMORREGULATÓRIA

          A mucosa respiratório é de central importância para a termorregulação em mamíferos em geral. Durante o descanso e a baixas temperaturas ambientes, os cães respiram exclusivamente através do nariz; e durante exercícios e/ou a mais altas temperaturas, a cavidade oral é adicionalmente incluída na termorregulação através da ofegação. Os cães braquicefálicos, além das dificuldades respiratórias, possuem sérios prejuízos na capacidade termorregulatória que se manifestam como um comportamento ofegante a mais baixas temperaturas comparado com cães de focinhos mais longos, e também durante o descanso. Essa menor capacidade termorregulatória é devida, primariamente, a uma reduzida área superficial do maxiloturbinal. Esses problemas termorregulatórios também são englobados pela síndrome braquicefálica, e levam comumente a estados de superaquecimento corporal e até mesmo a derrames térmicos e morte.


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          Em mamíferos e outro animais endotérmicos, o epitélio respiratório dentro da cavidade nasal cresce de forma proporcional ao tamanho do corpo durante a ontogenia pós-natal. O aumento simultâneo da área superficial respiratória assegura o aumento requerido da taxa metabólica em associação com o aumento da massa corporal. Em contraste, o Pug e os Buldogues Francês e Inglês exibem uma inibição do crescimento anterior ao estado de completo crescimento do corpo. Nesse sentido, enquanto os que filhotes e indivíduos jovens dessas três linhagens caninas não exibem dificuldades respiratórias, os danos passam a ser cada vez mais perceptíveis a partir dos ~12 meses de idade.


   SINAIS CLÍNICOS

          Típicos sinais clínicos da síndrome braquicefálica podem incluir ruído ressoado durante a respiração, estridor, dispneia inspiratória, tendência ao superaquecimento do corpo, ronco, tosse, intolerância a exercícios físicos, aumento do esforço respiratório e hipertermia. Esses sintomas podem progredir levando a baixos níveis de oxigênio no sangue, com subsequente colapso e até mesmo morte. Devido ao fato dessa síndrome ser uma doença progressiva, sinais clínicos podem variar de um aumento mínimo no esforço respiratório até crises respiratórias severas devido ao fechamento das vias aéreas e o colapso laríngeo. 

            Além dos sinais clínicos mais comuns observados nos animais despertos, sufocação pode também ocorrer durante o sono como resultado do relaxamento dos tecidos laríngeos. Essa é uma forma de apneia do sono, e pode piorar o inchaço laríngeo e edema, e ao longo do tempo pode contribuir para o colapso da laringe.

          Complicações gastrointestinais também podem ser observadas nos cães com síndrome braquicefálica, como vômitos e regurgitações frequentes, e ptialismo (secreção excessiva de saliva). 

          A síndrome obstrutiva braquicefálica das vias aéreas geralmente é diagnosticada em cães com 2-3 anos de idade, mas pode ser severa mesmo em filhotes com menos de 6 meses de idade.


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          Complicações médicas adicionais devido à estrutura craniana dos cães braquicefálicos incluem dermatite associada à dobradura da pele, doenças oculares, doenças da coluna espinhal, derrame térmico, maloclusão, hidrocéfalo, e paralisia do nervo facial. Eventos adversos após procedimentos de anestesia também parecem ser mais comuns entre os cães braquicefálicos (Ref.4). Existe também um aumento de risco reportado de ~3,8 vezes para pneumonia de aspiração entre os cães braquicefálicos do que em outras linhagens caninas (Ref.5).

          Os cães braquicefálicos também são mais afetados por problemas reprodutivos, primariamente distocia. Por exemplo, mais de 85% dos Buldogues no Reino Unido nascem via cesárea. A alta taxa de distocia nesses cães é devido ao fato da cabeça do filhote ser muito grande para passar através do canal vaginal.


    SÍNDROME OCULAR BRAQUIOCEFÁLICA

           O cão da linhagem Shih Tzu, originária do Tibet, está entre as mais populares do mundo, mas também está entre aquelas que mais comumente são apresentadas aos veterinários devido a problemas oculares. De fato, essa linhagem é propensa a desenvolver doenças na superfície ocular devido a fatores anatômicos e fisiológicos comumente referidos como síndrome ocular braquiocefálica. O Shih Tzu é outro exemplo de deletérias consequências da braquiocefalia, e algumas características anatômicas nesse sentido reduzem a proteção ou aumentam a irritação do globo ocular, promovendo uma série de enfermidades. Soma-se a isso deficiência no filme lacrimal ou baixa qualidade no filme lacrimal pré-córneo, aumentando o risco de doença do olho seco (Ref.14-15). Essa linhagem exibe alta prevalência de patologias na superfície cocular (ex.: queratite ulcerativa, fibrose córnea e ceratoconjuntivite seca). É estimado que o Shih Tzu possui um risco 10x maior de desenvolver úlceras córneas quando comparado com cães mestiços, um séria doença ocular que pode rapidamente deteriorar e resultar em perda da visão ou globo ocular se não tratada (Ref.14).

