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O que causa, como é gerado e para que serve o "mau cheiro" nas axilas?


- Atualizado no dia 17 de abril de 2024 -

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          Os mamíferos em geral produzem compostos odoríferos voláteis que possuem diversas finalidades, especialmente reconhecimento e função de feromônio. Nos humanos modernos (Homo sapiens) esses compostos desprendidos são conhecidos como odor corporal, cujo principal componente é o tioálcool 3-metil-3-sulfanilhexan-1-ol (3M3SH). O 3M3SH é produzido debaixo do braço, nas axilas, via atividade microbiana específica, gerando o tão famoso e desagradável "cecê". Nesse sentido, dois recentes estudos - um publicado no periódico eLife (Ref.1) e o outro no periódico Scientific Reports (Ref.2) - vieram para esclarecer com mais detalhes como esse mau-cheiro é gerado, o que pode inclusive possibilitar o desenvolvimento de inibidores específicos de combate a esse odor, ao invés da ação generalizada e muitas vezes limitadas dos desodorantes e dos antitranspirantes.

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   MECANISMO ODORÍFERO

          Na nossa espécie (H. sapiens), a pele das axilas (debaixo dos braços) fornece um ambiente único e bastante favorável a bactérias diversas. Através das secreções de várias glândulas - estas as quais abrem na pele ou dentro dos folículos capilares e formam um denso sistema glandular - esse ambiente se torna rico em nutrientes e hospeda uma rica comunidade microbiana. Ácidos graxos esterificados e outros lipídios são secretados pela glândula sebácea, enquanto as glândulas écrinas produzem uma solução salgada diluída com lactato e outros solutos orgânicos sendo excretados pela pele. Uma terceira glândula exócrina, a apócrina, a qual é mais especializada e encontrada somente nas axilas, auréola, genitália e no meato auditório externo (vulgo canal auditivo), começa a secretar uma secreção viscosa e rica em lipídios a partir da puberdade. Mas ao contrário da glândula écrina, essa secreção não está envolvida na termorregulação, e, nos mamíferos possui provavelmente um papel específico na geração de odores.


          A microbiota das axilas é dominada principalmente por bactérias dos gêneros Staphulococcus, Corynebacterium e Propionibacterium. Várias moléculas produzidas nas axilas têm sido ligadas ao mau-cheiro dessa região - também conhecido como cecê, catinga, CC, bodum e sovaqueira -, incluindo esteroides 16-androsteno e, ácidos graxos voláteis de cadeias curtas (C2-C5), e, principalmente, de cadeias médias (C6-C10) produzidos pela microbiota via várias rotas metabólicas. E mais recentemente, outro importante componente foi identificado: uma classe de moléculas que engloba os tioalcoóis (sulfanilalcanóis), estes os quais são particularmente mau-cheirosos e podem ser detectados a níveis de pg/l, uma ordem de magnitude mais baixa do que outros compostos voláteis sendo emitidos da pele. E o mais abundante e o mais mal-cheiroso desses tioalcoóis é o 3-metil-3-metil-3-sulfanilhexan-1-ol (3M3SH), o qual já foi demonstrado ser a causa molecular primária do mau-cheiro axilar oriundo do odor corporal.

          Para a produção do 3M3SH, o dipeptídeo cisteiniglicina-3-metil-3-sulfanilhexan-1-ol (S-Cis-Gli-3M3SH) é consumido e metabolizado por um altamente limitado espectro de bactérias do gênero Staphylococcus: S. hominis, S. haemolyticus e S. lugdunensis. Após produzido, o 3M3SH é liberado da célula bacteriana. Nos humanos, a S. hominis é a mais fortemente associada com esse processo.

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   MECANISMO DETALHADO

          No novo estudo publicado na eLife, os pesquisadores detalharam melhor o metabolismo realizado pela S. hominis para a produção do 3M3SH, fornecendo base teórica para o desenvolvimento de inibidores que possam livrar as pessoas do forte odor corporal, mas afetando especificamente essa espécie bacteriana.


