Por que os tardígrados são tão resistentes?
- Atualizado no dia 28 de agosto de 2024 -
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Os tardígrados estão entre os seres vivos mais fascinantes e resistentes do planeta. Esses animais são capazes de sobreviver por décadas sem comida ou água, enfrentar numa boa temperaturas próximas do zero absoluto até aquelas bem acima do ponto de ebulição da água, resistir a pressões variando do quase zero até valores muito acima daqueles encontrados no fundo oceânico, e sobreviver à exposição direta de perigosas radiações eletromagnéticas.
Não ultrapassando 1,5 milímetro de comprimento corporal e representados por várias espécies descritas, os tardígrados suportam extremos ambientais que derrubariam em instantes outros animais. Mas qual o segredo desses minúsculos animais que os tornam tão poderosos e únicos no ecossistema terrestre?
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Microscopia eletrônica de um tardígrado |
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TARDÍGRADOS INVENCÍVEIS
Tardígrados são seres minúsculos e frequentemente microscópicos - com dimensões típicas de 0, 05 a 1, 25 mm - com uma distribuição ao redor de todo o mundo, cobrindo ambientes marinhos, de água doce, lagos diversos e até mesmo terrestres (especialmente entre musgos). Eles são membros do superfilo Ecdysozoa, e passam por uma muda durante o crescimento pré-adulto e adulto. Fazem parte do clado Panartropoda e representam o filo Tardigrada, e atualmente são considerados como um filo irmão ao Onychophora (vermes-aveludados) e ao Arthropoda, este último incluindo invertebrados como insetos e aracnídeos. São conhecidos popularmente como 'Ursos-Aquáticos' e possuem corpos bem distintos com quatro pares de "pernas". Os tardígrados foram primeiro descritos pelo padre e zoólogo Alemão Johann Goeze, em 1773.
Relógios moleculares sugerem uma origem do filo Tardigrada no Pré-Cambriano, há >541 milhões de anos e em um ambiente marinho. Apesar disso, os mais antigos fósseis conhecidos são de 80-90 milhões de anos atrás (Ref.2). Colonização do ambiente terrestre pelos tardígrados é estimada de ter ocorrido no Siluriano Tardio-Devoniano Inicial, seguindo a radiação Cambriana de artrópodes e espelhando a evolução das plantas terrestres.
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> Aproximadamente 1400 espécies de tardígrados têm sido registradas de ambientes diversos (aquáticos e terrestres), mas o número real é pensado de ser pelo menos uma ordem de magnitude maior. Esses invertebrados possuem relação próxima com onicóforos e/ou artrópodes, com divergência desses grupos há mais de 500 milhões de anos. Os mais antigos membros "verdadeiros" de tardígrados conhecidos datam do Cretáceo (145 a 66 milhões de anos), a partir de fósseis preservados em âmbar.
> Tardígrados habitam virtualmente todos os tipos de sedimentos marinhos, desde zonas interdigais até profundidades abissais (registros em profundidades de até >5700 m). Preferem sedimentos macios/ásperos, mas podem ser também encontrados em pedras, algas e sobre animais como crustáceos cirrípedes. A diversidade de tardígrados nos mares é provavelmente muito subestimada e várias novas espécies continuam sendo descritas. Atualmente, mais de 200 espécies marinhas de tardígrados foram descritas, mas o número total global deve ser próximo de 1000. Apesar da maioria dos tardígrados até o momento terem sido descritos de ambientes terrestres, esses animais precisam estar cercados por um filme de água para ficarem ativos. Tardígrados marinhos possuem porte corporal inferior àqueles habitando ambientes terrestres e de água doce.
Leitura recomendada: Por que não existem peixes marinhos vivendo em profundidades abaixo de 8400 metros?
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Tardígrados apresentam diversas cores e características únicas. |
Todos os tardígrados necessitam de água ao seu redor para crescerem e se reproduzirem, mas algumas espécies - tipicamente aquelas vivendo em ambientes terrestres de lagos - possuem a habilidade de tolerar a quase total desidratação, e é daqui que vem grande parte da fama de superpoderosos desses animais - ou melhor, de boa parte dos seus representantes terrestres. Quando passam pela desidratação extrema, os tardígrados mais tolerantes perdem mais de 90% da água corporal e entram em um estado contraído e desidratado conhecido como anidrobiose, o qual é um estado ametabólico reversível. Nesse estado desidratado, os tardígrados suportam uma ampla variedade de extremos físicos que normalmente significariam a rápida morte da maior parte dos organismos.