 

Cão da linhagem Shih Tzu.

          Um estudo recente analisando 500 cães Shih Tzu (1000 olhos) encontrou que apenas 36 olhos (3,6%) não exibiam anormalidades; o restante dos olhos eram afetados por patologias diversas (Ref.16). Impactação do saco anal e hérnias umbilicais também parecem ser mais comuns em cães Shih Tzu do que em cães no geral (Ref.17).


   INTERVENÇÕES

          Cães com doença braquicefálica das vias aéreas podem se beneficiar com um controle da massa corporal (emagrecimento), apesar de resultados conflitantes na literatura acadêmica. Atividades que aumentam o esforço respiratório e de ofegação devem ser evitados, incluindo longas caminhadas com coleira no pescoço durante os horários mais quentes do dia. Leve sedação e medicamentos anti-inflamatórios podem também ser efetivos na redução do inchaço laríngeo, este o qual leva a crises braquicefálicas aéreas. Cirurgias acabam sendo frequentemente requeridas. Cães braquicefálicos também devem evitar ao máximo excitamento ou estresse, ou muita umidade.


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          Quanto mais cedo o diagnóstico da síndrome braquicefálica, melhor o prognóstico, onde intervenções cirúrgicas podem minimizar a progressão do problema para estágios mais avançados e danos irreversíveis. Rinoplastia para alargar as narinas pode ser benéfica em filhotes tão novos quanto 3-4 meses de idade. Resseção do palato mole pode remover o excesso do tecido palatal caudal, e facilitar também a respiração.


   POPULARIDADE E PARADOXO

          Apesar desses problemas todos relatados, as pessoas no público em geral continuam criando e incentivando a criação dos cães braquicefálicos. Coletivamente, as perturbações levando à síndrome braquicefálicas possuem um severo impacto no bem-estar dos animais afetados, estes os quais podem expressar pouca ou quase nenhuma atividade física ou de entretenimento porque estão inteiramente ocupados com a difícil tarefa de respirar. Muitos desses cães continuarão tendo uma qualidade de vida comprometida mesmo após correções cirúrgicas - procedimentos estes os quais já estão associados a sérios riscos.

          De fato, em 2017, a Associação Britânica Veterinária anunciou que não iria mais usar imagens de cães braquicefálicos nas suas propagandas e em campanhas diversas, visando diminuir a demanda por essas linhagens caninas. Uma pesquisa em 2013 entre os veterinários da Nova Zelândia concluiu que esses profissionais consensualmente concordam que o Pug, Buldogue e Buldogue Francês possuem "saúde e bem-estar muito comprometidos para continuarem sendo procriados."


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           Um dos principais problemas identificado em estudos diversos é que a maioria dos donos de cães braquicefálicos acreditam que sintomas respiratórios e outras manifestações clínicas adversas típicas desses cães são 'normais'. Um recente estudo Britânico demonstrou que 60% dos donos de cães braquicefálicos reconhecem os sinais clínicos da síndrome braquicefálica nos seus animais mas ignoram tais sinais como 'normais para a linhagem', e, mesmo reportando uma alta frequência e severidade de sinais clínicos, continuavam acreditando que não existia problema respiratório (Ref.2).

          Um estudo publicado em 2019 no periódico PLOS ONE (Ref.6), investigando 2168 donos de Pugs e Buldogues (Francês e Inglês), mostrou que 20% deles reportaram que seus cães foram submetidos a pelo menos uma cirurgia associada à conformação da estrutura craniana; 36,5% dos cães foram reportados com um problema de termorregulação; e 17,9% com problemas respiratórios. Apesar de estarem cientes desses frequentes problemas de saúde, 70,9% dos donos consideravam que seus cães possuíam uma saúde muito boa ou a melhor saúde possível. Paradoxalmente, apenas 6,8% dos donos consideravam seus cães de serem menos saudáveis do que a média das respectivas linhagens caninas. 

