YouTube

Artigos Recentes

Por que o calor vai do "quente" para o "frio"?


Compartilhe o artigo:



             Ah, essa é uma pergunta interessante: "Por que o calor passa de um corpo de maior temperatura para outro de menor temperatura?" Sempre ouvimos isso nas aulas de Física, afirmação a qual é derivação direta da 2° Lei da Termodinâmica, ou seja, que o calor flui espontaneamente do corpo de mais alta temperatura para o corpo de mais baixa temperatura, exceto se trabalho externo for efetuado no sistema analisado. E qual a razão para isso?

          Bem, a temperatura de um sistema é a medida do grau de agitação cinética das partículas no seu interior, as quais estarão em movimento caótico (1), seja translacional ou vibracional. Se for um gás, por exemplo, existirá um movimento mais caótico/livre, e, se for um sólido, um movimento mais vibracional, já que as partículas constituintes do mesmo estarão bem mais presas na sua estrutura. Ambos movimentos aumentarão à medida que a temperatura aumenta. Nesse sentido, quanto maior a temperatura, maior será a agitação das partículas (2).  No plasma, por exemplo, onde existe o fogo como um dos mais conhecidos representantes, a agitação caótica das partículas ali (no caso, íons) será gigantesca. Caso não consigamos medir diretamente essa agitação, podemos utilizar o espectro eletromagnético para medi-la indiretamente.

Quanto maior a temperatura, maior a agitação agitação caótica das partículas do sistema (setas maiores, maior velocidade)

            Toda a matéria normal emite radiação eletromagnética quando sua temperatura está acima do zero absoluto (temperatura mínima limite no Universo), independentemente dos efeitos de fluorescência ou fosforescência. Isso se dá pela conversão da energia de movimento das partículas em energia eletromagnética, seja por excitação eletrônica ou outros processos quânticos. Quanto maior a temperatura do corpo, mais energia eletromagnética liberada. No caso do corpo humano, por exemplo, nossa temperatura corporal é suficiente para produzir radiação infravermelha de forma majoritária e isso justifica os sensores e binóculos de infravermelho usados para facilitar a visão noturna. Uma barra metálica, à medida que vai se aquecendo, começa a ficar cada vez mais vermelha e vai mudando de cor para radiações cada vez mais energéticas com o contínuo fornecimento de calor. Sabemos das temperaturas das estrelas analisando as radiações por ela emitidas a partir do processo acima descrito (a base de análise, claro). Isso tudo entra na teoria da Radiação de Corpo Negro, onde não há reflexão de luz e, sim, emissão espontânea associada à temperatura.

A cor de um pedaço de metal vai sofrendo mudanças à medida em que ele é aquecido. Altas temperaturas e o seu aumento começam a gerar as cores vermelha, laranja, amarela e, nesse ponto, o metal irá se derreter e, eventualmente, irá evaporar. Se continuássemos aquecendo o vapor gerado, veríamos ele brilhar em azul, depois violeta e, por fim, em altíssimas temperaturas, teríamos uma maior emissão de radiação ultravioleta e raio x. Isso é o que ocorre no Sol, por exemplo.
 
            Bem, então, voltando a nossa pergunta inicial, porque um corpo com menor temperatura recebe calor de um corpo de maior temperatura, e porque o oposto não ocorre, ou seja, um corpo "frio" doando calor e ficando ainda mais frio do que o meio ao seu redor? Teremos aqui dois processos de transferência do calor justificando esse fenômeno: através da cinética e através da absorção de radiação eletromagnética.

- Continua após o anúncio -



  CINÉTICA

          Imagine que você tem uma bola futebol e chute ela em outra bola de futebol que esteja parada e solta no gramado. A bola parada irá se movimentar com o impacto, e, com isso, terá maior energia cinética, "doada" pela bola arremessada. Isso acontece com a temperatura: os corpos mais quentes terão suas partículas constituintes se movimentando com maior intensidade e irão se chocar com as partículas mais lentas dos corpos menos quentes, fazendo estas se movimentarem com maior intensidade e aumentando a temperatura. Já aquela com maior temperatura inicial irá perder energia térmica porque parte da energia cinética das suas partículas foi transferida para as partículas do corpo com menor temperatura. Da mesma forma que você não irá ver a bola parada continuar parada após o contato com a primeira bola, devido ao choque mecânico e à conservação de momento, uma partícula em menor temperatura não ficará com a mesma temperatura, ou menor temperatura, quando em contato com um corpo de maior temperatura.