Começando pela radiação, os tardígrados - englobando em específico as espécies Richtersius coronifer, Ramazzottius oberhauseri e Echiniscus testudo - podem sobreviver a doses letais de raios-X e partículas alfas (radiações ionizantes) sem nenhum problema. Para se ter uma ideia, essas doses podem ultrapassar 5 kGy e alcançar 8 kGy de partículas 4He, e onde humanos já começam a ter uma taxa de 50% de mortalidade em apenas 4 Gy. Resistem a doses de raio gama tão altas quando 3000-5000 Gy de raios gama, valor que é ~1000x a dose letal para humanos. Em testes feitos no espaço, esses animais sobrevivem vários dias no vácuo espacial, em pressões quase nulas e sem ar, sendo atacados violentamente por radiações mortais oriundas do Sol, e sem nenhuma atmosfera como proteção.
Começando pela radiação, os tardígrados - englobando em específico as espécies Richtersius coronifer, Ramazzottius oberhauseri e Echiniscus testudo - podem sobreviver a doses letais de raios-X e partículas alfas (radiações ionizantes) sem nenhum problema. Para se ter uma ideia, essas doses podem ultrapassar 5 kGy e alcançar 8 kGy de partículas 4He, e onde humanos já começam a ter uma taxa de 50% de mortalidade em apenas 4 Gy. Resistem a doses de raio gama tão altas quando 3000-5000 Gy de raios gama, valor que é ~1000x a dose letal para humanos. Em testes feitos no espaço, esses animais sobrevivem vários dias no vácuo espacial, em pressões quase nulas e sem ar, sendo atacados violentamente por radiações mortais oriundas do Sol, e sem nenhuma atmosfera como proteção.
Em outro extremo, esses animais são capazes de suportar 600 MPa de pressão, um valor altíssimo de pressão que não é encontrado nem
nos mais profundos mares e onde nem as mais resistentes bactérias
conseguem passar vivas dos 300 MPa.
Agora indo para extremos térmicos, tardígrados conseguem escapar ilesos de um aquecimento próximo ou superior a 100°C, numa faixa de temperatura que implica grandes danos no DNA e nas proteínas da maioria dos animais. E, novamente, indo para outro extremo, eles resistem a temperaturas beirando o zero absoluto (273,15°C negativos!). Em experimentos conduzidos em laboratório, tardígrados conseguem sobreviver horas e horas submersos em hélio líquido à 272°C negativos.
Agora indo para extremos térmicos, tardígrados conseguem escapar ilesos de um aquecimento próximo ou superior a 100°C, numa faixa de temperatura que implica grandes danos no DNA e nas proteínas da maioria dos animais. E, novamente, indo para outro extremo, eles resistem a temperaturas beirando o zero absoluto (273,15°C negativos!). Em experimentos conduzidos em laboratório, tardígrados conseguem sobreviver horas e horas submersos em hélio líquido à 272°C negativos.
Mas o mais
impressionante nas espécies terrestres é capacidade desses animais de resistir ao estado
de seca absoluta (anidro) a partir da criptobiose. Quando estão sem água disponível, os tardígrados se encolhem
todo o corpo, reduzem o metabolismo para apenas 0,01% do normal [!] e podem
passar anos nesse estado de quase morte, para depois saírem andando
felizes quando qualquer gota de água aterrissa sobre esses animais, em questão de apenas minutos! Além disso, conseguem sobreviver até mesmo depois de 6 ciclos repetidos de extrema dessecação (anidrobiose e a osmobiose). Quem primeiro descobriu que os tardígrados podiam ser revividos após quase completa dessecação com a adição de água foi o biólogo Italiano Lazzaro Spallanzani. Aliás, foi Spallanzani que deu o nome de 'Tardigrada' para esses animais, termo que significa 'movimentação lenta'.
