As fases da Lua afetam os cabelos?
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Existe uma pseudociência seguida como uma regra por muitas mulheres (e homens, em menor proporção) quando o assunto é estética com os cabelos: a alegação de que as fases da lua influenciam no crescimento do cabelo. É realmente recomendado cortar o cabelo durante alguma fase lunar específica? Afinal, a Lua possui algum efeito físico na nossa fisiologia?
Tá, ok, eu não sei quantos seguem essas dicas achando que isso é baseado em alguma ciência séria ou apenas o fazem por acreditar em astrologia e outras crenças. No motivo religioso, sem problema, é apenas questão de fé e cultura. Já que é algo que não traz malefícios à sociedade (ou seja, cortar o cabelo obedecendo certos rituais) eu não vejo mal em acreditar em tais coisas. O triste é quando vemos pessoas incentivando outras pessoas a não tomarem vacinas ou medicamentos por causa de crenças infundadas e opiniões pessoais egoístas e ignorantes. Bem, deixando essa minha revolta de lado, quero voltar o meu foco para as pessoas que seguem as fases lunares acreditando que isso, de alguma forma biológica, interfere com o crescimento e aparência do cabelo. Já sendo direto, isso não existe com base no atual conhecimento científico e, provavelmente, o Curupira inventou tal "teoria" para pregar uma peça em alguém.
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Sim, não podemos negar, a Lua realmente promove efeitos gravitacionais significativos na superfície terrestre, onde, junto com o Sol, é a responsável por provocar as famosas marés na superfície do planeta, ao afetar as massas oceânicas (Como são formadas as ondas e marés?). Mas esses efeitos gravitacionais não são capazes de interferir em qualquer nível de crescimento do cabelo. Na verdade, não somos capazes de senti-los no nosso corpo nem se quisermos. A Lua sempre está presente próximo ao nosso planeta, e o Sol também exerce força gravitacional sobre nós. Se fôssemos calcular a diferença de peso que sentimos por sermos atraídos pela Lua, junto ou não do Sol, teríamos um valor em torno de 0,000001% do nosso peso, ou seja, alguns miligramas. Agora pegue esses miligramas (em torno de 50) e distribua por toda a sua massa. É só você pensar nas marés: quantos quilos você acha que existe de água nos oceanos? Inimagináveis, certo? Agora veja que as marés só sobem alguns metros. Relacione alguns metros de trabalho fórmula de força (F=ma) e você descobrirá que os efeitos gravitacionais da Lua são muito fracos quando comparados com a aceleração gravitacional do nosso planeta na sua superfície. Isso já torna, à primeira vista, pouco provável a possibilidade de que o fator 'gravidade' tenha alguma influência no nosso corpo.
Já em relação à luz emitida pela Lua, esta é apenas compostas de comprimentos de radiação emanadas também pelo próprio Sol. Ora, a Lua não produz luz própria, apenas reflete a luz produzida pela nossa querida estrela. Se víssemos nosso planeta de bem longe no espaço, ele também se apresentaria como um corpo bastante brilhante, por estar também refletindo a luz solar. Se algo na luz da Lua influenciasse no crescimento positivo do cabelo, as pessoas que ficassem debaixo do Sol se tornariam um Primo Itt da Família Adams em questão de dias! (Risos) Ou melhor: era só incidir os comprimentos de luz refletido pela Lua nos cabelos, sem necessidade de ficar parado, à noite, tomando um banho lunar. Existem também hipóteses sobre a magnitude de interferência da Lua, e suas fases, sobre o campo eletromagnético da Terra, mas se isso pode interferir com algum ser vivo no planeta ainda não se tem evidência alguma (Ref.9).
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Deixando a brincadeira de lado, diversos estudos já foram feitos em humanos para verificar se existem reais efeitos fisiológicos em nosso corpo derivados da influência dos ciclos lunares. Até hoje, nada foi encontrado. Porém, alguns estudos recentes vem relacionando alguns padrões de sono com as fases da Lua, mostrando existir supostas diferenças significativas na duração e experiência do sono (Ref.1,2,3). Um grande estudo deste ano realmente achou uma tímida relação (cerca de 1%) de diferença entre as fases lunares no sono, mas sem existir explicação do porquê e com o tal resultado podendo não ter valor clínico nenhum (não existência de importância biológica). Este estudo foi feito em parceria com vários grupos de pesquisadores, usando-se comportamentos de crianças de 12 países (Ref.4).