          E mais recentemente, no estudo publicado no periódico Scientific Reports, os pesquisadores identificaram que a enzima liase cisteína-tiol (C-T liase) é essencial para a liberação de 3M3SH - especificamente visando o percursor Cis-3M3SH. Expressando o gene responsável por essa enzima em outra bactéria Stahlococcus não produtora de compostos odoríferos, eles mostraram que essa enzima era tanto necessária quanto suficiente para a formação do tioálcool. Ou seja, estratégias terapêuticas ainda mais específicas visando essa enzima podem ser ainda mais promissoras.

          A maior vantagem do uso de uma terapia mais específica é que os métodos de prevenção ao excesso de odor corporal não impactariam a microbiota axilar como um todo, apenas o agente causador do mau cheiro. Isso conservaria um equilíbrio microbiótico saudável na região, minimizando efeitos colaterais negativos a longo prazo. Os antitranspirantes, por exemplo, agem neutralizando o odor corporal ao reduzirem a produção de suor através de sais de alumínio.  Esses sais, como o cloridrato de alumínio, formam precipitados com os eletrólitos do suor que fisicamente bloqueiam as glândulas sudoríparas; esse processo reduz os recursos disponíveis para o crescimento da microbiota como um todo. Nesse sentido, todas a comunidade bacteriana é prejudicada. Já os desodorantes, apesar de não interferirem na produção de suor, agem reduzindo as populações bacterianas via bactericidas diversos, como etanol e triclosan.

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OBS.: Existe um rumor já antigo que corre pelas internet de que os antitranspirantes podem aumentar o risco de câncer de mama. Isso não é verdade. Não existe mínima evidência ou plausibilidade científica para tal alegação. Dois importantes fatores para o aumento de risco para o câncer de mama, e que são amplamente ignorados, é o consumo alcoólico (I) e a obesidade (II).

Leitura recomenda: 

Aproveitando a deixa, uma dica importante: não use desodorantes e antitranspirantes na região íntima. Componentes nesses produtos podem irritar ou danificar a sensível pele dos órgãos genitais. Para aliviar odores desagradáveis nessa área, busque intensificar a higiene íntima ou busque uma consulta com um médico especialista caso o problema não seja apenas questão de higienização.
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   POR QUE GERAMOS ODOR CORPORAL?

          A produção de odores corporais pelos humanos é um antigo processo olfativo evolucionário que provavelmente está associado mecanismos de seleção sexual e de seleção natural baseados em sinalizações químicas e coevolução com a microbiota. Outros animais como raposas, gatos, veados e besouros também parecem realizar sinalizações químicas via intermédio de bactérias (não diretamente pelo corpo, como na maioria dos outros animais). Apesar de hoje ser incerta a extensão de influência do olfato nas relações sociais e amorosas humanas no contexto de sociedades industrializadas, no passado acasalamentos e interações sociais podiam ser crucialmente decididos dependendo do odor corporal diferenciado emitido por machos e fêmeas, especialmente via compostos voláteis facilmente detectáveis, como o 3M3SH.

            Aliás, entre os ácidos orgânicos relacionados com odores corporais e produzidos nas axilas, temos em destaque o ácido 3 meti-2-hexenoico (3M2H) e o quantitativamente dominante ácido 3-hidróxi-3-metil-hexanoico (HMHA). Esses dois ácidos carboxílicos, até o momento, não foram descritos em outras espécies de animais e, portanto, podem ser específicos de humanos modernos.


           O estudo de 2018 na eLife, além de descrever como a bactéria S. hominis metaboliza e libera o principal composto volátil de mau cheiro, também mostrou que as bactérias que não geram esse composto - ou quaisquer outros compostos ligados ao odor corporal - podem também ingerir o percursor dipeptídeo através do mesmo processo metabólico. Isso sugere que a produção do forte odor é um processo único que ocorre uma vez que o dipeptídeo está dentro da S. hominis, implicando que os humanos e essa bactéria provavelmente evoluíram juntos (coevolução).

          No estudo citado da Scientific Reports, os pesquisadores usaram filogenética, bioquímica e biologia estrutural para demonstrar que a enzima C-T liase se moveu horizontalmente em um grupo monofilético do gênero Staphylococcus há cerca de 60 milhões de anos, subsequentemente adaptando sua função enzimática para percursores tioalcoóis humano-derivados. Esse processo evolutivo ocorreu através de mudanças no local de ligação para criar uma região hidrofóbica que é seletiva para ligantes ramificados alifáticos tioalcoóis. Essas evidências sugerem fortemente que a produção de odor corporal em humanos modernos é um processo muito antigo, provavelmente emergindo em ancestrais primatas não-humanos muito antes da emergência da nossa espécie, com a enzima C-T liase continuando a coevoluir especificamente com os humanos.