E enquanto tardígrados possuem uma longevidade média de alguns meses quando hidratados, durante estado de anidrobiose, marcado por extrema desidratação via evaporação de água corporal, esses animais podem persistir por 1 década ou mais. Existe registro na literatura acadêmica de um tardígrado sendo revivido após 120 anos. Mas casos recordistas bem documentados de sobrevivência em estado de anidrobiose no ambiente natural variam de 5 a ~30 anos para a espécie Acutuncus antarcticus (Ref.25).
À PROVA DE BALA
MECANISMOS DE RESISTÊNCIA
Em um estudo publicado no periódico Astrobiology (Ref.13), pesquisadores descobriram que os tardígrados conseguem sobreviver a impactos a partir de velocidades de até 900 metros/s (0,9 km/s), equivalente a uma pressão de choque de 1,14 gigapascal (GPa). No caso, foram testados 20 tardígrados, em um estado de hibernação (quando ficam extremamente desidratados), resfriados por 48 horas até o metabolismo alcançar apenas 0,1% do normal. Para impulsioná-los até velocidades de quase 1 km/s, os pesquisadores usaram uma arma de gás de dois estágios.
Apesar dessa velocidade não ser tão alta quanto a maioria daquelas de meteoritos que impactam a Terra (tipicamente acima de 11 km/s), ainda é possível que tardígrados possam ser transportados entre mundos (Teoria da Panspermia): até 40% dos objetos terrestres impactando na Lua alcançam velocidades verticais baixas o suficiente para permitir sobrevivência desses animais. Ou seja, tardígrados saindo da Terra e perdidos por aí no espaço são talvez capazes de colonizar outros mundos e satélites naturais.
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ATUALIZAÇÕES (NOVAS ESPÉCIES):
- Uma espécie de tardígrado do gênero Paramacrobiotus descoberta na Índia foi recentemente descrita e traz pigmentos vermelhos no corpo que a protege de altas doses de radiação UV. Para mais informações, acesse: Descoberta espécie de tardígrado que traz um novo 'poder': fluorescência anti-UV
- Nova espécie de tardígrado na Finlândia e um novo poder revelado: tardígrados sobrevivem ao trato digestivo de caracóis
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MECANISMOS DE RESISTÊNCIA
Os mecanismos adaptativos encontrados no corpo do tardígrados ainda
não são totalmente conhecidos, e existe debates se a resistência deles
vêm mais de reparações ou de proteções celulares. Mas uma coisa é certa:
eles estão aí há mais de 600 milhões de anos e vão continuar ainda muito
mais.
Um notável estudo de 2016 (Ref.5), analisando uma das mais resistentes espécies de tardígrados, o Ramazzottius varieornatus, encontrou que a produção de uma proteína única desse animal - Dsup (!) - é capaz de prevenir grande parte dos danos causados por radiação raio-X no DNA. Aliás, em experimentos in vitro, danos de raios-X sobre células humanas geneticamente modificadas no sentido de expressar a proteína Dsup são reduzidos em 40%! Além de esclarecer um dos mecanismos de resistência desses animais, essa descoberta está abrindo as portas para novas estratégias terapêuticas que podem reduzir os danos de radioterapia.
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> A proteína supressora de dano (Dsup) é única de tardígrados e se liga ao DNA, protegendo de clivagens induzidas por radiação energética. Tardígrados conseguem resistir a níveis de radiação 2000 a 3000x maior - e níveis de radiação ionizante ~500x maior - do que humanos conseguem tolerar e essa habilidade é, em parte, devido ao efeito radioprotetor da proteína Dsup. Outros mecanismos de proteção celular contra radiação ionizante incluem genes específicos de reparo de DNA, pigmentos protetores e possivelmente maior capacidade de reparo de proteínas. Ref.26-27
> A proteína Dsup forma um complexo com o DNA exibindo uma distância intermolecular de ~4 Å. Esse complexo proteína-DNA cria um escudo contra moléculas oxigenadas reativas geradas durante estresse oxidativo e exposição a radiações energéticas. Essa proteína exibe alta estabilidade mesmo sob exposição a altas doses de radiação (5-10 kGy). Ref.28
> Um ortólogo da proteína Dsup (UniProt A0A1W0XB17) é também expresso no tardígrado da espécie Hypsibius exemplaris.