          E não é preciso estar em contato direto do corpo aquecido para ver essa troca de calor, já que a movimentação térmica pode ser transmitida através de um meio, como o ar, líquidos, sólidos, entre outros. Ou seja, cada partícula vai batendo em outra nesse meio, assim como o efeito dominó presenciado nas ondas sonoras. Só que cada material terá um grau único de eficiência nessa transmissão, tanto pela dificuldade diferenciada para a movimentação térmica de um extremo a outro da sua estrutura quanto pelo fato de serem mais, ou menos, opacos às radiações eletromagnéticas. Os metais, por exemplo, são excelentes condutores térmicos por causa da presença de elétrons em grande grau de liberdade na sua estrutura, os quais permitem uma rápida transmissão da agitação térmica. Isso explica também o alto grau de condução elétrica desses materiais (4).

- Continua após o anúncio -



     RADIAÇÃO ELETROMAGNÉTICA

          Aqui, entramos no segundo processo de transferência. Ora, se um corpo está emitindo radiação eletromagnética de energia média proporcional à sua temperatura, esse poderá aquecer outro corpo através da colisão das partículas desse último com os fótons emitidos (fótons são as partículas-onda da radiação eletromagnética). Assim, mesmo sem um meio de transmissão de calor (no vácuo, por exemplo), a radiação eletromagnética liberada irá aquecer o sistema na vizinhança. E quanto maior a capacidade de absorção/interação das partículas com as radiações eletromagnéticas sendo emitidas, maior será a energia assimilada, a qual poderá se transformar em energia térmica (3). O Sol, por exemplo, aquece a superfície do nosso planeta dessa forma, através do seu espectro eletromagnético emitido. Em uma situação parecida, seu micro-ondas aquece os alimentos através da radiação eletromagnética na faixa das micro-ondas. Assim, um corpo quente estará mandando muito mais energia eletromagnética do que o corpo com menor temperatura, compensando a perda de energia térmica por esse último pelo mesmo processo e adicionando ainda mais energia térmica na sua estrutura.

           Vale lembrar aqui que essa energia eletromagnética não será distribuída de forma igualitária no processo de emissão. Pode parecer loucura, mas tanto você quanto o Sol emitem radiação em todas as faixas de comprimento de onda, ou seja, desde os violentos raios gama até às inofensivas ondas de rádio. Mas, calma, porque você não é um mutante radioativo! Primeiro,  a quantidade de quanta energia eletromagnética um corpo irá irradiar (M) irá depender da temperatura superficial de um objeto (T), obedecendo à Lei de Stefan-Boltzmann, como descrito no quadro abaixo - apenas observando que essa lei assume que o corpo está se comportando como um corpo negro, ou seja, um emissor ideal (uma estrela como o Sol é quase um corpo negro). O Sol, por exemplo, a uma temperatura próxima de 6000°C emite cerca de 150 mil vezes mais energia por unidade de área do que a Terra, esta a qual possui uma temperatura superficial média de 15°C.


           Porém, um corpo emite radiação ao longo de múltiplos comprimentos de onda, incluindo aqueles muito pequenos (gama, raio X) até aqueles muito grandes (micro-ondas, rádio), obedecendo à Lei de Distribuição de Wien,, ou seja, existe um pico máximo de comprimento de onda emitido por um corpo inversamente proporcional à sua temperatura. Isso quer dizer que a energia eletromagnética total sendo emitida por um corpo irá se concentrar em faixas de radiação cada vez menos energéticas à medida que a temperatura diminui. Por exemplo, você, neste momento, lendo este artigo, está emitindo radiação eletromagnética em todo o espectro. Mas como sua temperatura é em torno de 36°C, quase toda a totalidade energética estará concentrada na faixa do infravermelho de ondas longas, enquanto as emissões em outras faixas serão mínimas e quase inexistentes nas faixas muito energéticas (UV, raios X e gama).




           Agora, para acharmos a curva de densidade espectral da radiação eletromagnética emitida pelo corpo negro, basta usarmos a Lei de Plank (considerando o corpo negro em equilíbrio térmico a uma dada temperatura), como mostrado no esquema abaixo. Pronto temos agora a ferramenta para esboçarmos as curvas exibidas para cada temperatura do gráfico acima (3000K-6000k).