          Nesse último caso, a presença de uma enzima bacteriana específica para a produção de 3M3SH sugere fortemente pressão seletiva para a produção de odor ao longo de um estendido período de tempo evolucionário. Ou seja, a presença dessa enzima parece, de fato, fornecer vantagens para o hospedeiro (primata) que ativamente produz precursores para o odor que aparentemente não possui outras razões fisiológicas a não ser 'alimentar' a microbiota odorífera.

          Em outros mamíferos que dependem das bactérias para a produção de odores corporais específicos, a produção de cheiros é ligada à liberação de feromônios - substâncias voláteis envolvidas na comunicação e na seleção de parceiros sexuais. A persistência de grande quantidade de longos pelos na região das axilas - especialmente nos indivíduos do sexo masculino - é um forte indicativo da importância desses odores para a sinalização [comunicação química]. Além da abundância de glândulas apócrinas, a presença específica de vasta quantidade de pelos longos nas axilas tem sido proposta de servir para reter compostos químicos [odoríferos] ativos nos processos de comunicação, aumentando a intensidade do odor corporal (Ref.16). Relevante também apontar que outros primatas hominídeos (ex.: chimpanzés) parecem ter menos pelos nas axilas, sugerindo novamente a ideia que os pelos axilares humanos evoluíram como uma adaptação.

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Mito da Deficiência Olfativa em Humanos

> Existe uma histórica e persistente falsa crença que humanos possuem uma baixa capacidade de olfato. O nariz humano - com ~400 receptores olfativos - pode talvez detectar até ~1 trilhão de odores, superando outros sentidos em termos de combinações percebidas, incluindo a visão (10 milhões de combinações a partir de três receptores de luz) e audição (10 mil diferentes tons) (Ref.12-13). Somando-se a isso, o olfato humano pode detectar alguns compostos em concentrações tão baixas quanto 10 partes por bilhão ou menos, e ainda discriminar entre duas moléculas odoríferas que são imagens espalhadas uma da outra (Ref.14). Em outras palavras, o sistema olfativo humano possui alta sensibilidade e especificidade.

Leitura complementar

> O mito de que o olfato é fraco e subdesenvolvido em humanos parece ter origem de um estudo neuroanatômico comparativo do século XIX. Nesse falho e limitado estudo, o neuroanatomista Paul Broca concluiu que o bulbo olfativo humano no cérebro foi atrofiado [com robusta perda da capacidade olfativa] em prol de um lobo frontal hipertrofiado. Porém, análises neuroanatômicas modernas mostram que o nosso bulbo olfativo é relativamente grande [em termos absolutos,  embora constitua apenas 0,01% do volume cerebral em comparação com 2% em ratos] e, mais importante, o número de neurônios nessa estrutura é similar àquele encontrado em outros mamíferos. A errônea alegação de Broca inclusive influenciou o famoso médico neurologista Sigmund Freud, este o qual chegou a argumentar que o bulbo olfativo humano atrofiado tornou humanos mais suscetíveis a doenças mentais. No geral, nosso senso olfativo é similar àquele de outros mamíferos (incluindo ratos e cães), e nosso alta capacidade olfativa é reforçada por dados genéticos e neurobiológicos. Ref.15


Comparação do bulbo olfativo de um camundongo e de um humano (visão do aspecto ventral). Ambos os bulbos estão na mesma escala. 

> Importantes pistas olfativas em humanos parecem também estar associadas com a região da genitália externa, onde as glândulas apócrinas também ocorrem em meio a uma maior concentração de pelos longos [pubianos] em ambos os sexos. Existem ~120 compostos que constituem o odor corporal humano.
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          Evidência científica acumulada tem apontado que o odor corporal pode fornecer informação sobre heterozigosidade (diversidade de alelos/variantes genéticas), estabilidade de desenvolvimento, hormônios sexuais e saúde (Ref.8). Odores específicos para cada indivíduo são geneticamente determinados e estáveis, e podem indicar a qualidade geral de um potencial parceiro sexual (Ref.3, 19). Os odores corporais humanos também são alterados com mudanças no estado emocional (ex.: nível variável de agressividade e potencial de violência) e exposição a diferentes odores "emocionais" podem afetar a fisiologia e o comportamento de pessoas - indicando potencialmente um papel de comunicação social via sinalização química (Ref.9, 17). Características sociais dos indivíduos parecem também ser sinalizadas com o odor corporal (Ref.18).