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Tardígrado da espécie Hypsibius exemplaris. Ref.25 |
> Quando expressa em células de animais e plantas diversos (ex.: tabaco e mosca-da-fruta) através de engenharia genética, a proteína Dsup fornece também efetiva proteção ao DNA desses organismos.
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Na radioterapia, partículas e/ou ondas eletromagnéticas muito energéticas como raio-X, raio gama, feixe de elétrons ou prótons são usadas para destruir ou danificar células cancerígenas no corpo. Porém, nesse processo, essas emissões energéticas também podem quebrar cadeias de DNA em células normais (saudáveis) próximas ou ao redor das células tumorais visadas, resultando em efeitos colaterais de toxicidade muito debilitantes. Radioterapia é frequentemente usada para tratar cânceres de cabeça e de pescoço (radioterapia), onde pode danificar a boca ou garganta do paciente, tornando muito difícil a ingestão de alimentos e bebidas. É também comumente usada para cânceres gastrointestinais, podendo levar a sangramentos retais. Nesse contexto, vários pacientes acabam atrasando o tratamento radioterápico ou mesmo abandonando-o.
Em um estudo mais recente publicado na Nature Biomedical Engineering (Ref.30), pesquisadores criaram nanopartículas ionizáveis baseadas em polímeros e lipídios para transportar RNA mensageiro (mRNA) codificando a proteína Dsup. Essas nanopartículas foram então administradas em camundongos [modelos de câncer] através de injeção nas bochechas e no reto, visando células saudáveis de revestimento das cavidades oral e retal, as quais são comumente danificadas em pacientes recebendo radioterapia para cânceres de cabeça, pescoço e próstata. Os roedores, então, foram submetidos a radioterapia. E essa estratégia deu certo: células saudáveis, após receberem o mRNA administrado, produziram Dsup suficiente para protegê-las dos efeitos destrutivos da radioterapia (redução de 50% nas quebras de cadeias duplas de DNA), e, ao mesmo tempo, permitindo efetiva destruição de tumores. O mRNA administrado e a expressão de Dsup nos tecidos dos camundongos é local e transiente, sendo eliminada em poucas horas do organismo.
O próximo passo dos cientistas é desenvolver uma versão da proteína Dsup que não engatilhe resposta imune em pacientes humanos, tornando-a mais segura mas mantendo sua atividade radioprotetora. Potencialmente essa estratégia terapêutica pode ser efetiva em proteger contra danos no DNA causados por medicamentos quimioterápicos e até mesmo astronautas contra radiação e partículas muito energéticas no meio espacial.
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> Mais da metade das pessoas com câncer recebem radioterapia. Às vezes, é a única terapia necessária para tratar o câncer e outras vezes é usada como tratamento auxiliar. A fonte de radiação administrada pode ser externa (ex.: máquinas de raio-X) ou interna (ex.: medicamentos radioativos orais ou intravenosos). Ref.32
> Atualmente, existem poucos modos de prevenir dano colateral da radioterapia em pacientes com câncer. Existem alguns medicamentos que podem ser dados para tentar reduzir esse dano, e, para pacientes com câncer de próstata, um hidrogel pode ser usado para criar uma barreira física entre a próstata e o reto durante a exposição radioterápica.
> O mRNA é uma espécie de instrução para a produção de proteína no maquinário celular. Para mais informações: Cientistas "brincando de Deus": Letras Artificiais no DNA
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Em termos da extrema desidratação, um estudo publicado este ano (Ref.6), mostrou que proteínas intrínsecas de desordens específicas (TDPs, na sigla em inglês) são essenciais para permitir essa grande tolerância à perda de água. De fato, os pesquisadores comprovaram que os genes relativos ao TDP são expressos em altos níveis ou induzidos durante dessecação em várias espécies de tardígrados. Nesse sentido, as TDPs formam sólidos amorfos não-cristalinos sob dessecação, sendo importantes nesse estado para sua tarefa protetora.