          Esse é o motivo, por exemplo, do Sol ser branco quando observado no espaço, já que sua emissão máxima (como pode ser visto, novamente, na figura acima, na curva de temperatura de 6000K) será na faixa do visível, onde a energia emitida está mais concentrada no intervalo correspondente ao azul-verde na média de variações de temperatura da nossa estrela. Como o Sol produz uma quantidade relativamente equilibrada em toda a faixa do visível, ele acaba sendo percebido como uma junção de todas as cores (branco). Por outro lado, podemos citar a estrela Supergigante Azul Rigel, a qual possui uma temperatura superficial superior a 12000°C e acaba com isso emitindo muito mais azul do que os outros comprimentos de onda no espectro visível. Com isso, no Espaço, a Rigel possui uma coloração mais azulada. Já a estrela Supergigante Vermelha Betelgeuse possui uma temperatura superficial em torno de 3500°C e acaba emitindo muito mais vermelho. Isso faz a Betelgeuse ter uma coloração mais avermelhada.



         Saindo do campo estelar, outro exemplo, também já mencionado, é um pedaço de metal sendo continuamente aquecido. Primeiro vemos ele ficando vermelho, depois laranja e até amarelo, com faixas de radiação eletromagnética cada vez mais abundantes em frequências cada vez maiores (mais energéticas) à medida que a temperatura aumenta. Porém, no caso do típico aquecimento de um pedaço de metal, temos uma importante observação.

          Bem, em temperaturas em torno de 5727°C temos uma emissão máxima em torno da região do visível, como o Sol. Já o metal sólido, mesmo estando avermelhado ou amarelado em um máximo aquecimento, ainda possui um pico de emissão máximo no infravermelho (perto de 2 μm), já que o material estará em temperatura máxima em torno de 1500°C (ou caso contrário, já teria entrado em ebulição há muito tempo com temperaturas próximas de 6000°C). Mas como o olho humano não consegue enxergar o infravermelho, acaba que apenas os comprimentos de onda abaixo da curva de distribuição no visível são notados, e quanto maior a temperatura, maior a emissão em faixas do visível mais energéticas (amarelo > laranja > vermelho) - sendo percebidas preferencialmente obedecendo também à sensibilidade diferenciada do olho humano a cada uma delas por causa das pequenas quantidades emitidas. Mas só conseguimos ver essas cores porque a temperatura está muito alta e, com isso, emitindo bastante energia eletromagnética próxima da faixa do visível, mesmo o pico máximo ainda estando no infravermelho.

- Continua após o anúncio -



    CONCLUSÃO

            Através de dois processos - dinâmica cinética e emissão radiativa -, um corpo mais quente obrigatoriamente irá aquecer outro mais frio (calor flui do "quente" para o "frio") quando ambos estiverem em contato ou separados por uma barreira não adiabática. Após o contato, o calor continuará fluindo nesse sentido até que um equilíbrio térmico seja alcançado, ou seja, até ambos os corpos alcançarem a mesma temperatura. A partir daí, a transferência de calor é cessada. Essa regra só será quebrada caso haja um trabalho externo manipulando o sistema, como o motor da sua geladeira, o qual permite que o interior mais frio do congelador continue mandando energia térmica para o ambiente mais quente fora dele (5).

-------------
(1) Quando estamos falando de 'temperatura', estaremos nos referindo a um movimento caótico e desordenado das partículas constituintes do sistema (ou corpo). Caso o movimento seja ordenado e unidirecional, não iremos aumentar a temperatura do corpo, e, sim, iremos realizar um trabalho de deslocamento do mesmo no espaço, já que a resultante força estará seguindo um único sentido. No caso da temperatura, o movimento das partículas do corpo estão indo para todas as direções, "empurrando" o corpo de maneira igual para todas elas, mantendo-o imóvel, mesmo com a temperatura ali subindo.

(2) É uma movimentação média, ou seja, não significa que todas as partículas de um sistema estarão com a mesma velocidade.