          E existe evidência de que, assim características faciais e vocais, existe uma maior preferência por certos odores corporais, sugerindo novamente ação de seleção sexual para escolha de parceiros via pistas olfativas (Ref.20).

         Em especial, esses compostos voláteis - diferentes tipos ou níveis - podem acusar cargas genéticas distintas entre os humanos através do olfato, com a liberação diferenciada desses compostos por cada indivíduo fomentando a união (acasalamento) entre pessoas não relacionadas por parentesco. Isso garantiria maior variabilidade genética e potencial adaptativo, evitando também problemas genéticos comuns causados por genes recessivos. Hoje isso pode não parecer algo importante, mas em um passado distante onde os grupos humanos eram bem menores e mais isolados essas pistas químicas captadas pelo olfato podem ter sido essenciais, explicando nossa coevolução com a microbiota odorífera.

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Complexo Principal de Histocompatibilidade

> O complexo principal de histocompatibilidade (MHC) é uma grande região genômica onde encontram-se genes extremamente importantes para o sistema imune, autoimunidade e para o sucesso reprodutivo (ex.: atuando na imunotolerância fetal pelo sistema imune materno). É uma região altamente conservada entre os vertebrados com mandíbula, com origem estimada há ~500 milhões de anos, e em humanos os genes associados [antígenos leucocitários humanos] estão localizados no braço curto do cromossomo 6.

A região MHC inclui os mais polimórficos genes no genoma humano, com centenas de alelos conhecidos. E forte evidência aponta que essa região está sob pressão seletiva para manter alta diversidade alélica na população humana, resultando em benefícios imunes contra doenças infecciosas. Ao longo de vários vertebrados, indivíduos parecem preferir parceiros sexuais com um distinto perfil genômico de MHC, aumentando a probabilidade de potenciais filhotes com MHC heterozigoto e mais resistentes a um amplo espectro de patógenos. Em ratos e outros grupos de vertebrados, essa preferência aparentemente é mediada por pistas olfativas (odores corporais diferenciados). 

Estaria a preferência por parceiros sexuais sendo também mediada por pistas olfativas em humanos?

Estudos experimentais e de revisão publicados nos últimos anos têm trazido evidências conflitantes nesse sentido, sendo incerto se a percepção do odor corporal influencia na formação de casais com base em dissimilaridade do MHC. Evidências científicas acumuladas até o momento sugerem que não existe significativo efeito do MHC na seleção de parceiros sexuais humanos, mas estudos mais compreensivos precisam ser feitos para melhor esclarecer a questão (Ref.21-24). Por exemplo, em sociedades industrializadas e complexas, especialistas apontam que o nível de diversidade MHC já é muito alto, reduzindo a probabilidade de duas pessoas em uma relação amorosa exibirem um MHC similar - sugerindo que estudos conduzidos nessas populações não refletem interações humanas que marcaram a maior parte da nossa história evolutiva (Ref.22). 

Válido também apontar que atualmente não existe relevante evidência de suporte entre pistas odoríferas e qualidade imune dos indivíduos (Ref.25). PORÉM, existe convincente evidência recente de que o odor corporal de indivíduos doentes (ex.: infectados e sintomáticos) é qualitativamente distinto daquele produzido por indivíduos saudáveis, com pistas olfativas sendo detectáveis no supor axilar em poucas horas após ativação do sistema imune inato (Ref.26). Em outras palavras, o odor corporal pode ativar comportamento de repulsa em relação a indivíduos doentes no sentido de prevenir disseminação de doenças infecciosas.
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           Por fim, o odor corporal também promove a identificação dos filhos pelos pais, facilitando comportamentos pró-sociais e permitindo maior investimento seletivo de recursos. Mães e pais [humanos] conseguem identificar o odor do/a filho/a e preferem esse odor em relação àquele de crianças não familiares. Além disso, odores corporais transportam percepção olfativa emocional (informação hedônica), com odores familiares ativando redes neurais de recompensa e de prazer e reduzindo respostas de estresse. E substancial variação do odor corporal na pós-puberdade - associada a fatores hormonais - tem sido ligada a um mecanismo de prevenção ao incesto, com a preferência olfativa materna relativa ao odor dos filhos sendo significativamente reduzida com o avanço da idade desses últimos; a preferência paterna parece ser reduzida especificamente para filhas [sexo feminino] na pós-puberdade, reforçando a hipótese da prevenção ao incesto (Ref.27).