          Esse estudo de 2019 também mostrou que os donos desses cães braquicefálicos possuem relações extremamente fortes com esses animais. Ou seja, é um complexo fenômeno caracterizado por uma forte ligação dono-cão e percepções não realísticas de boa saúde mesmo contra altos níveis de doenças em espécimes relativamente jovens. Proximidade emocional ao cão se mostrou mais alta para donos de Pugs (o mais extremo em termos de fenótipo braquicefálico), donas (mulheres) e donos com crianças na casa.

          Em um estudo apresentando no congresso BSAVA Congress Proceedings 2020 (Ref.8), pesquisadores encontraram que entre 587 participantes, 69,9% deles eram familiares com o termo 'braquicefálico', mas que apenas 41,5% conheciam o termo BOAS (termo em inglês muito comum para se referir à síndrome braquicefálica obstrutiva da vias aéreas). Antes de uma intervenção educacional, a maioria dos participantes consideravam que os seguintes sinais clínicos eram algo normal (não ligado a prejuízos) nos cães braquicefálicos: ronco (89,7%), respiração alta (78%) e respiração forçada (65%). Após uma intervenção educacional (conscientização), 53% deles responderam que tiveram suas opiniões sobre os cães braquicefálicos alteradas, e com 77,5% deles expressando o desejo de não recomendar essas linhagens caninas para amigos e familiares; quase 98% passaram a acreditar que o público deveria estar mais consciente sobre a síndrome braquicefálica e 99,5% acreditavam que potenciais donos de cães braquicefálicos deveriam estar cientes dessa síndrome

             Em um estudo mais recente, publicado no periódico Applied Animal Behaviour Science (Ref.12), pesquisadores analisaram 1156 participantes na Hungria. Do total que mais gostava dos cães braquiocefálicos, 99% associavam esses animais com dificuldades respiratórias, 90% com distocia e 61% com ulceração corneal. Ou seja, no geral, as pessoas no país em questão estavam cientes dos problemas. O estudo também revelou que os entusiastas de cães braquiocefálicos possuíam relativamente pouca experiência como donos e tendiam a ser jovens, mulheres e pais. Portanto, é provável que essas pessoas não estejam cientes dos sinais de comunicação canina, ignorando sinais de dor e considerando problemas de saúde como características caninas normais nessas linhagens. Por exemplo, um Buldogue roncando pode parecer "fofo" ao dono, ao invés de um cão doente com sérias dificuldades respiratórias e sono comprometido.

           Os autores desse último estudo concluíram que campanhas de conscientização não devem apenas listar problemas de saúde que cães braquiocefálicos enfrentam, mas também enfatizar que esses problemas de saúde não podem ser considerados normais ou aceitáveis em um cão, porque causam significativa dor e sofrimento a esses animais.


Donos de Buldogues e Pugs não conseguem identificar sintomas patológicos ou percebem problemas de saúde características normais nessas linhagens caninas.

           Essa falta de conhecimento ou de compreensão sobre os sérios problemas de saúde ligados aos cães braquicefálicos pode estar associada ao fato das pessoas acreditarem que se um grupo de animais com certos traços fenotípicos existe, é porque aqueles traços são 'naturais' e adequados àqueles animais. E talvez essa percepção possa estar associada a um conhecimento deficiente sobre processos evolutivos, onde traços deletérios podem persistir a nível populacional dependendo dos mecanismos e pressões evolutivas associadas. No caso, as diferentes linhagens de cães foram criadas via processo de domesticação por seleção artificial, onde a seleção de traços fenotípicos respeitou apenas às necessidades estéticas humanas, em detrimento ou não da saúde e da capacidade de adaptabilidade desses animais.

          Mas por que cães como Pugs e Buldogues são tão atrativos? É proposto que a distinta aparência física do rosto dos cães braquicefálicos, englobando uma testa grande, olhos grandes e caídos, e bochechas salientes, possa engatilhar uma atração humana instintiva devido à similaridade dessas características faciais com os rostos de bebês humanos. Esse estímulo 'infantil' está associado com emoções positivas e respostas de cuidado maternal/paternal. Estudos empíricos já demonstraram que características infantis em gatos, cães e ursos aumentam a atratividade desses animais, e que mulheres mostram maiores taxas de afinidade com características infantis em animais de estimação do que os homens.

         Um estudo publicado em 2020 na PLOS ONE (Ref.7) encontrou que 93% dos donos eram altamente prováveis de querer outro cão braquicefálico no futuro e que 65,5% recomendavam seus cães para outros donos. As principais recomendações positivas eram atribuídas ao comportamento de companheirismo do cão, adequação a um estilo de vida sedentário em um espaço limitado, e adequação para casas com crianças. Ter um cão pela primeira vez e um longo tempo de convívio aumentavam a força da recomendação e do desejo de aquisição futura. Os atributos de não-recomendação estavam ligados à alta prevalência de problemas de saúde, altos gastos com cuidados, problemas éticos e de bem-estar associados à síndrome braquicefálica, efeitos negativos no estilo de vida do dono e atributos comportamentais negativos.        