(3) Por exemplo, um material de cor preta se aquece muito mais rapidamente com a luz solar por absorver bem os comprimentos de onda na faixa do visível. Já um material branco, por refleti-las em vez de absorvê-las, se aquecerá mais demoradamente. Já uma superfície metálica bem polida não irá se aquecer tanto com a radiação visível, já que irá refleti-la ao invés de absorvê-la. O vidro transparente também irá se aquecer com menor eficiência através da radiação solar por permitir que a parte visível do espectro passe direto sem interagir.

(4) As pessoas, às vezes, possuem uma ideia errada de que as folhas de alumínio (muito usadas nos fogões, por exemplo) não se aquecem e, com isso, acabam concluindo que o metal alumínio não conduz bem calor. Para começar, as folhas de alumínio são ligas metálicas, contendo entre 92 e 99% de alumínio e o resto de outros metais, como o cobre. Isso é feito porque o alumínio puro é muito reativo. Em segundo lugar, as folhas de alumínio conduzem calor muito bem. Na verdade, elas são condutoras térmicas excelentes. Então, por que que quando as pegamos vindas do fogão logo depois de aquecermos alguma coisa nele, elas parecem bem frias? Isso ocorre porque como a área superficial dessas folhas é muito grande e o metal transmite calor muito rapidamente, a energia térmica ali armazenada logo é perdida caso o fornecimento de calor seja cessado. Além disso, a pequena massa dessas folhas faz com que a capacidade quantitativa de armazenamento do calor recebido seja limitada. Juntando os dois fatos, quando você pega uma folha de alumínio do fogão instantes depois dela sair de perto da fonte de aquecimento, todo o calor ali contido é perdido rapidamente para o ambiente ao redor, inclusive um pouco indo para a sua mão também (mas uma quantidade tão pequena que você nem sente direito), dando a impressão que ela não estava sendo aquecida eficientemente pelo fogo do fogão.

(5) Recomendo o artigo: O sopro gelado do Superman pode ser explicado?
---------------

IMPORTANTE: No YouTube, em 2017, saiu um vídeo no canal do Nando Moura onde um ex-professor da USP e negacionista climático erra feio ao dizer que o dióxido de carbono apenas absorve radiação infravermelha sendo emitida por um corpo negro nas temperaturas de -80°C e 400°C, e por esse suposto motivo, ele não seria um gás estufa aqui na atmosfera do nosso planeta. Isso é muito triste. Como explicado acima, cada temperatura relacionada a um corpo negro terá um máximo de emissão radiativa em uma certa frequência, porém, esse corpo estará emitindo em TODO o espectro de frequências. Quanto mais próximo da frequência máxima, maior é a emissão de um corpo negro, ou um corpo aquecido qualquer. Um corpo nunca emite em apenas uma frequência. Ele emite em todo o espectro, na frequência máxima e bastante também em outras frequências ao redor da mesma. Como mostrado na imagem abaixo, dentro das frequências emitidas em bastante quantidade pela superfície terrestre (e sua temperatura média associada) existem vários picos de absorção da molécula de dióxido de carbono. E nessas frequências emitidas, a molécula de dióxido de carbono entra em ressonância/excitação, ou seja, absorve as mesmas. A USP precisa tomar providências urgentes, porque esse tipo de erro é grave e prejudica bastante a opinião da população leiga. Para saber mais, acesse: Aquecimento Global: Uma Problemática Verdade.


Artigos complementares:

Artigo recomendado: O Demônio de Maxwell


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. Borgnakke & Sonntag, Fundamentos de Termodinâmica. Série Van Wylen, 8° Edição.
  2. http://missionscience.nasa.gov/ems/07_infraredwaves.html
  3. http://quantummechanics.ucsd.edu/ph130a/130_notes/node48.html
  4. http://scienceline.ucsb.edu/getkey.php?key=703
  5. http://www.lehigh.edu/~amb4/wbi/kwardlow/conductivity.htm
  6. http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/hbase/mod6.html#c4 
  7. http://galileo.phys.virginia.edu/classes/252/black_body_radiation.html 
  8. http://dc.edu.au/hsc-physics-ideas-to-implementation/
  9. http://gsp.humboldt.edu/olm_2015/Courses/GSP_216_Online/lesson1-2/blackbody.html
  10. http://learningweather.psu.edu/node/18
  11. http://astronomy.swin.edu.au/cosmos/B/Blackbody+Radiation
  12. https://eclipse2017.nasa.gov/what-color-sun
  13. https://apod.nasa.gov/apod/ap180115.html