Além disso, mesmo não estando no estado desidratado e contraído, muitos tardígrados ativos conseguem ser muito tolerantes com estresses ambientais, lidando bem altos níveis de radiação ionizante, grandes flutuações na salinidade externa e evitando congelamento em temperaturas abaixo de 20°C negativos. Provavelmente os principais fatores de proteção nesse caso estejam estruturados em eficientes mecanismos de reparação do DNA e de osmorregulação. Aliás, resultados publicados em 2009 de um experimento realizado durante uma missão espacial envolvendo vários testes com a espécie Macrobiotus richtersi submetidas à microgravidade e radiação (Ref.7), mostraram que houve normal acasalamento e deposição de ovos pelas fêmeas nas condições espaciais, sendo que vários ovos eclodiram e os filhotes exibiram normal comportamento e morfologia.
E os superpoderes dos tardígrados têm sido explorados em várias pesquisas visando avanços na medicina.
Nesse último ponto, em um estudo recentemente publicado no periódico Scientific Reports (Ref.15), pesquisadores mostraram que versões naturais e engenhadas de proteínas extraídas de tardígrados podem ser usadas para estabilizar um importante produto farmacêutico usado para tratar pessoas com hemofilia (1) e outras condições sem a necessidade de refrigeração - mesmo sob altas temperaturas e outras condições agressivas de preservação. O produto em questão é o Fator VIII de coagulação sanguínea humana, crítico e efetivo para o tratamento de certas condições genéticas e quadros de extremos sangramentos. Porém, o Fator VIII é instável e precisa de condições específicas de temperatura - um grande desafio em regiões com escassos recursos ou afetadas por desastres naturais ou antrópicos. O novo estudo mostrou que proteínas CAHS, altamente expressas em certos tardígrados para proteger o corpo durante condições extremas (ex.: dessecação) - no caso, a proteína CAHS D, extraída da espécie Hypsibius exemplaris - é efetiva em estabilizar o Fator VIII em estado seco, mesmo em temperatura ambiente ou mais elevadas. O achado potencialmente revolucionário possui potencial também de otimizar a preservação de vários outros produtos médicos essenciais, como vacinas, anticorpos, células-tronco e sangue.
(1) Leitura recomendada: Hemofilia é uma doença apenas genética e hereditária?
Existe também um grande debate acadêmico sobre se o mecanismo de Transferência Horizontal de Genes (THG) pode ser um dos grandes responsáveis pelo resultado evolucionário final dos tardígrados. Porém, enquanto alguns estudos mostram massivas transferências genéticas dessa natureza, outros questionam tais achados, colocando a culpa em prováveis contaminações. (Para saber mais sobre o THG, acesse o artigo: A Evolução Biológica é um FATO)
Se você estava com dúvidas quanto a quem coroar com o título de animal mais parrudo do planeta, são poucas as chances de erro se você apostar todas as suas fichas nos tardígrados. Estudos com o DNA desses fantásticos seres ainda renderão muitos avanços no futuro, especialmente no campo evolucionário e da medicina. Não surpreende que possam ser encontrados em praticamente todos os lugares da Terra e estarem bem adaptados ao extremos da região Ártica (principalmente com a ajuda da criptobiose).
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
(!) DSUP E RADICAIS
Como explorado, a proteína nuclear Dsup (Damage suppression protein, na tradução proteína de supressão de danos), é encontrada somente nos tardígrados (especificamente na espécie Ramazzottius varieornatus). Quando a Dsup é testada em células humanas e in vivo (camundongos), ela promove proteção contra raios-X, ou seja, essa proteína parece ser um dos principais meios de proteção contra os danos radioativos. Mas até pouco tempo atrás, não se sabia como exatamente essa proteína atuava para cumprir esse papel protetor.
Um estudo publicado em 2019 no periódico eLife (Ref.12) mostrou que a Dsup se liga à cromatina (a forma assumida pelo DNA no núcleo celular) via nucleossomos. Uma vez ligada, a Dsup protege a célula ao formar uma "nuvem" protetora que defende o DNA de radicais hidroxilas, estes os quais são gerados pelos raios-X ao interagir com as moléculas de água. Estudando outra espécie, a Hypsibius exemplaris, os pesquisadores também encontraram uma proteína ortóloga à Dsup (He Dsup) que se liga à cromatina e cumpre a mesma função.
Os autores do estudo não acreditam, porém, que essas proteínas evoluíram especificamente em um contexto de proteção contra raios-X e, sim, para proteger esses animais em ambientes agressivos que também promovem a formação de radicais hidroxilas, como em secas prolongadas.