Leitura recomendada:


   EXTREMO ORIENTE

            Uma significativa parte da população no Extremo Oriente - a zona Asiática mais ao leste, incluindo a China, Coreias, Japão e Mongólia - produz uma cera de ouvido branca e seca, em oposição à cera de ouvido úmida e amarela dominante no resto da população global*. Ao mesmo tempo, indivíduos com esse fenótipo também são reportados exibir níveis muito baixos do típico odor axilar, ou seja, não produzem significativo "mau-cheiro" nas axilas (Ref.3,10). Esse fenótipo é causado pelo polimorfismo nucleotídico (SNP) 538G → A no gene ABCC11 - e de forma homozigótica (!). Esse gene codifica uma proteína que catalisa precursores de odor nas vesículas secretórias nas axilas, e parece estar diretamente envolvido na secreção de precursores de odor nas glândulas apócrinas. Essa mutação no gene ABCC11 parece ter ocorrido uma vez e então se espalhado rápido na população do Extremo Oriente, alcançando quase 100% de prevalência em certas populações e indicando uma forte pressão seletiva positiva.

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(!) Indivíduos que apresentam uma variante íntegra do gene (G) - forma heterozigótica (A/G) - exibem apenas uma redução significativa do típico odor axilar; quase ausência desse odor é observada apenas quando o alelo mutante (A) é expresso de forma homozigótica (A/A). No Leste Asiático, a nível populacional, prevalência do genótipo A/A reportada é de 80-95%, enquanto o fenótipo é raro entre populações Europeias e Africanas (0-3%).
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            Como essa mutação afeta a composição de secreções apócrinas nos ouvidos, na axila e também do colostro no início da lactação**, é incerto qual é o exato fator que fomentou a rápida fixação do genótipo ABCC11 538G → A em populações humanas do Leste Asiático. É possível especular que um fenótipo com quase ausência de odor axilar ("sem cecê") tenha se tornado um atributo de preferência social em antigas culturas Asiáticas e, portanto, conferindo vantagem na seleção de parceiros sexuais. Além disso, a alta prevalência do genótipo A/A claramente realça que os odores axilares perderam seu potencial de vantagem adaptativa em interações sociais nas culturas onde o alelo mutante se tornou prevalente.


          Indivíduos homozigóticos para a mutação ABCC11 538G → A são muito menos prováveis de adotar certos hábitos de higiene, como o uso de desodorante para combater o odor axilar, comparado com aqueles que carregam pelo menos um alelo funcional do gene (alelo G) - e é sugerido que usem tais produtos para benefícios alternativos (ex.: controle de suor). No Reino Unido, esses indivíduos são 5 vezes menos prováveis de usar desodorante do que aqueles carregando um alelo G (Ref.11).

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   CONCLUSÃO

          Assim como no nosso intestino, a pele humana abriga uma grande diversidade de microrganismos em equilíbrio saudável com o nosso corpo, entre bactérias, fungos, Archaeans e bacteriófagos. Nas axilas, devido a fatores evolutivos de provável sinalização química, esses microrganismos produzem fortes cheiros que muitas vezes incomodam bastante. Sabendo melhor como o mecanismo bioquímico de formação desses odores corporais ocorre, novos produtos de higiene pessoal futuramente poderão ser mais eficientes e específicos, de forma a combater o mau-cheiro mas sem trazer prejuízos para a microbiota.



REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS
  1. Thomas et al. (2018). Structural basis of malodour precursor transport in the human axilla. eLife 7:e34995. https://doi.org/10.7554/eLife.34995
  2. Rudden et al. (2020). The molecular basis of thioalcohol production in human body odour. Scientific Reports 10, 12500. https://doi.org/10.1038/s41598-020-68860-z
  3. Natsch & Emter (2020). The specific biochemistry of human axilla odour formation viewed in an evolutionary context. Philosophical Transactions of the Royal Society B: Biological Sciences, 375(1800), 20190269. https://doi.org/10.1098/rstb.2019.0269
  4. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4741080/
  5. https://www.cancer.org/cancer/cancer-causes/antiperspirants-and-breast-cancer-risk.html
  6. https://scienceline.ucsb.edu/getkey.php?key=2333
  7. https://goaskalice.columbia.edu/answered-questions/deodorant-down-below
  8. Třebický et al. (2023). (Cross-modal associations of human body odour attractiveness with facial and vocal attractiveness provide little support for the backup signals hypothesis: A systematic review and meta-analysis. Evolution and Human Behavior, Volume 44, Issue 1, Pages 19-29. https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2022.11.001 
  9. Roberts et al. (2022). Emotional expression in human odour. Evolutionary Human Sciences, 4, E44. https://doi.org/10.1017/ehs.2022.44
  10. Martin et al. (2010). A Functional ABCC11 Allele Is Essential in the Biochemical Formation of Human Axillary Odor. Journal of Investigative Dermatology, Volume 130, Issue 2, Pages 529-540. https://doi.org/10.1038/jid.2009.254
  11. Harker et al. (2014). Functional characterisation of a SNP in the ABCC11 allele—Effects on axillary skin metabolism, odour generation and associated behaviours. Journal of Dermatological Science, 73(1), 23–30. https://doi.org/10.1016/j.jdermsci.2013.08.016
  12. Bushdid et al. (2014). Humans Can Discriminate More than 1 Trillion Olfactory Stimuli. Science, Vol 343, Issue 6177, pp. 1370-1372. https://doi.org/10.1126/science.1249168
  13. Gerkin & Castro (2015). The number of olfactory stimuli that humans can discriminate is still unknown. eLife, e08127. https://doi.org/10.7554/eLife.08127
  14. Dikeçligil & Gottfried (2023). "What Does the Human Olfactory System Do, and How Does It Do It?" Annual Review of Psychology, Volume 75, pp. 155-181. https://doi.org/10.1146/annurev-psych-042023-101155
  15. McGann, J. P. (2017). Poor human olfaction is a 19th-century myth. Science, Vol.356, Issue 6338. https://doi.org/10.1126/science.aam7263
  16. Kohoutová et al. (2011). Shaving of axillary hair has only a transient effect on perceived body odor pleasantness. Behavioral Ecology and Sociobiology, 66(4), 569–581. https://doi.org/10.1007/s00265-011-1305-0
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  19. Třebický et al. (2023). Cross-modal associations of human body odour attractiveness with facial and vocal attractiveness provide little support for the backup signals hypothesis: A systematic review and meta-analysis. Evolution and Human Behavior, Volume 44, Issue 1, Pages 19-29. https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2022.11.001
  20. Williams & Apicella (2023). "Do humans agree on which body odors are attractive, similar to the agreement observed when rating faces and voices?" Evolution and Human Behavior, Volume 44, Issue 2, Pages 120-130. https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2022.11.003
  21. Havlíček et al. (2020). Major histocompatibility complex-associated odour preferences and human mate choice: near and far horizons. Philosophical Transactions of the Royal Society B. https://doi.org/10.1098/rstb.2019.0260
  22. Croy et al. (2020). Marriage does not relate to major histocompatibility complex: a genetic analysis based on 3691 couples. Proceedings of the Royal Society B, Volume 287, Issue 1936. https://doi.org/10.1098/rspb.2020.1800
  23. Schubert et al. (2021). How can the MHC mediate social odor via the microbiota community? A deep dive into mechanisms, Behavioral Ecology, Volume 32, Issue 3, Pages 359–373, https://doi.org/10.1093/beheco/arab004
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  25. Schwambergová et al. (2021). No evidence for association between human body odor quality and immune system functioning. Psychoneuroendocrinology, Volume 132, 105363. https://doi.org/10.1016/j.psyneuen.2021.105363
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  27. Schäfer et al. (2024). Body odours as putative chemosignals in the father-child relationship: New insights on paternal olfactory kin recognition and preference from infancy to adolescence. Physiology & Behavior, Volume 278, 114505. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2024.114505