YouTube

Artigos Recentes

 Caro Editor,

Desejo trazer a conhecimento o caso de BGL, 49 anos, solteiro, sexo masculino, aposentado e interno do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico de Franco da Rocha-SP. Segundo consta no inquérito policial, ele violou uma sepultura e vilipendiou o cadáver de uma mulher de 82 anos de idade introduzindo um cabo de vassoura na vagina dela no mesmo dia que a vítima foi sepultada. 

O acusado se encontrava embriagado e foi visto com uma garrafa de aguardente durante o sepultamento da vítima. No meio policial e entre os moradores de sua cidade era conhecido como necrófilo e tinha o hábito de violentar cadáveres homens. Ao delegado de polícia, o acusado confessou o delito e disse que tinha atração sexual por pessoas mortas e que poderiam ser homens ou mulheres, não importava a idade, e que não se sentia atraído por pessoas vivas. Havia sido preso anteriormente por ter abusado sexualmente de um homem e uma mulher falecidos e, inclusive, praticou sexo anal com o cadáver masculino. Sentia-se muito excitado sexualmente diante de um cadáver e se masturbava. Os irmãos relataram que o interno não conseguiu ter aprendizagem na escola e nem trabalhar ou ter vida socioeconômica independente. Aos 15-16 anos de idade furtou algumas vezes caixões de crianças de uma funerária, colocava-os na sala de sua casa, chamava as pessoas para um velório e então se descobria que os caixões estavam vazios. Houve menção de que tentava violentar o cadáver de uma pessoa que lhe provocava raiva quando viva. Em casa era calmo e cooperativo, não ingeria bebida alcoólica de modo frequente e nem usava drogas. Tinha tendência para homossexualidade e nunca teve namoradas. Quando jovem, teria sido violentado sexualmente por outro homem. Anteriormente, não se submeteu a tratamento psiquiátrico de forma regular. O exame físico revelou dismorfia da face, biotipo displásico e obesidade. O exame psíquico revelou déficit de inteligência como transtorno significativo em associação com perversão sexual.

Necrofilia é uma rara e bizarra parafilia caracterizada por atração e gratificação sexual por pessoas mortas.

Richard Von Krafft-Ebing é considerado um dos primeiros cientistas interessados em comportamentos sexuais anormais e, em 1886, ele considerava necrofilia como um comportamento perverso e que poderia ser decorrente de condições "neuropáticas ou psicopáticas", como senilidade ou enfraquecimento mental adquirido. O caso relatado é congruente com a descrição de enfraquecimento mental e esta perversão sexual.

A literatura mais antiga associava necrofilia com severa psicopatologia. Desrosières analisou 53 observações de casos descritos e encontrou 19% de debilidade mental, 13% de problemas neuróticos, 7,5% de epilepsia, 5,5% de depressão e 4% de psicose. Estas observações são concordantes com o caso relatado (presença de severa psicopatologia e retardo mental).

Rosman e Resnick revisaram 122 casos de necrofilia, classificando-os em três tipos (homicídio necrofílico, necrofilia regular e fantasia necrofílica), e descobriram que 11% dos necrófilos genuínos mostraram evidência de psicose. Álcool foi considerado um fator importante para vencer a inibição e cometer o ato (especialmente no grupo homicida), mas o diagnóstico mais comum foi transtorno de personalidade (metade da amostra). O uso de álcool contribuiu para o delito ocorrido no caso relatado e se mostrou congruente com a revisão desses autores.

Anil Aggrawal propôs uma nova classificação para necrofilia: pseudonecrofilia (uma pessoa finge estar morta), necrófilo romântico, necrófilos platônicos ou fantasias necrófilas, necrófilos táteis, necrofilia fetichista, necromutilomania, necrófilos oportunistas, necrófilos regulares, necrófilos homicidas e necrófilos exclusivos5. O caso relatado preenche critérios diagnósticos para necrofilia em associação com retardo mental moderado e abuso de álcool e pode ser considerado um necrófilo regular ou também chamado "necrófilo clássico" (preferência por contatos sexuais com pessoas mortas, embora possa ter contatos sexuais com pessoas vivas e mortas).

Roberto Moscatello

Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Professor
André Teixeira Lima, Franco da Rocha, SP, Brasil


> Carta ao Editor publicada em 2010 na Revista Brasileira de Psiquiatria

> Apesar da necrofilia ser tratada como uma determinada obsessão a uma gratificação sexual com pessoas mortas, alguns autores definem alguns tipos de necrofilia: a necrofilia dita verdadeira, na qual são mantidas relações sexuais com mortos; a necrofilia homicida, em que há assassinato com objetivos sexuais premeditados; e a necrofilia fantasiada, que diz respeito a fantasias sobre atos sexuais com mortos. Ao longo da história, em determinadas regiões e culturas mais antigas, era obtido à prática da necrofilia como um determinado meio de se comunicar com os mortos no mundo físico e espiritual, enquanto algumas outras tinham esta prática como determinada tentativa de proporcionar um renascimento dos seus entes recém-partidos