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Por que em regiões litorâneas o aço enferruja mais rápido?

Figura 1. Estrutura de concreto [poste] fraturada pela ação da maresia. Estruturas constituídas de partes metálicas como aço chegam a perder a função estrutural em cerca de um décimo do tempo em regiões litorâneas. Ref.1
 

          A corrosão é a deterioração de um material, geralmente metálico, por ação química, eletrolítica ou eletroquímica do meio ambiente associada ou não a esforços mecânicos. Os ataques corrosivos podem ocorrer sob diferentes formas e os fatores naturais que influenciam a ação corrosiva da atmosfera são basicamente três: a temperatura, a chuva e o vento.

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> A água da chuva possui especial relevância por sair arrastando componentes diversos na atmosfera através das gotículas em queda. Gases poluentes comumente encontrados nas gotículas são o dióxido de enxofre (SO2), trióxido de enxofre (SO3), óxido de nitrogênio (NO) e dióxido de nitrogênio (NO2) - em especial o SO2 e o NO2 -, os quais se transformam em ácidos fortes no meio aquoso que contribuem de forma robusta para processos corrosivos.

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           Quando agentes oxidantes como os gás oxigênio e o íon hidrogênio (H+) entram em contato com a superfície do metal, esses passam a receber seus elétrons (oxidação metálica). Os elétrons consumidos na reação de redução, que ocorre no cátodo, são fornecidos pela reação de oxidação do metal, que ocorre no ânodo, sendo estes transferidos para o cátodo através da peça metálica, que atua como um eletrodo (material no qual ocorre a transferência de elétrons). Nesse contexto, a maioria dos metais é corroída de algum modo por efeito da água e da atmosfera.

          E onde a maresia entra nesse processo?

           As altas taxas de corrosão no litoral estão fortemente associadas à maresia, e, no caso, envolve corrosão eletroquímica. A maresia é uma "névoa" salina provinda do mar carregada principalmente com sais como cloreto de sódio (NaCl) e de magnésio (MgCl); o NaCl é muito abundante na maresia e, portanto, atua de forma crucial na corrosão atmosférica de metais. A corrosão que ocorre nos metais nas regiões costeiras é acelerada em particular pela presença dos íons na água do mar e nos evaporitos e aerossóis carregando esses íons através da atmosfera. Tais íons (ex.: Nae Cl-) fazem uma ponte salina, o que possibilita o fenômeno de oxirredução entre o oxigênio do ar e os metais expostos a esses ambientes. Em especial, o cloreto (Cl-) é o íon que mais promove o processo de corrosão. O vento na atmosfera contribui bastante nesse cenário ao transportar os aerossóis marinhos carregando o Cl- e outros íons que eventualmente são depositados sobre as estruturas metálicas. 

Figura 2. Esquema ilustrado de um gota salina [corte transversal] depositada sobre uma peça metálica (contendo ferro) e com a indicação das reações que ocorrem. O Ferro é oxidado (Fe → Fe2+ + 2e-) pelo oxigênio atmosférico (O2), iniciando o processo de corrosão. A concentração elevada dos íons cloreto (Cl-) aumenta a condutividade elétrica da água, permitindo maior fluxo de íons e, consequentemente, uma maior rapidez no processo de corrosão do metal, otimizando a ponte salina e formando uma efetiva pilha entre o metal e o meio ambiente. O produto final do processo corrosivo é a ferrugem, de cor amarronzada, resultante da reação entre o íon ferroso (Fe2+) formado na região anódica e a hidroxila (OH-) formada na região catódica (O2 + 2H2O + 4e- → 4OH-). A ferrugem tem uma composição química complexa, porém, basicamente, é constituída de compostos na forma FeOOH e Fe3O4Ref.2

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> Para mais informações sobre o funcionamento de uma pilha eletroquímica: Prêmio Nobel de Química vai para os pesquisadores que desenvolveram a bateria de íon-lítio

> Evidência científica suporta que apenas partículas e gotículas de sal marinho com mais de 10-30 micrômetros (µm) causam corrosão quando depositados em uma superfície metálica. Como tais partículas permanecem na atmosfera apenas por um curto período de tempo, geralmente corrosão completamente perde influência marítima com poucos quilômetros de distância do mar. Mas tempestades severas podem carregar os aerossóis de sais tão distantes quanto 15 km (Ref.8). Essas partículas são formadas principalmente pela movimentação e quebra de ondas oceânicas. Vários fatores interferem na magnitude de salinidade na atmosfera de regiões litorâneas, como tamanho das ondas, topografia, força dos ventos, etc.

