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Qual é a maior centopeia conhecia ainda viva?


- Atualizado no dia 21 de maio de 2025 -

          Membros do gênero Scolopendra representam as maiores espécies conhecidas de centopeias, e são predadores vorazes. De hábitos noturnos e com fortes mandíbulas e forcípulas, caçam frequentemente grandes presas, como rãs e sapos de até ~10 cm, pequenos lagartos, cobras de até ~25 cm, aves do tamanho de pardais, roedores de pequeno porte (ex.: camundongos) e até morcegos. Essas centopeias são peçonhentas e acidentes com humanos em países como a Venezuela não são incomuns; o veneno injetado pode causar edema, eritema, dor intensa, linfangite local, tontura e necrose no local da mordida (1). Raramente a "mordida" (picada) desses invertebrados é letal para humanos.

          Entre as mais de 80 espécies descritas no gênero, a Scolopendra gigantea é provavelmente a maior, alcançando 30 cm de comprimento e habitando ilhas Caribenhas e regiões ao norte da Colômbia e da Venezuela (incluindo região Amazônica). Com comportamento agressivo, sua picada é muito dolorosa e o efeito dura por várias horas. É popularmente conhecida como centopeia-gigante-da-Amazônia, e exibe de 21 a 23 pares de pernas.

Figura 2. Na foto, uma centopeia S. gigantea segurando e comendo um morcego (espécie Mormoops megalophylla) após caçá-lo e matá-lo, no teto da caverna Cueva del Guano, na Península de Paraguaná, Venezuela. No caso, a centopeia devorou 35% da massa corporal do morcego predado. Ref.9


Figura 3. Centopeia S. gigantea predando uma cobra da espécie Phimophis guianensis. Evento registrado na Colômbia.


Figura 4. (A) Paciente de 21 anos após ser picada por uma centopeia do gênero Scolopendra de 10 cm de comprimento (B) enquanto dormia; foto da paciente após 2 dias de recuperação (C). Ref.10

          Assim como outras espécies de centopeias gigantes, a S. gigantea possui importante valor econômico na agricultura, ao controlar a população de potenciais pragas.

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(1) As centopeias injetam veneno com estruturas associadas à boca chamadas de forcípulas (Fig.5), as quais são derivados do primeiro par de pernas (membros modificados). A "mordida" - melhor caracterizada como picada - frequentemente deixa duas marcas pontuadas bem visíveis na pele. Comumente as picadas são sucessivas, aumentando a dor local resultante. É recomendado limpar o local com água e sabão.

Figura 5. Nas centopeias, o primeiro par de pernas (setas) é modificado no sentido de inocular veneno. Em outras palavras, centopeias não mordem, elas picam, inoculando substâncias tóxicas produzidas em glândulas de veneno associadas. O par de pernas modificado (forcípulas) é usado também para dominar/segurar presas e facilitar a alimentação. A ponta das forcípulas é afiada e mineralizada (incorporação de zinco ou cálcio), tornando-a muito dura e perfurante. Uma vez que a presa é capturada, as forcípulas perfuram a cutícula ou pele da presa e injeta veneno para imobilizá-la e matá-la. Na foto, centopeia da espécie Scolopendra hainanum. Ref.16-1720

(2) Falando em miriápodes e número de pernas, fica a sugestão de leitura: Cientistas descobrem espécie de milípede com número recorde de pernas

> O gênero Scolopendra pertence à família Scolopendidae da ordem Scolopendrida, e é amplamente distribuído ao redor do mundo, especialmente nos territórios tropical e subtropical, como o Sudeste Asiático, Norte da África, Mediterrâneo e parte da América do Norte e Central. Ref.11

Figura 6. Centopeia da espécie Scolopendra morsitans predando (A) e consumindo (B) um  lagarto da espécie Tympanocryptis tetraporophora. Essa espécie de centopeia pode alcançar 12,7 cm de comprimento, e é um predador noturno e generalista, com uma dieta composta primariamente de invertebrados mas que pode incluir pequenos vertebrados. Ref.12

> Representantes da ordem Scolopendrida incluem também as mais agressivas espécies de centopeias e o gênero Scolopendra é o responsável pela maioria dos acidentes envolvendo pessoas ao redor do mundo. As picadas são frequentemente descritas como uma dor severa e imediata, com ardência localizada e duração de várias horas até 3 dias. Efeitos sistêmicos são menos comuns, mas, quando ocorrem, podem ser sérios, incluindo anafilaxia. Ref.18

Figura 7. Diferentes padrões de cores de indivíduos da mesma espécie (Scolopendra cingulata). Essa é a maior espécie do gênero Scolopendra na Europa e também a mais comum. Adultos alcançam comprimento de 10 a 18 cm. Ref.19