Como explorado, a proteína nuclear Dsup (Damage suppression protein, na tradução proteína de supressão de danos), é encontrada somente nos tardígrados (especificamente na espécie Ramazzottius varieornatus). Quando a Dsup é testada em células humanas e in vivo (camundongos), ela promove proteção contra raios-X, ou seja, essa proteína parece ser um dos principais meios de proteção contra os danos radioativos. Mas até pouco tempo atrás, não se sabia como exatamente essa proteína atuava para cumprir esse papel protetor.
Um estudo publicado em 2019 no periódico eLife (Ref.12) mostrou que a Dsup se liga à cromatina (a forma assumida pelo DNA no núcleo celular) via nucleossomos. Uma vez ligada, a Dsup protege a célula ao formar uma "nuvem" protetora que defende o DNA de radicais hidroxilas, estes os quais são gerados pelos raios-X ao interagir com as moléculas de água. Estudando outra espécie, a Hypsibius exemplaris, os pesquisadores também encontraram uma proteína ortóloga à Dsup (He Dsup) que se liga à cromatina e cumpre a mesma função.
Os autores do estudo não acreditam, porém, que essas proteínas evoluíram especificamente em um contexto de proteção contra raios-X e, sim, para proteger esses animais em ambientes agressivos que também promovem a formação de radicais hidroxilas, como em secas prolongadas.
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> Cientistas recentemente conseguiram criar filhotes de tardígrados geneticamente modificados (Ref.24). No caso, injetando uma solução concentrada do editor genético CRISPR [Cas9 RNP] na cavidade corporal de fêmeas da espécie Ramazzottius varieornatus. Os filhotes gerados por fêmeas que receberam o editor genético nasceram com mutações no locus genético visado, incluindo mutantes homozigóticos. Pesquisadores agora esperam desvendar em detalhes os mecanismos moleculares que tornam esses animais tão resistentes.
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FÓSSEIS RAROS
Esse pequeno tardígrado preservado em um pedaço de âmbar (A) e datado em 16 milhões de anos (Mioceno), foi descoberto recentemente na República Dominicana, país da América Central. O achado - publicado recentemente no periódico Proceedings of the Royal Society B (Ref.14) - é mais do que notável, já que é apenas o terceiro tardígrado fossilizado descrito pela comunidade científica, e o primeiro do Cenozoico (a atual Era Geológica).
Com pouco mais de 0,5 milímetro, o espécime preservado representa um novo gênero e espécie (Paradoryphoribius chronocaribbeus), sendo identificado como um membro evolutivo primordial da superfamília de tardígrados modernos Isohypsibioidea.
A descoberta abre importantes caminhos para melhor explorar a evolução desse grupo de animais (em especial, na calibragem de relógios moleculares).
Análises mais recentes dos dois fósseis prévios, datados em 80 milhões de anos e também preservados em âmbar, apontam que esses animais evoluíram um dos seus principais superpoderes já no Cretáceo: criptobiose (Ref.23). O fóssil maior pertence à espécie Beorn leggi, nomeada em homenagem a um dos personagens inventados por J. R. R. Tolkien. Com ~310 mícrons de comprimento, o B. leggi traz sete garras bem preservadas. O fóssil menor, da espécie Aerobius dactylus, possui ~100 mícrons de comprimento. Ambos pertencem ao grupo Eutardigrada. As análises desses dois espécies fossilizados sugerem que os eutardígrados e o grupo Heterotardigrada - englobando ordens de tardígrados marinhos - divergiram entre si há ~500 milhões de anos.
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Reconstrução artística dos dois espécimes fossilizados em âmbar: Beorn leggi e Aerobius dactylu. Ref.23 |
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CONCLUSÃO
Se você estava com dúvidas quanto a quem coroar com o título de animal mais parrudo do planeta, são poucas as chances de erro se você apostar todas as suas fichas nos tardígrados. Estudos com o DNA desses fantásticos seres ainda renderão muitos avanços no futuro, especialmente no campo evolucionário e da medicina. Não surpreende que possam ser encontrados em praticamente todos os lugares da Terra e estarem bem adaptados ao extremos da região Ártica (principalmente com a ajuda da criptobiose).