Já outro estudo de revisão/clínico não encontrou evidência nenhuma de diferenças no padrão de sono causadas pelas fases da Lua quando o sistema elétrico cerebral era investigado e ainda questionou a confiabilidade de outros estudos que mostravam resultados contrários (Ref.5), os quais poderiam não estar levando em conta diversas variáveis ambientais, inclusive culturais. Fora isso, nenhum comportamento humano parece sofrer influência da Lua de acordo com o atual consenso científico. Ciclos menstruais com o período próximo ao do ciclo lunar parece ser apenas uma coincidência ( ainda mais quando levamos em conta as tantas irregularidades) e comportamentos mais agressivos de doentes mentais influenciados pelas fases da Lua não encontram suporte científico (Doenças mentais tornam as pessoas mais agressivas?). E a tão famosa relação entre a maior incidência de partos com a Lua Cheia também não possui base científica, sendo considerado um mito médico (Ref.16-21).
O negócio de 'A Lua Nova é a melhor época para cortar os cabelos, porque eles vão crescer com mais força e rapidez' não encontra apoio científico nenhum. Ora, se a força gravitacional que a Lua exerce sobre a superfície da Terra não é capaz nem de tremer um fio do nosso cabelo, ou, de longe, ser comparável com a gravidade terrestre sobre nossos corpos, qual é o seu efeito na raiz capilar? Nenhum perceptível. Reações bioquímicas na superfície terrestre não parecem ser afetadas, significativamente, pela gravidade da Lua, independentemente da sua posição de órbita. Quanto à luz, ela é a mesma encontrada no Sol e na sua lâmpada. E caso existam organismos vivos sensíveis o suficiente para perceberem supostas variações ínfimas no campo magnético da Terra ou gravidade, isso não é conhecido.
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O único real efeito comprovado da Lua nos seres vivos da Terra é através da sua luminosidade (1). Muitos animais se guiam através dela à noite, tanto para identificar o alimento quanto para encontrar o seu caminho na escuridão causada pela ausência dos raios solares. Outro efeito ecológico da Lua é na criação de certos ecossistemas ao longo das costas oceânicas devido ao efeito de maré (Como são formadas as ondas e marés?). Fora isso, é mais fácil acreditar que existam Sayajins virando gorilas gigantes ao olhar para a Lua Cheia do que um cabelo indomável banhado pelas fases lunares (Risos).
(1) Existem efeitos indiretos dos ciclos da lua que podem, ou não, afetar o comportamento de alguns animais, mas provavelmente não por causa da gravidade ou luz lunar, mas, sim, por causa de uma sincronização de eventos. Se existe algo a mais nessa relação, não é garantido por nenhuma evidência científica. A ocorrência das marés pode explicar o comportamento de animais nas regiões costeiras e a luminosidade lunar pode influir no comportamento de animais no meio das massas de água (ou seja, quando não percebem as marés).
OBS.: Alguns poucos estudos tentam relacionar algum efeito das fases da Lua sobre as plantas, levando-se em conta, principalmente, os efeitos gravitacionais, porque a luz lunar não possui poder de interferir perceptivelmente na fotossíntese (exceto no caso de dos fitoplânctons, organismos unicelulares procarióticos e fotossintéticos). Mas as evidências são muito escassas e/ou não podem ser comprovadas. É válido mencionar isso porque muitas pessoas acham que as fases da Lua influenciam bastante na produção da lavoura, assim como no desenvolvimento das plantas no jardim. Não existem reais evidências científicas de que isso seja verdade.
Artigo recomendado: Como são formadas as ondas e marés?
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
- http://onlinelibrary.wiley.com/enhanced/doi/10.1111/jsr.12312/
- http://onlinelibrary.wiley.com/enhanced/doi/10.1111/cob.12092
- http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0960982213007549
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4805596/
- http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0960982214005429
- http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0960982208008658
- http://bmcoralhealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12903-015-0001-2
- http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1095-8649.2009.02481.x/full
- http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0928468015300109
- http://aob.oxfordjournals.org/content/116/2/149.short
- http://aob.oxfordjournals.org/content/110/2/301.short
- http://link.springer.com/article/10.1007/s00425-015-2280-x
- http://link.springer.com/article/10.1007/s00709-016-0947-1
- http://jbr.sagepub.com/content/early/2015/08/26/0748730415591662.abstract
- http://europepmc.org/articles/pmc4307598
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9711362
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12131634
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21713579
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18607814
- http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672010000300021
- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22910625