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   MUTAÇÃO NO GENE ADAMTS3

           É válido também mencionar que um estudo publicado em 2019 no periódico PLOS Biology (Ref.9) mostrou que não é apenas o fenótipo braquicefálico a causa de problemas respiratórios nos cães. É bem conhecido que os cães da linhagem Norwich Terrier possuem um alto risco de desenvolverem uma condição similar à síndrome braquicefálica das vias aéreas, chamada de Síndrome das Vias Aéreas Superiores, mesmo não possuindo braquicefalia. No estudo em questão, os pesquisadores realizaram uma análise genômica ampla em 401 Norwich Terriers, e identificaram uma mutação no gene ADAMTS3 também encontrada em bulldogs e associada a edemas, estes os quais causam inchaço a partir da retenção de fluídos - fator de obstrução observado nas vias aéreas dos Norwich Terriers que apresentam a síndrome respiratória.



           Nesse sentido, os resultados do estudo indicam que existem causas genéticas além da braquicefalia para os problemas respiratórios em cães. Isso abre caminho, por exemplo, para uma triagem genética durante os programas de procriação e de cruzamento que evite passar adiante o alelo deletério para as próximas gerações, reduzindo os riscos ou a severidade de problemas respiratórios em bulldogs e Norwich Terriers. O achado também pode ajudar a evitar graves eventos pós-operatórios em bulldogs e ajudar a identificar aqueles com maiores riscos para problemas respiratórios mais graves.


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   CONCLUSÃO

          Apesar dos vários problemas de saúde e prejuízos ao bem-estar associados aos cães braquicefálicos, a demanda por essas linhagens caninas continua aumentando de forma robusta ano após ano. Muitas pessoas desconhecem a síndrome braquicefálica e outras complicações de saúde que enfrentam esses cães, especialmente Pugs e Buldogues, ou não compreendem que esses cães sofrem e que certos traços fenotípicos em cães são deletérios. Maior conscientização é necessária para diminuir drasticamente a demanda por esses cães, os quais tendem a passar mais tempo da vida lutando para respirar do que aproveitando a vida.


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS

  1. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S1938973613000548
  2. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0021997520300232
  3. https://anatomypubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/ar.24422
  4. https://avmajournals.avma.org/doi/abs/10.2460/javma.253.3.301
  5. https://avmajournals.avma.org/doi/abs/10.2460/javma.253.7.869
  6. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219918
  7. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0237276
  8. https://www.bsavalibrary.com/content/chapter/10.22233/9781910443774.ch70sec6
  9. https://journals.plos.org/plosgenetics/article?id=10.1371/journal.pgen.1008102
  10. https://www.hsvma.org/brachycephalic
  11. Niinikoski et al. (2023). Description of a novel method for detection of sleep-disordered breathing in brachycephalic dogs. Journal of Veterinary Internal Medicine. https://doi.org/10.1111/jvim.16783
  12. Bognár & Kubinyi (2023). The brachycephalic paradox: The relationship between attitudes, demography, personality, health awareness, and dog-human eye contact. Applied Animal Behaviour Science, Volume 264, 105948. https://doi.org/10.1016/j.applanim.2023.105948
  13. Iotchev et al. (2023). Sleep-physiological correlates of brachycephaly in dogs. Brain Structure and Function 228, 2125–2136. https://doi.org/10.1007/s00429-023-02706-y
  14. Sebbag et al. (2022). An eye on the Shih Tzu dog: Ophthalmic examination findings and ocular surface diagnostics. Veterinary Ophthalmology, Volume26, Pages 59-71. https://doi.org/10.1111/vop.13022
  15. Vitor et al. (2024). Shih-Tzu dogs show alterations in ocular surface homeostasis despite adequate aqueous tear production. Acta Vet Scand 66, 3. https://doi.org/10.1186/s13028-024-00724-2
  16. Rajaei et al. (2024). The Shih Tzu eye: Ophthalmic findings of 1000 eyes. Veterinary Ophthalmology. https://doi.org/10.1111/vop.13182
  17. Dale et al. (2024). Demography, common disorders and mortality of Shih Tzu dogs under primary veterinary care in the UK. Canine Medicine and Genetics, 11:2. https://doi.org/10.1186/s40575-023-00135-y