> A camada eletrolítica na corrosão atmosférica de metais pode ser tanto um filme úmido extremamente fino (apenas poucas monocamadas) ou um filme aquoso de centenas de mícrons de espessura (quando o metal está perceptivelmente molhado). Precipitação aquosa (chuva, nevoeiro, etc.) e condensação de umidade devido a mudanças de temperatura (orvalho) são os principais promotores de corrosão metálica na atmosfera. 

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           Além da maior condutividade elétrica proporcionada pelos íons Cl-, outros mecanismos estão também envolvidos favorecendo a corrosão metálica na presença de cloreto (Ref.3-6):

- natureza higroscópica (maior atração de água) de espécies Cl- como o cloreto de sódio (NaCl), cloreto de cálcio (CaCl2) e o cloreto de magnésio (MgCl2), fator que promove o processo de corrosão eletroquímica ao favorecer a formação de eletrólitos em ar com umidade relativa baixa (até 33%);

- aumento de solubilidade dos produtos de corrosão (sais e complexos metálicos de cloreto são geralmente muito solúveis), facilitando a estabilização de compostos oxidados de transição no meio aquoso e, portanto, favorecendo a reação de corrosão. 

          A salinidade no ar geralmente aumenta com o aumento da velocidade do vento, e o efeito se torna muito significante quando uma velocidade crítica é excedida (3-7,1 m/s). A taxa de corrosão metálica aumenta de forma mais rápida quando os valores de deposição de Cl- está entre 100 e 400 mg de Cl-/m2/dia. Ref.7

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          Os prejuízos causados pela maresia atingem valores extremamente altos, resultando em consideráveis desperdícios de materiais. Só para citarmos alguns exemplos, a CEPEL (Centro de Pesquisas da Eletrobrás), em Fortaleza, aponta que a vida útil de um poste, normalmente entre 25 e 30 anos, em regiões litorâneas, como na Praia do Futuro (Fortaleza - CE) é reduzida a menos de cinco anos. Os transformadores e demais equipamentos elétricos, que deveriam durar 20 anos, têm que passar por processos de manutenção constante a partir do segundo ano de uso. Ref.2


REFERÊNCIAS

  1. Araujo, A. L. R. (2019). Trabalho de conclusão de curso (TCC). Curso de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual do Maranhão. Link
  2. http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc26/v26a05.pdf
  3. Alcántara et al. (2017). Marine Atmospheric Corrosion of Carbon Steel: A Review. Materials, 10(4): 406. https://doi.org/10.3390%2Fma10040406
  4. Wang et al. (2019). Microscopic Analysis of Steel Corrosion Products in Seawater and Sea-Sand Concrete. Materials, 12(20): 3330. https://doi.org/10.3390%2Fma12203330
  5. https://iopscience.iop.org/article/10.1149/2.0221410jes/pdf
  6. Morcillo et al. (2015). Marine atmospheric corrosion of carbon steels. Revista de Metalurgia 51(2): e045. http://dx.doi.org/10.3989/revmetalm.045
  7. Li & Hihara (2014). Aerosol Salt Particle Deposition on Metals Exposed to Marine Environments: A Study Related to Marine Atmospheric Corrosion. Journal of The Electrochemical Society, Volume 161, Number 5. https://doi.org/10.1149/2.071405jes
  8. Vashi & Kadiya (2009). Corrosion Study of Metals in Marine Environment. E-Journal of Chemistry 6(4), 1240-1246.