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
- https://www.eje.cz/pdfs/eje/1996/03/07.pdf
- Ingemar et al. (2020). Tardigrades – Evolutionary Explorers in Extreme Environments. https://doi.org/10.1002/9781119593096.ch12
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21251237
- https://apod.nasa.gov/apod/ap130306.html
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28306513
- Hashimoto et al. (2016). Extremotolerant tardigrade genome and improved radiotolerance of human cultured cells by tardigrade-unique protein. Nature Communications 7, 12808. https://doi.org/10.1038/ncomms12808
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19663764
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27828978
- https://australianmuseum.net.au/uploads/journals/17856/1276_complete.pdf
- http://snm.ku.dk/SNMnyheder/alle_nyheder/2008/2008.11/241108_videnskabsgalla/masterthesis-dennispersson.pdf
- http://www.cell.com/current-biology/pdf/S0960-9822(02)00959-4.pdf
- https://elifesciences.org/articles/47682
- https://www.liebertpub.com/doi/full/10.1089/ast.2020.2405
- Mapalo et al. (2021). A tardigrade in Dominican amber. Proceedings of the Royal Society B, Volume 288, Issue 1960. https://doi.org/10.1098/rspb.2021.1760
- Packebush et al. (2023). Natural and engineered mediators of desiccation tolerance stabilize Human Blood Clotting Factor VIII in a dry state. Scientific Reports 13, 4542. https://doi.org/10.1038/s41598-023-31586-9
- https://www.mdpi.com/1424-2818/15/2/210
- https://www.mdpi.com/1424-2818/12/2/63
- Paul et al. (2020). Latitudinal gradients in body size in marine tardigrades, Zoological Journal of the Linnean Society, Volume 188, Issue 3, Pages 820–838. https://doi.org/10.1093/zoolinnean/zlz080
- Zawierucha et al. (2015). First observation of the marine tardigradesBatillipes mirusandBatillipes noerrevangi(Arthrotardigrada, Batillipedidae) from a strongly brackish part of the Polish Baltic Sea coast. Marine Biology Research, 11(8), 859–868. https://doi.org/10.1080/17451000.2015.1024133
- Saulenko et al. (2022). Deep-Sea Tardigrades from the North-Western Pacific, with Descriptions of Two New Species. Diversity 14(12), 1086. https://doi.org/10.3390/d14121086
- Nelson et al. (2018). Tardigrade Ecology. The Handbook of Environmental Chemistry, 163–210. https://doi.org/10.1007/978-3-319-95702-9_7
- Jörgensen & Kristensen (2001). A New Tanarctid Arthrotardigrade with Buoyant Bodies. Zoologischer Anzeiger - A Journal of Comparative Zoology, 240(3-4), 425–439. https://doi.org/10.1078/0044-5231-00051
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- Gartner et al. (2024). Tardigrades: Trained to be hardy in the face of DNA damage. Current Biology, Volume 34, Issue 10, pR504-R507. https://doi.org/10.1016/j.cub.2024.04.030
- Li et al. (2024). Multi-omics landscape and molecular basis of radiation tolerance in a tardigrade. Science, Vol. 386, Issue 6720. https://doi.org/10.1126/science.adl0799
- Zarubin et al. (2024). Radioprotective Protein of Tardigrades Dsup (Damage Suppressor) is Resistant to High Doses of Ionizing Radiation. Moscow University Physics Bulletin 79, 91–96. https://doi.org/10.3103/S0027134924700024
- Zarubin et al. (2024). Structural study of the intrinsically disordered tardigrade damage suppressor protein (Dsup) and its complex with DNA. Scientific Reports 14, 22910. https://doi.org/10.1038/s41598-024-74335-2
- Kirtane et al. (2025). Radioprotection of healthy tissue via nanoparticle-delivered mRNA encoding for a damage-suppressor protein found in tardigrades. Nature Biomedical Engineering. https://doi.org/10.1038/s41551-025-01360-5
- https://radiationoncology.medicine.uiowa.edu/news/2025/02/tardigrade-protein-may-help-protect-cancer-patients-radiation-side-effects
- https://www.cancer.org/cancer/managing-cancer/treatment-types/radiation/basics.html