> A centopeia gigante da espécie Scolopendra subspinipes - comumente conhecida como centopeia-chinesa-de-cabeça-vermelha - é amplamente distribuída na Ásia e possui um longo histórico de uso na medicina tradicional do Sudeste Asiático, com extratos corporais e veneno usados no tratamento de patologias diversos incluindo dor crônica, artrite e convulsão. O veneno dessa espécie exibe pelo menos 47 proteínas e vários peptídeos tóxicos, principalmente das famílias SLPTX11 e SLPTX15. O veneno das centopeias está associado a um dos sistemas de peçonha mais antigos entre os animais terrestres ainda vivos e contém peptídeos neurotóxicos similares àqueles encontrados em escorpiões e aranhas. Ref.13-14, 20

Figura 5. Filogenia representativa da ordem Scolopendrida, com destaque [em vermelho] para o clado do complexo Scolopendra subspinipes. Ref.14 

> Em geral, mordidas por centopeias do gênero Scolopendra são dolorosas e às vezes associadas com implicações mais severas de saúde. É sugerido inclusive que o gênero é provavelmente responsável por vários dos efeitos mais severos reportados em regiões tropicais, apesar da maioria dos acidentes reportados estarem associados com efeitos adversos leves ou moderados, como inchaço e eritema localizados. Ref.15

> Existem aproximadamente 3500 espécies ainda vivas de centopeias descritas e com um registro fóssil desses artrópodes datando de pelo menos 400 milhões de anos atrás. Aliás, curiosidade: Maior artrópode conhecido que já habitou a Terra era uma mistura entre centopeia e piolho-de-cobra, aponta estudo

> Apenas 15 espécies de centopeias (menos de 0,5% do total) são consideradas clinicamente importantes em acidentes envolvendo humanos. Mortes de humanos por picada de centopeia são muito raras mas tem sido registradas. Em um dos casos registrados de morte em humanos, a picada na região do pescoço da vítima levou a inchaço e asfixia letal. Ref.18

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REFERÊNCIAS

  1. https://www.scielo.br/j/rimtsp/a/3vVxDVdY8XPmsCvKXdNHjCv/
  2. https://www.cabdirect.org/cabdirect/abstract/20023132127
  3. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7944685/
  4. http://servicio.bc.uc.edu.ve/fcs/vol26n2/art02.pdf
  5. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/9781119569831.ch17
  6. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/9781119569831.ch17
  7. https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciBiolSci/article/view/1035/511
  8. https://sta.uwi.edu/fst/lifesciences/sites/default/files/lifesciences/documents/ogatt/Scolopendra_gigantea%20-%20Giant%20Centipede.pdf
  9. Molinari et al. (2005). Predation by Giant Centipedes, Scolopendra gigantea, on Three Species of Bats in a Venezuelan Cave. Caribbean Journal of Science, Vol. 41, No. 2, 340-346.
  10. https://www.scielo.br/j/rsbmt/a/F6tMwjWDyVDYkddxGbLJV6H/
  11. Kang et al. (2017). Taxonomy and Identification of the Genus Scolopendra in China Using Integrated Methods of External Morphology and Molecular Phylogenetics. Scientific Reports 7, 16032. https://doi.org/10.1038/s41598-017-15242-7
  12. McFadden & McFadden (2025). Predation of an adult Eyrean Earless Dragon, Tympanocryptis tetraporophora Lucas & Frost, 1895, by a Red-headed Centipede, Scolopendra morsitans, in Australia. Herpetology Notes, Volume 18: 221–223.
  13. https://www.mdpi.com/2072-6651/17/5/229
  14. https://www.mdpi.com/2072-6651/10/3/96
  15. Maczey, N. (2024). Scolopendra morsitans. CABI Compendium. Link do PDF 
  16. Guizze et al. (2016). Predatory behavior of three centipede species of the order Scolopendromorpha (Arthropoda: Myriapoda: Chilopoda). Zoologia, 33(06). https://doi.org/10.1590/S1984-4689zool-20160026
  17. Dugon, M.M. (2017). Evolution, Morphology, and Development of the Centipede Venom System. In: Malhotra, A. (eds) Evolution of Venomous Animals and Their Toxins. Toxinology. Springer, Dordrecht. https://doi.org/10.1007/978-94-007-6458-3_1
  18. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK542312/
  19. Oeyen et al. (2014). The Evolutionary History of the Rediscovered Austrian Population of the Giant Centipede Scolopendra cingulata Latreille 1829 (Chilopoda, Scolopendromorpha). PLoS ONE 9(9): e108650. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0108650
  20. Züger et al. (2024). Material composition and mechanical properties of the venom-injecting forcipules in centipedes. Frontiers in Zoology 21, 21. https://doi.org/10.1186/s12983-024-00543-1