Qual a mais forte mordida estimada para um animal terrestre?
- Atualizado no dia 11 de novembro de 2024 -
A espécie Purussaurus brasiliensis habitou porções ao noroeste da América do Sul (Pan-Amazônia) durante o Mioceno Superior. Nesse período, a região era constituída de um grande sistema de terras alagadas, favorecendo o gênero extinto de jacarés-gigantes Purussaurus, este o qual perdurou desde meados até o fim do Mioceno (23-12 milhões de anos atrás). O P. brasiliensis é a maior espécie conhecida desse gênero, e seus fósseis são conhecidos a partir da Formação Solimões do Mioceno Superior, no território hoje pertencente ao Brasil (apesar de materiais associados também já terem sido descritos na Bolívia).
É estimado que um indivíduo adulto alcançava 12,5 metros de comprimento, possuía uma massa corporal em torno de 8,4 toneladas, e um consumo alimentar diário médio de 41 kg (1). Análises dos seus fósseis junto com simulações biomecânicas sugerem que esse crocodiliano era capaz de gerar mordidas com força de até 69000 N (equivalente a cerca de 7 toneladas de peso na superfície terrestre) (2), algo quase 4 vezes mais forte que a mordida de um tubarão-branco. Esse valor é superior ao estimado para a força máxima de mordida do Tyrannosaurus rex (35000-57000 N), e é a mais poderosa estimada ou conhecida entre os animais terrestres que já habitaram o planeta. Seu robusto tamanho e extrema força de mordida sugerem que esse réptil era um dos principais predadores do seu ecossistema, potencialmente se alimentando de quase tudo que se movia, independentemente do tamanho (!).
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Crânio de um espécime subadulto de Purussaurus brasiliensis. Barra de escala = 200 mm. Ref.3 |
A evolução de grandes crocodilianos da linhagem Caimaninae na Amazônia Ocidental do Mioceno, como espécies do gênero Purussaurus, está ligada a condições climáticas mais quentes na região, com significativamente menos variação sazonal de temperatura (Ref.4).
> Apesar da poderosa mordida desse extinto crocodiliano, outra espécie também extinta que reinou os mares no mesmo período (Mioceno) provavelmente gerava mais do que o dobro de força de mordida: o super-tubarão Megalodon (Otodus megalodon). Para saber mais, acesse: Megalodon: A colossal máquina de caça dos mares pré-históricos
(1) Análise mais recente sugere dimensões corporais significativamente menores para o P. brasiliensis: 9-10 metros de comprimento total e massa corporal de ~4-5 toneladas. Ref.3
(2) Lembrando a clássica fórmula de força (F = ma, ou seja, força = massa x aceleração). No caso do peso*, a força equivalente próximo da superfície terrestre é encontrada multiplicando-se a massa pela aceleração da gravidade (~9,8 m/s2). No caso da mordida do P. brasiliensis, é como se estivéssemos colocando uma massa de 7,04 mil quilos (kg) sobre uma boca cheia de dentes afiados, e você estivesse debaixo dessa boca sendo esmagado e perfurado.
*Peso é medido em unidades de força (Newton, N). O peso equivalente a 7040 kg é 69000 N.
(!) GIRO DA MORTE
Crocodilianos não conseguem mastigar e, nesse sentido, esses répteis usam a forte mordida junto com um poderoso movimento de giro de corpo inteiro ("giro da morte") para incapacitar, matar e desmembrar a presa em pedaços menores que são então engolidos.
O "giro da morte" - realizado ao longo do eixo longitudinal do animal - parece ser quase universal nas atuais espécies de jacarés e crocodilos, com aparentemente uma única exceção: jacaré-anão, espécie Paleosuchus palpebrosu (Ref.5).
O comportamento, porém, não parece ter função apenas alimentar. É também acionado em resposta a ameaças intra- e interespecíficas, talvez para ferir oponentes ou mesmo como uma manobra de escape de predadores.
Análises biomecânicas de estresse craniano sugerem que certos crocodilomorfos gigantes extintos eram também capazes de realizar o giro da morte para incapacitar e matar dinossauros no Cretáceo - no caso do Deinosuchus - e mamíferos no Mioceno - no caso do Purussaurus - de grande porte (Ref.6). Mas ainda é incerto se os maiores representantes desses gêneros (P. brasiliensis e D. riograndenis) possuíam a capacidade física para utilizar o giro como estratégia de alimentação.
Embora plausível, a velocidade angular de giro para crocodilomorfos gigantes teria que ser significativamente reduzida em relação aos crocodilianos modernos e de menor porte para permitir o movimento.
REFERÊNCIAS
- https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0117944
- https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5435714/
- Paiva et al. (2022). Body size estimation of Caimaninae specimens from the Miocene of South America. Journal of South American Earth Sciences, Volume 118, 103970. https://doi.org/10.1016/j.jsames.2022.103970
- Paiva et al. (2024). The role of climate on the emergence of giant caimanines (Crocodylia, Alligatoroidea) from the Miocene western Amazonian region. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, Volume 656, 112582. https://doi.org/10.1016/j.palaeo.2024.112582
- Drumheller et al. (2019). Surveying death roll behavior across Crocodylia. Ethology Ecology & Evolution, Volume 31, Issue 4. https://doi.org/10.1080/03949370.2019.1592231
- Blanco et al. (2014). The ‘death roll’ of giant fossil crocodyliforms (Crocodylomorpha: Neosuchia): allometric and skull strength analysis. Historical Biology. https://doi.org/10.1080/08912963.2014.893300
- https://museum.wa.gov.au/explore/dinosaur-discovery/deinosuchus